Golpistas apelam ao assassínio
"Ele tem de ser morto"
A elite venezuelana já diz publicamente "Ele tem de ser
morto", referindo-se ao Presidente Hugo Chavez. Isso é proclamado
alto e bom som, sem rodeios e pelo visto sem receios. Tamanha é a
"liberdade" de imprensa na Venezuela que consente até mesmo no
apelo ao crime. Os media hoje na Venezuela são, na generalidade, um
factor contra-revolucionário: serventuários do imperialismo e da
corrupta oligarquia local, promotores do golpe e do crime.
É espantoso como um correspondente de um jornal norte-americano
reproduz, quase acriticamente, um apelo ao assassínio feito por um dos
indivíduos da oligarquia (ver abaixo). E é mais espantoso ainda
como um sítio web venezuelano, empresarial e supostamente
técnico, o
PetroleumWorld
,
reproduz tranquilamente tal apelo ao assassinato do Presidente democraticamente
eleito do seu país. O texto abaixo dá uma ideia do clima que
vive presentemente a sociedade venezuelana, submetida às
fortíssimas pressões desestabilizadoras do governo Bush.
resistir.info
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por T. Christian Miller
[*]
José Antonio Gil faz parte da elite da Venezuela. Ele movimenta-se nos
círculos do dinheiro, do poder e da influência. Foi educado em
escolas top dos EUA. Encabeça uma das mais prestigiosas empresas de
inquéritos do país. E ele só vê uma
saída para a crise política envolvendo o Presidente Hugo Chavez.
"Ele tem de ser morto", afirmou, usando o dedo para riscar a mesa do
seu gabinete, bem acima das ruas sujas de Caracas. "Ele tem ser
morto".
Cerca de três meses depois de Chavez ter sido afastado do gabinete, e de
retornar dois dias depois no bojo de um levantamento de massas de gente pobre,
a sociedade venezuelana permanece profundamente dividida. As tensões
continuam altas e o país parece tão polarizado como antes dos
acontecimentos de 11 de Abril.
Os esforços de reconciliação falharam. Os líderes
da oposição desejam abertamente a morte de Chavez. Um dos
principais historiadores do país escreveu recentemente um artigo de
primeira página em cujo título se podia ler: "É
correcto matar um dirigente que não está a cumprir as leis".
Chavez, cuja retórica inflamada e comportamento errático dele fez
um dos mais controversos lideres da história do país, deu alguns
passos no sentido de moderar o tom, mas eles não foram suficientes para
apaziguar um vasto conjunto de sectores que estão contra ele, desde
líderes empresariais a responsáveis sindicais e membros dos media.
Ele não consegue ultrapassar a amargura. Em uma semana de entrevistas
na Venezuela os seus opositores utilizaram os seguintes termos para descrever
Chavez: Hitler, assassino, psicopata, terrorista, messiânico,
estalinistas, comunista, fascista, autoritário, rústico e
vários outros epítetos inadequados para leitura ao pequeno
almoço.
A segurança tornou-se uma preocupação central para o
Presidente. Outrora um populista que outrora gostava de banhos de
multidão, ele agora quase eliminou as aparições
públicas. No fim do mês passado ele instalou baterias de
mísseis terra-ar em torno do palácio presidencial depois de
relatórios da inteligência terem-no advertido de ataques
aéreos. Um grupo auto-intitulado Forças Unidas de Auto Defesa da
Venezuela apregoou ter 2200 tropas paramilitares prontas para matar Chavez.
Segundo algumas estimativas, ele afastou ou rebaixou mais de 240 oficiais das
forças armadas que acreditava terem estado envolvidos na tentativa de
golpe. A acção aprofundou as divergências entre aqueles
militares que já se opunham a Chavez.
Enquanto isso, a economia continua a piorar. A moeda, o bolívar,
afundou quase 45 por cento em relação ao dólar desde o ano
passado. O desemprego e a inflação continuam a aumentar. A
Venezuela é um país que segura a respiração,
à espera de mais violência.
Rumores de um segundo golpe enchem as redacções e as
emissões de rádio e TV do país, embora outros descartem
tais conversas como lavagem cerebral. Mais recentemente, um crescente
número de observadores chega a acreditar que uma tentativa de
assassinato contra Chavez é quase uma certeza.
"Nunca vi uma sociedade mais dividida ou polarizada do que a
Venezuela", disse José Miguel Vivanco, o responsável pelo
continente da Human Rights Watch, que passou mais de duas décadas a
observar as guerras de guerrilhas e ditaduras da América Latina.
O golpe começou em 11 de Abril depois de os líderes da
oposição organizarem uma marcha em direcção a
Miraflores, a versão venezuelana da Casa Branca. Ambos os lados acusam
o outro de abrir fogo sobre os que marchavam e os contra-demonstradores que
apoiavam Chavez.
