A economia estado-unidense hoje:
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(mil milhões de dólares) |
1 | Lockheed Martin | Estados Unidos | 42.025 |
2 | BAE Systems | Reino Unido | 33.418 |
3 | Boeing | Estados Unidos | 31.932 |
4 | Northrop Grumman | Estados Unidos | 30.656 |
5 | General Dynamics | Estados Unidos | 25.904 |
6 | Raytheon Co. | Estados Unidos | 23.139 |
7 | EADS | Holanda | 15.013 |
8 | Finmeccanica | Itália | 13.332 |
9 | L-3 Communications | Estados Unidos | 13.014 |
10 | United Technologies | Estados Unidos | 11.100 |
11 | SAIC | Estados Unidos | 8.400 |
12 | Thales | França | 8.032 |
13 | ITT | Estados Unidos | 6.097 |
14 | KBR | Estados Unidos | 5.410 |
15 | Honeywell | Estados Unidos | 5.382 |
Guerra permanente
A administração Obama planeia reduzir o défice fiscal do
governo federal em cerca de 500 mil milhões de dólares em 2013,
graças às poupanças do fim da guerra no Iraque a
qual supostamente excederia os custos do reposicionamento de tropas no
Afeganistão. No entanto, o facto é que o presidente Obama e sua
equipe não reverteram a lógica das "guerras
preventivas" conduzidas pelo seu antecessor ao contrário do
que ele havia sugerido durante a sua campanha eleitoral e os Estados
Unidos não cessaram de "regular" o sistema capitalista mundial
através de guerras militares. A crise está estreitamente ligada a
estas guerras (Herrera, 3007, 2010b, 2011b). Elas estão integradas no
ciclo, de um ponto de vista económico, como formas extremas de
destruição de capital, mas também politicamente para a
reprodução das condições do comando de
fracções da classe dominante isto é, alta
finança sobre o sistema mundial. Veremos na próxima
secção como os oligopólios financeiros lançaram
recentemente um assalto ao complexo militar-industrial dos Estados Unidos [que]
lhes deu um controle decisivo sobre este sector. Como matéria de facto,
o capital financeiro apossou-se de suficientes acções comerciadas
publicamente de corporações do complexo militar-industrial para
assumir o seu controle.
A despesa militar tornou-se uma grande fonte de lucros para o capital num
contexto no qual a utilização de forças armadas é a
estratégia imposta sobre o mundo pela alta finança dos EUA como
condição para a sua reprodução. A
militarização está a tornar-se o modo de existência
para o capitalismo. E aqui, o papel do estado (neoliberal) é fundamental
para o capital porque é o estado que vai à guerra no
interesse do capital, enquanto as agências governamentais atribuem
montantes astronómicos de contratos militares às companhias
transnacionais de armamento, através do seu lobbying (Mampaey e Serfati,
2004).
Dever-se-ia observar que os Estados Unidos lançaram suas guerras contra
o Afeganistão e o Iraque num momento muito específico. Quanto ao
Afeganistão, o ano de 2001 já era um tempo de crise tal
como 1913 e 1938 foram anos de depressão que antecederam as Guerras
Mundiais. A crise actual emergiu exactamente quando estavam a ter lugar
mudanças na política monetária estado-unidense,
seguindo-se o agravamento dos desequilíbrios internos e externos
o primeiro, devido à necessidade de financiamento ligado parcialmente a
estas guerras; o segundo devido em parte ao
outsourcing,
acima de tudo para a China. Portanto, a seguir ao arrefecimento do crescimento
económico em 2000, o Fed reduziu grandemente sua taxa de juro: de 6,50%
em Dezembro de 2000 para 1,75% em Dezembro de 2001, a seguir para 1,00% em
meados de 2003, e ela foi mantida a este nível muito baixo até
meados de 2004. Foi precisamente neste momento, quando as taxas de juro reais
haviam-se tornado negativas, que os mecanismos da crise subprime foram gerados,
com cada vez maior tomada de risco, especialmente no sector habitacional.
Então, devido à pressão agravada causada pelo
esforço de guerra, o Fed (dentre outras decisões, mas de modo
significativo) teve de elevar a taxa de juro dos seus 1,00% de meados de 2004
(isto é, um ano após o começo da guerra no Iraque) para
5,25 em meados de 2006. E logo após, a partir do fim de 2006,
começou um incumprimento maciço de pagamentos de hipotecas por
parte dos devedores os seus números a aumentarem devido à
contracção do crescimento e à estagnação dos
salários.
