Pretensões do governo para 2011 (II)
- aumentar o IVA em 1178 milhões
- cortar as remunerações da função pública
em mais de 450 milhões
- integrar o fundo de pensões da PT, que está subfinanciado em
650 milhões , na Segurança Social ou na CGA podendo por em
risco a sustentabilidade financeira destas
Nota: Este artigo rectifica o de 30/Setembro, escrito antes de
se conhecer o comunicado do Conselho de Ministros
Com os poucos dados que se dispõem não é ainda
possível avaliar total e rigorosamente as consequências de todas
as medidas anunciadas por Sócrates, até porque elas ainda
não foram passadas para diplomas. No entanto, com base no comunicado
emitido pelo Ministério das Finanças em 30/09/2010,
disponível no seu site, o qual clarifica alguns pontos que
tinham ficado poucos claros na conferencia de imprensa dada pelo governo,
é possível, sem prejuízo de uma análise futura mais
completa e rigorosa, quantificar algumas das medidas para se poder avaliar
não só as graves consequências sociais que
provocarão, mas também as económicas cuja gravidade
não é menor mas que muitas vezes são esquecidas ou
intencionalmente omitidas.
As medidas do governo de Sócrates vão provocar não
só uma agravamento grande e imediato das condições de vida
dos trabalhadores e dos pensionistas, mas também terão um impacto
enorme a nível económico, provocando certamente uma forte
retracção da economia (mesmo recessão), já que
determinarão uma redução drástica adicional do
consumo interno (4.855 milhões , sendo 173 milhões
de investimento), o que causará a falência de muitas empresas,
fazendo disparar ainda mais do desemprego. Só a miopia deste governo, e
do PSD e CDS, que exigem a redução drástica da despesa
pública, ignorando as consequências gravíssimas numa
situação de grave crise como é actual, é que
parecem não compreender isso.
SÓ O IVA VAI AUMENTAR EM MAIS DE 1.178 MILHÕES EM 2011
Sócrates e o seu ministro das Finanças anunciaram que o IVA seria
aumentado em 2011 em 2 pontos percentuais. Como esse aumento é apenas na
taxa normal, ou seja, na taxa de 21% segundo o comunicado, o aumento do imposto
é o constante do quadro 1.
Quadro 1 Aumento da receita do IVA em 2011 obtida com um aumento de 2
pontos percentuais da taxa normal e a resultante do aumento nominal do PIB
|
TAXAS
|
ANO 2010
|
ANO 211
|
AUMENTO 2010-2011
|
|
Taxa
|
Receita prevista
Milhões
|
Taxa
|
Receita prevista
Milhões
|
Em Milhões
|
Em %
|
|
REDUZIDA
|
6%
|
1.409
|
6%
|
1.430
|
21
|
|
|
INTERMÉDIA
|
13%
|
1.158
|
13%
|
1.175
|
17
|
|
|
NORMAL
|
21%
|
10.204
|
23%
|
11.344
|
1.140
|
11,2%
|
|
SOMA
|
|
12.771
|
|
13.949
|
1.178
|
9,2%
|
Tendo como base a estrutura da despesas e da receita do IVA em 2010, o aumento
de receita do IVA obtida com uma subida de 2 pontos percentuais na taxa normal
(21%) e tendo em conta o crescimento do PIB em termos nominais deverá
rondar os 1.178 milhões em 2011, o que corresponde a uma subida
de receita, relativa à prevista em 2010, de 9,2%.
Mas não é só devido a esta medida que os impostos
vão aumentar. Sócrates também anunciou que o rendimento
dos reformados não sujeito a imposto (a chamada dedução de
pensões a nível do IRS) irá ser reduzida dos actuais
6.000 por ano para um valor que poderá ser apenas 3.888, que
é a dedução por rendimentos do trabalho. Portanto, se um
reformado receber uma pensão superior ao salário mínimo
nacional, mesmo que a sua pensão seja congelada em 2011, o IRS que
pagará poderá aumentar, pelo menos, em 168,96, pois
2.112 do seu rendimento ficarão sujeitos a IRS, o que não
acontecia em 2010.
A juntar a tudo isto, e por pressão fundamentalmente do CDS, o governo
também anunciou na conferencia de imprensa que irá reduzir
administrativamente a despesa com o Rendimento Social de Inserção
em 20%, ou seja, uma redução de 116 milhões por
ano, o que só se conseguirá retirando o apoio social a mais de
100.000 portugueses com rendimento abaixo do limiar da pobreza, pois o subsidio
por pessoa é actualmente apenas de 88,92 por mês.
