Governo corta e congela remunerações da
administração pública,
- mas aumenta em 205% a verba para tarefeiros
- e em 20% as despesas de representação dos governantes e chefias
À medida que se aprofunda a análise da Proposta de
Orçamento do Estado para 2011 apresentado pelo governo encontram-se mais
"surpresas". Neste estudo vão-se analisar quatro: (a) As
dotações incluídas no OE2011 para pagar trabalhadores
precários que aumentam significativamente; (b) As dotações
destinadas a suportar despesas de representação de governantes e
chefias que também aumentam; (c) As despesas com combustíveis que
sobem significativamente; (d) As dotações inscritas no OE2011
destinadas a aquisição de serviços a privados que, apesar
da crise, continuam elevadíssima sendo uma fonte importante de lucros
para dezenas de empresas. E isto numa altura em que se cortam 1.432
milhões nos vencimentos de mais de 350 mil trabalhadores e se
congelam, pelo segundo ano consecutivo, as remunerações dos
restantes trabalhadores. Para isso observem-se os dados do quadro seguinte
retirados dos Mapas Informativos anexo ao OE2011.
Quadro 1 Dotações inscritas nos orçamentos dos
Serviços Integrados da Administração Central em 2010 e em
2011
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RUBRICAS
|
2010
Milhões
|
2011
Milhões
|
2010-2011
Milhões
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Pessoal dos quadros Regime função pública
|
5.160,6
|
4.762,1
|
-7,7%
|
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Pessoal contratado a termo
|
168,1
|
175,2
|
+4,2%
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Pessoal em regime de tarefa ou avença
|
12,8
|
39,2
|
+205,0%
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Despesas de representação
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16,1
|
19,3
|
+20,0%
|
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Combustíveis e Lubrificantes
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42,5
|
53,8
|
+26,6%
|
Fonte: Mapas Informativos - SI - OE2010 e 2011
Entre 2010 e 2011, como mostram os dados do quadro 1, as despesas com a
generalidade dos trabalhadores dos Serviços Integrados (inclui todas as
direcções gerais de todos os Ministérios) diminuem em
-7,7% (menos -398,5 milhões ), mas as despesas destinadas à
contratação de trabalhadores a prazo, a trabalhadores em regime
de tarefa e avençados ("recibos verde"), as despesas de
representação e em combustíveis aumentam
significativamente.
Assim, a dotação destinada à contratação de
trabalhadores à tarefa e avençados sobe 205% em 2011 nos
Serviços Integrados da Administração Pública. Isto
quando o governo reduz e congela os salários dos trabalhadores da
Administração Pública. Em 2011, para além dos 214,3
milhões destinados à contratação de
trabalhadores a prazo e em regime de tarefa ou avença nos
Serviços Integrados, ainda existem mais 225,4 milhões com
o mesmo fim inscritos nos orçamentos dos Serviços e Fundos
Autónomos (institutos e outros organismos). Portanto, no conjunto de
toda a Administração Central encontram-se inscritos 439,7
milhões para a contratação de trabalhadores
precários. É clara a intenção do governo de
substituir trabalhadores com vínculo permanente por trabalhadores com
vínculo precário. É certamente um mau exemplo que o
governo dá também aos patrões privados que
encontrarão neste comportamento um estímulo para aumentar ainda
mais a precariedade em Portugal.
Outro ponto que caracteriza bem a política do governo de Sócrates
é o aumento das despesas de combustíveis em 26,6%, quando afirma
que está a substituir a frota do Estado, em que tem gasto milhões
de euros, precisamente com o objectivo de reduzir este tipo de despesas. Em
2011, nos Serviços Integrados estão previstos 53,8 milhões
para "combustíveis e lubrificantes" mas existem ainda
inscritos nos orçamentos dos Serviços e Fundos Autónomos
mais 20,4 milhões , o que soma 74,2 milhões
só para "combustíveis e lubrificantes". O aumento
significativo nas despesas com combustíveis desmente também aqui
as declarações do governo.
