O sistema bancário ocidental é um castelo de cartas
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01-01-2013 | 636,42 |
01-01-2014 | 728,86 |
01-07-2014 | 732,78 |
01-01-2015 | 598,68 |
Segundo os padrões mundiais, um nível aceitável de
dívida é
da ordem dos 35% do PIB. Para comparação: a dívida
média externa excede os 100% nos países da União Europeia.
É igual a 100% do PIB nos Estados Unidos. A dívida é muito
mais alta nos países dos "milhares de milhões
dourados". Ultrapassa os 400% na Suíça e na
Grã-Bretanha.
A parte de leão da dívida russa cai no Ocidente (dívida
pública, bancos, e setor não financeiro da economia). Os bancos
norte-americanos e europeus são os maiores detentores de títulos
russos. As sanções contra a Rússia foram impostas em
março de 2014. Desde então, o estado russo, os bancos e as
empresas russas têm pago regularmente os juros das suas dívidas.
Segundo Paul Craig Roberts, a Rússia tem base legal e política
para tomar a decisão de suspender os pagamentos numa
situação continuada de força maior. A Rússia foi
atingida por uma "força superior". Isso liberta-a da sua
obrigação perante um acontecimento ou circunstância fora do
seu controlo. De notar que não se trata de recusar o cumprimento das
obrigações, mas de adiar os pagamentos. A base política
é o facto de que foi desencadeada uma guerra económica contra a
Rússia. Paul Craig Roberts diz que a prova recente dessa guerra em curso
está na queda do rublo. Ele acha que a queda brusca do rublo não
é uma coincidência fatal mas antes uma ação planeada
enquanto se trava a guerra. A queda da divisa põe em causa o cumprimento
das obrigações para com os prestamistas ocidentais. Roberts tem a
certeza de que a queda do rublo pode e deve ser considerada como
"força superior" para justificar a suspensão dos
pagamentos, até que o rublo recupere a sua posição.
Segundo ele, "os russos nem sequer têm de entrar em incumprimento.
Podem dizer apenas, "Este ano não pagamos. Pagamos depois. Pagamos
quando o rublo estabilizar". "Podemos perceber qual o impacto no
Ocidente dessa decisão dos russos", diz o cofundador da
reaganeconomics. Ele acredita que o impacto será significativo, em
especial no caso dos bancos europeus. Na sua opinião, "o sistema
bancário europeu irá abaixo porque esses bancos estão
terrivelmente descapitalizados. Alguns deles têm empréstimos
à Rússia que quase absorvem toda a sua base de capital". E
acrescenta, "Podemos entender o impacto no Ocidente dessa decisão
dos russos, dadas todas as ligações e interligações
quando o Lehman Brothers foi abaixo teve o mesmo efeito adverso tanto na
Europa como nos Estados Unidos". Os economistas americanos dizem,
"Estive a ouvir as notícias hoje e havia toda aquela gente
farisaica muito feliz por finalmente terem encostado a Rússia à
parede, "a Rússia está feita" e a Rússia estava
acabada e "em breve será um estado vassalo da América como
lhe compete". E eu estava a ouvir estas parvoíces e comecei a
pensar, "Como é que as pessoas podem ser tão absolutamente
estúpidas?" Mas são, e são igualmente
estúpidas em Washington. E enquanto isso, dentro deste processo, Eric,
podemos ver a Rússia a lançar ações inesperadas que
deitam abaixo o castelo de cartas ocidental
".
Acredito que o sistema bancário ocidental parece realmente um castelo de
cartas. No final de 2014, o Banco de Compensações Internacionais
(BIS) em Basileia publicou os dados mais recentes apresentando a
posição de bancos estrangeiros na Rússia e dos bancos
russos no estrangeiro e lançando alguma luz sobre os possíveis
prejuízos para as partes envolvidas (os sistemas bancários) caso
a Rússia introduza uma moratória nos pagamentos da dívida
externa.
