Fase IV da crise sistémica:
Começa a sequência da insolvência global
Em 2007, o LEAP/E2020 anunciara que os bancos americanos e o consumidor
americano estavam ambos insolventes. Há mais de um ano, a nossa
equipe estimara em US$10 milhões de milhões (10
12
) o montante de "activos fantasmas" que ia desaparecer devido
à crise. Estes dois anúncios estavam em completa
oposição às análises que dominavam então; a
sequência dos acontecimentos mostrou no entanto que eram perfeitamente
justificadas. Em função da mesma lógica de
antecipação, o LEAP/E2020 estima hoje que o mundo entrou numa
nova sequência da fase IV da crise sistémica mundial (a fase dita
de "decantação"), ou seja, a sequência da
insolvência
global.
As graves consequências desta insolvência global são
antecipadas neste GEAB Nº 31. Este comunicado, com base no mesmo,
apresenta um extracto que permite verificar o que está em causa nesta
nova sequência da crise. Neste contexto, o GEAB Nº 31 apresenta os
29 "altos e baixos" do ano 2009 segundo a equipe do LEAP/E2020:
quinze tendências em alta e catorze em baixa que constituem ferramentas
de ajuda à análise e decisão para aqueles a quem o ano a
decorrer inquieta ou intriga.
Ao contrário do que os dirigentes mundiais, à imagem dos seus
banqueiros centrais, parecem pensar, o problema de liquidez, que eles tentam
resolver por baixas históricas das taxas de juros e uma
criação monetária ilimitada, não é uma causa
mas uma consequência da crise actual. É sim um problema de
solvência que cria os "buracos negros" nos quais desaparecem as
liquidezes, quer se chamem balanços dos bancos
[1]
, endividamentos das
famílias
[2]
, falências de empresas ou défices
públicos. Com uma estimativa conservadora dos "activos
fantasmas" mundiais elevada doravante a mais de US$30 milhões de
milhões
[3]
, a nossa equipe considera que doravante o mundo enfrenta uma
insolvência generalizada que evidentemente atinge em primeiro lugar os
países e as organizações (públicas ou privadas)
super-endividadas e/ou muito dependentes dos serviços financeiros.
Como distinguir uma crise de solvência de uma crise de liquidez
Esta distinção entre crise de liquidez e crise de solvência
pode parecer muito técnicas e no fim pouco determinante para a
evolução da crise em curso. Contudo, ela nada tem de querela
académica uma vez que, conforme o caso, a acção actual dos
governos e dos bancos centrais será útil ou pelo contrário
totalmente inútil, até mesmo perigosa.
Um exemplo simples permite captar bem o que está em jogo. Se tiver um
problema transitório de tesouraria e o seu banco ou a sua família
aceitar emprestar-lhe os fundos necessários a fim de atravessar este
período difícil, este esforço é benéfico
para toda a gente. Com efeito, o senhor continua a actividade em curso, pode
pagar os seus empregados ou a si mesmo, o seu banco ou a sua família
é reembolsado (com um juro sem dúvida no que se refere ao banco)
e a economia em geral foi beneficiada com uma contribuição
positiva. Em contrapartida, se o seu problema não for de tesouraria mas
sim devido ao facto de que a sua actividade não é rentável
e não pode vir a ser nas condições económicas do
momento, então o esforço do vosso banco ou da vossa
família torna-se tanto mais perigoso para toda a gente envolvida. Com
efeito, segundo toda a probabilidade, o seu primeiro pedido de fundos
será seguido por outros sempre recheados com promessas (honestas,
suponhamos) de que o mau passo logo estará terminado. O seu banco ou a
sua família serão tanto mais incitados a continuar a
ajudá-lo porque arriscam-se a perder o que já lhe emprestaram no
caso de cessar a sua actividade. Mas se a situação continuar a
piorar, o que será o caso se for realmente um problema de rentabilidade,
então chega um momento em que são atingidos certos limites: por
um lado, o seu banco vai decidir que tem mais a perder em continuar a
sustentá-lo do que em deixá-lo cair; e por outro lado a sua
família simplesmente não tem mais dinheiro disponível,
pois o senhor sugou-lhe toda a sua poupança. Fica evidente para toda a
gente que não só o senhor está falido e insolvente
como também que provavelmente arrastou a sua família para a mesma
situação ou enfraqueceu o seu banco
[4]
. O senhor desferiu assim um golpe terrível à economia em torno
de si, inclusive a dos seus
próximos
[5]
. É importante sublinhar que tudo isso pode lhe
acontecer com toda a boa fé quando uma mudança brutal do ambiente
económico perturbar as condições de rentabilidade da sua
actividade sem que o senhor tenha tomado consciencia da amplitude das
consequências na sua actividade.
