Petrobrás confia sua informação sigilosa aos piratas da
Halliburton
por Juan Luis Berterretche
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Cerca de 70 a 75 por cento de nosso negócio está relacionado
à energia, servindo a clientes como Unocal, Exxon, Shell, Chevron e
muitas outras entre as principais companhias petrolíferas de todo o
mundo. Como conseqüência, freqüentemente nos encontramos
operando em lugares muito difíceis. Nosso Senhor não achou
adequado colocar petróleo e gás apenas onde há governos
eleitos democraticamente e amistosos em relação aos EUA.
Às vezes temos que operar em lugares onde, considerando-se todos os
sinais, ninguém gostaria de trabalhar. "Mas nós vamos onde o
negócio está".
[1]
Dick Cheney (CEO da Halliburton, 1998)
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Em 21 de janeiro de 2008 a Petrobrás anunciou o achado de uma reserva
gigante de gás denominada Campo de Júpiter a 37 km do mega-campo
de petróleo de Tupi. O mega-campo de Tupi dispõe de uma
capacidade de 90 milhões de milhões de barris
de óleo equivalente (boe), medida que inclui petróleo e
gás natural. Este descobrimento elevaria o Brasil à
condição de terceiro ou quarto maior produtor mundial de
hidrocarbonetos.
A prospecção foi realizada pelo navio-sonda NS-21, conhecido como
Ocean Clipper, que pertence à empresa Diamond, na Bacia de Santos
(São Paulo). Os laptops que haviam acumulado a informação
da descoberta foram trasladados a terra.
Os computadores foram enviados em um contêiner que chegou ao Porto do Rio
em 25 de janeiro, trazido desde a Bacia de Santos, e ali ficaram até 29
de
janeiro quando um caminhão da empresa Transmagno o carregou para
transportá-lo a Macaé. A distância do Rio a Macaé
é de três horas pela rodovia, mas "devido a fortes
chuvas" o motorista do caminhão fez uma parada em Itaboraí,
onde passou a noite num posto à beira da rodovia. Depois dessa
acidentada viagem, em Macaé se comprovou que os lacres do
contêiner haviam sido retirados e o cadeado substituído.
A partir desse momento as informações do retirado foram
contraditórios.
Primeiro foi dito que havia desaparecido um notebook, logo dois, dias depois
que também faltavam os discos rígidos. Hoje se sabe, pelo registro
policial, que quando o técnico de manutenção Guilherme da
Silva Vieira foi confirmar a carga comprovou que faltavam quatro laptops, dois
discos rígidos, quatro pentes de memória com
informações, outro computador, uma impressora e um gravador de
DVD. Nas memórias dos aparelhos roubados estava toda a
informação sobre a reserva do Campo de Júpiter.
O roubo dos dados estratégicos da estatal brasileira com
informações sobre as reservas de hidrocarbonetos na bacia de
Santos não é o primeiro, segundo o diretor da
Associação de Engenheiros da Petrobrás (AEPET) e
ex-engenheiro da área de exploração e
produção da estatal, Fernando Siqueira.
"O roubo é reincidente, porque sabemos há um ano e meio que
vem sendo roubados laptops na casa dos técnicos envolvidos com a Bacia
de Santos. Houve assalto na casa de dois engenheiros e um geólogo de
onde só levaram os laptops", informou.
Siqueira lamentou que o roubo leve 30 anos de investigação feita
pela companhia numa jazida com um valor estimado em US$ 2 milhões de
milhões (10
12
), em mãos desconhecidas.
Halliburton
O de "mãos desconhecidas" seria certo se não
soubéssemos que a empresa encarregada de trasladar o contêiner era
a Halliburton. E que a transportadora Transmagno era uma companhia subcontratada
pela mesma Halliburton.
Vejamos alguns dados esclarecedores sobre a empresa a quem Petrobrás
confia sua informação sigilosa.