A Reserva Federal manteve esta ligeiramente alta taxa de juro, acima de 5%,
até meados de 2007, embora os sinais da crise já fossem
aparentes. Foi só em Agosto de 2007, portanto muito tardiamente, que o
Fed começou a dar aos bancos quantidades de crédito a taxas
reduzidas, taxas prenda, próximas do zero; este passo, contudo,
não conseguiu impedir novos pânicos financeiros. Portanto, a crise
explodiu quando uma massa crítica de devedores tinha dificuldades em
reembolsar seus empréstimos. Foi este o caso no fim de 2006, depois de o
Fed ter elevado suas taxas de juro para atrair o capital a fim de financiar os
orçamentos militares que haviam sido inchados por novas guerras.
Considerando tudo, não houve vitória militar para os Estados
Unidos, nem qualquer ressuscitar da acumulação apesar da
destruição provocada por estes conflitos. Ao contrário, o
prosseguimento de tais guerras, desde a Líbia, via NATO, até o
Iémen, onde em Junho de 2011 o presidente Obama convidou o
Pentágono e a CIA a colaborarem estreitamente, está a exacerbar
as contradições ainda mais...
A marcha forçada da sociedade iraquiana rumo ao neoliberalismo,
começada imediatamente depois de este país ser ocupado,
proporciona um "exemplo de tipo ideal" das consequências
económicas desta violência. Sem qualquer direito ao Iraque e aos
seus recursos, a coligação de ocupação conduzida
pelos Estados Unidos (e o Reino Unido) impôs a plena
privatização de serviços públicos e uma
mudança correspondente na estrutura de propriedade do capital de mais de
200 companhias (nos sectores da água, electricidade, telefone,
estações de televisão, ferrovias, aeroportos,
hospitais...) a fim de entregá-las a firmas transnacionais sob o
pretexto da "reconstrução".
Para este objectivo, Lewis Paul Bremer, o administrador civil da autoridade
provisória, então nomeado pelo presidente George W. Bush, durante
os seus 13 meses no gabinete [emitiu] cerca de 100 ordens (chamadas
"Coalition Provisional Authority Orders"), as quais serviam como
substitutos de leis nacionais mas sem qualquer controle
democrático. As companhias transnacionais estado-unidenses (e
britânicas) obtiveram aproximadamente 85% de todos os contratos
adjudicados. A Ordem 17 defendia os direitos de ocupantes legais e seus
subcontratantes, suplementada pela Ordem Executiva 13303, a qual os protegia
contra eventual processo nos Estados Unidos. O diploma isentava as 38 firmas na
coligação de impostos de importação, ao passo que a
Ordem 39 permitia propriedade estrangeira de até 100% em propriedades de
terra e companhias iraquianas e não estabelecia restrições
à repatriação de investimentos financeiros e lucros no
Iraque. A Ordem 400 permitia a estrangeiros comprarem bancos locais. A Ordem 81
impunha a privatização de recursos biológicos, o
patenteamento da vida (para sementes agrícolas) e a
liberalização dos Organismos Geneticamente Modificados (OGMs). Em
Fevereiro de 2004, o Iraque tornou-se observador na Organização
Mundial de Comércio, antes de preencher sua candidatura a membro pleno,
num "procedimento de emergência). Em consequência, a guerra no
Iraque transformou este país, em meses, numa das mais neo-liberalizadas
economias do mundo.
[3]
A alta finança e os militares
Em 2010 as despesas militares nos Estados Unidos foram de aproximadamente 700
mil milhões de dólares (Figura 7), isto é, pouco mais de
5% do PIB, a ser comparado com 6% para educação (Figura 8). Isto
representou cerca de um quinto do orçamento federal e quase 44% das
despesas militares mundiais (Figura 9). Contudo, o fardo real é
significativamente maior. Na verdade, algumas estimativas consideram que o
total de despesas militares dos EUA, incluindo pagamentos de juros sobre
dívidas a elas associadas, actualmente excederia 1,0 ou memo 1,1
milhão de milhões de dólares (Foster e Magdoff, 2009).
Mesmo este ajustamento para cima, o "fardo militar" (isto é, a
proporção da defesa no PIB) subestima a importância
efectiva do sector da defesa na economia americana. Também é
necessário avaliar a força destrutiva e o alcance das armas do
Pentágono, incluindo o impacto da sua rede mundial de bases militares.
Qualquer que seja o critério escolhido para medir a extensão da
militarização incluindo a I&D da defesa (Figura 10) ou
despesas de capital dos militares (Figura 11), a superioridade dos EUA é
clara.
Não há escassez de modernos "aproveitadores"
("profiteers")
da guerra, incluindo oficiais sénior na activa e na reforma, membros de
comités do Congresso sobre gastos de defesa e administradores de topo de
companhias de armamento, cujas actividades de lobbying obtiveram-lhes
lucrativos contratos militares das várias agências governamentais.
