Governo pretende premiar empresas que pagam baixos salários
– o premio é de 26,6 milhões de euros
– ele será retirado da Segurança Social

por Eugénio Rosa [*]

RESUMO DESTE ESTUDO

Uma das características negativas do modelo económico português é de continuar a basear-se em baixos salários, o que inevitavelmente também leva à baixa produtividade e à falta de competitividade. É esta também uma das razões porque a crise em Portugal está a ser mais grave, e que seja também muito mais difícil, lenta e longa a recuperação da economia.

Uma exemplo concreto do modelo de baixos salários que continua a vigorar em Portugal, é o facto de o salário mínimo nacional em Portugal ser bastante inferior ao da generalidade dos países da UE15, e de o aumento anual ser, em euros, sistematicamente inferior às subidas verificadas nos restantes países da UE15, o que está a afastar cada vez mais Portugal desses países. Por ex., em Espanha, entre 1999 e 2004 o salário mínimo nacional aumentou 103,71 euros enquanto em Portugal subiu apenas 59,14 euros; e, entre 2004 e 2009, o aumento em Espanha foi de 163,71 euros, enquanto a subida em Portugal foi somente 84,86 euros. Portanto, os aumentos em Portugal foram praticamente metade dos aumentos verificados em Espanha nos mesmos períodos. No fim de 2009, o salário mínimo na Bélgica era superior em 164,3% ao de Portugal; na Irlanda em +178,5%; na Espanha em +38,7%; na França em +151,6%; no Luxemburgo em +212,7%; na Holanda em +163,2%; e na Inglaterra em +92,4% (Quadro I). Portugal é um país de baixos salários, sendo prova disso o facto de o salário mínimo nacional ter no nosso País um valor bastante inferior ao dos países da UE15, e essa diferença estar a aumentar no lugar de diminuir.

Apesar disso, o governo pretende premiar as empresas que têm trabalhadores a quem pagam apenas o salário mínimo nacional à custa das receitas da Segurança Social, que são tão necessárias à sua sustentabilidade financeira e ao apoio aos trabalhadores desempregados e às famílias em dificuldades. E não se pense que as empresas que o governo pretende beneficiar serão apenas as micro e pequenas empresas que lutam pela sobrevivência; pelo contrário, inclui também grandes empresas como a Sonae que nos seus super e hipermercados têm trabalhadores a quem pagam apenas o salário mínimo nacional. A pretexto do aumento do salário mínimo nacional em 2010, de 450 euros para 475 euros, o governo pretende baixar a taxa de contribuição para a Segurança Social das empresas que pagam apenas o salário mínimo nacional em 1 ponto percentual, ou seja, reduzir a taxa de 23,75%, que é a taxa actual, para 22,75%. A receita que a Segurança Social vai perder devido à redução da taxa contributiva daquelas empresas em 1 ponto percentual, se esta for aprovada pelo governo, será de 26,6 milhões de euros por ano (Quadro III). Portanto, serão menos 26,6 milhões de euros que a Segurança Social terá para combater a pobreza e apoiar os desempregados. É evidente que esta medida representará também um incentivo à manutenção do modelo baseado em baixos salários. Para além disso, o governo se aprovar tal medida enviará aos patrões a seguinte mensagem: Vale a pena pagar salários baixos porque isso é uma justificação válida do ponto de vista do governo para as empresas contribuírem com menos para a Segurança Social.

Uma das características negativas do modelo português é continuar a assentar em baixos salários. Um exemplo comprovativo desse modelo de baixos salários é precisamente o facto do Salário Mínimo Nacional (SMN) em Portugal ser bastante inferior ao dos outros países da UE15, e do aumento do SMN em Portugal, em euros, ser sistematicamente inferior à subida registada na generalidade daqueles países, o que está a afastar o nosso País cada vez mais dos outros países da UE15, como revelam os dados do Eurostat constantes do quadro seguinte..

QUADRO I – Salário mínimo nacional (14 meses) em vários países da União Europeia (UE15) no período 1999-2009
PAÍS
1999
2004
2009
1999-2004
Aumento em €
2004-2009
Aumento em €
2009
Superior a Portugal -%
Bélgica 920,57 € 1.016,57 € 1.189,29 € +96,00 € +172,71 € +164,3%
Irlanda ? 919,71 € 1.253,14 € ? +333,43 € +178,5%
Grécia 432,86 € 540,69 € ? +107,83 €    
Espanha 356,57 € 460,29 € 624,00 € +103,71 € +163,71 € +38,7%
França 888,00 € 954,17 € 1.132,29 € +66,17 € +178,11 € +151,6%
Luxemburgo 996,00 € 1.202,57 € 1.407,17 € +206,57 € +204,60 € +212,7%
Holanda 912,00 € 1.084,11 € 1.184,57 € +172,11 € +100,46 € +163,2%
PORTUGAL 306,00 € 365,14 € 450,00 € +59,14 € +84,86 € BASE
Inglaterra 742,54 € 929,23 € 865,97 € +186,69 € -63,26 € +92,4%
  Fonte: Eurostat

Exceptuando o caso da Inglaterra, em que se verificou entre 2004 e 2009 uma diminuição do salário mínimo, em todos os outros países da UE15 o aumento do salário mínimo nacional tanto no período 1999-2004 como no 2004-2009, em euros, foi sempre bastante superior ao registado em Portugal. Por ex., em Espanha, entre 1999 e 2004 o salário mínimo aumentou 103,71 euros enquanto em Portugal subiu apenas 59,14 euros; e, entre 2004 e 2009, o aumento em Espanha foi de 163,71 euros, enquanto em Portugal subiu somente 84,86 euros; portanto, aumentos quase duplos dos registados em Portugal nos mesmos períodos. Como consequência do aumento insuficiente do salário mínimo nacional em Portugal, no fim de 2009, o salário mínimo na Bélgica era superior em +164,3% ao de Portugal; na Irlanda em +178,5%; na Espanha em +38,7%; na França em +151,6%; no Luxemburgo em +212,7%; na Holanda em +163,2%; e na Inglaterra em +92,4%. Portugal é um país de baixos salários, sendo prova disso o facto do salário mínimo nacional ter no nosso País um valor bastante inferior ao dos países da UE15, e essa diferença estar a aumentar no lugar de diminuir.

