Agravamento da repartição da riqueza em Portugal, 1973-2009
RESUMO DESTE ESTUDO
Numa altura em que se ouve com uma frequência crescente nos media
novamente os defensores do neoliberalismo (engane-se quem pensou que o
neoliberalismo estava definitivamente enterrado) a advogarem o congelamento dos
salários nominais dos trabalhadores portugueses, e mesmo a sua
redução, como solução para a grave
crise provocada pela especulação financeira que dominou toda a
globalização capitalista, interessa recordar alguns dados
oficiais sobre a repartição da riqueza em Portugal. E isto porque
se tal tese (a redução do poder de compra dos salários)
vingasse a parte das remunerações no PIB, que já é
reduzida, diminuiria ainda mais.
O PIB, ou seja, a riqueza criada em 2008 é cerca de 97,2 vezes superior
ao PIB de 1973. O valor das remunerações, sem incluir as
contribuições para a Segurança Social e CGA, de 2008
é apenas 69,8 vezes superior às remunerações,
também sem contribuições, de 1973. Mesmo se consideramos
as remunerações, incluindo as contribuições para a
Segurança Social e a CGA, a situação não se altera
significativamente. Entre 1973 e 2008, O PIB cresceu 97,2 vezes, como já
se referiu, mas as remunerações, com contribuições,
aumentaram apenas 89 vezes. Estes dados oficiais mostram duas coisas. Em
primeiro lugar, que as condições de vida dos trabalhadores
portugueses em 2008 são superiores às que tinham em 1973. Em
segundo lugar, e apesar disso, estes dados oficiais também revelam uma
situação preocupante que é a seguinte: a
repartição da riqueza criada em Portugal tem-se agravado de uma
forma continuada e significativa depois do período 1974-1976, sendo
actualmente pior da que se verificava mesmo em 1973.
Mas não são apenas as entidades oficiais portuguesas que revelam
a diminuição que se tem verificado em Portugal da parte das
remunerações na riqueza criada no nosso País.
Também o Eurostat, que é o organismo oficial de
estatística da União Europeia, confirma a quebra acentuada da
percentagem que as remunerações representam do PIB, e de uma mais
pronunciada que a revelada pelos dados divulgados pelas entidades oficiais
portuguesas. Se retirarmos as contribuições patronais para a
Segurança Social e para a CGA, em 1998, segundo o Banco de Portugal e o
INE as remunerações,
sem contribuições patronais
, representaram 35,3% do PIB, enquanto segundo o Eurostat corresponderam
apenas a 31,8% do PIB. A partir de 1998 deixamos de se dispor, para Portugal,
de dados sobre a percentagem que as remunerações, sem
contribuições, representam em relação ao PIB,
certamente por não serem favoráveis ao governo.
No entanto, o Eurostat tem divulgado as percentagens que as
remunerações,
com contribuições patronais
, representam do PIB, as quais revelam, para Portugal, uma quebra de valor
ainda maior do que a revelada por organismos oficiais portugueses. Assim, em
2006, segundo o INE e o Banco de Portugal, a percentagem correspondeu a 50,7%
do PIB, enquanto segundo o Eurostat, foi 50% do PIB; em 2007, segundo o INE e o
Banco de Portugal, representou 50% do PIB e, de acordo com o Eurostat, apenas
49,1% do PIB; e em 2008, a percentagem, segundo o INE, correspondeu a 50,3% do
PIB e, de acordo com o Eurostat, foi de 50,1% do PIB. Para 2009, o Eurostat
prevê que, em Portugal, as remunerações, com as
contribuições patronais, representem 49,9% do PIB, uma
percentagem bastante inferior à registada em 1973 (54,9% do PIB) e muito
inferior à do período 1974/1976 (entre 61% e 68,4% do PIB); e,
para 2010, prevê o valor de 49,7% do PIB.
E isto sem congelamento ou redução dos salários nominais
como defendem os neoliberais portugueses
.
É neste contexto de diminuição da percentagem que as
remunerações representam da riqueza criada no País, ou
seja, do PIB, que os neoliberais, que surgem de novo com força nos
media, defendem o congelamento e mesmo a redução dos
salários nominais dos trabalhadores portugueses. É curioso e
significativo que muitos dos que defendem tais posições
são precisamente aqueles que têm sido acusados de auferirem
vencimentos e bónus escandalosos que nunca negaram (mais um exemplo da
teoria faz o que eu digo, e não faças o que
faço). A redução do poder de compra das
remunerações em Portugal, para além de determinar o
agravamento das condições de vida da maioria dos portugueses, que
já vivem com dificuldades, provocaria um agravamento da crise
económica que enfrenta o País, pois determinaria a
redução da procura, e a crise actual é também uma
crise resultante da quebra da procura, o que está a impedir as empresas
de venderem uma parte crescente do que produzem ou podem produzir.
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Numa altura em que se ouve, com uma frequência crescente nos media,
novamente os arautos do pensamento único neoliberal (engane-se quem
pensou que o neoliberalismo estava definitivamente enterrado) a defenderem o
congelamento dos salários nominais dos trabalhadores portugueses, e
mesmo a sua redução, como solução para
a grave crise provocada pela especulação financeira que dominou
toda a globalização capitalista, interessa recordar alguns dados
oficiais sobre a situação da repartição da riqueza
criada em Portugal. E isto porque se tal tese vingasse a parte dos
salários no PIB, que já é reduzida, diminuiria ainda mais.