Aqui estão, em geral, as principais firmas transnacionais produtoras de
armas, com vendas astronómicas e contratos de vários milhares de
milhões de dólares para cada uma delas, como Lockheed Martin,
Boeing, Northrop Grumman, General Dynamics, L-3 Communications, Raytheon,
United Technologies, SAIC, ITT, Kellogg Brown & Root, Honeywell, General
Electric, ITT, Computer Sciences, etc. (Tabela 1); e mais especificamente,
aqueles entre elas que beneficiaram dos contratos adjudicados no Iraque e no
Afeganistão: a KBR outra vez (com 14,4 mil milhões de
dólares entre meados de 2002 e meados de 2004), a Parsons (5,3 mil
milhões no mesmo período), Fluor (3,8 mil milhões),
Washington Group (3,1), Shaw Group E&I (3,0), Bechtel (2,8), Perini (2,5),
Contrack (2,3), mas também a Tetra Tech, USA Environmental, CH2M Hill,
American International Contractors (com cerca de 1,5 mil milhões de
dólares respectivamente), e assim por diante (Herrera, 2010b).
O ponto fundamental a ser sublinhado aqui é que o capital financeiro
continua a fortalecer a sua recente e bastante rápida ascendência
sobre o complexo militar-industrial dos EUA. Isto pode ser visto quando
investidores institucionais, eles próprios dependentes dos mais
poderosos oligopólios bancários e financeiros dos EUA, capturaram
a estrutura de propriedade do capital destas companhias militares. No
princípio dos anos 2000, a proporção controlada pelo
capital financeiro alcançou 95,0% do capital a Lockheed Martin, 86,5% do
da Engineered Support Systems, 85,9% da Stewart & Stevenson Services, 84,7% da
L-3 Communications, 82,8% da Northrop Grumman, 76,0% da General Dynamics, 70,0%
da Raytheon, 66,0% da Titan, 65,0% da Boeing, etc.
Analogamente, quando o governo "externaliza" cada vez mais o seu
negócio da defesa, uma fatia crescente de companhias militares privadas
fica sob o controle da finança. Por exemplo, a DynCorp foi comprada pela
companhia de software Computer Sciences Corp. em 2003 e, dois anos depois,
tornou-se propriedade do fundo de acções privado Veritas Capital.
Anteriormente, em 2000, a L-3 Communications Holdings controlou a MPRI. Uma
consequência destas tomadas de controle é que cidadãos
comuns participam (muitas vezes sem o seu conhecimento) na propriedade de uma
companhia militar cujas actividades vão desde as missões de
mercenários até o "interrogatório" de
prisioneiros... No fim de 2006, sua colaboração foi recompensada.
O MPRI obteve um contrato para apoiar o U.S. Army no
Iraque e no Afeganistão; os preços oficiais das
acções comuns das firmas associadas e da sua companhia mãe
dispararam para cima. Outra companhia militar privada, a Vinnell, cuja
lucratividade atraiu tanto interesse que os seus proprietários mudaram
várias vezes nos últimos anos, havia sido comprada anteriormente
pelo grupo financeiro Carlyle... (Cicchini e Herrera, 2008).
O número de agentes empregues por companhias militares privadas no
Iraque atingiu os 182 mil em 2008, ou seja, um número maior do que
aquele do pessoal militar americano no Exército, Marinha, Corpo de
Fuzileiros Navais e Força Aérea somados (Figuras 12 e 13).
Naquela época, o número total de combatentes paramilitares
privados em actividade era aproximadamente de 75 mil, os quais deles faria o
segundo mais numeroso contingente empenhado no conflito, muitos mais do que as
tropas estrangeiras aliados aos Estados Unidos (aproximadamente 23 mil
soldados). Integrados na "Total Force", eles são empregados
por aproximadamente 300 companhias privadas, tais como KBR, Blackwater USA,
MPRI, Vinnell, DynCorp, Control Risks, Pacific Architects & Engineers, Custer
Battle, Titan, ArmorGroup, California Analysis Center, etc. Tomadas como um
todo, estas firmas partilhariam vendas anuais de mais de 100 mil milhões
de dólares. O seu maior cliente é obviamente o estado
(neoliberalizado), o qual transformou tanto o Afeganistão como o Iraque
em sítios privilegiados de acção para este novo
"mercado de guerra"que se abriu após 11 de Setembro de 2001
com o lançamento da "Guerra Global ao Terror".
