"Não há mais espaço para ilusões
reformistas"
O Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB) saúda os
partidos comunistas presentes, homenageando o anfitrião, o Partido
Comunista Libanês, referência para todos os revolucionários
e trabalhadores do mundo, com seu exemplo de luta sem tréguas contra o
capital.
O aprofundamento da crise sistêmica do capitalismo coloca para o
movimento comunista internacional um conjunto de complexos desafios.
Estamos diante de um estado de guerra permanente contra os trabalhadores, uma
espécie de guerra mundial, na qual o grande capital busca
sair da crise colocando o ônus na conta dos trabalhadores. Esta é
uma guerra diferente das anteriores, que tinham como centro disputas
interimperialistas.
Apesar de persistirem contradições interburguesas e
interimperialistas na atual conjuntura, as grandes potências (sobretudo
os Estados Unidos e os países hegemônicos da União
Européia) promovem hoje uma guerra de rapina contra todos os
países periféricos, sobretudo aqueles que dispõem de
riquezas naturais não renováveis e contra todos os trabalhadores
do mundo.
A guerra é o principal recurso do capitalismo para tentar sair da crise:
ativa a indústria bélica e ramos conexos, permite o saque das
riquezas nacionais e a queima de capitais; os capitalistas ganham também
com a reconstrução dos países destruídos.
Os métodos são sempre os mesmos: satanização,
manipulação, estímulo ao sectarismo e a divisões
entre nacionalidades e religiões, cooptações,
criação ou supervalorização midiática de
manifestações e rebeldias, atentados de falsa bandeira.
Nesta guerra permanente, pelo menos nesta fase, têm sido poupados os
chamados países emergentes, sócios minoritários do
imperialismo, que legitimam a política das grandes potências,
compondo, como atores coadjuvantes, o chamado Grupo dos 20.
Estes países (os chamados BRICS) se têm beneficiado da crise, na
medida em que ajudam a superá-la; em seguida, poderão ser as
próximas vítimas tanto da crise como de agressões
militares.
Em nosso país, nunca os banqueiros, as empreiteiras, o
agronegócio e os monopólios tiveram tanto lucro. A
política econômica e a política externa do estado
burguês brasileiro estão a serviço do projeto de fazer do
Brasil uma grande potência capitalista internacional, nos marcos do
imperialismo. As empresas multinacionais de origem brasileira, alavancadas por
financiamentos públicos, já dominam alguns mercados em outros
países, notadamente na América Latina.
Hoje, o governo brasileiro é o organizador da transferência da
maior parte da renda e da riqueza produzida pelo país para as classes
dominantes (através do superávit primário, da
política de juros altos e do sistema tributário altamente
regressivo). Cerca de 50% do orçamento se destina a pagar os juros e a
amortização da dívida (externa e interna), para
satisfação dos banqueiros internacionais e nacionais, assim como
dos nossos rentistas (que não chegam a 1% da população).
Para atender aos interesses dos grandes empresários, das empreiteiras e
do agronegócio, o governo promove a destruição do meio
ambiente, desde o desmatamento da floresta amazônica à
demolição da legislação ambiental. O novo
Código Florestal brasileiro, um total desrespeito ao meio-ambiente,
contou com o apoio de partidos que se dizem de esquerda, mas se caracterizam
por um esvaziamento ideológico, pela adesão às medidas
neoliberais e por se curvarem aos ditames do imperialismo. Em períodos
eleitorais, rebaixam ainda mais o discurso e abandonam os símbolos que
vagamente os ligam ao ideário socialista.
Em meio a esta grave crise, e sem a consolidação ainda de um
importante pólo de resistência proletária, o capital
realiza uma violenta ofensiva para retirar dos trabalhadores os poucos direitos
que lhes restam. Para fazê-lo, tentam cada vez mais fascistizar as
sociedades e criminalizar os movimentos políticos e sociais
antagônicos à ordem. A correlação de forças
ainda nos é desfavorável. Ainda sofremos o impacto da
contra-revolução na União Soviética e da
degeneração de muitos partidos ditos de esquerda e de setores do
movimento sindical.
Por outro lado, estamos muito preocupados com o verdadeiro cerco militar que o
imperialismo promove na América Latina. Realmente, a
reativação da IV Frota norte-americana, com um poderio
bélico maior do que a soma de todas as forças armadas dos
países latino-americanos, traz ameaças à soberania e
à paz na região. O estabelecimento de dezenas de bases militares
dos EUA na América Latina inquieta os latinoamericanos. A considerar
ainda a construção de um aeroporto militar ianque na cidade de
Mariscal Estigarribia, no Paraguai, que possibilita o controle da região
da tríplice fronteira (Brasil, Argentina e Paraguai) e onde se
assenta a maior reserva mundial de água doce, o Aquífero Guarani.
