O que fazem os impérios?
Quando em 1995 escrevi o livro
Against Empire
alguns dos meus compatriotas estado-unidenses, tal como seria de esperar,
consideraram que era um erro chamar os
Estados Unidos de império. Acreditava-se generalizadamente que os
governantes dos EUA não buscavam o império; intervenham lá
foram só como auto-defesa ou para operações de resgate
humanitário ou para derrubar a tirania, combater o terrorismo e difundir
a democracia.
Mas por alturas do ano 2000 toda a gente começou a falar dos Estados
Unidos como um império e a escrever livros com títulos como
Sorrows of Empire, Follies of Empire, Twilight of Empire,
ou
Empire of Illusions
todos referindo-se aos Estados Unidos quando falam de
império.
Mesmo conservadores começaram a utilizar a palavra. Admirável.
Podia-se ouvir sabichões da extrema-direita a anunciaram na
televisão estado-unidense: "Somos um império, com todas as
responsabilidades e oportunidades do império e é melhor
acostumar-nos a isso", e "Somos o país mais forte do mundo e
temos todo o direito a actuar como tal" como se ter o poder desse
aos líderes dos EUA um direito inerente a exercitá-lo sobre
outros como quisessem.
"O que está a acontecer?", perguntei-me na altura. Como
é que tantas pessoas sentem-se livres para conversarem acerca de
império querendo dizer que os Estados Unidos são um
império? A ortodoxia ideológica sempre foi que, ao
contrário de outros países, os EUA não se entregavam
à colonização e à conquista.
A resposta, percebi, é que a palavra havia sido despida do seu pleno
significado. "Império" parecia agora significar apenas
domínio e controle. O império para a maior parte destes
críticos de fresca data preocupa-se quase exclusivamente com
poder e prestígio. O que está habitualmente a faltar deste
discurso público é o processo do império e o seu
conteúdo político-militar. Por outras palavras, enquanto ouvimos
um bocado acerca do império, ouvimos muito pouco acerca do imperialismo.
Mas isto é estranho, pois imperialismo e o que os impérios
exercem. Imperialismo é o que o império faz. E por imperialismo
não quero dizer o processo de estender poder e domínio sem
considerar interesses materiais e financeiros. Na verdade
"imperialismo" tem sido utilizado por alguns autores do mesmo modo
oco com que utilizam a palavra "império", simplesmente para
assinalar domínio e controle dando pouco atenção às
realidades político-económicas.
Mas eu defino imperialismo como se segue: o processo pelo qual os interesses
dos investidores dominantes num país fazem valer o seu poder
económico e militar sobre outro país ou região a fim de
expropriar a sua terra, trabalho, recursos naturais, capital e mercados de modo
a enriquecer os interesses investidores. Numa palavra, impérios
não buscam apenas "poder pelo objectivo do poder". Há
interesses materiais reais e enormes em causa, fortunas a serem feitas muitas
vezes repetidamente.
Assim, durante séculos os interesses dominantes da Europa Ocidental e
depois da América do Norte e do Japão avançaram com os
seus financeiros e quando necessário os seus exércitos
para exigir direitos sobre a maior parte do planeta Terra, incluindo o
trabalho de povos indígenas, seus mercados, seus rendimentos
(através da tributação colonial ou controle da
dívida ou outros meios) e os tesouros abundantes das suas terras: o seu
ouro, prata, diamantes, cobre, rum, melaço, cânhamo, linho,
ébano, madeira, açúcar, tabaco, marfim, ferro, estanho,
níquel, carvão, algodão, milho e, mais recentemente:
urânio, manganês, titânio, bauxita, petróleo e
digamos isto outro vez petróleo. (ver em Hardly uma listagem
completa)
Os império são enormemente lucrativos para os interesses
económicos dominantes do país imperial mas enormemente custosos
para o povo do país colonizado. Além de sofrerem a pilhagem das
suas terras e recursos naturais, os povos destes países alvo são
frequentemente morto em grande quantidade pelos intrusos.
Isto é outra coisa que os impérios fazem a qual muito
frequentemente não é mencionada na literatura histórica e
política de países como os Estados Unidos, Grã-Bretanha e
França. Os impérios empobrecem populações inteiras
e matam grandes quantidades de pessoas inocentes. Quando escrevo isto, o
presidente Obama e o estado de segurança nacional para o qual ele
trabalha estão a travar duas guerras e meia (Iraque, Afeganistão
e norte do Paquistão) e a acenar ameaças militares contra o
Iémen, o Irão e, num dia tranquilo, a Coreia do Norte. Ao
invés de enviar ajuda médica e de resgate ao Haiti, o Nosso
Bombardeiro envia-lhe os Fuzileiros Navais, os mesmos fuzileiros navais
envolvidos em anos de assassínios em massa no Haiti décadas
atrás e que apoiaram massacres mais recentes de forças por
procuração.
O objectivo de toda esta matança é impedir países
alternativos, independentes e auto-definidos de emergirem. De modo que o
império utiliza o seu poder de estado para acumular riqueza privada para
a sua classe de investidores. E utiliza a sua riqueza pública para
sustentar o seu poder de estado e impedir outros países de se
auto-desenvolverem.
Mas cedo ou mais tarde este esquema começa a enfraquecer sob o peso das
suas próprias contradições. À medida que o
império se torna mais ameaçados e mais assassino em
relação a outros, ele se torna mais doentio e empobrecido dentro
de si próprio.
Desde tempos antigos até os dias de hoje, os impérios sempre
estiveram envolvidos na acumulação sangrenta de riqueza. Se
não pensa que isto é verdadeiro em relação aos
Estados Unidos então pare de chamá-lo "Império".
E quando escrever um livro acerca de como ele dispõe as suas armas por
todo o planeta, intitule-o "Tirano global"
("Global Bully")
ou o "Mandão intrometido
("Bossy Busybody"),
mas esteja certo de que não nos está a contar muito acerca de
imperialismo.
14/Fevereiro/2010
[*]
Obras de
Michael Parenti
e seu sítio web:
www.michaelparenti.org
.
O original encontra-se em
http://www.countercurrents.org/parenti140210.htm
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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