O que pode sair errado?

por William Blum [*]

Que ele possa não ser "qualificado" é pouco importante.

Que nunca tenha estado num governo ou numa posição electiva é pouco importante.

Que ao nível pessoal ele possa ser um tolo é pouco importante.

Para mim o que conta nesta etapa preliminar é que ele – ao contrário da querida Hillary – provavelmente não iniciará uma guerra contra a Rússia. O seu questionamento do carácter sagrado da NATO, chamando-a de "obsoleta", e a sua reunião com a congressista democrata Tulsi Gabbard , uma crítica declarada da política estado-unidense de mudança de regimes, especificamente na Síria, são sinais encorajadores.

Ainda mais encorajador é a sua nomeação do general Michael Flynn como Conselheiro de Segurança Nacional. No ano passado Flynn jantou em Moscovo com Vladimir Putin numa celebração de gala da RT (Russia Today), o canal de TV em inglês do estado russo. Flynn agora carrega o estigma, nos media americanos, de ser um indivíduo que não vê a Rússia ou Putin como diabólicos. É realmente notável como jornalistas americanos podem considerar de modo indiferente a possibilidade de uma guerra com a Rússia, mesmo uma guerra nuclear.

(Posso agora aguardar uma barragem de emails dos meus leitores excessivamente politicamente correctos acerca do alegado aspecto anti-Isão de Flynn. Mas mesmo que seja verdade isso é irrelevante para esta discussão acerca do evitar uma guerra com a Rússia.)

Penso que com Trump a influência americana também poderia inspirar uma solução para a sangrenta crise russo-ucraniana, a qual é o resultado do derrube americano do governo ucraniano democraticamente eleito em 2014 a fim de, mais uma vez, avançar o cerco EUA/NATO da Rússia. Depois disso ele poderia finalizar as sanções dos EUA impostas contra a Rússia, com as quais dificilmente alguém na Europa se beneficia ou deseja. E então – finalmente! – por um fim ao embargo contra Cuba. Será um grande dia para celebração! É pena que Fidel não estará presente para desfrutá-lo.

Podemos ter outros dias de celebração se Trump perdoar ou de alguma maneira libertar Chelsea Manning, Julian Assange e/ou Edward Snowden. Nem Barack Obama nem Hillary Clinton fariam isto, mas penso que há pelo menos uma possibilidade com o Donald. Imagine uma reunião deles todos juntos em algum maravilhoso dia futuro.

Trump provavelmente também não evitará acções militares contra radicais islâmicos devido a qualquer receio de ser chamado anti-Islão. Ele é suficientemente repelido pelo ISIS para querer destruí-los, algo que nem sempre se pode dizer do sr. Obama.

Acordos internacionais de comércio, escritos por juristas corporativos em benefício dos seus patrões, com pouca preocupação acerca de nós restantes, podem ter uma tramitação mais árdua na Casa Branca de Trump do que é habitual com tais acordos.

Os críticos convencionais da política externa de Trump deveriam estar embaraçados, mesmo humilhados, pelo que apoiaram no Afeganistão, Iraque, Líbia e Síria. Ao invés disso, o que os incomoda quanto ao presidente eleito é a sua falta de desejo de fazer o resto do mundo à imagem da América. Ele, ao contrário, parece estar mais preocupado em que o mundo não faça a América à sua imagem.

No capítulo mais recente de Alice na Trumplandia ele agora diz que não pretende processar Hillary Clinton, que tem uma "mente aberta" acerca do acordo sobre alterações climáticas [NR] do qual prometera retirar os Estados Unidos e que não está mais certo de que torturar suspeitos de terrorismo seja uma boa ideia. Assim, seja o que for que você possa temer acerca de algumas das estranhas políticas que manifestou ... simplesmente espere ... elas podem ser deixadas de lado muito facilmente, embora eu ainda pense que a um nível pessoal ele é uma toupeira.

A necessidade de Trump por aprovação, aparentemente enraizada de modo profundo, pode sucumbir à crítica e protestos generalizados. Pobre Donald ... tão poderoso ... mas ainda assim vulnerável.

O dilema de Trump, assim como toda a confusão com Hillary Clinton, talvez pudesse ter sido evitado se Bernie Sanders tivesse sido nomeado. Esse grande "se" histórico está quase ao mesmo nível dos democratas que em 1944 escolheram Harry Truman para substituir Henry Wallace como o vice-presidente de Roosevelt já doente. Truman trouxe-nos uma coisa encantadora chamada a Guerra-fria, a qual por sua vez nos deu o macartismo. Mas Wallace, tal como Sanders, era um tanto demasiado à esquerda para os refinados patrões do Partido Democrata.

30/Novembro/2016

[NR] A denúncia da impostura do aquecimento global é um dos aspectos positivos de Trump. Seria uma pena se ele desse o dito por não dito.

Ver também:
  • 'New era of peace': Trump vows to stop US toppling of regimes during 1st stop of 'Thank You' tour (Trump promete travar o derrube de regimes durante a 1ª paragem da sua viagem de agradecimentos), 02/Dez/2016

    [*] Autor de Killing Hope: U.S. Military and CIA Interventions Since World War II e Rogue State: A Guide to the World’s Only Superpower

    O original encontra-se em williamblum.org/aer/read/147


    Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
  • 03/Dez/16