Fazer com que mil bilionários paguem a crise
por Damien Millet e Sophie Perchellet
[*]
Todos os anos a revista
Forbes
publica a sua célebre lista dos bilionários. A
classificação de 2010, que acaba de vir à luz, dá
informações esclarecedoras: em um ano, o número de
bilionários em dólares passou de 793 para 1011 e o seu
património acumulado monta a 3600 mil milhões de dólares,
uma alta de 50% em relação ao ano anterior. Para os super ricos,
a crise já está bem longe.
Pouco importa que Bill Gates seja apenas o segundo, ultrapassado pelo mexicano
Carlos Slim cuja fortuna atinge US$53,5 mil milhões. O mais importante
é que um tal montante, concentrado nas mãos de uma única
pessoa, representa 12 vezes o orçamento de um país como a
República Democrática do Congo (RDC), que abriga mais de 68
milhões de pessoas. Esta quantia também representa mais de 3,3
milhões de anos do salário mínimo (SMIC) em vigor em
França.
Este forte aumento do número de bilionários verifica-se quando
milhares de milhões de pessoas vêm as suas condições
de vida degradarem-se em consequência da crise. Isto revela de maneira
gritante que os muito ricos conseguiram fazer com que o custo desta crise seja
suportado pelo maior número. Em numerosos países, tanto ao Norte
como ao Sul, a dívida pública dos Estados explodiu, nomeadamente
para vir em socorro dos responsáveis desta crise (bancos privados,
fundos especulativos...) ou para pagar as consequências. O
acréscimo desta dívida é a seguir o pretexto para impor
medidas anti-sociais que penalizam as populações mas poupam os
mais ricos.
Em oposição ao sistema capitalista que a cada dia mostra as suas
desastrosas consequências sociais, há uma ideia que faz o seu
caminho: a de um imposto mundial sobre as grandes fortunas, avançada
desde 1995 pela Conferência das Nações Unidas para o
Comércio e o Desenvolvimento (CNUCED). Por exemplo: um imposto de 20%
sobre o património deste pequeno milhar de bilionários permitiria
recuperar 720 mil milhões de dólares, ou seja, a metade da
dívida pública externa de todos os países em
desenvolvimento no ano de 2008 (US$1405 mil milhões) e 3,5 vezes o
montante dos seus reembolsos anuais devido a esta dívida (US$211 mil
milhões).
Às somas assim libertadas poderiam acrescentar-se outras para
lançar as bases de uma outra mundialização:
recuperação das somas despejadas nas grandes
instituições bancárias privadas desde o começo da
crise e reparações dos danos sociais provocados pela sua sede
desmedida de lucros tomando-os do património dos seus administradores e
dos seus principais accionistas, abolição da dívida
externa pública dos países do Sul, pagamento pelos países
mais industrializados de reparações em compensação
por cinco séculos de dominação (escravidão,
colonização, destruição de culturas locais,
pilhagem das riquezas naturais, destruições do ambiente...),
retro cessão dos bens mal adquiridos pelas elites do Sul (o que implica
a realização de inquéritos internacionais assim como a
supressão dos paraísos fiscais e judiciários),
tributação das transacções financeiras
internacionais e dos lucros das sociedades internacionais... Ao mesmo tempo, a
plena soberania dos povos não poderá se efectiva senão se
todas as condicionalidades macroeconómicas de ajustamento estrutural,
como o FMI e o Banco Mundial impõem desde há trinta anos, forem
abandonadas. Uma nova arquitectura económica e financeira internacional
será então possível, tendo como prioridade absoluta a
garantia dos direitos humanos fundamentais.
Os fundos recuperados permitiriam então às
populações do Norte deixar de suportar as consequências da
crise e às populações do Sul principiar finalmente um
verdadeiro desenvolvimento que estariam em condições de decidir
por si mesmas, tendo em conta as suas próprias necessidades e os seus
próprios interesses, ao contrário do que lhes exigem os seus
credores, aproveitando plenamente os seus recursos naturais e no respeito das
suas especificidades culturais.
A publicação da classificação da
Forbes
deve portanto ser a oportunidade para repor em causa as bases do modelo
económico e financeiro existente e para propor medidas radicais a fim de
que os bilionários citados nesta classificação, assim como
todos aqueles que acumularam fortunas extravagantes, suportem o custo de uma
crise cujas vítimas têm sido os povos.
Apesar de os preceitos neoliberais terem sido brevemente vilipendiados
após o desencadeamento da crise em 2007-2008, nenhum ensinamento foi
extraído, e são os mesmo de sempre que lucram com a
mundialização financeira e com a injusta repartição
das riquezas que ela organiza. Os muito ricos retomaram a sua marcha para a
frente, que se faz a espezinhar os direitos da grande maioria dos outros e
levando o mundo para um impasse suicida. Mas desde já germinam as ideias
força capazes de entravar a sua corrida louca. O desafio é chegar
a impor-lhes o mais rapidamente possível.
14/Março/2010
[*]
Respectivamente porta-voz e vice-presidente do CADTM França
(Comité para a anulação da dívida no terceiro
mundo).
O original encontra-se em
http://www.legrandsoir.info/Mille-milliardaires-a-faire-payer.html
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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