O GOVERNO PRETENDE REDUZIR AS REMUNERAÇÕES DA
FUNÇÃO PÚBLICA EM MAIS DE 450 MILHÕES E
AUMENTAR OS DESCONTOS PARA A CGA EM 124 MILHÕES
O governo de Sócrates pretende não só congelar mais uma
vez em 2011 (já o fez em 2010) as remunerações dos
trabalhadores da Função Pública que recebem até
1500 por mês, mas também reduzir as
remunerações dos trabalhadores que recebem mais de 1500 por
mês, entre 3% e 10%, de forma a obter uma redução do total
de remunerações pagas à Função
Pública em 5%. Se esse for objectivo do governo, e se ele se
concretizar, a redução em milhões nos vencimentos
dos trabalhadores será a que consta do quadro 2, a que se deve juntar o
aumento da taxa de contribuição para a CGA a aplicar a todos que
descontam para esta instituição também anunciada pelo
governo.
Quadro 2 Redução das remunerações e aumento
dos descontos dos trabalhadores da Administração Pública
em 2010 e em 2011
|
MEDIDAS
|
2010
Milhões
|
2011
Milhões
|
Nº trabalhadores lesados
|
Redução/Encargo médio anual por trabalhador
|
|
Aumento da quotização para CGA de 10% para 11% (a acrescentar a
1,5% que pagam para a ADSE).
|
41
|
143
|
603.840
|
237
|
|
Redução nas remunerações superiores a 1500
entre 3% e 10%, de forma que se verifique uma redução nas
remunerações certas totais do Estado em 5%
|
|
425
|
250.000
|
1.702
|
|
SOMA
|
41
|
568
|
|
|
O governo pretende aumentar em 1 ponto percentual o desconto dos trabalhadores
da Função para a CGA. Para se compreender a injustiça
desta medida é preciso ter presente que os trabalhadores da
Função Pública já descontam nos seus
salários, para pagar a saúde e a reforma. 11,5% (10% para a CGA e
1,5% para a ADSE), enquanto os do sector privado descontam 11%. E como tudo
isso não fosse suficiente o governo pretende agora aumentar em mais 1
ponto percentual, ou seja, para 12,5%, o que significa um novo corte nas
remunerações dos trabalhadores da Função
Pública em 124 milhões por ano. Como o número
actual de subscritores da CGA é de 603.840, isso significa uma
redução média anual nas remunerações de
237 por trabalhador. E ainda têm de pagar impostos como qualquer
trabalhador.
Durante a conferencia de imprensa o governo anunciou que tenciona aumentar a
taxa de desconto dos trabalhadores para a CGA já este ano, o que
poderá custar aos trabalhadores da Administração
Pública uma redução nas suas remunerações em
2010, que foram congeladas, estimada em 41 milhões .
Para além disso, o governo pretende ainda cortar nas
remunerações dos trabalhadores da Função
Pública que recebem mais de 1500 por mês entre 3% e 10%, de
forma que obtenha uma redução da massa salarial da
Função em 5%. Se essa redução tiver como base
apenas as remunerações certas e permanentes a
diminuição será de 425 milhões por ano, mas se for
de 5% das Despesas de Pessoal da Função Pública a
redução já será de 573 milhões por
ano. O director da OCDE, quando esteve em Portugal, aconselhou o governo a
reduzir os salários da Administração Pública porque
isso determinaria, por arrastamento, o mesmo no sector privado. O governo,
obedientemente, seguiu o conselho, por isso é previsível que
procure ajudar os patrões privados a fazerem o mesmo.
Na conferência de imprensa nem Sócrates nem Teixeira dos Santos
foram claros. Portanto, teremos de esperar pelos projectos de diplomas para
saber ao certo. Mas o que ficou na conferência de imprensa claro, tendo
Teixeira dos Santos até mesmo corrigido o 1º ministro na tentativa
deste para ocultar a verdade: é que os trabalhadores nunca serão
no futuro compensados por este corte na suas remunerações. A
gravidade desta medida só fica clara se se tiver presente que a maioria
dos trabalhadores atingidos por este corte são os trabalhadores mais
qualificados da Administração Pública (médicos,
enfermeiros, professores, técnicos superiores, etc), que muitos deles
já são insuficientes na Administração
Pública (recorde-se a situação a nível de
médicos, em que milhares de portugueses não têm
médico de família) e medidas como esta só poderão
levar ao agravamento da situação actual. Esta é uma forma
de destruição do SNS, e dos serviços públicos, que
Sócrates em palavras diz defender. E esta situação ainda
ganha foros mais graves se se tiver presente outra medida anunciada
também por Sócrates: o congelamento total das entradas na
Administração Pública o que determinará a
rápida degradação dos serviços públicos
prestados à população e o aumento desemprego (a partir de
agora, nenhum jovem conseguirá arranjar emprego na A. Pública).
O FUNDO DE PENSÕES DA PORTUGAL TELECOM ESTÁ SUBFINANCIADO EM 650
MILHÕES , E O GOVERNO PRETENDE INTEGRÁ-LO NA
SEGURANÇA SOCIAL OU NA CGA PODENDO PÔR EM PERIGO A
SUSTENTABILIDADE FINANCEIRA DESTAS
A PT, para distribuir todos anos elevados dividendos aos seus accionistas,
não tem provisionado o Fundo de Pensões dos trabalhadores nas
importâncias necessárias. No fim de 2009, as responsabilidades do
Fundo de Pensões eram superiores a 2.265 milhões
(actualmente já devem rondar os 2.400 milhões ), e o valor
dos activos do Fundo, que servem para pagar as pensões, era apenas de
1617 milhões , ou seja, estavam em falta 648 milhões
. O valor do fundo nem dava para pagar as pensões dos
trabalhadores já reformados, e muito menos para pagar as pensões
correspondentes ao tempo de serviço prestado pelos trabalhadores no
activo.
