Razões para desconfiar desta "aristocracia"
por Daniel Vanhove
Os dias, as semanas, os meses, os anos passam e assemelham-se...
Poderíamos mesmo acrescentar, séculos passam e também
são semelhantes... São sempre os mesmos que ganham e os mesmos
que perdem... De um lado os que dominam, do outro os dominados. A
história parece imutável, a este nível.
Hoje em dia a principal diferença reside na informação. Em
tempos, era difícil de aceder, agora é superabundante ao ponto de
muitos se perderem e acabarem por tudo misturar... o que nos permite (quase)
dizer que estes não estão melhor informados que antes. A
quantidade aí está, sem dúvida, mas com uma perda de
qualidade óbvia... Como qualquer outro produto, neste mundo
"mercantilizado" ao exagero, a informação tornou-se
objeto de consumo...
Há poucos dias, a sra. Lagarde, diretora executiva do FMI, a
funcionária internacional mais bem paga do mundo, com um salário
de cerca de 500 mil dólares por ano (ou seja, quase 32 mil
euros/mês) do qual não paga impostos (!) em conformidade com as
artigos 34º e 38º da Convenção de Viena de 1961 sobre
relações diplomáticas, esteve em Bruxelas no quadro das
Grandes Conferências Católicas.
Além de questões que se podem colocar sobre a presença da
diretora do FMI em tais conferências, o mais incrível reside sem
dúvida no conteúdo do discurso feito pela sra. Lagarde. Sem
pestanejar, ela asseverou que "todos ganharão com uma
redução das desigualdades excessivas". O público na
conferência "católica" ouviu estas máximas
"piedosamente" sem que alguém tenha tentado infligir a esta
senhora o único tratamento que ela merece, ou seja, lançando-lhe
um pastelão
!
Perguntamo-nos se estamos a sonhar (ou antes num pesadelo) ao ouvi tais
declarações. E como não reagir!? Que ela comece, portanto,
por rever o seu salário e os da sua comitiva...
A sra. Lagarde enumerou uma quantidade de boas intenções,
sugerindo ainda que: "Nossos estudos mostram que, contrariamente às
ideias vulgarizadas, os benefícios de um aumento do rendimento,
vêm dos de baixo e não dos do topo". Não sabemos em
quem ela pensava nestas "ideias vulgarizadas"'... Quanto a
nós, do povo, nós o sabemos há muito e não
tínhamos necessidade que a diretora do FMI viesse com esta tirada. Teria
a sra. Lagarde encontrado a direção certa para cortar no bom
sentido? Mas, sinceramente, haverá um cargo no mundo que mereça
aquele pagamento, para não mencionar todas as vantagens que o
acompanham? A resposta deve ser clara: nenhum! (ver
www.lalibre.be/....)
O mais interessante da história é ver com que tenacidade, com que
ressentimento a mesma diretora, tão bem intencionada quando se trata de
dar lições de moral num ambiente "católico",
procede de comum acordo com as altas instâncias internacionais
(UE-BCE-FMI, a chamada "Troika") que puseram a Grécia de
joelhos. Viver com 32 mil euros/mês sem pagar impostos e reivindicar para
a Grécia esforços suplementares para os desempregados e
aposentados, que tentam sobreviver com uns 500 por mês é
uma vergonha e uma impostura que mereceria ser de imediato destituída do
cargo e entregar 95% do que tem recebido à custa dos mais pobres que
veem tais números e ficam simplesmente paralisados na sua
dramática situação, não sabendo muitos deles como
terminar o mês. Para memória, lembremos que a taxa de
suicídio aumentou de maneira endémica na Grécia
após as medidas de austeridade, defendidas pelas pessoas atacadas de
autismo que nos governam.
E toda esta gente que gira entre cimeiras e reuniões especiais para ver
como esgotam ainda mais os que já não tem quase nada, esses
indivíduos arrogantes que se espanejam atrás dos seus mandatos
imerecidos, esta aristocracia de nutridos que abomina cada vez mais os povos
não deve surpreender-se de ver a Europa transformar-se na cor castanha
de que eles afirmam não entender as razões e fazer todo o
possível para a combater. Eles são os primeiros
responsáveis e com eles a comunicação social que controlam
e manipulam. Raramente, sem dúvida, o mundo tem enfrentado tanta
exibição de cinismo.
Alguns podem repetir que o grande problema da Europa é
imigração. Realmente é a árvore que esconde a
floresta. O grande problema da Europa (e da globalização em
geral) é precisamente estas desigualdades que se tornaram
intoleráveis entre os cada vez mais ricos e os cada vez mais pobres.
Imigração maciça é uma das resultantes. Entre os
patrões de grandes empresas que se concedem salários de uma
indecência sem nome estes funcionários com salários
excessivos, nunca responsáveis pelos seus vários erros, no
entanto múltiplos, mas com a renovação dos seus mandatos
assegurada neste jogo de dar e receber entre amigalhaços. Isto, enquanto
os pensionistas, os desempregados, os jovens, os trabalhadores, cujas
condições são precarizadas ao longo dos anos, a
contradição é hoje enorme. Chegará o dia onde a
revolta popular virá surpreende-los sob as suas janelas e eles sem
dúvida vão se espantar, vivendo na sua bolha acética e
sombria, feita de diretivas e decretos que não são do interesse
do cidadão...
Atualmente, joga-se o destino da Grécia, os outros povos de
países europeus vizinhos olham e compreendem pouco a pouco como esta
aristocracia organiza-se para despedaçar um país e enriquecer
à sua custa. Porque é a Europa e seus banqueiros que enriquecem
sobre as costas da população, fornecendo empréstimos a
juros que noutras circunstâncias seriam qualificados de
usurários...e vem dizer-nos em seguida, para "reduzir as
desigualdades excessivas"...
Que impostura a destes funcionários! Que parasitas! Isto verifica-se
quase todos os dias. Não se estava a ver este jogo de víboras
aquando da nomeação de J.-C. Junckers a seguir ao Sr. Barroso
à frente da Comissão? Belo exemplo para os povos, com efeito
nomear para a chefia da Comissão um dos feitores do paraíso
fiscal chamado Luxemburgo! E pensam que a população não
tem memória e não se lembra? Tomam-nos portanto além do
mais por imbecís... Não satisfeitos em ter renunciado há
muito a qualquer probidade, de não terem a mínima integridade
pessoal, de estarem muitos deles metidos em sombrias tramoias e
múltiplas fraudes, arrastam-se na baixeza para obter mais um lugar onde
poderão ainda por mais alguns anos encher os bolsos... Eis a ideia que
fazem das populações que pretendem gerir.
Em 27 de junho, em Montpellier, numa sessão dedicada ao partido Syriza,
um responsável local explicou-nos que o que tinha permitido o sucesso
deste partido "de esquerda", tinha sido o Pasok (partido
social-democrata grego que faz parte do partido dos socialistas europeus e da
Internacional Socialista pois claro!) já não ser
qualificado nem designado há longo tempo pelos Gregos como um partido
"da esquerda". Enquanto noutros países europeus, os partidos
socialistas que levam a cabo em concertação uma política
neoliberal idêntica à da direita, são considerados como
sendo de "esquerda", a confusão reina no seio da
população. Para meditar...
[...]
P.S.: Mme. Lagarde, acaba de anunciar que se solicitado pelas instâncias,
se sente pronta para "servir" num novo mandato à frente do
FMI, "esta bela casa", acrescentou... Assim se vê a hipocrisia
e a duplicidade no trabalho quando estes responsáveis confundem
"servir" e 'servir-se"...
O original encontra-se em
www.legrandsoir.info/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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