Política de crédito da banca contribuiu para o atraso e
estagnação do país
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A direita no seu ataque violento ao investimento público procura fazer passar a ideia junto da opinião pública que o investimento privado é sinónimo de qualidade, de crescimento económico e desenvolvimento, e de que o investimento público é necessariamente mau investimento, aumento do endividamento e mesmo desperdício. Embora o investimento público não seja sempre bom investimento (exs.:os estádios de futebol construídos durante o Euro2000, muitos deles agora não utilizados estrangulando financeiramente as autarquias, e a multiplicação de auto-estradas em regiões de tráfego reduzido em que uma simples via rápida de menores custos seria suficiente), o investimento privado, mais interessado em obter lucros elevados e rápidos, leva muitas vezes ao estrangulamento das actividades produtivas, à promoção da especulação, e ao aumento das assimetrias regionais, como aconteceu no nosso País. O bom investimento público, que para o ser tem de ser eficiente, é fundamental para combater a crise, criar emprego e recuperar o atraso. A banca em Portugal é responsável pela falta de qualidade do investimento e, consequentemente, também pela estagnação do País, pela gravidade da crise e pelo aumento das desigualdades regionais . Ela tem a função importante de recolher recursos (poupança dos portugueses e empréstimos externos que aumentam a divida do país ao estrangeiro) e depois em canalizar os meios que assim obtém, que não são seus, através do crédito que concede, para as diferentes áreas de actividade económica, regiões, empresas e indivíduos, promovendo uns (os que têm acesso a esse crédito) e estrangulando outros (os que não conseguem crédito). Desta forma, a banca acaba por condicionar todo o crescimento económico e desenvolvimento de um pais. E segundo o Banco de Portugal (Quadro I), em Janeiro de 2010, o crédito concedido à agricultura representava apenas 0,8% do credito total; à pesca somente 0,1%; às industrias extractivas 0,2%, à Industria Transformadora 6,2%; em suma, estes 4 sectores produtivos fundamentais para o crescimento económico e aumento da competitividade do País receberam apenas 7,3% de todo o crédito concedido pela banca em Portugal. E entre 2000 e 2010, o crédito concedido a estes 4 sectores baixou de 11,3% para 7,3% do credito total concedido pela banca, ou seja, sofreu uma redução de 35,4%. Enquanto sucedeu isto em relação às actividades produtivas essenciais para o desenvolvimento do País, entre 2000 e 2010, o crédito concedido pela banca às empresas de construção cresceu de 8,4% para 9,3% do total; às actividades imobiliárias de 11,2% para 17,2%; e à habitação, que permitiu a especulação nas duas actividades anteriores, subiu de 42,7% para 45,2% do crédito total concedido pela banca; em resumo, estas três actividades construção, imobiliário e habitação absorveram, em 2000, 62,3% de todo o crédito concedido pela banca em Portugal e, em 2010, 71,7% do crédito total. Se adicionarmos o crédito ao consumo (6,5% do total em 2000 e 6,4% em 2010) a desigualdade de tratamento ainda se torna mais grave. Mas esta distorção no crédito imposta pela banca na ânsia de obter lucros elevados e rápidos com riscos reduzidos, é visível não só na repartição do credito concedido pelas diferentes actividades económicas, promovendo as especulativas e estrangulando as produtivas, mas também na repartição pelas diferentes regiões do País agravando as desigualdades regionais. Segundo dados também do Banco de Portugal (Quadro II), no fim de 2009, o crédito concedido no distrito de Aveiro representava apenas 4,4% do crédito total; no de Beja: 0,8%; no de Braga: 5,2%; no de Bragança: 0,5%; no de Castelo Branco: 0,9%; no de Coimbra: 2,6%; no de Évora : 1,1%; no de Faro: 3,9%; no da Guarda: 0,6%; no de Leiria: 3,6% . Por outras palavras, estes 10 distritos receberam apenas 20,5% de todo o crédito concedido pela banca, enquanto o distrito de Lisboa recebeu 42,7%, ou seja, mais 89,3%. A mesma desigualdade se verifica em relação aos restantes distritos. O de Santarém recebeu apenas 2,7%; o de Setúbal: 5,8%; o de Viana de Castelo: 1,2%; o de Vila Real: 0,9%; o de Viseu: 2%; os Açores somente 1,8%; a Madeira:3,3%; e o de Portalegre: 0,6%. Estas oito regiões receberam 18,3% de todo o crédito concedido pela banca, ou seja, um pouco mais que o recebido pelo distrito do Porto que, em 2009, tinha obtido 15,4%. É evidente que esta grave