A tentativa de manipulação da opinião pública sobre os preços dos combustíveis: Preços em Portugal continuam a ser superiores aos da maioria dos países da União Europeia

por Eugénio Rosa [*]

RESUMO DESTE ESTUDO

Tem-se assistido nos últimos dias, a uma tentativa de manipulação da opinião pública, procurando naturalizar, ou seja, tornar normal e aceitável pelos portugueses, as subidas cada vez mais frequentes dos preços do gasóleo e da gasolina. Jornais como o SOL entraram nessa campanha escrevendo mesmo em título destacado que "impostos explicam diferenças de preços de combustíveis". Mas como podem explicar a diferença de preços quando os preços em Portugal da gasolina e do gasóleo sem impostos são sistematicamente superiores aos preços médios da União Europeia como os dados do Quadro I e II revelam? Como se explica essa diferença que torna os preços de venda final aos consumidores mais elevados do que deviam ser?

Uma peça fundamental nessa operação foi um estudo mandado fazer pela Galp (por uma questão de transparência seria bom que a opinião pública soubesse quanto a Galp pagou por esse estudo), ao ex-ministro da Economia, Augusto Mateus. Segundo o Semanário Sol, esse estudo aponta "para a inexistência de concertação de preços entre as petrolíferas, justificando as subidas de preços com as cotações internacionais dos produtos refinados". À "boleia" desse estudo mandado fazer pela Galp, o citado ex-ministro da economia multiplicou-se em declarações aos órgãos de comunicação social, nomeadamente à TV, no mesmo sentido.

Dados já de 2010 sobre os preços dos combustíveis nos países da União Europeia, da Direcção Geral da Energia do Ministério da Economia, revelam uma realidade diferente que Augusto Mateus se recusou em ver e apontam numa direcção oposta ao estudo mandado fazer pela Galp.

Assim, em Fevereiro de 2010, em apenas dois países (Finlândia e Grécia) dos 27 países da União Europeia é que o preço do gasóleo sem taxas e impostos, ou seja, o preço que reverte integralmente para as empresas, era superior ao preço que os consumidores eram obrigados a pagar em Portugal. Em 24 países da U.E. o preço era inferior ao praticado em Portugal. Em Fevereiro de 2010, o preço do gasóleo em Portugal era superior em 6,8% ao preço médio da União Europeia , sendo o preço com impostos apenas superior em 2,2% (Quadro I). Seria importante que tanto a Autoridade da Concorrência como Augusto Mateus, como também a Galp, e mesmo os media que utilizam o mesmo argumento, explicassem aos portugueses essa diferença de preços, já que o preço sem impostos em Portugal é sistematicamente superior ao preço médio da União Europeia. Mesmo considerando o preço com impostos, em 16 países dos 26 da União Europeia esse preço era inferior ao de Portugal (Quadro I).

Situação semelhante se verificava com a gasolina 95. Em Fevereiro de 2010, de acordo com a Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia, em apenas cinco países (Chipre, Dinamarca, Espanha, Itália e Malta) dos 27 países da União Europeia é que o preço da gasolina 95 sem taxas e impostos, ou seja, o preço que reverte integralmente para as empresas, era superior ao preço a que os consumidores portugueses eram obrigados a pagar. Em 21 países da U.E. esse preço era inferior ao praticado em Portugal. Em Fevereiro de 2010, o preço da gasolina 95 em Portugal sem impostos era superior em 4,9% ao preço médio da União Europeia . Mesmo considerando o preço com impostos, em 21 países dos 26 da União Europeia esse preço era inferior ao de Portugal (Quadro II)