Mas é a nível das despesas de representação que o
escândalo é ainda maior. Quando se reduzem em cerca de 1.432,5
milhões aos trabalhadores da Função Pública,
o governo aumenta em 20%a dotação para despesas de
representação nos orçamentos dos Serviços
Integrados. Em 2011, nos orçamentos dos Serviços Integrados
estão inscritos 19,3 milhões a que se devem juntar ainda
mais 10,8 milhões que se encontram inscritos nos
Orçamentos dos Serviços e Fundos Autónomos com o mesmo
fim. Ao todo, são 30,1 milhões para despesas de
representação. Só no orçamento de 2011 da
Presidência do Conselho de Ministros estão inscritos para despesas
de representação 1.414.675 euros. Desta forma os governantes e
chefias poderão ser compensados pelos cortes nos vencimentos, o que
não acontecerá com os restantes trabalhadores. É evidente
a politica de "dois pesos e duas medidas".
QUEM PODERÁ SER BENEFICIADO COM O AUMENTO DA DOTAÇÃO PARA
DESPESAS DE REPRESENTAÇÃO EM 2011
O quadro seguinte mostra quais são os governantes e as chefias da
Administração Pública que têm direito a despesas de
representação e quais são os seus montantes em 2010.
Quadro 2 Governantes e chefias com direito a despesas de
representação
|
GOVERNANTES E CARGOS DE CHEFIA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
|
Nº
|
Remuneração
|
Despesas de
representação
|
|
Remuneração base Presidente República
|
1
|
7.630,04
|
3.052,01
|
|
Presidente da Assembleia da República
|
1
|
6.104,03
|
2.441,61
|
|
Primeiro-Ministro
|
1
|
5.722,53
|
2.289,01
|
|
Ministros
|
17
|
4.959,52
|
1.983,81
|
|
Secretários de Estado
|
36
|
4.578,02
|
1.373,41
|
|
Cargos de Direcção Superior de 1º Grau
|
1.331
|
3.734,06
|
778,03
|
|
Cargos de Direcção Superior de 2º Grau
|
4.536
|
3.173,95
|
583,81
|
|
Cargos de Direcção Intermédia de 1º Grau
|
|
2.987,25
|
311,21
|
|
Cargos de Direcção Intermédia de 2º Grau
|
|
2.613,84
|
194,79
|
Fonte: Direcção Geral da Administração e Emprego
Publico -Ministério das Finanças e Lei 4/85
Os que constam do quadro somam 5.923 (mas ainda não inclui a totalidade,
embora os que faltam sejam em número muito mais reduzido) têm
direito a despesas de representação num universo de cerca de 650
mil trabalhadores da Administração Pública.
O GOVERNO VAI GASTAR EM 2011, 1317 MILHÕES COM A
AQUISIÇÃO DE SERVIÇOS, MAS MUITOS DELES PODIAM SER FEITOS
PELOS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O quadro construído com dados constantes Mapas Informativos dos
Serviços Integrados e dos Servidos Autónomos anexos à
Proposta de Orçamento do Estado para 2011, revela o volume de verbas que
o governo pretende gastar com aquisição de serviços a
privados, quando uma parte importante deles podiam ser realizados internamente
por trabalhadores da Administração Pública.
Quadro 3 Dotações inscritas no Orçamento de Estado
para 2011 destinadas a aquisição de serviços a privados
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RUBRICAS
|
2011
Milhões
|
|
Estudos Pareceres, Projectos, Consultoria
|
150,5
|
|
Assistência Técnica
|
108,7
|
|
Outros Trabalhos especializados
|
617,1
|
|
Publicidade
|
47,0
|
|
Vigilância e segurança
|
90,9
|
|
Outros serviços
|
303,1
|
|
SUBTOTAL
|
1.317,2
|
Fonte: Mapas Informativos Serviços Integrados e SFA OE2011
Ao mesmo tempo que corta 1.432,5 milhões nos salários
nominais dos trabalhadores da Administração Pública, o
governo tenciona gastar, em 2001, 1.317, milhões com a
aquisição a privados de "estudos, pareceres, projectos,
consultoria"; com "assistência técnica"; com
"outros trabalhos especializados"; com publicidade (entre 2010 e
2011, as despesas com publicidade aumentarão 32,9%); com
"vigilância e segurança"; e com "outros
serviços". Tudo isto não deixa de ser insólito numa
altura de grave crise financeira do Estado, e mais quando se sabe que existem
na Administração Pública trabalhadores com as
competências necessárias para fazer muitos destes serviços.
É evidente que a austeridade não se aplica a todos os sectores da
Administração Pública, e estas elevadas
dotações para aquisição se serviços
permitirão a muitos privados fazerem bons negócios.
20/Outubro/2010
[*]
Economista,
edr@netcabo.pt
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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