[2]
Os principais contratos governamentais da Halliburton nos EUA se realizam com o
Pentágono, por meio do Corpo de Engenheiros do Exército (ACE, por
suas siglas em inglês) ou da Marinha, baixo uma modalidade conhecida como
Logistics Civilian Augmentation Program (LOGCAP), um esquema de
privatização e "mercenarismo" das
funções de "logística" do Pentágono
iniciado em 1985, que permite a milhares de firmas suprir serviços e
fornecimentos como transporte, habitação,
construção de prisões, preparação e
distribuição de alimentos e combustível,
interrogatório de prisioneiros, limpeza, lavanderia, etc.,
"liberando" milhares de tropas que são usadas na frente de
batalha.
O LOGCAP não conseguiu grande alento senão até que Dick
Cheney, atual vice-presidente dos EUA e grande embusteiro
[3]
, como
secretário de Defesa de Bush pai, o impulsionou e generalizou em 1992
por meio de um estudo que contratou precisamente com a subsidiária da
Halliburton, Kellog, Brown and Root (KBR) para determinar se os contratistas
podiam fazer frente às necessidades logísticas
"básicas" do Pentágono.
O estudo, classificado, conclui que um LOGCAP generalizado beneficiaria ao
governo com "a vantagem" de que as empresas não estão
submetidas ao código militar, por exemplo, em matéria de
atrocidades caso dos contratistas do Pentágono na Colômbia.
Em agosto de 1992 Cheney outorgou o primeiro contrato "ampliado"
do LOGCAP a favor da KBR e pouco depois, em 1995, foi nomeado presidente da
Halliburton. Este tráfico de influência e manejo pressuposto,
Estado-empresa e de pessoal é parte do
modus operandi
do capital monopolista.
Em 1997 a Auditoria Geral detectou irregularidades e a Halliburton foi
substituída pela DynCorp, mas manteve um contrato sem
licitação por cinco anos para reconstruir os campos petroleiros
do Iraque. Em 2001, com Cheney na Casa Branca, a KBR conseguiu um contrato
LOGCAP
por 10 anos e hoje domina 90 por cento de todo o LOGCAP no Iraque, passando
de 320 milhões de dólares em junho de 2003 para 2 mil
milhões em setembro deste ano. Segundo Lolita Baldor, da AP, entre 2003 e
2004 a Halliburton realizou contratos no Iraque estimados em 10,7 mil
milhões, sem incluir outros LOGCAP da KBR em dezenas de países
como a construção das prisões em Guantánamo e
Afeganistão. A Halliburton está submetida a "auditorias"
e detectam-se copiosas anomalias ("subornos" por atacado,
cobrança de
10 mil refeições diárias que não se serviram,
sobrepreço na
gasolina para o Exército, uso de alimentos com um ano de vencimento,
etc). Ainda assim, a imprensa informa que em julho de 2005 o Exército
atribuiu 5 mil milhões a Halliburton para o apoio logístico das
tropas no Iraque até julho de 2006, um aumento de mil milhões
pelos mesmos serviços.
[3]
Até janeiro de 2006 a Halliburton obteve o montante de 16 mil
milhões de dólares em contratos para "reconstruir" o
Iraque.
Em março de 2007 a empresa Halliburton com sede central em Houston,
Texas, anunciou que se mudava para os Emirados Árabes Unidos,
concretamente na cidade de Dubai, onde imperam descontraídas e muito
liberais taxas impositivas e cômodas leis de residência. Desta
forma pretende evitar os juízos nos EUA. contra os não
cumprimentos de contratos e as fraudes.
Em 2007 acumularam-se múltiplos casos de fraude cometidos por empregados
das empresas privadas na adjudicação de contratos na erroneamente
chamada reconstrução do Iraque. Os mais notórios da
Halliburton. Mas há indícios de que a corrupção
endêmica implica cada vez mais oficiais das forças armadas dos
EUA. Em julho de 2007, deflagrou o escândalo do comandante John
Cockerham, encarregado de contratação e compras da base do
exército de Fort Sam em Houston (Texas). Cockerham e sua esposa Melissa
foram detidos e acusados de receberem subornos de mais de 15 milhões de
dólares na adjudicação de vários contratos, desde o
fornecimento de água engarrafada até os serviços de
lavanderia para as tropas dos EUA no Iraque e Kuwait. Um destes contratos por
fornecimento de água foi adjudicado à empresa kuwaitiana de
transporte Green Valley em troca de 175 mil dólares. Após ser
empacotado em bolos de notas dentro de maletas, o dinheiro foi depositado num
banco do Oriente Médio e dali ao paraíso fiscal em Barbados.
