por Mike Whitney
Duas semanas atrás George Bush foi enviado em missão ao
Médio Oriente a fim de entregar uma "cabeça de cavalo",
ou seja, uma advertência intimidatória. Todos nos lembramos da
cena
perturbante do filme "O Padrinho", de Francis Ford Coppola, em que
Lucca Brassi vai a Hollywood para convencer um produtor de cinema recalcitrante
a utilizar o sobrinho de Don Corleone no seu próximo filme. O grande
produtor acaba por ser persuadido a contratar o jovem actor depois de ter
acordado na cama com a cabeça decepada do seu puro sangue. Penso que
Bush terá feito uma oferta semelhante, que "não podiam
recusar", a vários líderes dos Estados do Golfo quando com
eles se encontrou no mês passado.
Os media tentaram retratar a viagem de Bush ao Médio Oriente como uma
"missão de paz", mas aquilo era apenas uma cortina de fumo.
De facto, três dias depois de Bush ter deixado Jerusalém, Israel
avançou as suas operações militares nos territórios
ocupados e retomou o seu bloqueio impiedoso de alimentos, água,
remédios e energia a 1,5 milhão de pessoas de Gaza. Claramente,
Bush deu o sinal verdade às operações ou a agressão
de Israel teria sido vista como uma bofetada na cara do Presidente dos Estados
Unidos.
Assim, qual era a finalidade real da viagem de Bush? Afinal de contas, ele
não tem interesse na paz ou em honrar o seu compromisso para resolver a
crise israelense-palestina. Então, por que escolheria visitar o
Médio Oriente exactamente quando o seu segundo mandato como presidente
está a acabar e não há probabilidade de êxito?
Às vezes as visitas pessoais são importantes, especialmente
quando a natureza da informação é tão
sensível que a mensagem tem de ser dada cara a cara. Neste caso, Bush
deu-se ao trabalho de viajar por meio mundo para dizer aos sauditas e aos seus
amigos nos Estados do Golfo que deveriam continuar a ligar o seu
petróleo ao dólar ou do contrário iriam "dormir com
os peixes". Nos últimos dois meses, vários xeques e
ministros das Finanças estiveram a lamentar e a resmungar acerca da
queda do dólar ameaçando romper com a chamada
ligação ao dólar
("dollar-peg")
e comutá-la para um capaz de divisas. A viagem de Bush parece ter
reacendido o espírito de cooperação fraternal. Os
resmungos cessaram e toda a gente voltou "para bordo". Os
líderes regionais agora parecem muito menos aborrecidos pelo facto de
que a inflação está a engolir as suas economias e a
remeter trabalho, alimentos, energia e habitação para os
píncaros. A Reuters resumiu isto assim:
Após um turbilhão de desacordos públicos no ano
passado sobre a reforma da divisa, os banqueiros centrais do Golfo estão
a tentar cerrar fileiras, falando nas ligações [ao dólar]
como uma fonte de estabilidade e subestimando o enfraquecimento do dólar
como um fenómeno temporário".
Vejam como Bush acomodou as coisas.
Nas últimas duas semanas, os líderes do Golfo observaram com
nervosismo que o Federal Reserve havia cortado as taxas nuns colossais 125
pontos. Os cortes estavam a corroer gradualmente os US$ 1 milhão de
milhões de capital que os xeques haviam investido em Títulos do
Tesouro e obrigações dos EUA.
A inflação está num máximo de 16 anos na
Arábia Saudita e no Oman, e num pico de 19 anos nos Emirados
Árabes Unidos. Os decisores políticos do Golfo estão a
intervir directamente em empréstimos, propriedades e mercados de
commodities para compensar cortes nas taxas". (Reuters)
Os valores da propriedade dispararam. A propriedade comercial nos EAU duplicou
desde o princípio de 2007. A bomba da inflação
forçou outros Estados do Golfo a darem subsídios de
alimentação ao seu povo e um "aumento salarial de 70% para
alguns empregados do governo federal dos Emirados".
Trabalhadores migrantes insatisfeitos recentemente fizeram tumultos em Dubai,
exigindo que fossem razoavelmente compensados pelos agudos incrementos nos
preços. O riyal saudita saltou para um pico de 21 anos.
Negociantes de divisas esperavam mais 8% de ascensão no dirham e no
riyal no mês de Abril e estavam a prever que as taxas de juro obrigariam
banqueiros centrais por todos os Estados do Golfo a cobrirem-se com o euro ou
com um cabaz de divisas regionais. Até então, entretanto, os
leais príncipes sauditas haviam mantido o seu apoio ao dólar.
Defendendo a hegemonia do dólar
Assim, quão importante será que o petróleo continue a ser
denominado em dólares? Será que os Estados Unidos travariam
guerras para defender o status do dólar como a "divisa de
reserva" do mundo?
A resposta a esta pergunta poderia vir já nesta semana, uma vez que se
prevê abrir a há muito aguardada Bolsa Iraniana do Petróleo
entre 1-11 de Fevereiro. Segundo o ministro das Finanças do
Irão, Davoud Danesh-Jafari, "Foram feitos todos os preparativos
para o lançamento da bolsa; ela abrirá durante os 10 dias da
Aurora (as cerimónias que assinalam a vitória da
Revolução Islâmica de 1979 no Irão). A bolsa
é considerada uma ameaça directa à contínua
dominação global do dólar porque exigirá que
"o petróleo, produtos petroquímicos e gás"
iranianos sejam comerciados em "divisas não-dólar".