Quadro 1
Indicadores do custo do risco para os bancos estrangeiros na Rússia
(a 1 de julho de 2014, em milhares de milhões de dólares)
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(crédito e outros empréstimos) |
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EUA | 109,6 | 26,1 | 85,3 |
França | 59,1 | 47,8 | 11,3 |
Grã-Bretanha | 45,2 | 14,3 | 30,9 |
Itália | 34,0 | 18,4 | 6,3 |
Alemanha | 20,8 | 17,7 | 3,1 |
Japão | 20,3 | 18,4 | 1,9 |
Holanda | 15,7 | 15,7 | - |
Suécia | 9,1 | 9,1 | - |
Espanha | 1,4 | 1,2 | 0,2 |
Outros países | 48,0 | 31.4 | 16,6 |
363,2 | 207,6 | 155,6 |
Como se vê no Quadro 1, os bancos norte-americanos detêm a quota
principal de todos os riscos para bancos estrangeiros na Rússia, em 30
por cento. As percentagens para os bancos de outros países principais
são: França 16,2%; Grã-Bretanha 12,4%;
Itália 9,4%; e Alemanha 5,7%. No conjunto, os nove
países listados no quadro acima detêm 86,6 por cento de todos os
riscos. A grande maioria de todos os riscos para os bancos estrangeiros na
Rússia é responsável pelo risco de prejuízos
associados ao não pagamento dos créditos emitidos a bancos
russos. A quota geral desses riscos eleva-se a 57,2 por cento. Os restantes
42,8 por cento caem na categoria de "outros riscos" (também
chamados de "riscos potenciais" ou "passivos
contingentes"). Estes incluem possíveis prejuízos para
bancos estrangeiros que decorrem das suas obrigações ao abrigo de
garantias bancárias e instrumentos financeiros derivados. Tomando apenas
em consideração os prejuízos resultantes da
suspensão dos pagamentos da dívida pela Rússia, os
principais perdedores irão ser (do maior para o mais pequeno): a
França, os Estados Unidos, a Itália, o Japão, a Alemanha,
a Holanda, a Grã-Bretanha e a Suécia. Paul Craig Roberts tem
razão quando diz que os bancos europeus são os que mais
sofrerão. Os meios de comunicação mencionam os bancos
europeus mais vulneráveis, incluindo o UniCredit italiano e o
Société Générale francesa. Também são
mencionados alguns bancos austríacos como, por exemplo, o Raiffeisen
Bank International com o seu portfólio russo de 10,8 mil milhões
de euros (no início de 2015).
Os bancos europeus não estão ameaçados apenas pela
Rússia, mas também pela Grécia, pela Itália, pela
Espanha, por Portugal e pela Irlanda. Os tesouros destes países emitiram
títulos no valor de muitos milhares de milhões de euros.
Estão a perder o seu valor de dia para dia. Isso está a corroer a
estabilidade de bancos gigantescos. Segundo o Banco de
Compensações Internacionais, os riscos potenciais dos bancos
alemães no conjunto da Grécia, da Irlanda e de Portugal
ultrapassam os 220 mil milhões de euros. Os bancos franceses correm
riscos de 150 mil milhões de euros.
No Outono de 2014, o Banco Central Europeu publicou os resultados de um
cuidadoso exame ao longo do ano sobre a resiliência e as
posições dos 130 maiores bancos da área do euro. A
análise abrangente que consistiu na avaliação da
qualidade de ativos (AQR) e um teste de stress dos bancos com vista ao futuro
encontrou uma escassez de capital de 25 mil milhões de euros em
25 bancos. Doze dos 25 bancos já tinham coberto a sua falta de capital,
aumentando o capital em 15 mil milhões de euros em 2014. Os bancos com
falta de capital têm de preparar planos de capitalização no
prazo de duas semanas depois da publicação dos resultados. Os
bancos terão até nove meses para cobrir a falta de capital. A
verdade é que este relatório atraiu poucas atenções
na Europa e no resto do mundo. O Banco Central Europeu e outras
instituições da UE fazem o melhor possível para esconder o
verdadeiro estado de coisas.
O problema é que os novos testes são muito suaves. O Centro para
Gestão de Risco da Suíça, em Lausana, sugeriu estimativas
mais rigorosas. Por exemplo, os seus especialistas colocam a falta de capital,
apenas em 37 bancos, em quase 500 mil milhões de euros, em
oposição aos 6 mil milhões de euros do relatório do
BCE, na sua amostra de 130. Este teste mais rigoroso mostra como o valor do
mercado de ativos se comporta sob tensão. Há outras estimativas
mais próximas da que é dada pelos especialistas do Centro de
Lausana. A falta de capital que os prestamistas enfrentam, desde o JPMorgan
Chase & Co. ao HSBC Holdings Plc pode chegar aos 870 mil milhões de
dólares, segundo as estimativas da Alliance Bernstein Ltd.
Resumindo tudo isto, podemos chegar à conclusão de que o sistema
bancário da União Europeia é muito menos estável do
que o sistema bancário dos Estados Unidos. Segundo a
investigação do ano passado, feita pelo Fundo Monetário
Internacional, só 30% de 300 bancos europeus têm uma estrutura e
reservas que garantam lucros a longo prazo, em comparação com 80%
nos Estados Unidos. O sistema bancário europeu está preso por
cordelinhos. Como diz Paul Craig Roberts pode ir abaixo como um castelo
de cartas. Basta que os russos introduzam uma moratória sobre os
pagamentos da dívida. Se a Grécia se juntar a isso o
colapso é inevitável. É preciso ter em
atenção que no mundo da finança internacional essas
situações normalmente dão origem a um efeito de
dominó. Se o sistema europeu entrar em colapso, os bancos dos Estados
Unidos vão a seguir.
Lembremos a Grande Depressão dos anos 30. O pânico na bolsa de
valores de Nova Iorque em 1929 atingiu rapidamente outros bancos americanos.
Houve alguma estabilização em 1931 até que se seguiu outro
golpe, ainda mais poderoso. Veio da Europa. Nessa altura, o processo foi
provocado pelo colapso de um só banco o Creditanstalt
austríaco. Hoje poderá ser o Raiffeisen Bank International.
Não posso deixar de concordar com Paul Craig Roberts que disse na sua
entrevista que as pessoas em Washington que desencadearam a guerra
económica contra a Rússia são absolutamente
estúpidas.