Seria importante que tanto a Autoridade da Concorrência como Augusto Mateus, como também a Galp, e os próprios órgão de informação que têm alinhado nas posições das petrolíferas explicassem aos consumidores portugueses porque razão em Portugal os preços dos combustíveis sem impostos são sistematicamente superiores aos preços médios praticados na União Europeia, apesar da Galp adquirir o petróleo no mesmo mercado internacional em que o fazem as empresas dos outros países. Se os preços sem impostos fossem mais baixos, como deviam ser, naturalmente os preços com impostos também o seriam. Só a passividade, para não dizer mesmo, a conivência do governo e da Autoridade da Concorrência, e estudos como o de Augusto Mateus, que são depois divulgados acriticamente por muitos órgãos de informação, é que podem explicar isso. Só as diferenças entre os preços sem impostos em Portugal e os preços médios da U.E. também sem impostos, dão às empresas em Portugal um lucro extraordinário que estimamos em mais de 400 milhões de euros por ano à custa dos consumidores portugueses. É esta a verdade que não pode nem deve ser manipulada nem omitida e que é necessário que os portugueses a conheçam.

Face à nova escalada de aumentos dos preços dos combustíveis em Portugal assistiu-se, nos últimos dias, a uma tentativa de manipulação da opinião pública, procurando naturalizar, ou seja, tornar normal e aceitável pela população, as subidas cada vez mais frequentes dos preços dos combustíveis. Para isso, começou-se por procurar associar esses aumentos não só à subida do preço do petróleo no mercado internacional, como isso se verificasse apenas para Portugal, como também ao aumento da carga fiscal, como isso se tivesse registado nos últimos dias. Mais recentemente apareceu, como por acaso, um estudo mandado fazer pela Galp ao ex-ministro da economia Augusto Mateus, que defendia que "no gasóleo e na gasolina, o que se encontra é uma correlação estreitíssima entre Portugal e os outros países", portanto o aumento de preços em Portugal seria normal; e que a Autoridade da Concorrência deve ter "uma regulação estratégica" portanto, não devia nem interferir nem controlar a fixação dos preços aos consumidores em Portugal. Era a "música celestial" que tanto as petrolíferas, como a Autoridade da Concorrência, como o próprio governo, gostaram de ouvir para tudo pudesse continuar na mesma.. E segundo o semanário SOL, na sua edição online de 20.3.2010, "o estudo apontou para a inexistência de concertação de preços entre as petrolíferas, justificando as subidas com as cotações internacionais dos produtos refinados". À "boleia" desse estudo mandado fazer e naturalmente pago pela Galp, o citado ex-ministro fez declarações aos grandes órgãos de comunicação social, nomeadamente à TV, no mesmo sentido.

Face a esta tentativa clara de influenciar, para não dizer mesmo, manipular a opinião publica, para que ela aceite como natural e inevitável subidas frequentes dos preços dos combustíveis, Interessa conhecer os últimos dados oficiais sobre os preços dos combustíveis nos países da União Europeia divulgados pela Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia.

EM APENAS DOIS DOS 27 PAISES DA UE, O PREÇO DO GASÓLEO SEM IMPOSTOS É SUPERIOR AO DE PORTUGAL, E O PREÇO DO GASÓLEO EM PORTUGAL É SUPERIOR AO PREÇO MEDIO DA UE EM 6,8%

As empresas dos outros países, tal como acontece com a Galp, também têm de adquirir o petróleo no mercado internacional. No entanto, em 24 dos 27 países da União Europeia, o preço do gasóleo sem impostos que reverte totalmente para as empresas, é inferior ao preço pago pelos consumidores portugueses como mostram os dados da Direcção Geral de Energia do quadro.