Segundo o LEAP/E2020, este exemplo simples ilustra perfeitamente a
situação prevalecente neste princípio do ano 2009 para o
conjunto do sistema financeiro mundial, uma parte importante da economia do
planeta e todos os actores económicos (Estados inclusive) que
fundamentaram o seu crescimento destes últimos anos sobre o
endividamento. A crise traduziu e ampliou um problema de solvência
global.
O mundo está em vias de tomar consciência de que é muito
mais pobre do que a última década o havia feito acreditar. Em
2009 é o ano que vai obrigar todos os actores económicos a tentar
avaliar concretamente o estado da sua solvência, sabendo que numerosos
activos ainda continuam a perder valor. A dificuldade é que um
número crescente de operadores já não tem confiança
nos indicadores e instrumentos de medida tradicionais. As agências de
classificação perderam toda credibilidade. O dólar dos
EUA não é senão uma ficção de unidade de
medida
monetária mundial de que numerosos Estados tentam livrar-se o mais
rapidamente possível
[6]
. Portanto toda a esfera financeira é,
com boa razão, suspeita de não ser senão um imenso buraco
negro. Para as empresas, já ninguém sabe se os pedidos de
encomenda são fiáveis
[7]
uma vez que, na generalidade dos sectores, os clientes anulam
maciçamente as encomendas
[8]
ou não compram mais, mesmo quando os preços são
rebaixados,
como se confirma pela forte baixa das vendas a retalho destas últimas
semanas
[9]
. E para os Estados (e outras colectividades públicas),
doravante é o afundamento das receitas fiscais que faz temer um disparar
dos défices que pode também implicar falências.
Além disso, desde os milionários russos
[10]
até as petromonarquias
do Golfo passando pelo Eldorado comercial chinês
[11]
, todas as "galinhas dos ovos de ouro" das empresas e dos
estabelecimentos do
planeta (e nomeadamente europeus, japoneses e norte-americanos
[12]
) agora mostram-se insolventes ou simplesmente solventes. A
questão da solvência do Estado federal e dos estados
americanos
[13]
(tal como a da Rússia ou do Reino Unido) já
começa igualmente a ser colocada nos grandes media internacionais; assim
como certamente a dos grandes fundos de pensão por
capitalização, grandes actores da economia globalizada destes
últimos vinte anos.
Para o LEAP/E2020, a tendência é clara: a sequência que
começa neste princípio do ano de 2009 é realmente a da
insolvência global.
15/Janeiro/2009
Notas
(1) Eis uma lista muito útil dos bancos americanos prestes a falirem,
apresentada no sítio
LewRockwell.com
e elaborada a partir do Texas Ratio, que permite medir a sua
exposição ao risco.
(2) Este mapa dinâmico dos cartões de crédito e dos
empréstimos imobiliários não pagos nos Estados Unidos
(2º trimestre de 2008), realizado pelo Federal Reserve de Nova York,
permite julgar a extensão da crise que afectam os rendimentos das
famílias e o seu nível de endividamento. Fonte:
NewYorkFed
, 12/2008
(3) A evolução dos valores bursáteis mundiais é um
bom indicador deste desaparecimento dos "activos fantasmas", mesmo
que seja preciso acrescentar todas as perdas de valor imobiliário e em
outras espécies de activos à estimativa, assim como deveriam ser
deduzidos pequenos aumentos (varridos pela actual tormenta mas a serem
restaurados uma vez ultrapassada a crise).
