Notas desconexas
por Ricardo Antunes
As intempéries desencadeadas pelo Katrina e Rita mostram que o
hiperimpério, que se preparou há décadas para a ''guerra
nas estrelas'', que provoca diuturnamente o mundo, que ataca, bombardeia,
boicota, bloqueia e impede o controle elementar da destruição
ambiental em escala global, o mesmo país que com menos de 5% da
população mundial consome destrutivamente 25% dos recursos
mundiais energéticos, estava completamente despreparado para salvar a
população pobre e predominantemente negra de Nova Orleans e
região, que esperou por mais de uma semana para ver seus corpos deixarem
de boiar nas águas fétidas, para serem retirados com uma
indignidade capaz de rebelar os gados.
A recente vitória de Berzoini mostra que o PT dominante recusou a
mudança de fundo. A redução do Campo Majoritário
não impede que ele continue dominando com relativa folga. Berzoini foi o
ministro responsável pelo achaque
[1]
da previdência pública e sua privatização.
Não teve nenhum escrúpulo em defender o FMI contra os
trabalhadores aposentados, no vilipêndio que foi cometido pelo governo.
Depois, foi para o Ministério do Trabalho, para ''aprovar'' a nefasta
reforma sindical.
Aliás, o que será que se passou entre a saída do
''Querido Zé'', conforme o afetuoso bilhetinho de despedida que Lula o
enviou, quando da demissão de Dirceu, e o cumprimento frio,
gélido mesmo, durante o enterro de Apolônio de Carvalho? O PT e
seu governo não são acusados de enriquecimento ilícito, de
corrupção privada, mas de terem montado o mais escandaloso
esquema de corrupção feita por um partido de esquerda. Aqui
está o fulcro da questão: dizer que sempre houve
corrupção no Brasil, quando a direita governava, não
justifica a mesma prática, pela esquerda, ainda que para fins
políticos. Que, então, se passou desde a demissão de
Dirceu?
Lembro que em 1980, quando nasceu o PT, as organizações de
esquerda olhavam-no com certo desdém. E o PT foi responsável pela
''primeira vingança'' da história: encontrou seu espaço,
cresceu, foi parte das lutas da esquerda brasileira, tornou-se seu maior
partido, até ser avassalado por um grupo mafioso que o levou ao fundo do
poço, contra a vontade e com o desconhecimento completo de milhares de
seus militantes.
29/Setembro/2005
[1] A palavra é usada no sentido de extorsão, de depauperar a segurança social pública em benefício do sector privado. [*] Autor de "O caracol e sua concha - ensaios sobre a nova morfologia do trabalho", Boitempo Editorial. O livro será lançado dia 6 de Outubro, 5ª feira, às 18 horas, na Livraria Cortez, R. Bartira, 317, em S. Paulo. O original encontra-se em http://www.jb.com.br/jb/papel/opiniao/2005/09/28/joropi20050928001.html . Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ . |