Alastra-se a dissenção entre os militares americanos
A cólera crescente contra a guerra americana no Iraque e o entendimento
cada vez maior de que a ocupação é um fracasso completo
estão a alastrar-se nas fileiras dos militares americanos. Esta
dissidência apresenta-se de diferentes maneiras entre os soldados rasos e
entre as tropas profissionalizadas e os oficiais. Mas a partir de um aumento
de cartas iradas em
publicações anti-guerra como GI Special relativas a um aumento
das cortes marciais, os sinais de resistência estão a crescer.
Em 18 de Maio, o capitão de corveta Matthew Diaz foi sentenciado depois
de ter sido considerado culpado por uma corte marcial da U.S. Navy daquilo que
a Armada considerou um crime sério. Enquanto enfrentava uma
possível pena de 14 anos de prisão, a sentença deste
veterano com 19 anos de Armada foi seis meses de confinamento com pagamento e
remoção da Armada, o equivalente oficial de um afastamento menos
do que honroso.
Diaz fora designado para investigar alegados abusos de prisioneiros em
Guantánamo, o bocado de território cubano que os EUA ainda ocupam
ilegalmente. Washington tem mantido ali prisioneiros de guerra capturados no
Afeganistão em 2003 e outros que considera "terroristas" nos
últimos quatro-cinco anos sob condições de campo de
concentração.
Cumprindo ordens do secretário da Defesa Donald Rumsfeld, os EUA
marimbaram-se para o direito internacional e recusaram-se a divulger os nomes
dos prisioneiros. Alguns professores de direito consideram Rumsfeld culpado de
crimes de guerra por emitir tais ordens. Diaz, preocupado com este abuso dos
direitos humanos, em Fevereiro de 2005 enviou uma lista dos nomes daqueles
prisioneiros a promotores de liberdades civis em Nova York.
"Meu juramento como oficial comissionado é para com a
Constituição dos Estados Unidos", afirmou Diaz.
"Não sou um criminoso. Havia observado a obstrução,
os obstáculos que continuávamos a colocar no caminho dos
promotores", declarou aos media antes da sua condenação.
"Eu sabia que o meu tempo era limitado.
Eu tinha de fazer
algo".
Muitos, talvez mesmo a maioria aqui nos EUA, considerariam Diaz como um
herói por fazer algo. (Ver
www.militaryproject.org
)
Em relação a outros heróicos resistentes militares, em 10
de Maio o cabo especialista Augustín Aguilar foi recentemente libertado
da prisão militar na Alemanha e retornou ao seu lar na
Califórnia. Durante oito meses fora mantido como prisioneiro de
consciência depois de se ter ausentado sem licença (AWOL)
a fim de demonstrar a sua recusa em retornar ao Iraque.
Segundo o grupo Courage to Resist (
www.couragetoresist.org
), a partir de 10 de
Maio Aguilar "partilhou a sua história de resistência em
reuniões de comunidade em Sacramento, Carmel e San Francisco. É
de destacar que a primeira semana de Augustin como activista anti-guerra
incluiu apresentações no dia dos trabalhadores a operários
agrícolas e suas famílias em Stockton, e a estudantes de
faculdades e colégios em Watsonville".
Longe de ser isolado ou ostracizado por sua acção anti-guerra,
Aguilar foi bem recebido numa comunidade de resistentes à guerra que
inclui Robert Zebala, Pablo Paredes e Camilo Mejía bem como muitos
outros veteranos da guerra do Iraque que agora estão a falar em
reuniões anti-guerra e conseguem aceitação popular.
Outro resistente à guerra, o tenente Ehren Watada, cuja corte marcial
está pendente depois de os militares decidirem unilateralmente declarar
como inválido o seu primeiro julgamento em Fevereiro, teve agora a sua
corte marcial adiada mais uma vez. Agendado primeiro para 23 de Junho em Ft.
Lewis, o julgamento está agora em suspenso até ser determinado se
recomeçá-lo significaria que Watada arriscava-se a dupla
condenação
("double jeopardy").
Ainda é possível que o Exército seja forçado a
abandonar as acusações a Watada, o primeiro oficial a recusar
servir no Iraque.
