As amarras da UE dos monopólios
Uma Europa sem futuro
por Vladimir Nesterov
[*]
No passado Verão o bom humor prevaleceu em Bruxelas. Quando o Eurostat
publicou o seu relatório estatístico para o segundo trimestre,
ficou-se a saber que a economia da zona euro tinha crescido, apesar das
expectativas pessimistas de alguns especialistas. Nada de significativo, claro
em 0,3% e mesmo isso, graças principalmente a uma certa
recuperação económica na Alemanha e em França. O
crescimento das maiores economias da Europa foi equivalente a 0,7% e a 0,5%,
respectivamente, em termos anuais. Foi previsto que o PIB da Alemanha iria
crescer mais 0,5% no final do ano. Evidentemente o PIB da zona euro, que baixou
por causa dos "países problemáticos" do Sul da Europa,
também iria descer nos mesmos 0,5%.
De qualquer modo, o presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy,
apressou-se a anunciar que "se ultrapassara o ponto baixo da crise
financeira na Europa" e o presidente da Comissão Europeia,
José Manuel Barroso, proclamou que "a UE está a passar de
uma política de crise para uma política de crescimento". E
tudo isto foi acontecendo enquanto os especialistas continuavam a dizer que
é demasiado cedo para começarmos a regozijar-nos quanto ao
"crescimento". Por exemplo, Guntram Wolff, director do centro
analítico Bruegel, afirmou nessa altura, "Os números do
crescimento em toda a Europa ainda são demasiado baixos para permitir
inverter a situação no mercado do emprego. As taxas de desemprego
vão continuar a manter-se altas no Sul da Europa no próximo ano.
Vai demorar algum tempo antes de assistirmos a um alívio nessa
área
Penso que o investimento público é
especialmente importante na Alemanha, que tem uma das quotas
mais baixas na UE. É surpreendente que num país
onde o dinheiro dos empréstimos contraídos é tão
barato, os investimentos sejam tão baixos. Na Alemanha em especial
há algum défice no que se refere a infra-estruturas
públicas. Nalgumas regiões, como a do Ruhr, é evidente que
os investimentos públicos estão a ficar para trás".
No entanto, nem Berlim nem Bruxelas estão preparados para esta
mudança dos acontecimentos. Claro, o BCE tentou tomar algumas medidas,
por exemplo, baixando a taxa de desconto para 0,25%. Mas a Alemanha, que tem a
economia mais forte da Europa, não aumentou os investimentos de acordo
com a iniciativa do BCE. Submetendo-se à vontade de Berlim, houve outros
países que fizeram a mesma coisa.
Vendo a política financeira dos seus governos, os empresários
também aderiram ao jogo do "dinheiro barato". Começaram
a investir, mas em imobiliário, e não no sector real. Isso
aconteceu em França, na Alemanha e noutros países.
Um Novembro sóbrio
O optimismo do Verão dos funcionários de Bruxelas evaporou-se em
Novembro passado. No final do terceiro trimestre, o crescimento
económico da zona euro revelou-se ilusório foi apenas de
0,1% (!). Ou seja, a crise não tinha desaparecido; mantivera-se apenas
em baixo a fim de voltar a rebentar com nova força. O terceiro trimestre
desmentiu a noção generalizada de uma "Europa a duas
velocidades", segundo a qual, enquanto no Sul da Europa não
há crescimento, ele existe sem sombra de dúvida no Norte. Nada
pode estar mais longe da verdade; nenhum país na zona do euro pode
actualmente gabar-se de um crescimento significativo. Mesmo na Alemanha, o
crescimento do PIB foi ridiculamente modesto 0,3%, ou 1,3% em termos
anuais. E possivelmente nem vão acabar com estes 1,3%. A verdade
é que em Setembro a produção já começara a
diminuir. E o quarto trimestre começou de modo extremamente fraco; em
Outubro o volume da produção industrial da Alemanha foi 1,2% mais
baixo do que em Setembro. A produção na indústria de
transformação baixou em 1,1%, a produção de bens de
capital diminuiu em 3% e o fabrico de bens consumíveis duradouros
diminuiu em 4,5%.
"A economia alemã não conseguiu fazer um bom arranque no
quarto trimestre. Os negócios ainda estão emperrados por falta de
investimento. Isso indica uma posição bastante cautelosa para a
actividade de investimento nos próximos meses", disse o economista
do Commerzbank, Ralph Solveen, comentando os recentes acontecimentos.