(Press TV, Irão)
O sistema do petrodólar não é diferente daquele do
padrão ouro. A divisa de hoje é simplesmente garantida por uma
fonte vital de energia sobre a qual está dependente todas as sociedades
industrializadas o petróleo. Se o dólar for desligado do
petróleo, ele não mais servirá como a divisa internacional
de facto e os EUA serão forçados a reduzir seus défices
comerciais maciços, reconstruir sua capacidade manufactureira e
tornar-se mais uma vez um país exportador. A única alternativa
é criar uma rede de regimes clientes que reprimam as
aspirações colectivas dos seus povos de modo a que possam seguir
fielmente as directivas de Washington.
Será que a administração Bush iniciaria uma guerra para
defender a hegemonia do dólar, tal é a questão que Saddam
Hussein deveria ter indagado. O Iraque foi invadido apenas seis meses
após a conversão de Saddam Hussein para o euro. A mensagem
é clara, o Império defenderá a sua divisa.
Analogamente, em 2007 o Irão comutou do dólar e tem insistido em
que o Japão pague as suas enormes facturas de energia em yen. A
"conversão" enfureceu a administração Bush e
desde então tornou o Irão o alvo da beligerância americana.
De facto, embora 16 agências da inteligência estado-unidense
tenham emitido um relatório (NIE) a dizer que o Irão não
estava a desenvolver armas nucleares, e embora o cão de guarda nuclear
da ONU, a AIEA, considerasse que o Irão estava a cumprir suas
obrigações do Tratado de Não Proliferação
(TNP), um ataque antecipativo ao Irão conduzido pelos EUA ainda parece
provável.
E, apesar de os media ocidentais agora minimizarem as perspectivas de uma outra
guerra na região, Israel está a tomar precauções
que sugerem que a ideia não é tão remota. "Israel
apela por compartimentos de abrigo a serem construídos como forma de
preparar o público para mais um ano de guerra, desta vez uma guerra com
chuva de mísseis". (Press TV, Irão)
"A próxima guerra assistirá uma utilização
maciça de armas balísticas contra a totalidade do
território israelense", afirmou o general retirado Udi Shani.
(Global Research,
http://globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=7982
)
A Rússia também considera uma probabilidade crescente de
hostilidades a irromperem no Golfo e respondeu a isto com o envio de uma
força tarefa naval para o Mar Mediterrâneo e o Atlântico
Norte.
Segundo um artigo no sítio Global Research:
"A nau capitânia da Frota do Mar Negro da Rússia, o
cruzador com mísseis guiados Moskva, juntou-se aos navios de guerra
russos no Mediterrâneo em 18 de Janeiro para participar de manobras... O
presente operação é o primeiro exercício em grande
escala da Armada Russa no Atlântico dos últimos 15 anos. Todos os
navios e aviões de combate envolvidos transportam cargas de
munição para pleno combate. (Global Research,
http://globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=7983
)
A França também planeia manobras militares nos Estreitos de
Ormuz. A operação "Gulf Shield 01," terá lugar
ao largo da costa do Irão e empregará milhares de pessoas em
operações armadas combinadas que incluirão ataques
simulados a plataformas de petróleo".
Os exercícios estão programados para serem efectuados de 23 de
Fevereiro a 5 de Março. Eles envolverão, como pessoal
operacional em terra, mar e ar, 1550 franceses, 2500 dos emirados e 1300 do
Qatar, afirmou o Ministério... "Cerca de meia dúzia de
vasos de guerra, 40 aviões e dúzias de veículos blindados
estarão presentes nos jogos de guerra", disse Fusaba.
http://www.defensenews.com/story.php?F=3346953&C=mideast
Além disso, durante a semana passada, três dos principais cabos
submarinos que transportam tráfego de Internet foram cortados no Golfo
Pérsico e três quartos das comunicações
internacionais entre a Europa e o Médio Oriente foram perdidas. Grandes
partes do Médio Oriente foram mergulhadas na escuridão
[1]
Será isto simplesmente uma coincidência ou será que algo
está a acontecer abaixo da superfície?
Ian Brockwell, do
American Chronicle
afirmou:
"Supondo que o corte dos cabos não foi acidental, devemos
perguntar-nos quem faria tal coisa e porque. Evidentemente o Irão, que
foi o mais afectado, nada ganharia com uma tal acção e talvez
seja o alvo dos responsáveis pelo corte. Poderá isto ser um
prelúdio de um ataque, ou talvez um teste para um futuro ataque?
A comunicação sempre foi um factor importante na
acção militar, e cortar estes cabos pode afectar a capacidade de
defesa do Irão" (
American Chronicle,
http://www.americanchronicle.com/articles/51085
)
Apesar da falta de cobertura dos media, as tensões estão em
crescendo no Golfo e a probabilidade de um ataque ao Irão dirigido pelos
EUA ainda é bastante alta. Bush está convencido de que se ele
não confrontar o Irão, então ninguém o fará.
Assim, a questão real é se Bush perceberá que a
América já está irremediavelmente presa a dois conflitos
"invencíveis" ou se irá "com as suas tripas"
mais uma vez e nos levará para uma ruinosa conflagração
à escala regional.
04/Fevereiro/2008
[1] O corte dos cabos submarinos afectou 27% da Internet iraniana, segundo a
agência
ISNA
.
O original encontra-se em
http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=7998
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.