Novo julgamento em Fort Drum
Um soldado da 10ª Divisão de Montanha, uma unidade cuja base
é em Fort Drum, a norte do estado de Nova York, e que agora arrombar
lares em Bagdad, está a enfrentar um afastamento por má conduta e
um ano de prisão por ausência sem licença. Em 16 de Maio o
Exército anunciou que a corte marcial do cabo especialista Eugene Cherry
principiará em 25 de Junho. Cherry dispõe de
documentação médica de que sofre distúrbios por
stress pós-traumático. Ele afirma que está a ser
submetido a corte marcial porque foi à sua casa em Chicago para obter
ajuda depois de o Exército não lhe ter proporcionado o tratamento
adequado.
"Eles não querem responsabilidades por isso negam que eu tenha um
problema e, por ter tentado ajudar-me a mim próprio, agora eles querem
tornar-me um criminoso", disse o cabo especialista Eugene Cherry numa
entrevista telefónica de Fort Drum à Associated Press.
Cherry contou ao seu médico que durante a sua estadia no Iraque como
enfermeiro o evento mais perturbador que testemunhou aconteceu quando uma
equipe de artilharia do Exército tentou explodir um veículo
utilitário (minivan) descoberto carregado de explosivos e materiais
inflamáveis. A explosão arrasou um edifício de
apartamentos com três andares nas proximidades, ferindo os residentes.
Cherry tentou ajudar uma mulher iraquiana que descobriu com a cara virada para
baixo. Quando a virou, descobriu que metade da sua cara fora explodida. Foi
então que começaram os pesadelos e a depressão, conta
Cherry. (Ver
www.differentdrummercafe.org
)
O horror à Guerra e às acções americanas são
as únicas forças que motivam a dissidência militar.
Há também a percepção de que os EUA estão a
perder a guerra.
Alguns oficiais americanos, designados para trabalhar com as tropas fantoches
iraquianas, fizeram objecções às tropas prenderem civis
iraquianos que aparentemente não cometeram crimes, nem actos que os
ocupantes americanos pudessem considerar um crime. Um oficial americano foi
recentemente repreendido por um general americano por ter libertado 35
prisioneiros que ele acreditava terem sido presos sem boas razões.
Alguns destes oficiais americanos consideram o aprisionamento de civis
inocentes um crime de guerra pelo qual não querem responsabilidades.
Além disso, consideram-no contra-producente.
Mesmo o almirante tem receios
Alguns dos oficiais de topo, que normalmente não têm
perturbações ao ordenar ataques de bombardeamento
estratégico que provocarão centenas de milhares de baixas, e que
certamente não têm pruridos morais quanto a iniciar uma guerra,
começam a hesitar em seguir a liderança da
administração Bush. Uma notícia do Inter Press Service
divulgada em 19 de Maio relata que o almirante William Fallon, chefe do CENTCOM
e um dos nomeados pelo próprio Bush, exprimiu "em Fevereiro
exprimiu forte oposição a um plano da administração
para aumentar de dois para três o número de grupos de
porta-aviões
(carrier strike groups)
no Golfo Pérsico e prometeu em privado que
não haveria guerra no Irão enquanto ele fosse chefe do CENTCOM,
segundo fontes com acesso às suas ideias".
Segundo esta fonte não mencionada, Fallon disse não estar
só e que "Há vários de nós a tentar colocar os
loucos outra vez dentro da caixa". Esta declaração,
publicitada uma semana depois de o vice-presidente Dick Cheney ter
ameaçado a guerra contra o Irão no convés de um
porta-aviões no Golfo ao largo da costa daquele país, e cerca do
mesmo momento em que o arquitecto da guerra do Iraque Paul Wolfowitz foi
forçado a demitir-se da chefia do Banco Mundial, tem o toque da verdade
ainda que não seja fácil verificá-la.
Fallon é um leal oficial do imperialismo americano, cujos interesses de
classe e privilégios estão ligados à
dominação militar americana do mundo. Suas palavras
assumindo que o relato da IPS é verdadeiro reflectem o cepticismo
entre a classe dominante quanto à liderança da
administração Bush. Elas reflectem o impacto de quatro anos de
heróica resistência iraquiana que paralisaram a tentativa
americana de dominar aquele país.
De uma forma diferente, a resistência iraquiana estimulou a
dissidência honesta e a recusa em participar em crimes de guerra expressa
pelos oficiais de graduação mais baixa e pelo pessoa alistado.
Os sinais de que esta dissidência está a crescer e a difundir-se
nas Forças Armadas dos EUA constituem a melhor notícia para
aqueles que querem acabar com a horrenda e criminosa ocupação do
Iraque.
27/Maio/2007
[*]
jcat@workers.org
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O original encontra-se em
http://www.workers.org/2007/us/dissent-0531/
Este artigo encontra-se em
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