Criação insuficiente de emprego qualificado gera
desqualificação e desemprego crescente entre os de maior
escolaridade
RESUMO DESTE ESTUDO
Em 09/11/2007 a Comunidade Europeia (CE) divulgou as suas previsões para
Portugal para o ano de 2008. E essas previsões são, todas elas,
diferentes e piores do que as do governo que constam do OE2008. O governo
prevê que, em 2008, o PIB cresça 2,2%, mas a CE prevê
apenas 2%; o governo prevê que o investimento aumente 4% mas a CE apenas
2,8%; o governo prevê que a taxa de inflação em 2008
aumente 2,1% mas a CE prevê uma subida de 2,4%, que é superior ao
aumento das remunerações dos trabalhadores da
Administração Pública; o governo prevê para 2008 uma
taxa de desemprego de 7,6% mas a CE 8%. Portanto, um cenário ainda pior
do que o do governo constante do OE2008. E isto depois de vários anos de
sacrifícios. Este desvio e incompreensão da realidade nacional
por parte do governo verifica-se também em outros campos.
Assim, durante o debate do OE2008 na Assembleia da República, o ministro
do Trabalho afirmou que o emprego qualificado estava a crescer em Portugal
porque o nível de escolaridade da população empregada
estava a aumentar. E quando o confrontamos com dados do INE que mostravam que
isso não se estava a verificar pura e simplesmente recusou esses dados
oficiais.
Entre 2005 e 2007, a população empregada com o ensino
básico ou menos passou de 72,2% para 70,6%, portanto diminuiu em -1,6
pontos percentuais (-65,3 mil), e a população empregada com o
ensino secundário aumentou em 0,8 pontos percentuais pois passou de
14,4% para 15,2% (+42,1 mil) e a com o ensino superior cresceu também
0,8 pontos percentuais ( 45,7 mil).
No entanto, apesar do nível de escolaridade da população
empregada ter aumentado nos dois últimos anos, o número de postos
de trabalhadores relativos a profissões que podemos considerar como de
"qualificação mais elevada" (quadros superiores,
especialistas de profissões intelectuais e cientificas, e
técnicos profissionais de nível intermédio) diminuiu em
115,9 mil. Pelo contrário, durante o mesmo período, o
número de postos de trabalho relativos a profissões que podemos
designar como de "qualificação média" aumentou
em 59,7 mil, e os com "qualificação mais baixa "
cresceram em 72,1 mil. Para além disso, em 2006, o salário
médio do grupo de "qualificação média"
representava 48% do salário médio do grupo de
"qualificação elevada", e o salário médio
do grupo "qualificação mais baixa" representava apenas
40,9% do salário médio do de "qualificação
mais elevada", o que mostra que existe uma grande correlação
positiva entre os grupos de qualificação considerados e
salários médios e graves desigualdades.
A conclusão que se tira dos dados anteriores
destruição de emprego qualificado que é substituído
por emprego menos qualificado e de salários mais baixos é
ainda reforçada pelo facto de serem precisamente as empresas com 49 e
menos trabalhadores que criaram emprego, pois nas empresas com 50 ou mais
trabalhadores verificou-se uma destruição líquida de
emprego que é tanto maior quanto maior é a dimensão da
empresa. Em 2005, nas empresas com 50 e até 249 trabalhadores
verificou-se uma quebra de -0,3% no emprego e, nas empresas com mais de 249
trabalhadores, a redução do emprego atingiu -5,2%. Tendo presente
estes dados oficiais, é mais fácil compreender porque
razão a criação de emprego que se tem verificado em
Portugal é fundamentalmente pouco qualificado pois é feita por
micro e pequenas empresas .
