O colapso capitalista
Trabalhadores e oprimidos pagam milhares de milhões para salvar a Wall Street
Com o salvamento governamental de US$85 mil milhões da AIG, a gigante
dos seguros, a Reserva Federal e o Departamento do Tesouro fizeram outra
tentativa desesperada para sustentar uma estrutura financeira global em
processo de colapso.
Esta última tentativa de resgatar uma enorme firma financeira vem a
seguir ao salvamento de US$200 mil milhões dos dois maiores bancos
hipotecários do mundo, a Fannie Mae e o Freddie Mac, há apenas 10
dias.
Acordos secretos enviam a conta para os trabalhadores
O presidente do Federal Reserve Bank of New York, Timothy Geithner e o
secretário do Tesouro Henry Paulson têm estado assoberbados em
reuniões ininterruptas, carpinteirando acordos. Isto tem sido efectuado
em segredo, por trás das costas dos trabalhadores e das camadas
médias, as quais será remetida a conta. Eles têm estado a
desenvolver estes acordos com os mesmos tubarões dos empréstimos
da alta finança cujas orgias de especulação, jogo e fraude
na busca do lucro levaram à crise.
A farra especulativa da Wall Street levou a uma crise mundial realmente
formidável.
Ao longo dos últimos três dias, a AIG, a maior companhia
seguradora do mundo com UM MILHÃO DE MILHÕES de dólares em
activos, esteve a poucos horas da bancarrota.
A Lehman Brothers, um prestigiado banco de investimento com 158 anos de idade,
com US$639 mil milhões em activos e US$613 mil milhões em
dívidas, caiu na maior bancarrota da história dos Estados Unidos.
A Merrill Lynch, outro pilar dos bancos de investimento com mais UM
MILHÃO DE MILHÕES de dólares em activos, conseguiu evitar
a bancarrota só depois de ser engolida pelo Bank of America.
O Washington Mutual, a maior caixa económica dos EUA, teve a
classificação dos seus títulos reduzida a lixo e
está encostada às cordas.
Quando a crise da bancarrota estava em desenvolvimento, na quinta-feira 11 de
Setembro, Paulson disse aos banqueiros que o governo estava a acabar de
intervir e que eles teriam de resolver o problema entre si próprios.
Isso foi na semana passada. Agora o governo dos EUA providenciou mais US$85
mil milhões para salvamento dos bancos. É um sinal de crise e de
fraqueza.
Se bem que o salvamento da Fannie Mae e do Freddie Mac tivessem dado
alívio aos possuidores de milhões de milhões de
dólares de dívidas que possuíam junto aos dois bancos
hipotecários, isto também colocou uma enorme tensão sobre
o sistema financeiro e foi mais um sinal de fraqueza e fragiliza profunda.
Novos salvamentos foram excluídos, disse o governo. Este limite foi
como traçar uma linha na areia.
Mas as declarações de Paulson e Geithner não tiveram
impacto sobre os banqueiros. Eles buscavam os seus próprios interesse
imediatos e jogaram à defesa frente ao seu próprio governo. No
fim, se bem que Washington deixasse a Lehman Brothers fracassar, a AIG era uma
outra história. O Federal Reserve Board e o Tesouro fizeram uma meia
volta humilhante e intervieram no último minuto, "temendo uma crise
financeira à escala mundial". (
New York Times,
Sept. 17)
O salvamento da AIG pelo Fed é instrutivo quanto à profundidade
da crise. A AIG nem sequer é um banco. Ela não é
regulamentada pelo governo federal. O Fed teve de utilizar poderes de
emergência para intervir, os quais são considerados
necessários não só porque a AIG emite apólices de
seguros para milhões de indivíduos e empresas comerciais como
também porque ela segurou mais de US$400 mil milhões em
títulos apoiados por hipotecas e outros investimentos de risco de
jogadores e especuladores por todo o globo.
A AIG tomou dinheiro emprestado de muitos dos grandes bancos e jogou seus
activos a fim de fazer maiores lucros. Quando as hipotecas começavam a
cair e os possuidores dos títulos apoiados por hipotecas
começavam a pedir seus pagamentos dos seguros, a posição
financeira da AIG estava a deteriorar-se numa base diárias e até
horária.
A imprudência financeira do sistema pode ser medida pelo facto de uma
companhia de seguros, que é suposta ser regulamentada a fim de se manter
conservadora, precisamente porque é a guardiã de fundos que devem
estar disponíveis para cumprir as necessidades de emergência dos
segurados, fosse livre para participar no casino global.
A AIG opera em mais de 100 países, tem 116 mil empregados 62 mil
na Ásia e tem instalações bancárias privadas
para gente rica. Ela faz corretagem de negócios em
acções, administra fundos mútuos, possui 900 aviões
no seu negócio de leasing e em geral alavancou seu negócio de
seguros numa operação especulativa globalizada.