No entanto, tais mudanças geraram novas contradições
económicas e políticas, ainda mais profundas do que aquelas que
provocaram as mudanças. A ineficácia desta estratégia de
"privatização da segurança" é cada vez
mais aparente do Iraque, bem como no Afeganistão; ela não
"minimiza custos" e nem tão pouco faz vencer estas guerras.
Alguns economistas estimam que os custos financeiros destas guerras são
demasiado altos...
[4]
O que quer seja poupado ao recrutar mercenários experientes ao
invés de treinar novos recrutas é perdido devido às
altas quantias pagas a firmas militares com fundos públicos. E os
escândalos são conhecidos: sobrecarregar preços ou contrato
por administração
("cost plus"),
ausência de competição sob o pretexto de "acordos
secretos" com o Pentágono ou a CIA, dupla contabilidade e
pagamentos por serviços que não são executados, conluio
duvidoso de accionistas, além de abusos repetidos (que vão desde
a tortura até crimes impunes de mercenários)... Têm sido
observados conflitos entre soldados do exército regular e
mercenários privados sendo os últimos mais bem pagos, com
melhores "condições de trabalho" e muitas vezes
escapando a penalidades legais...
A exacerbação das contradições dentro do sistema
capitalista
Entretanto, o fracasso desta nova "parceria público-privado"
é completo, como também é o caso da própria
estratégia de guerra permanente. Esta não impediu o ressurgimento
de protestos e resistências dentro do exército. Hoje, a
oposição às guerras é parcialmente organizada pelo
IVAW, ou "Iraq Veterans Against the War", movimento fundado pela
convenção de Veteranos pela Paz efectuada em Boston em Julho de
2004 a fim de encorajar as vozes de pessoal activo e veteranos que recusam a
guerra no Iraque, mas forçados a manterem-se silenciosos. O
espírito de rebelião da antiga "Resistência dentro do
Exército" ("Resistance Inside The Army", RITA), durante a
guerra do Vietname, exala-se no seu manifesto. Desde o princípio da
guerra no Iraque, mais de meio milhão de soldados americanos fizeram
pelo menos uma missão ali. Segundo dados estatísticos oficias,
entre Março de 2003 e Julho de 2008, 4.124 deles foram mortos (num total
de 4.438 mortos entre todas as tropas da coligação). Fontes
alternativas
[5]
, que descrevem os artifícios utilizados pelas autoridades militares
para reduzir o número de baixas tornadas públicas, sugerem
números muito mais elevados...
Depois de ter anunciado a retirada do Iraque ao longo de 19 meses a
começar em Fevereiro de 2009, e o reposicionamento de tropas no
Afeganistão, o desafio do presidente Barack H. Obama será tentar
amortecer o impacto destas decisões no interior da sociedade
estado-unidense. Os efeitos da procura efectiva associados às guerras no
Iraque e no Afeganistão afectam essencialmente o curto prazo, e os
efeitos tecnológicos são positivos somente para o complexo
militar-industrial, o qual é claramente insuficiente para restaurar o
crescimento sustentável. A destruição de capital provocada
por estas guerras considerável para os povos que sofrem estes
conflitos não revitalizará a acumulação no
centro da economia hegemónica do sistema capitalista mundial, como foi o
caso durante a reconstrução conduzida pelo Plano Marshall
após a II Guerra Mundial. Para ser capaz de recomeçar um ciclo de
expansão de acumulação de capital de longa
duração no Norte, a crise teria de "destruir" montantes
absolutamente gigantescos de capital fictício, a maior parte dele sendo
parasitário. Contudo, as contradições profundas que
caracterizam o sistema capitalista tornaram-se agora tão difíceis
de resolver uma tal desvalorização poderia impelir ao colapso.
Pensadores ortodoxos também acreditam que a crise actual levará
ao colapso do capitalismo, como, por exemplo, os analistas do
Global Europe Anticipation Bulletin,
cujas previsões acerca do agravamento da situação levam
à total deslocação geopolítica do sistema, à
queda do dólar e ao desaparecimento das bases do sistema financeiro
globalizado; ou, nos Estados Unidos, aquelas [análises] de
Money&Markets,
que prevêem o futuro aprofundamento da crise numa sequência mais
tradicional: ampliação do défice fiscal, inchaço da
dívida pública, defesa insuficiente do dólar pelas
autoridades monetárias dos EUA... Por agora, o agravamento da
situação mina um pouco mais a hegemonia unipolar dos Estados
Unidos.
A esta luz, uma pequena mas significativa minoria entre as correntes pensamento
dominantes continua a ser cada vez mais radical no seu apoio a teses
ultra-liberais, inspiradas do von Mises, Hayek ou Rothbard.
