Nuvens tempestuosas?
por Zoltan Zigedy
Quando o pânico sobre o destino do programa de "facilidade
quantitativa"
(quantitative easing)
do Federal Reserve atinge proporções
histéricas, anomalias económicas extraordinariamente bizarras
vêm à superfície. Na última semana de Junho, a
notícia de que o crescimento interno do Produto Interno Bruto dos EUA no
primeiro trimestre fora reduzido dramaticamente de 2,4% para 1,8% deparou-se
com um igualmente dramático, mas paradoxal, salto positivo nos mercados
de acções.
Normalmente, uma queda particularmente inesperada na estimativa do PIB
dispararia perdas no mercado de acções a confiança
do investidor seria abalada. Mas verificou-se o oposto.
O que está a acontecer?
Sabichões e investidores saudaram as más notícias porque
esperam que isso venha a manter o compromisso do Federal Reserve com a compra
de US$85 mil milhões por mês de títulos no projecto
alcunhado "facilidade quantitativa". Eles acreditam que o Fed
não ousaria reduzir o programa devido ao fraco desempenho económico.
E reconhecem que sem o pé do Fed a pressionar fortemente o acelerador, a
economia capitalista estagnará ou declinará. O programa do
Federal Reserve é realmente uma máquina para manter viva
(life-support system)
a nossa economia e os apologistas do capitalismo reconhecem que sem ela
estariam em perturbação profunda. Portanto, os investidores
saúdam a queda do crescimento do PIB.
Mesmo Paul Krugman, a voz popular da teoria social-democrata nos EUA, foi
contagiado pelo medo. Num apelo no fim de Junho em
The New York Times
(Et tu, Ben?) ao chefe do Federal Reserve, Ben Bernake, Krugman conclama o Fed
a manter o pé agressivamente sobre o pedal da gasolina.
Apesar de ser um firme advogado de uma opção política
alternativa, com estímulos fiscais (gastos em infraestrutura, obras
públicas, etc), Krugman tapou o seu nariz e incitou à
continuação do programa de estímulo monetário do
Fed de imprimir dinheiro a fim de comprar títulos.
Então por que é que não podemos todos nós
simplesmente concordar em avançar assim e estimular o Federal Reserve a
continuar a imprimir dólares?
Em primeiro lugar, a política promíscua do Fed de
impressão de dólares está a perder seus poderes curativos.
O efeito da compra de dívida do governo notas do Tesouro a
fim de restringir taxas de juro e rendimentos
(yields)
de títulos tem diminuído desde meados de 2012.
Além disso, o remédio do Fed perdeu inteiramente a sua magia em
Maio e Junho deste ano, com a
yield
da nota do Tesouro a 10 anos a subir em dois terços, as taxas de
hipotecas a saltarem cerca de 27% entre Março e o fim de Junho, e o
mercado de títulos dos EUA e europeu (excepto a Alemanha) experimentando
uma venda ao desbarato. Todos estes indicadores demonstram que a facilidade
quantitativa, como política de estímulo, está simplesmente
a perder a sua força.
O Federal Reserve encara a sua injecção mensal de US$85 mil
milhões na economia como uma protecção contra a temida
deflação, uma companhia óbvia à
estagnação ou ao crescimento negativo. Eles observam para ver
quando a inflação transpõe o seu alvo de 2% a fim de dar
uma patada nos travões a fim de evitar uma economia super aquecida.
Mas não há razão para que o Fed se preocupe: a
inflação está bem abaixo do seu alvo, um sinal claro de
que sem estímulo monetário estaríamos num período
deflacionário. As corporações estão a entesourar
cash ao invés de investir: elas estão a manter 5,6% do seu total
de activos em cash, contra uma média de 40 anos de 4,4%. Foi o fraco
investimento nos negócios, em parte, que causou a revisão
baixista de 25% no crescimento do PIB no primeiro trimestre.
A média móvel de três meses do índice de Actividade
Nacional do Federal Reserve de Chicago permaneceu em território
negativo, sublinhando os efeitos decrescentes da facilidade quantitativa.
À parte a sua ineficácia, a facilidade quantitativa coloca
problemas mais graves, mais fundamentais. A promiscuidade monetária do
Fed distorce mercado e mascara processo económicos subjacentes. Uma vez
que a economia capitalista é um organismo enormemente complexo composto
de actores, mercadorias e processos mutuamente interactivos, manipular alguns
dos elementos centrais tais como taxas de juro, oferta de moeda, crescimento da
dívida, etc tem repercussões imprevistas e danosas em outros
sectores da economia. Falham mecanismos e são rompidos
equilíbrios. Uma terapia torna-se um ferimento.
