60º aniversário da Batalha de Stalingrado
O COMEÇO DO FIM DO NAZISMO
por Oficina de Informações
[*]
Passou quase despercebido, no dia 2 de fevereiro, o 60º aniversário
da capitulação do 6º Exército da Alemanha nazista ao
Exército Vermelho da União Soviética na cidade de
Stalingrado (hoje Volgogrado).
A Batalha de Stalingrado, talvez o maior e mais sangrento confronto militar da
história, marcou o ponto de viragem dos aliados na 2ª Guerra
Mundial, o início do fim do 3º Reich de Adolf Hitler. Hoje
subestimada por motivos ideológicos, essa batalha selou o destino de
Hitler e despertou em todo o mundo esperanças na vitória do
socialismo.
No dia 2 de Fevereiro de 1943, capitulou no distrito fabril, no norte de
Stalingrado, o último bolsão dos invasores nazistas, 40 mil
soldados e oficiais alemães sob o comando do general Strecker. Do dia 10
de Janeiro até essa data, as tropas da Frente do Rio Don, chefiadas pelo
general Rokossovski, derrotaram 22 divisões alemãs e mais 160
unidades de reforço e de retaguarda do 6º Exército, um dos
melhores da Wehrmacht, sob o comando do marechal-de-campo Friedrich Paulus.
Nessa ofensiva final, o Exército Vermelho capturou, junto com Paulus, 24
generais, 2.500 oficiais e 91 mil soldados.
O anúncio da capitulação chegou a Berlim três dias
depois da comemoração do 10º aniversário da chegada
de Adolf Hitler ao poder. Segundo o historiador William Shirer, autor de
Ascenção e Queda do Terceiro Reich
, o comunicado da derrota -- que, por ordem do ministro da propaganda, Joseph
Goebbels, omitiu a rendição dos 91 mil soldados do 6º
Exército -- foi precedido de um rufar de tambores abafados e seguida do
segundo movimento da 5ª Sinfonia de Beethoven. Hitler decretou quatro dias
de luto nacional e mandou fechar todos os cinemas, teatros e casas de
diversão durante esse período.
Todos os números envolvendo a Batalha de Stalingrado são
superlativos. O académico soviético A. Samsónov, autor de
A Batalha de Stalingrado
, conta que o Exército Vermelho derrotou nessa frente cinco
exércitos: dois alemães (o 6º e o 4º de tanques); dois
romenos (o 3º e o 4º) e um italiano (o 8º). Segundo seus
cálculos, os soviéticos destruíram completamente 32
divisões e três brigadas; provocaram a perda de metade dos
efectivos de outras 16 divisões; e teriam matado cerca de 800 mil
homens. No total, as baixas dos alemães de seus aliados entre
mortos, feridos e capturados teriam chegado a 1,5 milhão de
pessoas, ou 25% das forças de que dispunham no início da
invasão da União Soviética, em Junho de 1941. Os nazistas
perderam também 3.500 tanques e peças de assalto; mais de 3 mil
aviões de combate e de transporte; 12 mil peças de artilharia e
morteiros; 75 mil viaturas, etc. Em contrapartida, segundo informa o
historiador inglês Antony Beevor, o Exército Vermelho sofreu
durante essa campanha 1,1 milhão de baixas, das quais 485.751 fatais.
O sacrifício não foi em vão. Com a derrota em
Stalingrado, Hitler não pôde completar seu plano de conquistar a
região do Cáucaso, no Sul da URSS, e seguir adiante para juntar
as tropas com o Afrika Korps, do marechal Erwin Rommel, que havia chegado ao
Egipto em Agosto de 1942. Depois disso, a perspectiva era unir as tropas
alemãs com os japoneses, cuja Armada estava no Oceano Índico
nessa época, pronta para invadir a Índia.
É mais ou menos consensual a constatação de que Hitler
cometeu seu maior erro estratégico ao se decidir pela invasão da
União Soviética, em Junho de 1941, dando início à
"Operação Barbarossa". Nessa ocasião, as tropas
nazistas já haviam feito as principais conquistas na Frente Ocidental
(que se estendia desde a Noruega até os Pirineus e do rio Tamisa ao rio
Elba), incluindo a ocupação de Paris. O Reino Unido enfrentava a
Alemanha praticamente sozinha, sem poder contar ainda com a ajuda dos Estados
Unidos, cuja posição isolacionista dividia o país. Em vez
de iniciar uma segunda "Batalha da Grã-Bretanha", que
certamente submeteria a resistência já combalida dos
britânicos, Hitler resolveu abrir a "Frente Oriental",
esperando "esmagar a Rússia soviética numa rápida
campanha antes do fim da guerra contra a Inglaterra". Seu objectivo era
garantir o abastecimento e tornar invencível a sua máquina de
guerra com os cereais da Ucrânia e o petróleo do Cáucaso.