QUADRO I – Preço sem taxas e impostos (PST) e Preço de Venda ao Público (PVP) do gasóleo em Portugal e nos outros países da União Europeia – Fevereiro 2010 – Litro/Euros
PAÍS
PST
(preço sem taxas e impostos)
PVP
(Preço de venda ao público, com taxas e impostos]
DIFERENÇA ENTRE PVP-PST
Alemanha 0,459 1,106 0,647
Áustria 0,452 1,005 0,553
Bélgica 0,504 1,053 0,549
Bulgária 0,446 0,904 0,457
Chipre 0,516 0,887 0,371
Dinamarca 0,519 1,136 0,617
Eslovénia 0,465 1,078 0,613
Espanha 0,516 0,994 0,477
Estónia 0,498 1,069 0,571
Finlândia 0,548 1,071 0,523
França 0,468 1,071 0,603
Grécia 0,562 1,069 0,507
Holanda 0,468 1,078 0,610
Hungria 0,503 1,092 0,589
Irlanda 0,523 1,155 0,632
Itália 0,529 1,142 0,613
Letónia 0,503 1,008 0,505
Lituânia 0,518 0,959 0,441
Luxemburgo 0,494 0,915 0,421
Malta 0,478 0,980 0,502
Polónia 0,487 0,983 0,496
PORTUGAL 0,530 1,074 0,543
Reino Unido 0,462 1,298 0,836
República Checa 0,510 1,118 0,608
República Eslovaca 0,472 1,033 0,561
Roménia 0,498 0,954 0,456
Suécia 0,484 1,148 0,664
MÉDIA UE-27 0,497 1,051 0,554
PORTUGAL / MÉDIA EU-27 +6,8% +2,2% -2,0%
Fonte: Direcção Geral de Energia - Ministério da Economia

Em Fevereiro de 2010 (e a situação em Março, com as subidas frequentes de preços, não deve ter melhorado; muito pelo contrário), em apenas dois países ( Finlândia e Grécia) dos 27 países da União Europeia é que o preço do gasóleo sem taxas e impostos, ou seja, aquele que reverte integralmente para as empresas, era superior ao preço sem impostos que os consumidores portugueses eram obrigados a pagar para as empresas. Em 24 países da U.E. este preço é inferior ao praticado em Portugal. Em Fevereiro de 2010, o preço do gasóleo em Portugal sem impostos era superior em 6,8% ao preço médio da União Europeia (27 países) também sem impostos. Seria importante que tanto a Autoridade da Concorrência como Augusto Mateus, como também a Galp e os media que defendem a posição das empresas explicassem aos portugueses essa diferença de preços , que é em Portugal sistematicamente superior ao preço médio da União Europeia, que dá às empresas um elevado lucro extraordinário.

Em relação ao preço de venda ao publico de gasóleo, que inclui taxas e impostos, os dados da Direcção Geral de Energia, revelam que o preço em Portugal é superior ao preço médio da União Europeia em 2,2%, portanto um terço da diferença que se verifica nos preços sem impostos e taxas, em que a diferença é de 6,7%. Em euros, a diferença entre o Preço de Venda ao Público e o Preço sem Impostos e Taxas é, em Portugal, de 0,543 €/litro, enquanto a média na União Europeia é de 0,554€/litro (apenas em 10 países dos 26 países da União Europeia têm preços com impostos superiores aos de Portugal).

EM APENAS QUATRO DOS 27 PAISES DA UE, O PREÇO DA GASOLINA 95 SEM IMPOSTOS É SUPERIOR AO DE PORTUGAL, E O PREÇO EM PORTUGAL É SUPERIOR AO PREÇO MEDIO DA UE EM 4,9%

Situação semelhante à verificada com o gasóleo também se observa na gasolina, como revelam os dados da Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia constantes do quadro seguinte.

