Por uma solução revolucionária para a crise venezuelana

por Carolus Wimmer [*]
entrevistado por Melina Deymann, do Unsere Zeit

Cartaz da última campanha eleitoral venezuelana.
Em 6 de Dezembro de 2020 realizaram-se as eleições legislativas na Venezuela. O PSUV, partido do presidente Maduro, venceu amplamente com 68,5% dos votos. Mas a participação atingiu apenas 30,5% dos eleitores inscritos. Apesar de marginalizado dos media, o Partido Comunista da Venezuela, na Alternativa Popular Revolucionária, obteve 169 mil votos e conservou uma cadeira no Parlamento, a de Oscar Figuera, seu secretário-geral. O secretário do PCV para questões internacionais, Carolus Wimmer, fez uma análise deste resultado numa entrevista ao jornal Unsere Zeit, do Partido Comunista Alemão.

UZ: Quais são os efeitos da guerra económica efectuada pelos EUA e a UE contra a Venezuela, especialmente nestes tempos de pandemia?

CW: As sanções americanas levaram a uma perda de receitas da ordem dos 31 mil milhões de dólares para o Estado venezuelano. O anterior conselheiro de segurança da administração americana, John Bolton, explicava, ainda em 2019, que as sanções americanas causariam um prejuízo de mais de 11 mil milhões de dólares por ano.

Os mais afectados pertencem às camadas mais frágeis da população: as crianças e os jovens, as pessoas doentes e idosas. Há poucos meios para importar víveres e medicamentos, porque o capitalismo rentista venezuelano depende quase exclusivamente das receitas petrolíferas em termos de entrada de divisas. As sanções dos Estados Unidos contribuíram para a queda brutal das importações essenciais. No sector público, elas afundaram 50% em 2019 (500 milhões de dólares) e depois ainda 50% em 2020 (250 milhões de dólares).

As sanções dos Estados Unidos e dos seus aliados europeus, visando bloquear as importações essenciais e as exportações de petróleo, tiveram o efeito esperado. Aprofundaram a crise social e económica pré-existente do capitalismo na Venezuela, que resultou dos erros políticos do governo. As sanções são a desculpa perfeita para mascarar a sua incompetência estrutural. Com a pandemia, o país está a cair numa verdadeira tragédia cuja primeira vítima é o povo, porque nem o partido social-democrata no poder nem a oposição contra-revolucionária enfrentam os problemas diários agravados pela crise.

UZ: Será que o governo Maduro teria podido tomar medidas para precaver melhor a Venezuela destes ataques do imperialismo?

CW: Com certeza. Nas nossas expressões, que já transmitimos muitas vezes ao governo, nós, o Partido Comunista da Venezuela, falamos de uma saída revolucionária para a crise. Isso significa uma reversão política total. Em vez de prosseguir uma política governamental reformista, social-democrata e favorável ao capital, precisamos de um governo revolucionário de operários e camponeses. O poder nas fábricas deve ser transferido à classe operária; os camponeses devem tornar-se proprietários da terra; é o que declara a constituição. O controlo da produção deve ser confiado aos trabalhadores. A actual estrutura de classes do governo está em contradição com isto. Desde a morte de Hugo Chavez, estão ali sobretudo representantes da burguesia ou da pequena burguesia.

Tivemos exemplos comprovativos. Quando em 2002, após o putsch contra o Presidente Chavez, a indústria petrolífera foi sabotada, os trabalhadores conseguiram salvá-la, chegando ao ponto de descodificar o software das companhias petrolíferas americanas.

O PCV promove constantemente o apoio à produção industrial nacional e à agricultura contra a actual política de importações generalizadas. Um dos pontos-chave para o progresso a longo prazo é a nacionalização dos bancos. Eles estão no centro da sabotagem contra-revolucionária. Eles opõem-se a uma moeda nacional estável. Põem em perigo a estabilidade política e económica do país através da especulação monetária.

O governo actual trai mais uma vez, em contradição com o do presidente Chavez, os trabalhadores, o que levou à mudança de posição táctica do PCV.

UZ: O PCV critica em primeiro lugar a nova "lei anti-bloqueio" pois ela prevê privatizações ao invés de medidas eficazes contra os efeitos do bloqueio. Pode nos dizer mais, resumidamente?

CW: A lei anti-bloqueio está em contradição com a constituição. O presidente está a ignorá-lo. Ela que dá um poder não controlável. Por este meio, desde a sua adopção em 9 de Outubro, iniciou-se uma vaga de reprivatizações de empresas estatais no sector agrícola, sem informação prévia aos trabalhadores e aos sindicatos. Há despedimentos e violações do direito do trabalho todos os dias. Os media nada dizem de tudo isto.

O PCV mobiliza os trabalhadores. Ele é o porta-voz decisivo do protesto e das reivindicações da classe operária, apesar, repitamos, de uma censura total implementada pelo governo contra os comunistas. Continuaremos o combate contra o imperialismo e o capital, mas também contra a política dos traidores, anti-operária, da social-democracia.

A "lei anti-bloqueio" serve a oligarquia económica e prejudica a maioria. Nestas circunstâncias, o PCV e a Alternativa Popular Revolucionária (APR) vão desempenhar um papel importante no novo parlamento. Vamos já apelar a um referendo contra a "lei anti-bloqueio".

UZ: Quais os pontos principais sobre os quais o PCV conduziu a sua campanha eleitoral?

O PCV e a APR pedem, entre outras coisas, um salário mínimo e uma pensão mínima que garantam as necessidades básicas das famílias. As pessoas não devem mais ser constrangidas a emigrar para sobreviver, a vender os seus bens, a depender de transferências dos seus parentes no estrangeiro, a trabalhar clandestinamente. Nossa proposta de lutar por um salário decente foi bem acolhida.

Exigimos um rendimento suficiente para viver dignamente, o estabelecimento de uma escala móvel dos salários, indexada à inflação, segurança de emprego e de benefícios sociais. Exigimos o levantamento do acordo que isenta de tributação o capital estrangeiro, a tributação do capital das grandes empresas nacionais e transnacionais, a abolição do IVA. A garantia do abastecimento de gás, electricidade e água potável são outras das nossas propostas políticas centrais.

Uma pesquisa de opinião do instituto "Datanalisis" estima que mais de 62% dos venezuelanos não têm confiança nem no governo nem na oposição.

Sobre esta realidade, constituímos uma nova aliança eleitoral destinada a perdurar, a Alternativa Popular Revolucionária (APR).

Duros combates de classe estão diante de nós, contra o imperialismo e face a um governo que, na prática, afasta-se cada vez mais das fontes da Revolução Bolivariana de Hugo Chavez, que trai os interesses da classe operária e do campesinato, que mantém salários de miséria sempre concedendo aos capitalistas novas mais-valias gigantescas.

O PCV agirá, no quadro parlamentar como extra-parlamentar, contra a criminalização das lutas de classe e contra a perseguição dos militantes operários e camponeses. Os crimes não devem permanecer impunes.

14/Dezembro/2020

Ver também:
  • PCV: rumo ao congresso fundador da APR

    [*] Responsável pelas relações internacionais do PCV.

    O original encontra-se em Für eine revolutionäre Lösung der Krise
    e a versão em francês em Solidarité Internationale PCF .


    Esta entrevista encontra-se em https://resistir.info/ .
  • 18/Dez/20