Mas não é só o imperialismo estadunidense que cerca a
Nossa América. A OTAN construiu, em 1986, na Ilha Soledad do
Arquipélago das Malvinas, a grande base militar de Mount Pleasant, que
dispõe de aeroporto e porto naval, de águas profundas, onde
atracam submarinos atômicos e foram construídos silos para
armazenar armas nucleares e instalações para aquartelar milhares
de efetivos militares. Essa fortaleza das Malvinas contraria, expressamente, o
contido na Resolução 41 da ONU, que considera o Atlântico
Sul zona de paz e cooperação, isenta de armamentos e engenhos
nucleares.
A considerar, ainda, a ilha de Ascensão, outra base militar da OTAN que
fica a meio caminho da costa brasileira e da costa africana.
A OTAN criou uma zona de exclusão pesqueira de mais de um milhão
de quilômetros quadrados em torno das ilhas Georgia e Sandwich do Sul,
destinando essa zona exclusivamente às suas forças bélicas.
A ocupação militar imperialista no Atlântico Sul permite o
controle das rotas marítimas que unem a América do Sul à
África e sua conexão com o continente da Antártica e com
os países do Pacífico, através do Estreito de
Magalhães. Ademais, permite o controle dos inúmeros recursos
naturais da plataforma continental da América do Sul. É assim que
a América Latina está cercada por terra e por mar pelas
forças militares imperialistas, com a omissão da grande maioria
dos governos locais.
Analisando este quadro, o PCB tem feito algumas reflexões.
Nos marcos da ordem burguesa, o futuro é sombrio. Mais do que nunca o
regime do capital virá acompanhado de crescente instabilidade
econômica, absoluta irracionalidade no uso e na
distribuição da riqueza, escandalosa desigualdade social,
escalada da prepotência imperialista e inexorável perigo para as
conquistas populares e dos trabalhadores.
A nosso juízo, não há mais espaço para
ilusões reformistas. Aliás, os reformistas, mais do que nunca,
são grandes inimigos da revolução socialista, pois iludem
os trabalhadores e os desmobilizam, facilitando o trabalho do capital. Em cada
país, as classes dominantes forjam um bipartidarismo em verdade
um monopartidarismo bicéfalo em que as divergências, cada
vez menores, se dão no campo da administração do capital.
Cada vez mais também faz menos sentido a escolha de aliados
no campo imperialista e mesmo entre seus coadjuvantes emergentes, como se
houvesse imperialismo do bem e do mal. A
diferença é apenas na forma, não no conteúdo. Isto
não significa subestimar as contradições que vicejam entre
eles.
Não podemos conciliar com ilusões de transição ao
socialismo por vias fundamentalmente institucionais, através de maiorias
parlamentares e de ocupação de espaços governamentais e
estatais. A luta de massas, em todas as suas formas, adaptada às
diferentes realidades locais, é e continuará sendo a única
arma de que dispõe o proletariado.
Temos avaliado também que o atual modelo de encontros de partidos
comunistas e operários, que vêm cumprindo importante papel de
resistência, precisa se adaptar às complexas necessidades da
conjuntura mundial, com suas perspectivas sombrias no curto prazo e suas
possibilidades de acirramento da luta de classes, com a emergência das
lutas operárias.
Pensamos que é preciso romper com o encontrismo em que, ao
final dos eventos, nossos partidos formulam um documento genérico e
decidem a sede do próximo encontro e se despedem até o ano
seguinte, inclusive aqueles dos países da mesma região.
Para potencializar o protagonismo dos partidos comunistas e do proletariado no
âmbito mundial, é necessária e urgente a
constituição de uma coordenação política
que, sem funcionar como uma nova internacional, tenha a tarefa de organizar
campanhas mundiais e regionais de solidariedade, contribuir para o debate de
ideias, socializar informações sobre as lutas dos povos.
Mas, para além da indispensável articulação dos
comunistas, parece-nos importante a formação de uma frente
mundial mais ampla, de caráter antiimperialista, onde cabem
forças políticas e individualidades progressistas, que se
identifiquem com as lutas em defesa da autodeterminação dos
povos, da paz entre eles, da preservação do meio ambiente, das
riquezas nacionais, dos direitos trabalhistas, sociais e políticos;
contra as guerras imperialistas e a fascistização das sociedades.
Em resumo, as lutas em defesa da humanidade.
Deixamos claro que o nosso Partido valoriza qualquer forma de luta. Não
podemos cair no oportunismo de fazer vistas grossas ao direito dos povos
à rebelião e à resistência armada. Em muitos casos,
esta é a única forma de fazer frente à violência do
capital e de superá-lo. Os povos só podem contar com sua
própria força.