Afinal, tudo tem a ver com o reduzido poder de compra na Europa e no resto do
mundo, provocado pela crise. Para a economia alemã, que se centra na
exportação, os tempos são difíceis. Vale a pena
observar que em Novembro na cimeira China-UE em Beijing, nem os alemães
nem os outros europeus, que estão habituados a criticar o governo
chinês por "violações dos direitos humanos",
disseram uma única palavra sobre este tópico. E é
compreensível: quer os alemães gostem ou não da forma como
os chineses fazem as coisas, não há nenhum outro consumidor dos
seus produtos tão grande como a China, e dificilmente aparecerá
outro.
As coisas não correm melhor nos países mais pequenos da zona do
euro. A Áustria conseguiu regressar a um insignificante crescimento de
0,2%. A Holanda compensou uma queda na primeira metade do ano, apresentando um
crescimento de 0,3%. A Finlândia atingiu um crescimento de 0,4%.
Também não houve alterações significativas para
melhor no "problema" do Sul da Europa. O crescimento em Espanha
é microscópico; a Itália ainda não está a
crescer e desde o início da crise o seu PIB reduziu-se em 25% (!). Na
Grécia o declínio continua como habitualmente, apesar de
não tão rapidamente como anteriormente.
Quanto à França, as pessoas pensam agora que o "doente
crónico" da Europa já não é a Grécia,
mas o seu próprio país. Uma redução de 0.1% no PIB
provocou uma espécie de stress nacional. Afinal, tanto o gaullista
Nicolas Sarkozy como o socialista François Hollande reduziram
continuamente as despesas sociais, aumentaram os impostos existentes e
introduziram outros. Em consequência, o desemprego aumentou no terceiro
trimestre deste ano; entre os jovens, segundo dados para Setembro, manteve-se
ao nível dos 25%.
Entre os problemas económicos na Europa, a pobreza está a
avançar rapidamente. Segundo sociólogos do Eurostat, em 2012
havia 124,5 milhões de pessoas no limiar da pobreza. A pior
situação é na Bulgária, onde a pobreza e o
isolamento social ameaçam a metade (!) da população. Logo
a seguir à Bulgária vêm a Roménia e a
Letónia, onde 42% e 37% dos residentes, respectivamente, estão em
risco de pobreza. Na Lituânia, a pobreza ameaça 33% da
população, na Polónia 27,2% e na Estónia 23,1%.
Também temos de mencionar a Itália entre esses países;
embora a percentagem de pessoas pobres não seja tão grande
(29,2%), em termos absolutos, chegam aos 18,2 milhões de pessoas. Os
italianos formam a maior massa de pobres na Europa.
Do eurocepticismo ao pessimismo total
A crise da dívida que já vai no quinto ano na Europa e as severas
medidas de austeridade que tiveram que ser introduzidas em todos os
países europeus estão a provocar o aumento do euroceptismo,
não só na periferia da Europa, mas em países relativamente
prósperos como a Alemanha e a Áustria.
Os resultados de uma sondagem realizada no final de Agosto início
de Setembro de 2013 pela firma francesa de marketing IFOP mostram um aumento
abrupto no número de eurocépticos nas quatro economias de topo da
zona euro: Alemanha, França, Itália e Espanha. A principal
pergunta que foi feita a alemães, franceses, italianos e
espanhóis foi se eles achavam que ser membro da União Europeia
lhes era vantajoso. 37% dos residentes além Pirenéus acham que
ser membro da UE só traz problemas a Espanha (um ano antes só 26%
em Espanha eram eurocépticos). Em França o número dos que
estão descontentes com o facto de o seu país ser membro da
União Europeia aumentou de 38% em 2012 para 43% neste momento. Na
Alemanha, 44% da população são contra ser membro duma
Europa unida (há um ano os eurocépticos na Alemanha eram 36%). O
maior número de eurocépticos está na Itália, onde
45% dos cidadãos não vêem quaisquer benefícios em
fazer parte da União Europeia
Juntamente com o eurocepticismo, as almas dos residentes do Velho Mundo
estão cada vez mais pessimistas. As pessoas estão a perder a
esperança e a fé no futuro. Segundo dados do Centro Americano de
Investigação Pew, que efectuou um estudo sobre este tópico
na Primavera de 2013, apenas 28% dos alemães, 17% dos britânicos,
14% dos italianos e 9% dos franceses acreditam que os seus filhos vão
viver melhor do que as gerações anteriores. O que ainda é
mais interessante é que o pessimismo no ocidente contrasta profundamente
com o optimismo nos países em desenvolvimento; 82% dos chineses, 59% dos
indianos e 65% dos nigerianos acreditam num futuro melhor.
Obviamente, os especialistas que acreditam que a Europa está a perder a
sua antiga posição de liderança como locomotiva de
progresso, têm razão. Chegou a época de novas
civilizações.
29/Dezembro/2013
[*]
Economista.
O original encontra-se em:
www.strategic-culture.org/news/2013/12/29/a-europe-without-a-future.html
. Tradução de Margarida Ferreira.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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