Na confusão que se seguiu, 17 pessoas foram mortas e Chavez foi afastado
do gabinete. O líder do golpe, Pedro Carmona, um homem de
negócios, anulou a constituição e dissolveu o governo.
Mas dois dias depois, os venezuelanos pobres que constituem o grosso dos
apoiantes de Chavez afluíram ao centro da cidade para exigir a sua
reinstalação no poder, tal como o fizeram unidades militares
leais. A seguir, os líderes do golpe fugiram e Chavez retornou
triunfantemente ao gabinete.
Chavez imediatamente prometeu reconciliar-se com a oposição. Ele
reformou seu gabinete, transferindo ou afastando para outros postos alguns dos
ministros mais controversos. Também substituiu um aliado controverso
que estava a administrar a empresa de petróleo estatal.
Chavez também moderou a sua retórica exaltada. Como antigo
pára-quedista, ele cessou de chamar os seus opositores de
"fedorentos" e deixou de usar o seu uniforme militar durante as
aparições públicas.
Mais recentemente, Chavez admitiu a possibilidade de um referendum acerca da
sua liderança logo no próximo ano, apesar de o seu mandato
não terminar senão em 2007. A sua popularidade aumentou
após o golpe, crescendo 10 pontos percentuais e chegando aos 43 por
cento.
Responsáveis governamentais de topo dizem que Chavez procura
sinceramente a cooperação mas é hostilizado por uma
oposição intransigente que até agora recusou-se a
sentar-se e conversar.
"São preciso dois para o tango", disse o ministro dos
Negócios Estrangeiros Roy Chaderton.
"Estamos a tentar encontrar um meio para negociar, mas é muito
difícil".
Ainda assim, como Chavez evidenciou durante uma aparição recente
para comemorar uma batalha histórica, ele continua a acreditar na sua
"Revolução Bolivariana", um movimento político
para mudar de forma drástica a historicamente desigual sociedade da
Venezuela. Mais de 80 por cento da população vive na pobreza.
O movimento mal definido levou à criação de
políticas controversas tal como uma lei que permite ao governo tomar
terras improdutivas e aumentar o controlo do Estado sobre a
produção de petróleo.
Os dirigentes da oposição responderam às aberturas de
Chavez considerando-as como cosméticas. Dizem eles que Chavez continua
a interferir com a operação da PDVSA, a empresa estatal de
petróleo, e que as mudanças no gabinete foram simplesmente um
rearranjo, não uma mudança real. E alguns que o culpam pelas
mortas durante o golpe dizem que não podem negociar com um
"assassino".
Um esforço do Congresso para formar uma comissão de verdade e de
reconciliação ficou empacado, dividindo mais uma vez o
legislativo nacional, onde os membros do Movimento da Quinta República
de Chavez possuem uma estreita maioria de três ou quatro votos. Fora do
Congresso, os apoiantes de Chavez acenam com um nó de forca suspenso
como advertência àqueles que pensam em mudar de lado.
Mesmo fora, os esforços para reunir o governo e a oposição
fracassaram. Os opositores são favoráveis a um inquérito
pela Organização dos Estados Americanos. Os responsáveis
do governo convidaram a Fundação Carter para a Paz a ajudarem na
mediação.
Os problemas da Venezuela tem um primeiro nome e um último nome, e estes
são Hugo Chavez", declarou Henry Ramos, chefe do maior partido da
oposição, a Acção Democrática. "A
melhor solução para ele é ter um ataque do
coração. A mais provável é um golpe".
Os oponentes de Chavez, pelo menos aqueles que não o querem morto,
puseram as suas esperanças em dois caminhos. Primeiro, Chavez tem sido
atacado com um enxame de processo judiciais e escândalos legislativos nas
últimas semanas, alegando tudo e mais alguma coisa, desde o
genocídio até à fraude.
O primeiro processo acusa-o de apossar-se de mais de US$ 1,5 milhão de
contribuições secretas para a campanha de um banco espanhol.
Enquanto isso, há um escândalo político crescente acerca da
diversão de US$ 2 mil milhões de um fundo de "dias
chuvosos" governamental para pagar salários do Estado e
pensões.
A oposição também está a reunir assinaturas para
uma emenda constitucional que limitaria o mandato presidencial a quatro anos, o
que significa que Chavez estaria fora do gabinete no próximo ano. Mas
para muitos opositores, tal caminho é demasiado lento, e também
incerto.
"Qualquer coisa pode acontecer", disse Hidalgo Valero, um ex-coronel
da Guarda Nacional que foi preso recentemente depois de liderar uma parada de
antigos oficiais contra Chavez.
"Há fanáticos em ambos os lados, e o único
responsável por isto é Chavez".
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do Los Angeles Times, 07-07-02
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info
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