Crise dos trabalhadores e oprimidos é ignorada
A crise dos banqueiros produziu manchetes sensacionais, com relatos hora a hora
da agonia de um punhado de milionários e bilionários na Wall
Street. Mas os media capitalistas deixaram de lado o drama real da massa de
arrestos e despedimentos que afectam as vidas de milhões de
trabalhadores.
Centenas de milhares de milhões de dólares foram repartidos entre
banqueiros que caíram numa crise em grande parte devido a
empréstimos hipotecários predatórios e à revenda
daquelas hipotecas no mercado capitalista global. Nenhum alívio
está previsto para as vítimas da indústria
hipotecária da banca.
Foi dada pouca atenção à notícia de que em Agosto
houve 303.879 pedidos de arrestos um aumento de 12 por cento em
relação ao mês anterior e um acréscimo de 27 por
cento em relação ao ano passado. Uma em cada 416 famílias
nos EUA recebeu um aviso de arresto no mês de Agosto. Só na
Califórnia houve 101.714, mais de 40 por cento em relação
ao mês anterior e 75 por cento mais do que um ano atrás.
Enquanto derrama lágrimas sobre as agruras dos banqueiros, a imprensa
capitalista não apresenta manchetes acerca de um estudo recente
intitulado "Estado do sonho: arrestado"
("State of the Dream: Foreclosed"),
o qual mostrava que a crise dos arrestos resultara na maior
destruição de riqueza pessoal na história das comunidades
afro-americanas e latinas.
Segundo o estudo, mutuários afro-americanos perderam entre US$71 e US$92
mil milhões devido aos empréstimos contraídos ao longo
dos últimos oito anos. O número para a população
latina, o qual é ainda mais elevado do que para a
população afro-americana, mostra perdas dentre os US$75 e os
US$98 mil milhões.
Juntamente com a crise financeira está a crise crescente da economia
capitalista geral, pois a super-produção resulta em subida do
desemprego. Mais de 84 mil trabalhadores perderam o emprego em Agosto,
elevando o total anual a mais de 605 mil. Mais de dois milhões de
pessoas foram acrescentadas ao desemprego nos últimos 12 meses, elevando
o total oficial a 9,4 milhões. O desemprego a longo prazo também
está a aumentar.
O desemprego dos trabalhadores negros atingiu 10,6 por cento, devido
principalmente a perdas de emprego entre mulheres negras. O desemprego entre
mães solteiras e juventude também está a crescer. E estes
números governamentais não incluem milhões de
trabalhadores desencorajados que desistiram de procurar emprego.
Em meio à crise do crédito, foi anunciado que a
produção industrial a base do emprego e do rendimento
em Agosto caiu no máximo de três anos. Houve uma
diminuição de 1,1 por cento na produção das
fábricas, minas e serviços públicos. A
produção automóvel caiu 12 por cento, a maior queda numa
década.
Uma coisa está clara com a presente crise: Nem a classe capitalista ,
que possui toda a riqueza produtiva, nem o governo capitalista, que
supervisiona o sistema, tem o controle da situação
económica ou financeira.
Cada medida que eles tomam para deter a crise do crédito é
seguida por outra erupção de pânico. Cada vez que o
mercado de acções sobe, ele rapidamente perde todos os seus
ganhos e ainda mais. E por muito que os sábios declarem não
haver recessão, o crescimento firme do desemprego e o declínio da
produção continua, sem consideração por quaisquer
dos chamados "estímulos económicos".
Mudança na psicologia da classe dominante
A intervenção do governo capitalista na crise bancária
provocou uma mudança súbita na psicologia da classe dominante
pois esta observa o seu sistema a girar descontroladamente. Depois de o
sistema capitalista ter ultrapassado a crise da década de 1930, os
patrões nos EUA começaram a esquecer-se das razões porque
o presidente Roosevelt havia tomado medidas sem precedentes para resgatar a
economia. Eles começaram a desdenhar qualquer intervenção
do governo nos seus assuntos.
Naturalmente, eles sempre estiveram prontos para receber esmolas sob muitas
formas subsídios, gastos militares, legislação
especial, isenções fiscais, etc. Mas sentiam-se os altos e
poderosos dominadores corporativos do mundo.
Intervenção do governo, dizem eles, era para a Europa e
social-democratas. As classes dominantes europeias haviam sido sacudidas pelos
trabalhadores e pela luta de classe, pela divisão e pela guerra. Porque
os dominadores europeus eram fracos e precisavam ser apoiados pelos governos
capitalistas, tinham de submeter-se ao monitoramento estatal dos seus assuntos.
Tal caminho, entretanto, era fortemente rejeitada pela Wall Street e os
gigantes da indústria.
Esta crise de agora é uma enorme degradação para o capital
financeiro estado-unidense, o qual costumava dar lições a outros
governos capitalista sobre os males da intervenção governamental.
Subitamente, contudo, os banqueiros e os patrões estão todos
unidos, desde a extrema direita até os moderados e os liberais, no
aplauso ao Tesouro e ao Federal Reserve Board pela sua "oportuna"
intervenção. Eles estão a submeter-se, em meio a
resmungos mas com clareza, à supervisão e monitoramento do
governo a fim de salvar o seu sistema do colapso.