Isto é uma lição que a liderança da
República Popular da China está a aprender a partir da
volatilidade criada pelo seu sector bancário sombra
(shadow banking sector).
Mesmo com maioria de propriedade pública dos maiores bancos, o sector
privado informal distorce o impacto de decisões políticas.
Em termos marxistas, a intervenção maciça do Federal
Reserve em mercados financeiros viola a lei do valor. Ou seja, substitui o
intercâmbio de equivalente-por-equivalente em mercados financeiros com
intercâmbios determinados independentemente de forças de mercado
pelos responsáveis do Fed.
Aqueles intercâmbios devem, em algum ponto, ser reconciliados; mas nesse
meio tempo distorcem relacionamentos de intercâmbio em outros sectores da
economia. Criam uma desconexão entre o sector financeiro e os sinais
enviados à economia produtiva. Distorcem a taxa de lucro no sector
financeiro, canalizam capital para a especulação e criam excesso
de confiança no crédito barato
[NT]
. Não é de admirar que corporações entesourem cash
e procurem retornos mais altos sobre os capitais retidos e o capital facilmente
disponível.
Na realidade, a facilidade quantitativa chama as próprias
condições que levaram ao colapso de 2007-8.
E agora estamos a ver os presságios nos dados económicos.
O exuberante mercado de acções de 2013 está a sofrer uma
retracção e, ainda mais ameaçadoramente, a demonstrar
volatilidade crescente. No ano passado, o pequeno investidor afastou-se do
mercado, um sinal seguro de que um mercado deprimido
(bear market)
estava à vista. Grande parte da volatilidade vem de manipuladores do
mercado a aproveitarem-se de traders amadores. Tal como os jogadores
aventureiros de fim-de-semana em Vegas, eles estão prontos para serem
depenados. Pode-se observar isso acompanhando a compra e venda no fim do dia;
eles não sabe quando entrar ou quando caírem fora.
As exportações dos EUA estão a retroceder
O recorde de lucros pós II Guerra Mundial verificado em 2012 está
ameaçado. De 108 companhias que se previa relatarem lucros no segundo
trimestre de 2013, 87 apresentaram orientação negativa aos seus
accionistas. Lucros em queda, ao contrário das teorias subconsumistas,
são um melhor prognosticador de uma retracção do que a
queda no consumo. O consumo geralmente cai em consequência e como um
ampliador do declínio económico.
Hoje, o consumo nos EUA está na dependência de um
equilíbrio precário. Enquanto as poupanças estão em
declínio, os salários estão em queda livre. No ano
finalizado em Setembro de 2012 verificou-se um declínio salarial de
1,1%. Estimativas para o primeiro trimestre [de 2013] auguram um
declínio chocante. O consumidor está simplesmente a ficar sem
dinheiro, poupanças e crédito disponível.
E os números do desemprego anunciados em Junho mostram realmente um
aumento no
cálculo U6 do desemprego
para 14,3%. Essa taxa inclui aqueles que se retiraram do mercado de trabalho e
aqueles a trabalharem em tempo parcial mas que desejam um trabalho a tempo inteiro.
Um quadro não alvissareiro.
Na maior parte dos países do mundo capitalista, os movimentos
trabalhistas e os partidos política de esquerda ainda têm de
desligar o seu destino daquele do capital monopolista, conduzido pelo lucro, do
sistema governado pelo mercado. Eles são como navios em águas
turbulentas relutantes em levarem suas embarcações e
tripulações para o porto. Eles estão simplesmente a
confiar em que a tempestade se acalme. Não estão preparados nem
para a expectativa de um novo furacão nem para um naufrágio.
Após cinco anos desastrosos, poder-se-ia esperar que líderes de
esquerda e trabalhistas começassem a procurar alternativas para o
capitalismo, um lugar seguro para os seus passageiros
07/Julho/2013
[NT] Ver por exemplo o
comportamento da Apple
: apesar de nadar em US$145 mil mihões acumulados, esta empresa monopolista
decidiu endividar-se no mercado de obrigações dos EUA.
O original encontra-se em
mltoday.com/.... Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|