GOVERNO PRETENDE PREMIAR EMPRESAS QUE PAGAM BAIXOS SALÁRIOS À CUSTA DA SEGURANÇA SOCIAL

Dados publicados em 2009 pelo INE revelam que a pobreza tem aumentado em Portugal mesmo entre a população empregada devido aos baixos salários pagos pelas empresas. Apesar disso, o governo pretende premiar as empresas que pagam baixos salários (é também um incentivo ao modelo de baixos salários), à custa da Segurança Social, delapidando esta de receitas que são tão necessárias à sua sustentabilidade financeira, ao apoio aos desempregados e às famílias em dificuldades.

De acordo com os dados divulgados no Boletim Informativo de Outubro de 2009 da Direcção Geral do Orçamento do Ministério das Finanças e da Administração Pública, nos primeiros dez meses deste ano, as receitas da Segurança Social que têm como origem as Contribuições (descontos) dos trabalhadores e das empresas aumentaram apenas em 0,3% quando comparadas com as de idêntico período de 2008, pois passaram de 10.695,7 milhões de euros para 10.753,1 milhões de euros.

Durante o mesmo período as despesas com o pagamento das pensões cresceram +5,2%; com o subsídio de desemprego aumentaram +29,4%; com a Acção Social +9,9%; com o Rendimento Social de Inserção +19,2%. Portanto, é evidente que a Segurança Social está a fazer um esforço financeiro grande para responder ao agravamento da crise social em Portugal. No entanto, esse esforço não tem sido ainda suficiente como prova o número crescente de desempregados sem direito a subsidio de desemprego (em Outubro de 2009, o desemprego oficial já atingia 567,7 mil portugueses, e o efectivo 716,9 mil, e os desempregados a receberem subsidio de desemprego eram apenas 346,9 mil) e o aumento da pobreza em Portugal

No entanto, o governo no lugar de aplicar os dinheiros da Segurança Social no reforço do apoio aos desempregados e no combate à pobreza, pretende entregar anualmente algumas dezenas de milhões de euros aos patrões que pagam apenas o salário mínimo nacional

A pretexto do aumento do salário mínimo nacional em 2010 de 450 euros para 475 euros, o que apenas cumpre o acordo estabelecido na concertação social, o governo pretende baixar a taxa de contribuição para a Segurança Social das empresas que têm trabalhadores a quem pagam apenas o salário mínimo nacional em 1 ponto percentual, ou seja, reduzir a taxa de 23,75%, que é a taxa actual, para 22,75%. É uma forma de premiar os patrões que pagam apenas o salário mínimo.

No estudo que o governo apresentou em 2009, aquando do aumento do salário mínimo nacional para 450 euros, com a designação de "e;Estimativa de impacto da retribuição mínima mensal garantida (RMMG) para 2009"e;, constava o seguinte numero de trabalhadores abrangidos pelo salário mínimo nacional.

QUADRO II – Numero de trabalhadores abrangidos pelo SMN no período 2006-2010
ANOS
Nº de Trabalhadores
abrangidos pelo SMN
Aumento de beneficiados
SMN
2006 (Previsão do governo) (*) 181.000   360€ 
2007 (Previsão do governo) (*) 216.000 35.000  403€
2008 (Previsão do governo) (*) 254.000 38.000  426€
2009 (Previsão do governo) (*) 365.000 111.000 450 €
2010 (Previsão – Número mínimo) (**) 400.000 35.000 475 €
Fontes: (*) Estimativa do impacto da retribuição mínima mensal garantida para 2009 – MTSS; (**) Nossa previsão

A partir dos dados anteriores é fácil de calcular a perda de receita que a Segurança Social sofrerá devido ao prémio que o governo pretende dar aos patrões, reduzindo a taxa de contribuição das empresas para a Segurança Social em um ponto percentual.

QUADRO III – Custo para a Segurança Social da redução de 1 ponto percentual das contribuições das empresas com trabalhadores a ganharem o Salário Mínimo Nacional (SMN)
Nº de Trabalhadores
abrangidos pelo SMN
SMN
Nº Meses/Ano
Taxa de desconto
das empresas
para a Segurança Social
Contribuições das empresas para a Segurança Social
400.000 475 € 14 23,75% 631.750.000 €
400.000 475 € 14 22,75% 605.150.000 €
 RECEITA ANUAL PERDIDA PELA SEGURANÇA SOCIAL - 26.600.000 €

A receita que a Segurança Social vai perder devido à redução da taxa contributiva das empresas que têm trabalhadores a quem pagam apenas o salário mínimo nacional, o que inclui também grandes empresas, é de 26,6 milhões de euros por ano. Portanto, serão menos 26,6 milhões de euros que a Segurança Social terá para combater a pobreza e apoiar os desempregados. É esta a realidade que não pode nem deve ser omitida assim como tal medida vai funcionar também como um incentivo para a manutenção do modelo baseado em baixos salários. Para além disso, o governo, se aprovar tal medida, enviará também aos patrões a seguinte mensagem:   Vale a pena pagar baixos salários porque isso é uma justificação válida do ponto de vista do governo para as empresas contribuírem com menos para a Segurança Social.

09/Dezembro/2009
[*] Economista

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
11/Dez/09