Saudamos os povos que hoje enfrentam as mais duras batalhas. Saudamos os
trabalhadores gregos, portugueses, espanhóis, que já se levantam
em greves nacionais e grandes jornadas e os demais trabalhadores da Europa, que
enfrentam terríveis planos do capital para tentar superar a crise, hoje
mais acentuada no continente europeu mas que poderá agravar-se e
espalhar-se para outros países e regiões.
Saudamos o povo palestino, em sua saga duradoura e dolorosa no enfrentamento ao
sionismo que o sufoca e reprime, ocupa seu território, derruba suas
casas, prende seus melhores filhos e impede seu direito a um Estado soberano.
Valorizamos o cessar-fogo celebrado recentemente no Egito, como uma
vitória importante mas parcial da resistência palestina em Gaza. O
sionismo - cuja intenção era claramente mais uma vez invadir Gaza
com tropas e tanques - surpreendeu-se com a atual capacidade de
reação militar palestina neste pequeno, isolado e sofrido
territorio, de fato sob ocupação israelense: uma
reação à altura das necesidades de autodefesa e da
ampliação dos direitos do povo palestino.
Mas não podemos, de maneira alguma, subestimar a agressividade do
imperialismo e do sionismo, que não desistirão de seu intento de
dobrar a combatividade e destruir a identidade do povo palestino, ocupando todo
seu territorio, como parte do plano expansionista que chamam de Novo
Oriente Médio.
No entanto, a considerar a justa e proporcional reação do povo de
Gaza e a extraordinária solidariedade internacional à luta dos
palestinos, melhoram as condições de resistência aos planos
sionistas.
E aqui pedimos a manifestação deste encontro em solidariedade
à realização na próxima semana, no Brasil, do Forum
Social Mundial Palestina Livre, que vem sofrendo ameaças da comunidade
sionista em nosso país, inclusive, em desrespeito à
soberanía brasileira, por parte da representação
diplomática israelense.
Da mesma forma, saudamos os também sofridos povos do Iraque, do
Afeganistão, da Líbia. Saudamos os povos do Egito, do Iêmen
e de vários países árabes, em sua luta contra a tirania e
a opressão.
Saudamos sírios e iranianos, contra os quais batem os tambores de guerra
do imperialismo. Nosso Partido está incondicionalmente solidário
à grande maioria do povo sírio e a seu direito à
autodeterminação. Como na Líbia, trata-se na Síria
do plano imperialista de fomentar guerras civis sectárias, valendo-se de
mercenários e equipamentos militares estrangeiros, para dividir e ocupar
o país. No caso da Síria, procura o imperialismo criar
condições para uma posterior agressão militar ao
Irã.
Solidarizamo-nos com os comunistas, os trabalhadores e as forças
antiimperialistas libanesas diante da movimentação de setores da
burguesía nacional aliados ao imperialismo, que procuram fomentar uma
nova guerra civil, no contexto da divisão dos países do Oriente
Médio por criterios sectários e religiosos, para facilitar a
recolonização da região.
Chegando até nossa América Latina, saudamos nossa querida Cuba
Socialista em sua luta contra o cruel bloqueio ianque. Saudamos nossos Cinco
Heróis. Saudamos os processos de mudanças na América do
Sul (Venezuela, Bolívia e Equador), neste momento decisivo, uma
encruzilhada entre o avanço dos processos ou sua derrota.
Saudamos nossos irmãos colombianos que, nas cidades e nas montanhas,
resistem, através de variadas formas de luta, contra o estado terrorista
de seu país, a grande base militar norte-americana na América
Latina. Saudamos os revolucionários colombianos, na expressão de
seu partido comunista e guerrilhas.
Não há solução militar para o conflito colombiano.
Por isso, saudamos os diálogos que têm como objetivo buscar uma
solução política. Este diálogo só foi
possível pelo surgimento e desenvolvimento da Marcha Patriótica,
um combativo e amplo movimento de massas, e pela constatação da
impossibilidade de vitória militar do estado contra a guerrilha.
Sabemos que não será simples este diálogo, pois as classes
dominantes colombianas e o imperialismo querem a paz dos cemitérios.
Assim sendo, propomos que este Encontro assuma a organização de
uma campanha mundial de solidariedade ao povo colombiano por uma verdadeira paz
democrática com justiça social e econômica
Finalmente, reiteramos nossa proposta de criação de
coordenações políticas internacionais e regionais dos
Partidos Comunistas, tendo como princípio fundamental o
internacionalismo proletário.
Beirute (Líbano), 22 de novembro de 2012
PCB Partido Comunista Brasileiro
[*]
Secretário-geral do PCB. Intervenção no XIV Encontro
Mundial dos Partidos Comunistas e Operários, em Beirute,
22-24/Novembro/2012
O original encontra-se em
pcb.org.br/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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