(4) Não falamos aqui sequer dos empregados, fornecedores, clientes, ...
(5) E, uma tal situação, repetida à escala de todo um
país, conduz a um caos social. O próprio exército
americano certamente considera que a instabilidade social criada pela crise
possa levar a uma intervenção militar. Fonte:
ElPasoTimes
, 29/12/2008
(6) A este respeito, o LEAP/E2020 emite uma recomendação
destinada às instituições financeiras internacionais e
sobretudo aos seus responsáveis dos serviços estatísticos:
é urgente estabelecer um contabilidade internacional alternativa,
fundamentada num cabaz de divisas (por exemplo: 25% USD, 25% Euro, 25% Yen e
25% Yuan até que os dirigentes políticos decidam um cabaz global)
pois a cessação de pagamentos dos Estados Unidos [da sua
dívida] e a ruptura do sistema monetário mundial que
antecipámos no Verão de 2009 vai imediatamente provocar uma
catástrofe em matéria de contabilização dos valores
e dos fluxos financeiros mundiais. Portanto é urgente, mesmo que isto
resulte de discussões oficiosas e de contabilidade "no negro",
duplicar as estatísticas actuais feitas essencialmente em dólares
dos EUA por uma versão de "salvaguarda" efectuada num cabaz de
divisas. Isto permitirá assegurar uma continuidade das
estatísticas quando chegar o tempo de uma reconstrução do
sistema monetário mundial.
(7) Uma série de artigos da revista
Spiegel
(18/12/2008), intitulada "A calma antes da recessão mundial",
ilustra muito bem a crise vista da Alemanha. E a queda generalizada do
transporte de mercadorias na zona Euro ilustra bem este facto. Fonte:
Libération
, 12/01/2009
(8) Um dos indicadores avançados da economia mundial é
inegavelmente o mercado de máquinas-ferramenta, pois são elas que
servem para produzir os objectos manufacturados. As encomendas de
máquinas-ferramenta permitem antecipar com um avanço de 6 meses a
um ano o estado da indústria manufactureira mundial. Os dois grandes
fabricantes e exportadores mundiais de máquinas-ferramentas sendo a
Alemanha e o Japão, a evolução da sua
produção e exportação neste sector é
portanto um índice fiável do futuro da indústria
manufactureira mundial. No caso, este verifica-se muito sombrio para 2009 uma
vez que, tal como a Alemanha, em Novembro de 2008 o Japão registou uma
queda vertiginosa de 16,2% das suas encomendas em relação a
Outubro de 2008, ou seja, a pior baixa desde 1987 quando estas
estatísticas principiaram a estar disponíveis. Fonte:
MarketWatch
}, 15/01/2009
(9) Nos Estados Unidos, em 2009 há o risco de que 25% dos
estabelecimentos comerciais a retalho fechem as suas portas. Fonte:
ClusterStockAlleyInsider
, 27/12/2008
(10) Os "milionários russos" estão reduzidos a implorar
a esmola do Kremlin, o qual também vê as suas reservas financeiras
fundirem-se a olhos vistos. Fonte:
Spiegel
, 08/01/2009
(11) Um "El Dorado chinês" que em 2009 está em vias de
se transformar em atoleiro socioeconómico. Fonte:
Janelanaweb
, 25/12/2008;
Yahoo/Reuters
, 07/01/2009;
Guardian
, 13/01/2009
(12) A muito recente falência da Nortel, líder norte-americana da
indústria das telecomunicações, é um exemplo
flagrante.
(13) Fontes:
USAToday
, 28/12/2008;
Reuters
, 02/01/2009
[*]
Global Europe Anticipation Bulletin.
O original encontra-se em
www.leap2020.eu
Este comunicado encontra-se em
http://resistir.info/
.
|