Na mesma semana o ex-comandante do exército John Allen Rivard, outro
oriundo do Texas, declarou-se culpado de suborno, lavagem de dinheiro e
conspiração enquanto exercia a máxima responsabilidade de
contratação de serviços e fornecimentos para a base
militar estadunidense de Camp Anaconda, no Iraque. Uma empresa com sede em
Dubai pagou subornos a Rivard por contratos avaliados em 20 milhões de
dólares relacionados com o fornecimento de tratores, equipamentos
elétricos e moradias pré-fabricadas para as tropas estadunidenses.
Anthony Martin, de Houston, confessou que havia adjudicado dois contratos a uma
empresa de transporte kuwaitiana em troca de 50.000 e 150.000 dólares.
Martin incorpora-se a uma longa lista de empregados da Halliburton seduzidos
pelo suborno. Alex Mazan, diretor da Halliburton de Atlanta, responsável
pela adjudicação de contratos para o transporte de
combustível, aumentou o custo de um contrato assinado a uma empresa
kuwaitiana e embolsou um milhão de dólares. A principal empresa
de transporte kuwaitiana que se havia beneficiado de contratos com o
exército estadunidense é a PWC. Assim mesmo, Stephen Seamans,
outro diretor de contratação da Halliburton, recebeu subornos de
uma firma paquistanesa.
Estes subornos são tostões comparados às fraudes da
transnacional.
Segundo auditores governamentais, houve gastos de 1.000 milhões de
dólares sem justificar no mega contrato LOGCAP adjudicado sem concurso
à
Halliburton em 2003.
Esta é a eficiente empresa na qual a Petrobrás confia a
informação confidencial de uma riqueza que pertence a mais de 180
milhões de brasileiros.
O interrogatório aos possíveis envolvidos no roubo não
é mais que uma en cenação. A informação que
realmente interessa é quem é o responsável na
Petrobrás pela contratação da empresa pirata Halliburton e
quanto recebeu por isso.
Todo o resto é resultado dessa traição ao país.
Notas
1-
Tyler Marshall,
High stakes in the Caspian
Los Angeles Times 23 de fevereiro de 1998. Richard B. Cheney, Defending
liberty in a global economy, discurso pronunciado na Conferência sobre
Danos Colaterais no Cato Institute, 1998. Cato Institute é uma
instituição liberal.
2-
Juan L.Berterretche
e
Tali Feld Gleiser
Réquiem para el sueño americano
Livro em preparação.
3- Oito funcionários chave do governo dos Estados Unidos, incluindo o
presidente George W. Bush, realizaram pelo menos 953 declarações
falsas nas vésperas e depois da invasão do Iraque em março
de 2003. Assim indica uma investigação que acaba de publicar na
capital estadunidense o Centro para a Integridade Pública e que dirigiu
Check Lewis, fundador desta organização. Entre os investigados
figuram Bush, o vicepresidente
Dick Cheney
e quem então encabeçavam o Departamento de Estado (chancelaria)
Colin Powell, e o de Defesa, Donald Rumsfeld, assim comoa ex conselhera de
Seguridade Nacional e atual secretária de Estado (chanceler),
Condoleezza Rice, e o ex-subsecretário de Estado Paul Wolfowitz. A lista
se completa com os hoje exportavozes da Casa Blanca Ari Fleischer e Scott
McClellan.
4-
John Saxe-Fernández
Halliburton Irak y Katrina,
La Jornada, Ciudad de México, 15 de setembro de 2005,
http://www.jornada.unam.mx/
Ver também:
Petrobrás: fechemos as nossas portas
AEPET: Roubo é mais um motivo para se cancelar os leilões
O original encontra-se em
http://www.desacato.info/
Tradução de Vanessa Bortucan.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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