[6]
Suas análises da crise baseiam-se numa fé reafirmada no
carácter automático do reequilíbrio do mercado. Isto
é aborrecido para os neoliberais, na medida em que estes ultra-liberais
defendem a ideia de que a crise decorre de um excesso de intervencionismo e que
o estado não deveria salvar os bancos e companhias em dificuldade. O que
precisa ser feito, segundo eles, é por um fim às
regulações do estado que limitam a liberdade dos agentes nos
mercados. Estes autores são portanto contra qualquer plano anti-crise e,
em particular, contra qualquer regulação das taxas de juro pelo
banco central. Os mais extremistas entre eles chegam até a apelar pela
supressão das instituições do estado incluindo o
exército bem como a privatização da moeda. Ainda
que estejam conscientes de que tais medidas empurrariam o capitalismo rumo ao
caos, eles pensam que, graças a mecanismos de mercado, este caos
beneficiaria o capital e o capitalismo reconstituir-se-ia a si próprio
mais rapidamente e melhor do que através de intervenções
do estado na forma de assistência pública artificial a empresas
que em qualquer caso estão condenadas a fracassar.
Paralelamente, a gravidade da crise tem favorecido um retorno a teses
"reformistas" (Krugman, 2009). De facto, enquanto medidas
"keynesianas" eram perceptíveis inclusive no plano de
G.W. Bush de 2008, por exemplo (com sua entrega de parte dos impostos) e, acima
de tudo, no programa do presidente Obama (infraestrutura, etc) hoje, a
prioridade é dada claramente ao neoliberalismo a fim de salvar tanto
quanto possível do capital fictício sobre-acumulado. Contudo, as
actuais políticas anti-crise não são keynesianas e os seus
iniciadores não se libertaram dos dogmas neoliberais. Na verdade, o Fed
e os outros bancos centrais do Norte continuam a criar moeda primária
numa escala maciça. Mas esta política monetária
aparentemente "keynesiana" caiu de facto na "armadilha da
liquidez" ("
liquidity trap
"), em que a estratégia de rebaixamento da taxa de juro real
demonstrou-se incapaz de aumentar a eficácia marginal do capital e
transferir capital-dinheiro da esfera financeira para a esfera produtiva.
As crises constituem momentos nos quais fracções de capital,
geralmente as menos produtivas e/ou inovadoras, são absorvidas e
incorporadas numa estrutura de propriedade capitalista mais concentrada.
Até agora, cada reorganização do capital na
história permitiu ao sistema construir instituições e
instrumentos mais eficazes para amenizar os piores efeitos devastadores destas
crises, mas de modo nenhum para resolver as contradições
profundas do sistema capitalista.
Conclusão
A probabilidade da escalada da crise actual é extremamente alta hoje
não só na Europa com as dificuldades da zona euro e as
preocupações causadas pelo endividamento público, ou no
Japão, preso numa conjunção de problemas
dramáticos, mas também e acima de tudo nos próprios
Estados Unidos. Há uma alta probabilidade de que a presente crise venha
a tornar-se mais aguda, como uma crise sistémica do capital, uma vez que
todas as condições estão aí para que isso
aconteça. O capitalismo está em perigo, incluindo o
próprio centro do sistema. Obviamente, outras crises capitalistas
aconteceram no passado e o sistema sempre saiu delas mais forte e mais
concentrado do que antes. É uma ilusão acreditar que o
capitalismo está em vias de entrar em colapso devido aos efeitos da
crise actual.
Entretanto, se o problema estrutural para a sobrevivência do capitalismo
é na verdade o das pressões declinantes sobre a taxa de lucro, e
se a financiarização não é uma
solução sustentável, a única coisa que este sistema
oferecerá, até a sua agonia, será uma pressão
constante para aumentar a exploração da força de trabalho,
porque o capital fictício pretende ser remunerado e ele consegue isto
pela transferência do excedente
(surplus)
do capital produtivo. A situação presente não se parece
ao
"começo do fim da crise"
como dizem alguns conselheiros do presidente Obama. Não é uma
crise de crédito habitual, nem tão pouco uma crise
temporária de liquidez, através da qual o sistema se
reorganizará e se reforçará para então
começar a funcionar "normalmente", com uma nova
expansão das forças produtivas numa estrutura de
relações sociais modernizadas. Parece ser muito mais grave; o que
significa dizer, o princípio de um de longo processo de colapso da
actual etapa ou fase do capitalismo, a qual é agora
oligopolística e financiarizada. E este processo de entrada em colapso
está a abrir vastas perspectivas de transições. Portanto,
isto tornará necessário reconsiderar possibilidade de
alternativas e transformações pós-capitalistas.