QUADRO II – Preço sem taxas e impostos (PST) e Preço de Venda ao Público (PVP) da gasolina 95 em Portugal e nos outros países da União Europeia – Fevereiro 2010 – Litro/Euros
PAÍS
PST
(preço sem taxas e impostos)
PVP
(Preço de venda ao público, com taxas e impostos)
DIFERENÇA ENTRE PVP-PST
Alemanha 0,452 1,317 0,865
Áustria 0,432 1,101 0,668
Bélgica 0,472 1,314 0,842
Bulgária 0,445 0,954 0,509
Chipre 0,526 0,961 0,435
Dinamarca 0,538 1,389 0,850
Eslovénia 0,471 1,155 0,684
Espanha 0,513 1,102 0,588
Estónia 0,473 1,075 0,602
Finlândia 0,505 1,362 0,857
França 0,480 1,299 0,819
Grécia 0,511 1,179 0,667
Holanda 0,487 1,437 0,949
Hungria 0,481 1,169 0,688
Irlanda 0,498 1,244 0,746
Itália 0,530 1,313 0,783
Letónia 0,486 1,047 0,561
Lituânia 0,503 1,135 0,631
Luxemburgo 0,503 1,110 0,607
Malta 0,536 1,150 0,614
Polónia 0,469 1,075 0,606
PORTUGAL 0,511 1,313 0,802
Reino Unido 0,446 1,279 0,833
República Checa 0,484 1,173 0,689
República Eslovaca 0,474 1,176 0,702
Roménia 0,487 1,009 0,522
Suécia 0,452 1,255 0,803
MÉDIA UE-27 0,488 1,189 0,701
PORTUGAL/ MÉDIA UE27 +4,9% +10,5% +14,4%
Fonte: Direcção Geral de Energia - Ministério da Economia

Em Fevereiro de 2010 em apenas cinco países (Chipre, Dinamarca, Espanha, Itália e Malta) dos 27 países da União Europeia é que o preço da gasolina 95 sem taxas e impostos, ou seja, o preço que reverte integralmente para as empresas, era superior ao preço sem impostos que os consumidores portugueses eram obrigados a pagar. Em 21 países da U.E. este preço era inferior ao praticado em Portugal.

Em Fevereiro de 2010, o preço da gasolina 95 em Portugal sem impostos era superior em 4,9% ao preço médio da União Europeia (27 países). Seria importante também que tanto a Autoridade da Concorrência como Augusto Mateus, como também a Galp explicassem aos portugueses o porquê desta diferença de preços, em que o preço em Portugal é sistematicamente superior ao preço médio da União Europeia, o que dá às petrolíferas um elevado lucro extraordinário. Mas essa explicação sempre se recusam a dar

Em relação ao preço de venda ao publico de gasóleo, que inclui taxas e impostos, os dados da Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia, revelam que o preço em Portugal é superior ao preço médio da União Europeia (27 países), em 10,5%. A diferença entre o Preço de Venda ao Público e o Preço sem Impostos e Taxas é, em Portugal, de 0,802 €/litro, enquanto a média na União Europeia é de 0,701€/litro. No entanto, a diferença de 0,101€/litro é explicada da seguinte forma: 48,1% (0,049€/litro) pelo facto do preço sem taxas em Portugal ser superior ao preço médio da UE27; e 51,9% (0,052€/litro) pela carga fiscal mais elevado sobre a gasolina em Portugal. É evidente, que se o preço da gasolina em Portugal sem impostos fosse igual pelo menos ao preço médio da União Europeia também se impostos, o preço de venda ao publico, mesmo com carga fiscal existente, seria certamente mais baixo. E é isso que a Galp, Augusto Mateus, a Adc, o governo, e muitos órgãos de comunicação social não querem ou não falam. E a diferença entre os preços praticados em Portugal e os preços médios da União Europeia também sem impostos dá às empresas em Portugal um lucro extraordinário que estimamos em mais de 400 milhões de euros, que são pagos pelos consumidores portugueses, que enfrentam dificuldades crescentes na sua vida diária. E é importante recordar que, considerando mesmo os preços com impostos, em apenas 4 países dos 26 países da União Europeia os preços da gasolina 95 com impostos são superiores ao preço com impostos em Portugal. Em 22 países os preços da gasolina 95 com impostos são inferiores aos de Portugal como revelam os dados da Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia constantes do quadro II. E isto era importante que os media portugueses divulgassem, mas infelizmente não o fazem. Porquê? É a pergunta que deixamos para reflexão de todos.

20/Março/2010

Economista, edr2@netcabo.pt

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21/Mar/10