A caotizaçao do Brasil
O clima moral em Brasília está podre
Legisladores preparam lei rolha contra jornalismo crítico
Projecto de lei para criminalizar os que denunciam a
corrupção
Não há mais ninguém limpo na política
burguesa do
Brasil
A revelação das gravações secretas envolvendo as
mais poderosas figuras do Brasil provocou uma série de escândalos
explosivos em meio a atual crise política do país. Agora, os
legisladores brasileiros tentam tornar ilegal a publicação destas
gravações.
Um
projeto de lei
, que se arrastava na Câmara dos Deputados desde o ano passado, tomou
novo fôlego este mês. Ele pretende criminalizar o ato de
"filmar, fotografar ou captar a voz de pessoas, sem
autorização ou sem fins lícitos", punível com
até dois anos de reclusão e multa. Se as gravações
forem publicadas nos media sociais a pena aumenta para quatro a seis anos.
Quando foi originalmente apresentado, o projeto
foi
criticado
como uma das muitas medidas draconianas destinadas a
proteger políticos
e uma ameaça direta à liberdade de expressão e de
imprensa.
O projeto de lei anti-gravações (PL 16762015) foi apresentado em
2015 pelo deputado Veneziano Vital do Rêgo, do
PMDB
, partido do presidente interino Michel Temer, com orientação
à direita. Rêgo, que votou pelo impeachment da agora afastada
presidente Dilma Rousseff, aparentemente tem razões para temer as
gravações secretas: ele é suspeito em
35 investigações em andamento
por vários crimes financeiros e administrativos, até abril,
de acordo com o Transparência Brasil, importante órgão de
fiscalização anticorrupção, e com o site de
verificação de fatos, Agência Lupa.
O
Instituto de Tecnologia & Sociedade do Rio de Janeiro
, que chamou o projeto de "preocupante" e
"inacreditável", disse que a lei poderia criminalizar
atividades quotidianas como filmar uma festa aniversário e postar o
vídeo nas redes sociais. No
Medium,
o instituto afirmou que o projeto de lei "impede atividades
jornalísticas e investigativas de grande relevância, assim como
coloca em risco quem realiza atividades audiovisuais. Trata-se de um projeto
inconstitucional que viola a liberdade de expressão e outros
princípios constitucionais como o direito de informação e
prerrogativas da comunicação social".
O projeto de lei não impediria o uso de gravações secretas
pela Polícia Federal, mas proibiria qualquer gravação
secreta ou não conduzida sem pleno consentimento e
não produzida para "o interesse público", termo
subjetivo que seria provavelmente deixado aos critérios de juízes.
Essa semana, fugas de gravações revelaram que o presidente da
Associação de Magistrados do Paraná coordenou
acções de retaliação
contra jornalistas que produziram uma série de matérias
sobre
super-salários
de juízes e funcionários do judiciário. Tribunais
brasileiros também ordenaram que Marcelo Auler, jornalista independente,
retirasse do ar dez reportagens sobre fugas e escutas ilegais relacionadas com
a Operação Lava Jato, a investigação em curso de
corrupção, e
proibiu que este publicasse novas reportagens
sobre o assunto.
Com o risco de seis anos de prisão, a lei teria inevitavelmente um
efeito profundamente inibidor em todas as organizações de media e
editores independentes.
O projeto não representaria ameaça ao jornalismo "porque
para citar, filmar ou gravar um cidadão, um jornalista profissional
primeiro deve pedir sua permissão e autorização para
publicar o material", escreveu o gabinete do deputado Veneziano do
Rêgo em email a
The Intercept.
Em declaração a
The Intercept,
o conselho diretor da Associação Brasileira de Jornalismo
Investigativo (Abraji) disse que "o projeto representa um retrocesso ao
criar um novos tipos de crime em que jornalistas podem incorrer no desempenho
de suas funções", adicionando que "a
criminalização do libelo, calúnia e
difamação é um risco para a democracia".
O projeto de lei também inclui uma controversa proposta de "direito
ao esquecimento" que permitiria aos indivíduos exigir,
"independente de ordem judicial", que mecanismos de busca e websites
tirem do ar e apaguem dos resultados de buscas conteúdo que
"comprometa a honra de alguém".
O novo fôlego para o projeto de lei de Veneziano surge enquanto
gravações secretas ameaçam o núcleo do novo governo
do presidente interino Michel Temer. Na terça-feira, o maior jornal do
país, a
Folha de S. Paulo,
informou que o Procurador Geral
solicitou a prisão
do Presidente do Senado, Renan Calheiros, do ex-presidente, José Sarney,
e do homem de confiança de Temer, o Senador Romero Jucá
todos importantes líderes do partido de Temer, o PMDB. Jucá
e
outro aliado de Temer
foram
forçados a renunciar
aos seus ministérios no fim do mês passado. Um
importante senador
do partido da presidente Dilma Rousseff, o PT,
esteve preso
no ano passado num incidente semelhante. A própria presidente foi
apanhada numa
conversa gravada
com o ex-presidente Lula da Silva a discutir a sua indicação
para um ministério, o que foi visto pelos oponentes como uma prova de
que tentavam colocá-lo fora do alcance da
Operação Lava Jato
, o que provocou protestos.
Outra proposta de lei inclui um plano para
restringir o uso de acordos de delação premiada
por suspeitos sob custódia, e outro para
reduzir a fuga selectiva de investigações
ambos apresentados recentemente por legisladores do PT. Mais de
200 projetos de lei visando a corrupção foram apresentados em
2015 cinco vezes a média e,
de acordo com o jornal O Globo
, "as propostas que tramitam com mais rapidez são justamente as que
podem criar dificuldades para investigações ou embutem mecanismos
de abrandam punições".
Um representante do gabinete de Veneziano do Rêgo disse a
The Intercept
que o projeto de lei destina-se a proteger vítimas de estupro,
"não apenas políticos". Depois que vídeos e
imagens do
horrendo estupro coletivo
de uma menina inconsciente, de 16 anos, no Rio de Janeiro, foram
divulgadas online e fizeram as manchetes internacionais, o assunto das
gravações não autorizadas ganhou grande
atenção do público. O deputado está confiante em
que o projeto, atualmente agendado para ser discutido em comitê no dia 15
de junho, será aprovado nos comitês de Tecnologia e Justiça
da Câmara dos Deputados, depois do que iria a votação na
Câmara e no Senado.
Em abril,
um dispositivo de escuta foi descoberto
num gabinete do Supremo Tribunal Federal e a origem do aparelho é
desconhecida. E, com tantos indivíduos envolvidos em uma ampla gama de
investigações sobre corrupção, de acordo com a
Folha de S. Paulo,
o clima de paranoia
entre os agentes do poder em Brasília é tão intenso
que as reuniões estão sendo realizadas sem celulares ou fatos, e
às vezes com as persianas fechadas e com música de fundo a tocar
para prevenir a gravação de diferentes tipos de escuta
medidas que lembram um filme de gangsters.
Esta semana foi informado que altos executivos da construtora Odebrecht
comprometeram-se
a pormenorizar como foram distribuídos 500 milhões de reais
em contribuições ilegais de campanha e propinas desde 2006, como
parte do acordo de delação premiada. O presidente do Senado,
Renan Calheiros, disse numa
gravação secreta
que se isso acontecesse "ninguém de nenhum partido" escaparia.
10/Junho/2016
[*]
Jornalista de
The Intercept,
fishman@theintercept.com
O original encontra-se em
theintercept.com/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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