O capitalismo na sua fase autofágica
O ocidente está reduzido a canibalizar-se
por Paul Craig Roberts
[*]
Eu próprio, Michael Hudson, John Perkins e alguns outros, temos relatado
os múltiplos saqueios de povos pelas instituições
econômicas ocidentais, principalmente os grandes bancos de Nova Iorque
com a ajuda do Fundo Monetário Internacional (FMI).
Os países do terceiro mundo foram e são saqueados ao serem
induzidos em certos planos de desenvolvimento. A governos crédulos e
confiantes é-lhes dito que podem tornar os seus países ricos
contraindo empréstimos externos para implementarem planos de
desenvolvimento que as potências ocidentais apresentam e que teriam em
resultado desse desenvolvimento económico suficientes receitas fiscais
para pagamentos dos empréstimos externos.
Raramente, se alguma vez, isso acontece. O que acontece é que o
país se torna endividado até ao limite, muito para além
dos seus ganhos em moeda estrangeira. Quando o país é incapaz de
satisfazer o serviço de dívida, os credores enviam o FMI ao
governo endividado para dizer que o FMI poderá proteger o rating
financeiro do governo emprestando-lhe dinheiro para pagar aos seus credores
bancários. No entanto, as condições impostas são
que o governo deverá tomar as necessárias medidas de austeridade
a fim de poder pagar ao FMI.
Estas medidas consistem em restringir serviços públicos, o sector
estatal, pensões de reforma e vender recursos nacionais aos
estrangeiros. O dinheiro economizado pela redução de
benefícios sociais e o obtido com a venda de ativos do país aos
estrangeiros serve para pagar ao FMI.
Esta é a maneira pela qual historicamente o Ocidente tem saqueado
países do terceiro mundo. Se o presidente de um país estiver
relutante em entrar em tal negócio, ele simplesmente é subornado,
como governos gregos foram, juntando-se ao saque do país que
pretensamente representaria. Quando este método de saque se esgota, o
Ocidente compra terras agrícolas forçando países do
terceiro mundo a abandonarem uma política de auto-suficiência
alimentar, produzindo uma ou duas culturas para exportação.
Esta política tornou populações do terceiro mundo
dependentes das importações de alimentos do ocidente. Normalmente
as receitas de exportação são captadas por governantes
corruptos ou pelos compradores estrangeiros que pagam preços reduzidos
pelas exportações enquanto os estrangeiros vendem alimentos
demasiado caro. Desta forma, a auto-suficiência é transformada em
endividamento.
Com o terceiro mundo explorado até aos limites possíveis, as
potências ocidentais resolveram saquear os seus próprios
países. A Irlanda tem sido saqueada, o saque da Grécia e de
Portugal é tão severo que forçou um grande número
de mulheres jovens à prostituição. Mas isso não
incomoda a consciência ocidental.
Anteriormente, quando um país soberano se encontrava com endividamento
superior ao que poderia suportar, os credores tinham que anular parte da
dívida até um montante em que o país pudesse suportar. No
século XXI, como relato no meu livro
The Failure of Laissez Faire Capitalism,
esta regra tradicional foi abandonada.
A nova regra é que a população de um país,
até mesmo de países cujos dirigentes de topo aceitaram subornos
para endividar o país a estrangeiros, deve ter as pensões de
reforma, emprego e serviços sociais reduzido. Além disto,
valiosos recursos nacionais como sistemas municipais de água, portos,
lotaria nacional e espaços naturais protegidos, tais como as ilhas
gregas protegidas, vendidas a estrangeiros, que ficam com a liberdade de
aumentar os preços da água, negar ao governo grego as receitas da
lotaria nacional e vender a imobiliárias o patrimônio nacional
protegido da Grécia.
O que aconteceu à Grécia e a Portugal está em curso em
Espanha e Itália. Os povos são impotentes, porque seus governos
não os representam. E não se trata apenas de governantes que
receberam subornos, os membros dos governos possuem a lavagem cerebral de que
os seus países devem pertencer à União Europeia, caso
contrário, serão ultrapassados pela história.
Os povos oprimidos e sofredores sofrem o mesmo tipo de lavagem cerebral. Por
exemplo, na Grécia o governo eleito para evitar o saque da Grécia
estava impotente porque a lavagem cerebral ao povo grego era para que custasse
o que custasse deviam permanecer na UE. A junção de propaganda,
poder financeiro, estupidez e subornos significa que não há
esperança para os povos europeus.
O mesmo é verdade nos Estados Unidos, Canadá, Austrália e
Reino Unido. Nos Estados Unidos dezenas de milhões de cidadãos
dos EUA aceitaram tranquilamente a ausência de qualquer rendimento de
juros sobre suas poupanças durante sete anos. Em vez de levantarem
questões e protestarem, os americanos aceitaram sem pensar a propaganda
de que a sua existência depende do êxito de um punhado de
megabancos artificialmente criados, "grandes demais para falir".