desigualdade na repartição do crédito pelas diferentes regiões do País agravou as assimetrias regionais, contribuindo para um País cada vez mais desigual. Em resumo, os dados do Banco de Portugal mostram: (1) Que a politica de crédito da banca na ânsia de maximizar os lucros e reduzir o risco, é também responsável pela estagnação económica e pela gravidade da crise que o País enfrenta; (2) Que o investimento privado não é sinónimo de bom investimento, muito pelo contrário; (3) Que uma politica de crescimento económico e de combate à crise passa também pela alteração da politica de crédito da banca ( é urgente ) incluindo a da CGD, e do investimentos público (aprova-se o TGV mas corta-se para menos de metade o investimento na CP e na ferrovia convencional), até porque os recursos são escassos e limitados. |
A politica de crédito do sistema bancário é uma
matéria que tem merecido pouca atenção por parte quer do
governo, quer do pensamento económico neoliberal dominante, quer dos
próprios media, embora ela condicione a qualidade do investimento que
é realizado em Portugal e, consequentemente, o crescimento
económico e o desenvolvimento do País.
Mesmo agora que Portugal enfrenta uma crise económica e social com uma
gravidade nunca antes registada depois do 25 de Abril, em que os recursos
são escassos e limitados, a necessidade do investimento ser de qualidade
parece não preocupar os governantes nem os fazedores de opinião
pública. Preocupa-os apenas a redução do défice
como se isso fosse suficiente para gerar, como por milagre, o crescimento
económico e desenvolvimento. Outros continuam a pensar que os recursos
são ilimitados, e que se pode fazer simultaneamente tudo desde
auto-estradas para resolver problemas de regiões com tráfego
reduzido que poderia ser resolvidos com vias rápidas de muito menor
custo; alta velocidade de 350 km/hora, quando de menor velocidade e,
consequentemente, de menores custos seria mais que suficiente;
modernização da ferrovia convencional, a maior parte dela
degradada e a carecer de grandes investimentos que são absolutamente
indispensáveis para combater as graves assimetrias regionais e
desenvolver de uma forma equilibrada o País, mas que são
cortados para metade ou adiados perante o silêncio geral; a
construção de mais uma ponte sobre o Tejo e de mais um novo
aeroporto, que envolvam investimentos gigantescos, mas que ninguém sabe
com um mínimo de consistência qual será o nível de
utilização e benefícios até devido as
alterações no mercado mundial resultantes da crise actual; a
industrialização do país, a modernização da
agricultura e das pescas necessárias mas que exigem também
grandes investimentos; a produção de bens que sejam competitivos
no mercado global, etc.; em resumo, tudo isto exige meios financeiros
gigantescos, que ninguém se preocupa nem em quantificar nem em saber
como serão obtidos, nem que benefícios reais se
alcançarão com esses investimentos, nem depois como serão
pagos.
A preocupação de qualidade do investimento continua a estar
ausente do debate público actual. Uns pensam que é suficiente o
investimento ser privado para ser de qualidade e justificável, enquanto
outros defendem precisamente o contrário, ou seja, que basta o
investimento ser publico para ser inevitavelmente bom investimento,
esquecendo-se que a eficiência e a análise custo-benefício,
incluindo o beneficio social, é fundamental para que se tenha um bom
investimento público. A forma ligeira e mesmo irresponsável como
Sócrates e outros membros do governo falam de investimentos que, pela
sua dimensão, condicionam o futuro do País e dos portugueses
durante muitos anos é preocupante. À falta de argumentos
consistentes a única coisa que sabem dizer é que é
necessário respeitar compromissos com empresas (diga-se com a
Mota-Engil, por ex.) ou com a Comissão Europeia. Os encargos já
assumidos com as Parcerias Público Privadas, que envolvem lucros certos
e seguros para os grandes grupos económicos à custa do OE, e
pesados encargos para as gerações futuras (só até
2030, os encargos das PPP já assinadas atingem 22.493,2 milhões
), é preocupante e é um obstáculo importante ao
crescimento económico e ao desenvolvimento do país. Para
além disso, a análise da politica de crédito da banca
mostra que o investimento privado não é necessariamente
sinónimo de qualidade, e que uma politica de concessão de
crédito orientada pelo lucro pode conduzir um país ao atraso,
à crise e à estagnação e ao aumento das assimetrias
regionais como acontece em Portugal.