Mesmo aquele valor do Fundo em 1617 milhões era pouco seguro pois
mais de 40% estava investido em acções, portanto um activo de
elevado risco, e ainda maior numa altura de grande instabilidade nos mercados
financeiros.
Apesar desta situação ser conhecida pela entidade reguladora, que
é o Instituto de Seguros de Portugal, ela nunca fez nada para obrigar a
PT a corrigir rapidamente a situação, o que prova que
também neste sector a entidade reguladora está refém dos
grandes grupos económicos.
E agora aparece o governo de Sócrates com a estranha decisão de
pretender integrar o Fundo de Pensões da PT na Segurança Social
ou na CGA, numa das suas habituais manobras de engenharia financeira para,
assim, reduzir artificialmente a Dívida Pública (recebe agora, e
paga pensões no futuro quando já Sócrates não
estiver no governo, embora não se saiba o certo o que se pagará).
É certamente um bom negócio para a PT que assim se livrará
das pesadas responsabilidades actuais e futuras do seu Fundo de Pensões,
que são muito grandes, transferindo-as para o Estado, ou melhor, para a
Segurança Social ou para a CGA, mas é um negócio que
poderá por em perigo a sustentabilidade financeira da própria
Segurança Social, se for esta a escolhida pelo governo e as reformas de
milhões de trabalhadores portugueses, ou mais impostos para a financiar
a CGA se for esta o instrumento utilizado pelo governo.
É necessário que os trabalhadores e as suas
organizações estejam muito atentos a esta questão, pois a
estabilidade financeira da Segurança Social ou da CGA poderão
estar em perigo, e é uma questão muito importante para todos os
trabalhadores portugueses. A experiência já mostrou
suficientemente aos portugueses que não se pode acreditar neste governo,
que um dia diz uma coisa para pouco depois fazer o contrário, e ele
naturalmente vai dizer que é bom para Segurança
Social e para a CGA. Mas só acredita quem quiser e mesmo assim
não deve esquecer a experiência recente para não poder
dizer mais tarde que foi enganado mais um vez. Uma coisa é certa: quem
esteja familiarizado e conheça quais são os riscos de um fundo de
pensões sabe bem que nunca se sabe ao certo a quantia necessária
para se pagar no futuro as pensões, portanto o risco é grande, e
a PT, como boa gestora defensora dos interesses dos seus accionistas, quer-se
livrar dessa responsabilidade, e o governo de Sócrates parece querer-lhe
fazer o frete. Seria bom não esquecer e reflectir sobre
exemplos passados.
REDUÇÃO DE 3.121 MILHÕES NA DESPESA PÚBLICA
E SUBIDA DE 1.714 MILHÕES DE IMPOSTOS
Para finalizar, quantificaram-se as várias medidas utilizando as
percentagens do PIB constantes do comunicado do Ministério das
Finanças, cujos resultados estão no quadro seguinte.
Quadro 3- Redução da despesa pública e aumento de impostos
segundo o próprio governo - 2011
|
REDUÇÃO DE DESPESAS E RESPECTIVAS RÚBRICAS
|
Em % do PIB
|
Em milhões
|
|
Redução das despesas da Administração
Pública (remunerações, congelamento de carreiras e
admissões, redução de ajudas de custo, HE,etc.)
|
0,6%
|
1.040
|
|
Redução de despesas com prestações sociais
(congelamento de pensões, redução de 20% no RSI,
eliminação do aumento extraordinário e do 1º e o
2º escalões do abono de família)
|
0,6%
|
1.040
|
|
Redução de despesas com o SNS (medicamentos, exames,
análises, etc.)
|
0,3%
|
520
|
|
Redução das transferências do Estado para outros sectores
da Administração Publica (autarquias, ensino, etc..) e para as
empresas públicas
|
0,2%
|
347
|
|
Redução das despesas do PIDDAC (investimento)
|
0,1%
|
173
|
|
SOMA (redução total da despesa pública)
|
1,8%
|
3.121
|
|
AUMENTO DE RECEITAS E RESPECTIVOS IMPOSTOS
|
Em % do PIB
|
Em milhões
|
|
Redução dos benefícios fiscais no IRS (despesas de
saúde, educação, diminuição da
dedução nas pensões o que aumentará o IRS dos
reformados e aposentados )e no IRC
|
0,4%
|
694
|
|
Aumento de 2 p.p.da taxa normal do IVA
|
0,6%
|
1.040
|
|
SOMA (aumento total de impostos)
|
1,0%
|
1.734
|
Fonte: Comunicado do Ministério das Finanças
01/Outubro/2010
[*]
Economista,
edr2@netcabo.pt
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