A social-democracia brasileira à moda do PT
É a estrutura, aldrabões
1. Economistas escrevem copiosos e longos artigos sobre o quanto a taxa de
câmbio do real, valorizada, prejudica a indústria local e
contribui para a crise das contas externas apontada pelo déficit recorde
nas transações correntes (TCs) com o exterior em 2013: US$ 81,4
mil milhões.
2. Na realidade, é ainda maior, pois as contas foram contabilizadas como
exportadas as plataformas de exploração de petróleo em
atividade no país. Sem essa maquilagem, o déficit nas TCs teria
sido 10% maior.
3. Claro que a taxa de câmbio do real valorizada pode estimular as
importações, mormente num país que está em vias de
desindustrialização há decênios, e por incentivar
gastos no exterior.
4. Entretanto, faz melhorar a relação de intercâmbio, pois
as exportações brasileiras são cada vez mais intensivas de
recursos naturais, as
commodities,
cuja comercialização depende pouco da competição
de preços.
5. De fato, foi o grande superávit nas mercadorias, acima de US$ 100 mil
milhões, que possibilitou o pequeno saldo positivo, de US$ 2,6 mil
milhões, na balança comercial, em queda impressionante,
decorrente do crescente e enorme déficit externo dos produtos
industriais: nada menos que US$ 105 mil milhões.
6. Na realidade, o déficit industrial chegou a US$ 113 mil
milhões, se expurgarmos a mágica das plataformas.
É consequência da desindustrialização do Brasil,
dominado pelo capital estrangeiro.
7. A valorização cambial decorre do afluxo de capitais do
exterior, que funciona como uma droga, com efeitos altamente prejudiciais
à economia, inclusive a própria dependência dessa droga.
8. Por sua vez, os capitais forâneos são atraídos por taxas
de juros altas, tendo sido as dos títulos públicos, elevadas,
agora, a 10,5% ao ano. Nos EUA os títulos até dois anos pagam
menos de 0,3% ao ano, e lá a dívida externa, de US$ 16
milhões de milhões, supera o PIB, e a pública ascende a
US$ 17 milhões de milhões.
9. O Banco Central, ilegalmente independente na prática, age a
serviço dos bancos e empresas transnacionais, inclusive de brasileiros
que aplicam diretamente do exterior. As autoridades monetárias servem
assim os concentradores, os reais detentores do poder.
10. Entre os prejuízos decorrentes dos juros altíssimos,
está o de os juros para as empresas produtivas serem um múltiplo
dos títulos públicos, o que eleva o custo de
produção de bens e serviços.
11. As grandes empresas e as transnacionais não padecem com essas taxas,
pois são favorecidas com a benigna TJLP (taxa de juros de longo prazo)
aplicada pelo BNDES e por taxas também suaves da Caixa Econômica e
de outros bancos públicos.
12. Tudo isso é para fazer crescer os lucros das transnacionais, pois
elas nem precisam de crédito as que têm acesso ao exterior
a baixo custo nem dependem de custos de produção baixos,
porque, não sofrendo concorrência, aplicam os preços que
desejam.
13. Ademais, elevado às nuvens pelos juros absurdos, o serviço da
dívida federal absorve mais de 40% da despesa, impulsionado por taxas de
juros acolhidas pelo governo, que, assim, perde capacidade de investimento e
custeio.
14. Já se vê que as mazelas da economia brasileira são
estruturais e não podem ser sanadas por medidas de política
monetária ou fiscal, sem substituir o modelo dependente por um modelo
econômico e social que atenda os interesses do país.
15. Assim, submisso ao modelo dependente, o governo não tem autonomia
para manejar as taxas de câmbio nem as taxas de juros, nem praticar
políticas expansionistas ou contracionistas da moeda e do crédito.
16. O tenebroso art. 164 da Constituição dá todo o poder
ao Banco Central para emitir moeda, para passá-la exclusivamente aos
bancos privados, deixando sem recursos o setor público e o
próprio Tesouro, assim obrigado a endividar-se com os bancos. Não
bastasse tudo isso, suas disponibilidades de caixa têm que ser
depositadas no Banco Central.
17. As causas do descalabro são, portanto, estruturais,
sistêmicas. Como também estas:
a) a administração pública tornou-se incapaz de conduzir o
desenvolvimento, com o Estado enfraquecido pelo serviço da
dívida, e com as estatais incrivelmente capitalizadas pelo Estado antes
de serem privatizadas em favor de grupos concentradores, inclusive estrangeiros.
b) o setor privado nacional continua vitimado pelas políticas
públicas, desde que foi condenado a definhar, desde o golpe de 1954, que
decretou a entrega do mercado às empresas transnacionais, sem que
tivessem sequer de investir realmente, subsidiadas, de forma absurda, para
trazer suas máquinas usadas, amortizadas e mais que pagas no exterior.
c) esses oligopólios e carteis que continuaram sendo subsidiados
pela União, estados e municípios e ocupam posições
dominantes são os agentes da transferência de recursos para
o exterior, através de diversas contas.
d) essa é a grande fonte da dívida externa, que se desdobrou na
enorme dívida interna, cevada com a capitalização de
juros, devido às taxas de juros extorsivas; estas, por sua vez, a raiz
da dependência financeira, que pretende justificar as altas taxas de
juros dos títulos públicos para atrair capitais a fim de
compensar os déficits na conta corrente.
e) a ascendência das transnacionais fez delas as beneficiárias dos
incríveis subsídios às exportações,
instituídos desde o final dos anos 60, as quais não evitaram a
explosão da dívida externa daí até o final dos anos
70, que também cresceu com os investimentos públicos na
infraestrutura e nas indústrias básicas, sob dependência
financeira (comandada pelo Banco Mundial) e dependência
tecnológica, agravadas em função das
especificações impostas nas concorrências internacionais.
f) no modelo brasileiro alardeado nos anos dos falsos
milagres econômicos , não há como incorporar a maior
parte da força de trabalho a um processo produtivo de qualidade, nem
elevar o padrão de vida do grosso da população: só
cresce a já esmagadora concentração da renda
[NR]
nas grandes empresas e os modestos programas de transferência de renda
[NR]
, na tentativa de sustentar parte do número gigantesco dos
marginalizados, a grande maioria da população; tudo como o Banco
Mundial gosta, enquanto as transnacionais extraem os recursos naturais do
país e transferem para o exterior os lucros, principalmente como
despesas, afora as crescentes remessas como lucros oficiais e juros.
17. Colocar o Brasil no caminho da industrialização, com
produção crescente de bens de alto valor agregado e intensidade
tecnológica, é tarefa que não há como realizar sem
as mudanças estruturais rejeitadas pela atual estrutura de poder,
dominada pelos concentradores, que controlam também o processo
político e os centros formadores de opinião, inclusive a
mídia.
31/Janeiro/2014
[NR] No Brasil chamam de renda a qualquer espécie de rendimento,
não apenas aos de actividades rentistas.
Ver também:
Brasil: O capitalismo extractivo e o grande salto para trás
, de James Petras
[*]
Doutorado em Economia e autor do livro
Globalização versus Desenvolvimento.
O original encontra-se em
www.correiocidadania.com.br/...
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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