Milhões de americanos estão convencidos de que é melhor
para eles deixar degradar as suas economias do que um banco corrupto falir.
Para manter os povos ocidentais confusos sobre a real ameaça que
enfrentam, é dito às pessoas que há terroristas
atrás de cada árvore, de cada passaporte, ou mesmo sob cada cama,
e que todos serão mortos a menos que o excessivo poder do governo seja
inquestionável. Até agora isso tem funcionado perfeitamente, com
falsas palavras de ordem, reforçando falsos ataques terroristas, que
servem para evitar a tomada de consciência de que isto não passa
de um embuste para acumular todos os rendimentos e riqueza em poucas
mãos.
Não contente com sua supremacia sobre os "povos
democráticos", o um por cento dos mais ricos
avançou com as parcerias Transatlântica (TTIP) e
Transpacífica. Alegadamente, são "acordos de livre
comércio" que beneficiarão a todos. Na verdade, são
negociações cuidadosamente escondidas, secretas, que permitem o
controlo de empresas privadas sobre as leis de governos soberanos.
Por exemplo, veio a público que no âmbito do TTIP o Serviço
Nacional de Saúde no Reino Unido poderia ser regido por tribunais
privados, instituídos no âmbito daquele tratado e, constituindo um
obstáculo para seguros médicos privados, ser processado por danos
a empresas privadas e até mesmo forçado à sua
extinção.
O corrupto governo do Reino Unido sob o vassalo de Washington David Cameron
bloqueou o acesso aos documentos legais que mostram o impacto da parceria
transatlântica no Serviço Nacional de Saúde da
Grã-Bretanha.
www.globalresearch.ca/...
Para qualquer cidadão de um país ocidental, que seja tão
estúpido ou tenha o seu cérebro tão lavado para não
ter percebido isso, a verdadeira intenção da política do
"seu" governo é entregar todos os aspectos das suas vidas ao
apoderamento de interesses privados.
No Reino Unido, o serviço postal foi vendido a um preço
irrealista a interesses privados com ligações políticas.
Nos EUA os republicanos e talvez os democratas, pretendem privatizar o Medicare
e a Previdência Social, assim como privatizaram muitos aspectos das
forças armadas e do sistema prisional. As funções do
Estado tornaram-se alvos para o lucro privado.
Uma das razões para a escalada do custo do orçamento militar dos
EUA é a sua privatização. A privatização do
sistema prisional dos EUA resultou em que grande número de pessoas
inocentes é enviada para a prisão e forçada a trabalhar
para a Apple Computer, para empresas de vestuário que produzem para as
forças armadas e para um grande número de outras empresas
privadas. Os trabalhadores da prisão são pagos tão baixo
quanto 69 centavos por hora, inferior ao salário chinês.
Isto é a América hoje. Policiais corruptos. Promotores de
Justiça corruptos. Juízes corruptos. Mas máximo lucro para
os capitalistas dos EUA a partir de trabalho nas prisões. Os economistas
do livre mercado glorificaram prisões privadas, alegando que seriam mais
eficientes. E na verdade são eficientes em fornecer os lucros do
trabalho escravo para os capitalistas.
Mostramos uma reportagem sobre o primeiro-ministro Cameron negando
informações sobre o efeito da parceria transatlântica TTIP
no Serviço Nacional de Saúde britânico.
www.theguardian.com/...
O jornal britânico
Guardian,
que várias vezes teve de prostituir-se para manter um pouco de
independência, descreve a raiva que sente o povo britânico pelo
sigilo do governo sobre uma questão tão fundamental para o seu
bem-estar. Contudo, continuam a votar em partidos políticos que
têm traído o povo britânico.
Por toda a Europa, governos corruptos controlados por Washington têm
distraído as pessoas sobre a forma como são vendidos pelos
"seus" governos, concentrando a sua atenção nos
imigrantes, cuja presença decorre de governos europeus representarem os
interesses de Washington e não os interesses de seus próprios
povos.
Algo terrível aconteceu à inteligência e a
consciência dos povos ocidentais, que parecem já não ser
capazes de compreender as maquinações dos "seus"
governos.
Governo responsável nos países ocidentais é
história. Apenas fracasso e o colapso aguarda a
civilização ocidental.
[*]
Foi secretário de Estado Adjunto do Tesouro para
a política económica e editor associado do
Wall Street Journal.
Colunista na
Business Week,
Scripps Howard News Service e Creators Syndicate. Tem tido muitas
intervenções em universidades. Os seus textos na internet
são seguidos no mundo inteiro. Os livros mais recentes de Paul Craig
Roberts são
The Failure of Laissez Faire Capitalism and Economic Dissolution of the West
,
How America Was Lost
e
The Neoconservative Threat to World Order
.
O original encontra-se em
www.paulcraigroberts.org/
. Tradução de DVC.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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