Por outro lado, entre o 2º Trimestre de 2005 e o 2º Trimestre de
2007, o desemprego total aumentou 10,3% mas o desemprego com nível de
escolaridade superior cresceu em 63,3%, ou seja, seis vezes mais. É
evidente por estes números que a economia portuguesa não
está a criar postos de trabalho qualificados suficientes para absorver
os desempregados de escolaridade mais elevada. O mesmo sucede em
relação aos desempregados com o ensino secundário cujo
desemprego cresceu, entre 2005 e 2007, 15,1%, ou seja, 3,6 vezes mais do que o
aumento percentual verificado no desemprego com o "ensino básico ou
menos". Afirmar, como fez o ministro do Trabalho, durante o debate
parlamentar, que escolaridade mais elevada corresponde a emprego mais
qualificado, e que o problema da economia portuguesa é apenas a
insuficiência de trabalhadores mais qualificados entendido como tendo
escolaridade mais elevada, é não compreender como funciona a
economia, em que não se está a verificar actualmente uma
criação elevada de empregos qualificados, o que está a
determinar que muitos trabalhadores com escolaridade e mesmo com
qualificações elevadas sejam obrigados ou a realizar trabalhos
poucos qualificados ou a ficarem no desemprego.
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Durante o debate do OE2008 na Assembleia da República, o ministro do
Trabalho afirmou, repetidamente, que o emprego qualificado estava a crescer em
Portugal porque a escolaridade da população empregada estava a
aumentar. E quando o confrontamos com dados do INE sobre a
repartição da população empregada por
profissões que, embora indicativos, são os únicos dados
oficiais globais que se dispõem sobre esta matéria, que revelam
que se está a registar uma destruição significativa de
empregos qualificados, os quais têm sido substituídos, na sua
maioria, por empregos menos qualificados e de salários mais baixos;
repetindo, quando confrontado com estes dados do INE, o ministro irritou-se e
recusou-se a analisar esses dados.
Por isso, interessa analisar com objectividade esta questão, que vai
contra ideias feitas do governo, fornecendo dados ao leitor para que ele possa
tirar as suas próprias conclusões que certamente serão
completadas pela sua experiência pessoal resultante da
observação da realidade. O quadro seguinte, construído com
dados do INE, permite iniciar essa análise.
A ESCOLARIDADE DA POPULAÇÃO EMPREGADA ESTÁ A AUMENTAR EM
PORTUGAL
Embora lentamente, a escolaridade da população empregada em
Portugal está aumentar. Isso é um facto como mostram os dados do
INE constantes do quadro I.
Entre 2005 e 2007, a população empregada com o ensino
básico ou menos diminuiu em -1,8% (-65,3 mil), representando, no
entanto, no 2º Trimestre de 2007 ainda 70,6% da população
empregada. Durante o mesmo período a população empregada
com o ensino secundário aumentou em 5,7% (+42,1 mil) e com o ensino
superior cresceu em 6,7% (+ 45,7 mil).
Mas uma coisa é o aumento da escolaridade da população
empregada, e outra bem diferente é a ocupação por essa
população com maior escolaridade de empregos qualificados.
A ECONOMIA PORTUGUESA NÃO ESTÁ A CRIAR EMPREGOS QUALIFICADOS
SUFICIENTES
Um aspecto revelado pelos dados por profissões do INE, que se apresentam
seguidamente, é que a economia portuguesa não está a
criar empregos qualificados suficientes, por um lado, para compensar a
totalidade dos empregos qualificados que estão a ser destruídos;
por outra lado, para dar emprego qualificado aos trabalhadores empregados com
maior escolaridade; e, finalmente, para dar emprego aos desempregados com
elevada escolaridade. O quadro seguinte construído com dados constantes
das Estatísticas de Emprego do INE mostra precisamente essa realidade
que o ministro se recusou a admitir.
Apesar do nível de escolaridade dos empregados ter aumentado entre 2005
e 2007, no mesmo período, o número de postos de trabalhadores
relativo a profissões que designamos de "qualificação
mais elevada" (quadros superiores, especialistas de profissões
intelectuais e cientificas, e técnicos profissionais de nível
intermédio) diminuiu em 115,9 mil. Pelo contrário, durante o
mesmo período, o número de postos de trabalho relativo a
profissões que se podem considerar de "qualificação
média" aumentou em 59,7 mil, e os de qualificação
mais baixa " cresceu em 72,1 mil.
Estes dados, apesar de serem indicativos, já mostram o que se
está a verificar neste campo em Portugal, ou seja, a
destruição de emprego qualificado e sua
substituição por emprego menos qualificado. Para além
disso, existe um outro aspecto que reforça o que se acabou de referir.