O quadro seguinte, construído com dados do Banco de Portugal e do
Instituto Nacional de Estatística, portanto dados oficiais, mostra como
essa repartição tem evoluído no nosso País ao longo
dos últimos 35 anos.
O PIB, ou seja, a riqueza criada em 2008 é cerca de 97,2 vezes superior
ao PIB de 1973. O valor das remunerações em 2008, sem
contribuições, é 69,8 vezes superior às
remunerações sem contribuições sociais de 1973.
Portanto, o PIB aumentou muito mais vezes que as remunerações
neste período, o que teve como consequência um agravamento na
repartição da riqueza. Mesmo se considerarmos as
remunerações, com as contribuições para a
Segurança Social e para a CGA a situação não se
altera significativamente. Entre 1973 e 2008, o PIB cresceu 97,2 vezes, como
já se referiu, e as remunerações, com
contribuições, aumentaram 89,1 vezes. Estes dados oficiais
mostram duas coisas. Em primeiro lugar, que as condições de vida
dos trabalhadores portugueses em 2008 são muito superiores às que
tinham em 1973. E isto já sem entrar em conta com a Segurança
Social e o Serviço Nacional de Saúde que abrangem a totalidade da
população portuguesa, situação essa que não
se verificava antes do 25 de Abril onde menos de um terço da
população estava abrangida por uma previdência extremamente
deficiente e por um sistema de saúde insuficiente e maioritariamente
privado. Em segundo lugar, estes dados também revelam uma
situação preocupante que é a seguinte: a
repartição da riqueza em Portugal tem-se agravado de uma forma
continua e acentuada depois do período 1974-1976, sendo actualmente pior
da que se verificava em 1973.
Efectivamente, se analisarmos a evolução verificada no
período 1973-2008, concluímos que entre 1973 e 1975 a parte que
as remunerações, sem incluir as contribuições
sociais, representava do PIB aumentou de uma forma continua e significativa,
pois passou de 47% para 59% do PIB entre 1973 e 1975, tendo-se depois
verificado uma diminuição contínua e significativa,
alcançando com o governo de Sócrates, em 2008, apenas 34% do PIB.
E a previsão é que sofra uma nova redução em 2009
como prevê o próprio Eurostat, cujos dados se apresentam
seguidamente.
UNIÃO EUROPEIA CONFIRMA A DIMINUIÇÃO DA PARTE DAS
REMUNERAÇÕES NO PIB
Mas não são apenas as entidades oficiais portuguesas que revelam
a diminuição da parcela das remunerações no PIB.
Também o Eurostat, que é o organismo oficial de
estatística da U.E. confirma essa quebra acentuada que se tem verificado
em Portugal. O quadro II, construído com dados divulgados pelo Eurostat,
disponíveis no seu sítio web, confirma esse facto.
Se compararmos os dados do quadro I (dados do Banco de Portugal e do INE) com
os dados do quadro II (dados do Eurostat), a primeira conclusão que se
tira é que os dados do Eurostat revelam a existência de uma
repartição da riqueza em Portugal mais injusta que a revelada
pelos dados do INE e do Banco de Portugal. Por exemplo, em 2006, segundo o
Banco de Portugal e o INE, a parte das remunerações, incluindo as
contribuições patronais, representaram em Portugal 50,7% do PIB
enquanto, segundo o Eurostat, representaram 50% do PIB; em 2007, segundo o INE
e o Banco de Portugal, o valor das remunerações, com
contribuições, representou 50% do PIB mas, de acordo com o
Eurostat, correspondeu já a 49,1% do PIB; e em 2008, a percentagem,
segundo o INE, correspondeu a 50,3% do PIB e, de acordo com o Eurostat, de
50,1% do PIB. Para 2009, o Eurostat prevê que, em Portugal, as
remunerações, com as contribuições patronais,
representem 49,9% do PIB, uma percentagem mesmo inferior à verificada em
1973 (54,9% do PIB) e muito inferior à registada no período
1974/1976 (entre 61% e 68,4% do PIB) e, em 2010, 49,7% do PIB.
Se retirarmos as contribuições patronais para a Segurança
Social e para a CGA, a diferença é ainda maior. Em 1998, segundo
o Banco de Portugal e o INE as remunerações, sem
contribuições patronais, representaram 35,3% do PIB enquanto,
segundo o Eurostat, corresponderam apenas a 31,8% do PIB. A partir de 1998
deixamos de dispor, para Portugal, de dados sobre a percentagem que as
remunerações, sem incluir as contribuições
patronais, representam em relação ao PIB e, a partir de 2005,
estes dados deixam de ser publicados para todos os países da U.E.
certamente por serem pouco abonatórios para os governos, embora a
situação em Portugal, a nível de desigualdade na
repartição da riqueza criada (PIB) fosse muito pior que a
média europeia. Basta recordar que, de acordo também com o
Eurostat, em Portugal, em 2007, os 20% da população mais ricos
recebiam 6,5 vezes mais rendimento que o 20% mais pobres da
população quando a média na União Europeia, no
mesmo ano, era 4,8 vezes mais.
É neste contexto concreto de agravamento contínuo da
repartição da riqueza criada em Portugal que os defensores do
pensamento neoliberal advogam o congelamento das remunerações
nominais dos trabalhadores portugueses, e mesmo a sua redução, o
que, a concretizar-se, só poderia agravar ainda mais a
repartição existente, e também a crise económica,
com mais falências e mais desemprego, pois a crise actual é
também uma crise de procura, e a redução dos
salários reais dos trabalhadores determinaria uma redução
ainda maior da procura.
12/Abril/2009
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Economista ,
edr@mail.telepac.pt
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