A BANCA É TAMBÉM RESPONSÁVEL PELO ATRASO DO PAÍS,
PELA ESTAGNAÇÃO ECONOMICA, E PELA GRAVIDADE DA CRISE QUE O
PAÍS ENFRENTA
No mundo actual, uma economia não consegue nem funcionar nem se
desenvolver sem crédito. O crédito, ao canalizar recursos para
certas actividades, regiões, e empresas, e a negar a outras, promove
umas e condena outras à estagnação e mesmo ao
desaparecimento. A análise da repartição do credito
concedido pela banca em Portugal por actividades revela a responsabilidade da
banca na estagnação económica do País e na
gravidade da crise nacional actual .
QUADRO I CRÉDITO POR ACTIVIDADES EM PORTUGAL, em Percentagem do
Crédito Total
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produção animal, caça e silvicultura |
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extractivas |
transformadoras |
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2000 Jan | 0,7% | 0,1% | 0,3% | 10,2% | 1,5% | 8,4% | 42,7% |
2004 Jan | 0,7% | 0,1% | 0,3% | 8,5% | 0,9% | 9,8% | 42,5% |
2005 Jan | 0,7% | 0,1% | 0,3% | 7,8% | 1,0% | 9,8% | 43,8% |
2007 Jan | 0,7% | 0,0% | 0,2% | 6,2% | 1,0% | 9,4% | 47,2% |
2009 Jan | 0,8% | 0,1% | 0,2% | 6,4% | 1,5% | 9,7% | 44,4% |
2010 Jan | 0,8% | 0,1% | 0,2% | 6,2% | 1,5% | 9,3% | 45,2% |
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2000 Jan | 11,7% | 1,0% | 3,1% | 11,2% | 2,6% | 6,5% | 100% |
2004 Jan | 9,0% | 1,4% | 3,9% | 15,7% | 1,7% | 5,5% | 100% |
2005 Jan | 8,0% | 1,4% | 3,5% | 16,5% | 1,6% | 5,6% | 100% |
2007 Jan | 7,2% | 1,5% | 2,6% | 16,5% | 1,6% | 5,9% | 100% |
2009 Jan | 6,8% | 1,6% | 2,9% | 18,0% | 1,7% | 6,5% | 100% |
2010 Jan | 6,5% | 1,7% | 2,9% | 17,2% | 1,9% | 6,4% | 100% |
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2000 | 4,5% | 0,6% | 4,5% | 0,5% | 1,0% | 2,4% | 0,9% | 2,5% | 0,6% | 3,0% | 44,8% |
2004 | 4,7% | 0,7% | 5,0% | 0,5% | 1,0% | 2,6% | 1,1% | 3,1% | 0,6% | 3,5% | 43,2% |
2005 | 4,7% | 0,7% | 5,1% | 0,5% | 1,0% | 2,6% | 1,1% | 3,3% | 0,6% | 3,6% | 42,5% |
2007 | 4,6% | 0,7% | 5,1% | 0,6% | 1,0% | 2,6% | 1,2% | 3,8% | 0,6% | 3,7% | 41,5% |
2009 | 4,4% | 0,8% | 5,2% | 0,5% | 0,9% | 2,6% | 1,1% | 3,9% | 0,6% | 3,6% | 42,7% |
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2000 | 18,9% | 2,4% | 6,1% | 0,9% | 0,9% | 1,6% | 1,2% | 2,2% | 0,3% | 0,6% | 100% |
2004 | 16,6% | 2,6% | 6,3% | 1,0% | 0,9% | 1,7% | 1,3% | 3,1% | 0,5% | 0,6% | 100% |
2005 | 16,1% | 2,7% | 6,2% | 1,1% | 0,9% | 1,8% | 1,6% | 3,1% | 0,4% | 0,6% | 100% |
2007 | 15,9% | 2,8% | 6,2% | 1,1% | 1,0% | 1,9% | 1,8% | 3,3% | 0,5% | 0,6% | 100% |
2009 | 15,4% | 2,7% | 5,8% | 1,2% | 0,9% | 2,0% | 1,8% | 3,3% | 0,4% | 0,6% | 100% |