Lei da Água gravemente danosa prestes a ser aprovada à revelia
dos cidadãos
A maioria parlamentar prepara-se para aprovar dia 29 de Setembro na Assembleia
da República uma Lei da Água que permite ao governo vender a
água, os rios, as albufeiras, as praias e os portos de Portugal.
A metodologia adoptada pela Comissão de Poder Local, Ambiente e
Ordenamento do Território da Assembleia da República faz
tábua rasa das alternativas presentes e substitui por um simulacro a
participação pública que nunca ocorreu.
Baseia-se exclusivamente na proposta do Governo e resume o processo
"público" à solicitação de parecer
escrito a algumas entidades (pedido emitido a 22/7 para responder até
10/8) e a uma
Audição Parlamentar Pública no dia 14/Setembro
inscrições até 09/Setembro
(fax: 21 391 7448,
email:
Comissao.7a-CPLAOT@ar.parlamento.pt
).
Das entidades constantes da lista aprovada, várias não foram
contactadas. A divulgação das alternativas, dos pareceres
recebidos e da própria audição parlamentar é nula,
contrastando com a campanha publicitária de que tem sido alvo a proposta
do Governo.
A Associação Água Pública apela à
participação activa, incluindo na Audição
Parlamentar, à reivindicação de um processo aberto e
sério, da defesa do direito de todos se pronunciarem e do direito a
conhecer as alternativas e as críticas fundamentadas.
Apela à defesa firme do acesso à água, às praias,
aos rios, às fontes e às infraestruturas, e do direito de
utilização da água que esta lei nos espolia.
A Associação Água Pública lançou conjuntamente com o
STAL
um Abaixo-Assinado para suspensão desse processo e
apela à sua subscrição urgente em
http://www.stal.pt/abaixoassinado.asp?id=2
.
A Associação entregou à Assembleia da República, no
dia 10/8, um parecer escrito detalhado, que pode ser consultado em
http://aguapublica.no.sapo.pt
assim como outros documentos do processo.
Súmula do Parecer entregue pela Associação Água
Pública
1. Os projectos 51/X, apresentado pelo PSD, 104/X, apresentado pelo CDS, e as
propostas 19/X e 22/X do Governo PS são versões do mesmo
projecto, iniciado em 2001 e designado por "Lei Quadro da
Água" . Um texto críptico e uma organização
labiríntica escondem objectivos muito diferentes dos declarados e a sua
aprovação seria gravíssima para os portugueses.
A essência da Lei Quadro reduz-se a um "corpo central"
que se destina a alterar a legislação actual para instituir um
mercado monopolista da água e dos terrenos do domínio
público hídrico, permitindo ao Governo vender ou arrendar por
longuíssimo prazo a sua exploração comercial. Representa
menos de 20% do texto, deliberadamente disperso pelos artigos 3º, 5º,
7º, 9º, 19º e 29º da proposta de lei 19/X e pelos artigos
1º, 2º, 13º, 54º a 79º (capítulos V, VI e VII)
e 94º da proposta de lei 22/X
(correspondendo nos projectos 51/X e 104/X aos artigos 1º a 3º,
11º,13º,15º, 17º, 28º, 66º a 95º, 117º,
121º e 131º).
Esse "corpo central", exclusivamente orientado para a
mercantilização da água e formação de
monopólios que cairão inevitavelmente nas mãos das grandes
transnacionais do sector, é a única parte realmente consistente
da Lei Quadro
proposta pelo Governo, pelo PSD e pelo CDS.
É falaciosa a propaganda em torno da organização
administrativa e dos planos, matérias em que a "lei quadro"
revoga muito mais do que institui.
Nada impede o Governo de criar de imediato as ARH e a ANA, nem de delegar
competências nos organismos públicos que entender tem
competência para definir a orgânica do Ministério, e suporte
no DL 70/90 para os órgãos que pretende criar, e nada obsta a que
inicie os planos e programas de medidas. Existem, de resto, Plano Nacional da
Água e Planos de Bacia Hidrográfica que o Governo fez e meteu na
gaveta.
Todo o resto do projecto é um vazio que remete para
legislação posterior
a elaborar pelo Governo matérias em grande parte de competência
relativa da Assembleia da República. Ou seja,
a Lei está por fazer.
E não haverá mais Lei que o "corpo central", tendo em
conta que o presente documento se iniciou em 2001.
Nem é possível fazer a Lei da Água nessa base, porque o
"corpo central" é incompatível com a
protecção da água, com os direitos das pessoas e com as
instituições portuguesas. Nem é conciliável com a
Directiva Quadro da Água da UE, nem com a Constituição da
República.
A Directiva impõe prazos muito difíceis de cumprir e resultados
mensuráveis, de qualidade da água e do estado dos ecossistemas. A
Lei Quadro, ao contrário de transpor a DQA, distorce-a e viola-a,
tornando impossível o seu cumprimento.
2. O projecto 119/X apresentado pelo PCP, intitulado "Lei de Bases da
Água" difere logo na forma - clara, sintética e estruturada.
O eixo da "Lei de Bases" é a relação humana com
a água, com destaque para os direitos das pessoas, a dinâmica dos
processos naturais e das utilizações da água e a
participação pública.
Concilia a base clássica da legislação portuguesa da
água com os "novos" requisitos: os direitos constitucionais, a
participação pública, a protecção da
qualidade da água, das águas subterrâneas e dos
ecossistemas, a função social e económica da água.
Exige uma quantidade reduzida de alterações ao direito vigente,
tem em conta a relação tradicional com a água e não
choca na sua aplicação o "sentido de justiça"
das pessoas.
Torna o direito da água consistente com a Constituição
Portuguesa, vinculando os direitos ao uso da água,
das praias e dos terrenos associados,
a participação dos cidadãos e o acesso à
justiça,
respeitando as competências da Assembleia da República, do
Governo, do Poder Local e dos Tribunais
e articulando-as nesta matéria.
É consistente com a dinâmica dos processos naturais e das
tecnologias de uso da água, e, ao contrário da Lei Quadro,
cria de facto as condições para cumprimento da Directiva Quadro
da Água.
Assegura o cumprimento das directivas europeias sobre
participação pública e a Convenção de Aahrus
e prepara o suporte às novas directivas em elaboração.
Os mecanismos incorporados para cumprimento da lei, assim como o Código
da Água, são importantes contributos no combate ao incumprimento
legislativo,
reputado como a principal "praga" da legislação da
água em Portugal.
3. As iniciativas legislativas do Governo, PS e PSD são
inconciliáveis com os processos naturais e tecnológicos em causa,
com a importância humana, social e ecológica da água, e
também com o direito português e com as directivas
comunitárias. Assim, entre os diplomas em apreciação,
só o projecto do PCP poderia proporcionar os alicerces
imprescindíveis a uma Lei da Água para Portugal.
4.
Mas não basta um projecto. Qualquer Lei da Água precisa ser
sujeita a um processo de participação muito alargado,
proporcionado o debate público de posições
contrárias e acolhendo contribuições de áreas muito
distintas. Esse processo não foi sequer iniciado.
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Este comunicado encontra-se em
http://resistir.info/
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