Com esta crise, a estrutura do capitalismo estado-unidense está a entrar
numa nova etapa. O governo capitalista começou, numa base gradual a
princípio mas talvez mais sistematicamente no futuro, a absorver os
passivos e as dívidas podres dos jogadores e da oligarquia da
especulação financeira. Isto pode apenas aprofundar a crise a
longo prazo, tornando-a mais profunda no organismo do capitalismo dos EUA.
Isto determina que haja não só repercussões
económicas como também políticas por todo o mundo quando
imperialistas rivais virem a vulnerabilidade dos dominadores nos EUA. Isto
determina o enfraquecimento do imperialismo estado-unidense e ao mesmo tempo
torna-o mais perigoso quando ele procura sair da sua crise.
Não é casual que o
Wall Street Journal
de 16 de Setembro, em meio a um relato em profundidade da crise financeira,
publicou um artigo intitulado "Manter a sua pólvora seca:
conscrição militar continua, por precaução".
O jornal não fala necessariamente por toda a classe dominante, nem pelo
Pentágono por enquanto. Mas o reflexo que emerge em meio à crise
de algumas secções da classe dominante é que se
começa a pensar num impulso guerreiro como solução.
Com a "Nova ordem mundial" a alimentar o conflito com a Rússia
na Geórgia, a invasão do Paquistão e a escalada da guerra
contra o Afeganistão, a possibilidade de uma nova aventura nunca deveria
ser excluída.
A contradição básica do capitalismo
Os democratas querem lançar culpas sobre Bush e pedem por mais
regulamentação. Naturalmente os financeiros pediram ao governo
para eliminar a maior parte das regulamentações, as quais datavam
da Depressão, que estabeleciam restrições às suas
operações de jogo. Esta desregulamentação
começou com a administração Reagan e atingiu um ponto alto
na administração Clinton. Por instigação do
Citicorp e de Robert Rubin, que deixou o Goldman Sachs para se tornar
secretário do Tesouro, o Glass-Steagall Act foi revogado em 1998, sob o
patrocínio do actual conselheiro económico de McCain, Phil Gramm.
A lei proíbe aos bancos comerciais que se envolvam na banca de
investimentos, subscrevam acções e operações em
bolsa de valores, subscrições e outras actividades que facilitam
a hiper-especulação generalizada do tipo que antecedeu a
Depressão.
E naturalmente a administração Bush minou todas as tentativas de
inibir a concessão de empréstimos hipotecários
predatórios e deu liberdade de acção total a toda
espécie de especulação não regulamentada de
milhões de milhões de dólares de jogo especulativo, a qual
aumentou o risco geral no sistema financeiro global. Mas, apesar da demagogia
do Partido Democrata, a administração Bush não é a
causa da crise.
A intervenção do governo, a regulamentação mais
forte dos monopólios e as práticas mais "prudentes"
não podem ultrapassar a contradição fundamental do
capitalismo: a propriedade privada dos meios de produção
sociais, globalizados.
É uma contradição irreconciliável que uma
minúscula minoria controle a produção da riqueza do mundo
para seu próprio proveito. É uma contradição
irreconciliável que este aparelho global pare de funcionar quando
há uma crise de lucratividade para os patrões. E tais crises
ocorrem sempre, mais cedo ou mais tarde, devido à anarquia da
produção capitalista.
Nenhum capitalista sabe onde aquilo que é produzido poderá ser
vendido. Mas na corrida por "fatia de mercado" para o lucro
máximo, cada agrupamento capitalista é obrigado a expandir a
produção.
Em simultâneo, as leis do capitalismo obrigam cada capitalista a reduzir
os salários dos trabalhadores tanto quanto possível. Nas
últimas três décadas, a classe capitalista criou um sistema
de baixos salários que contrapõe trabalhadores uns contra outras
numa base global. Isto apenas agrava e acelera a contradição do
sistema do lucro.
Sob o capitalismo a produção é anárquica e
finalmente expande-se a um ponto em que os trabalhadores não podem
comprar o que foi produzido a um preço que dê lucro aos
patrões. Esta anarquia da produção está a ser
reflectida na anarquia do sistema financeira na crise actual.
Na crise actual, multi-milionários no topo da sociedade capitalista pode
estar a perder parte da sua riqueza, a qual realmente existia apenas no papel,
mas eles mantêm suas mansões, serviçais, limousines e Lear
jets. São os trabalhadores que estão a suportar a crise
económica.
A única saída é o caminho da resistência como
o movimento para travar arrestos, o qual está a ganhar força por
todo o país.
17/Setembro/2008
Articles copyright 1995-2008 Workers World. Verbatim copying and distribution
of this entire article is permitted in any medium without royalty provided this
notice is preserved.
O original encontra-se em
http://www.workers.org/2008/us/capitalist_meltdown_0925/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|