Como mostram também os dados do quadro, que são os constantes das
Estatísticas de Emprego do INE relativas ao 2º Trimestre de 2007,
em 2006, o salário médio do grupo que designamos de
"qualificação média" representava 48% do
salário médio do grupo de "qualificação
elevada", e o salário médio do grupo
"qualificação mais baixa" representava apenas 40,9% do
salário médio do de "qualificação mais
elevada".
Afirmar como fizeram o Ministro do Trabalho e o seu Secretário de Estado
que o que conta é apenas a escolaridade para obter emprego qualificado e
não a criação de empregos qualificados pela economia,
é ir contra o que se verifica na realidade, pois esta mostra que
poderão existir trabalhadores com escolaridade e
qualificação elevadas mas se a economia não criar empregos
qualificados para poderem ocupar, esses trabalhadores ficarão no
desemprego.
O EMPREGO LÍQUIDO CRIADO EM PORTUGAL DEVE-SE A MICROS E PEQUENAS
EMPRESAS
Outro aspecto que reforça a conclusão anterior é a
variação do emprego por dimensão das empresas. O quadro
seguinte, construído com dados constantes de uma
publicação do INE saída em 2007, mostra o que se tem
verificado neste campo.
Em 2005, e são os últimos dados oficiais disponíveis, as
empresas com 49 ou menos trabalhadores que representavam 99,3% do número
total das empresas, empregavam 66,7%, dos trabalhadores e o seu volume de
negócios representava 47,6% do volume total de negócios de todas
as empresas não financeiras.
Outro aspecto importante que interessa referir é que foram precisamente
as empresas com 49 e menos trabalhadores que criaram emprego, pois nas empresas
com 50 ou mais trabalhadores verificou-se uma destruição liquida
de emprego que é tanto maior quanto maior é a dimensão da
empresa. Nas empresas com 50 e até 249 trabalhadores verificou-se uma
quebra de -0,3% no emprego e, nas empresas com mais de 249 trabalhadores , a
redução de emprego atingiu -5,2%.
Tendo presente estes dados, que são oficiais, é mais fácil
compreender porque razão a criação de emprego que se tem
verificado em Portugal é fundamentalmente pouco qualificado pois
é feito principalmente por micro e pequenas empresas .
O DESEMPREGO DE ESCOLARIDADE ELEVADA DISPAROU DEVIDO À ECONOMIA
PORTUGUESA NÃO ESTAR A CRIAR EMPREGO QUALIFICADO SUFICIENTE
O quadro seguinte, construído com dados das Estatísticas do
Emprego do INE, mostra a variação verificada a nível do
desemprego por níveis de escolaridade entre o 2º Trimestre de 2005
e o 2º Trimestre de 2007.
Entre o 2º Trimestre de 2005 e o 2º Trimestre de 2007, o desemprego
total aumentou 10,3% mas o desemprego com nível de escolaridade superior
cresceu em 63,3%, ou seja, seis vezes mais. É evidente que a economia
portuguesa não está a criar postos de trabalho qualificados
suficientes para absorver os desempregados com o ensino superior. O mesmo
sucede em relação aos desempregados com o ensino
secundário cujo desemprego cresceu, entre 2005 e 2007, 15,1%, ou seja,
3,6 vezes o aumento percentual verificado no desemprego com o "ensino
básico ou menos".
Afirmar como fez o ministro do Trabalho durante o debate parlamentar que
escolaridade mais elevada corresponde a emprego mais qualificado, e que o
problema da economia portuguesa é fundamentalmente a insuficiência
de trabalhadores mais qualificados entendidos apenas como tendo escolaridade
mais elevada, é não compreender como funciona a economia em
Portugal, em que se está a verificar uma criação
insuficiente de empregos qualificados, o que está a determinar que
muitos trabalhadores com escolaridade e mesmo com qualificações
elevadas sejam obrigados ou a realizar trabalhos poucos qualificados ou a
ficarem desempregados.
09/Novembro/2007
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Economista,
edr@mail.telepac.pt
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