Nos primeiros seis meses da invasão, a Wehrmacht obteve vitórias
espectaculares. No norte, as divisões Panzer do marechal Wilhelm Josef
Franz von Leeb atravessaram os países bálticos e, com o apoio de
seus aliados finlandeses, chegaram aos arredores de Leninegrado, a segunda
maior cidade russa. No centro, sob o comando do marechal Fedor Bock tomaram
Minsk, a capital da Bielorússia em menos de um mês e, logo em
seguida, Smolensk, não muito distante de Moscovo, fazendo mais de 600
mil prisioneiros. No sul, o marechal Gerd von Rundstedt capturou a capital da
Ucrânia, Kiev (com outros 600 mil prisioneiros), e depois Odessa, o
principal porto soviético no mar Negro. A ofensiva final sobre Moscovo
teve início em Outubro. Na batalha de Vyasma, as tropas do marechal von
Bock capturaram mais 600 mil soviéticos. Em Dezembro, destacamentos
alemães chegaram aos arredores da capital, já em pleno inverno.
Os soldados estavam exaustos. E o pior para eles é que o marechal
Gueorgui Konstantinovitch Júkov iniciava a contra-ofensiva
soviética de três meses, com tropas descansadas. Diante do
fracasso na batalha de Moscovo, Hitler exonerou o comandante da Wehrmacht,
marechal Heinrich Alfred Hermann Walther von Brauchistch, assumindo o posto ele
próprio. Foi quando se decidiu pela ofensiva ao Cáucaso, na
primavera de 1942.
De acordo com Samsónov, Stalingrado tinha, na época, 445 mil
habitantes. Naquela cidade às margens do rio Volga funcionava um
importante parque industrial e comercial, com 126 empresas, 30 das quais de
importância nacional. Sua fábrica de tractores, símbolo da
indústria soviética, havia produzido mais da metade dos 300 mil
tractores então em operação no país. A
fábrica Krasni Oktiabr produzia 776 mil toneladas de aço por ano
e 584 mil toneladas de laminados. Também eram relevantes a
fábrica Barricadi, os estaleiros e a central termoeléctrica. Na
região, trabalhavam 325 mil operários e empregados. A cidade era
também um centro cultural, com 125 escolas, vários centros de
ensino superior, teatros, galerias de pintura e ginásios desportivos.
Mais importante ainda, Stalingrado era uma encruzilhada de
comunicações, unindo a parte europeia da URSS com a Ásia
Central e a região dos Montes Urais. Por ali passava uma estrada que
unia as regiões centrais do país com o Cáucaso, escoadouro
do petróleo de Baku. Na época, a cidade também se
transformou num símbolo, por ter sido baptizada com o nome do
líder soviético Joseph Stalin.
É fora de dúvida que o Führer subestimou a capacidade dos
soviéticos de lhe opor resistência. Assim, quando o 6º
Exército se rendeu, a derrocada do 3º Reich tornou-se uma
questão de tempo, a ser consumada com a tomada de Berlim pelos
exércitos do marechal Júkov, no dia 7 de 1945.
Três dias depois do final da batalha de Stalingrado, o presidente
americano Franklin Roosevelt enviou uma mensagem de
congratulações a Stalin "por sua brilhante
vitória". Segundo Roosevelt, "os 162 dias da épica
batalha pela cidade... serão lembrados como um dos mais dignos
capítulos desta guerra dos povos que se uniram contra o nazismo e seus
emuladores. Os comandantes e os soldados de seus exércitos e os homens e
mulheres que os apoiaram nas fábricas e no campo cobriram de
glória não apenas os braços de seu país, mas
inspiraram e renovaram com o seu exemplo a determinação de todas
as nações unidas de empenhar toda a sua energia para conseguir a
derrota final e a rendição incondicional do inimigo comum".
Já no primeiro encontro dos "três grandes" na
Conferência de Teerão, em novembro de 1943 Stalin,
Roosevelt e o primeiro-ministro britânico Winston Churchill a
bravura dos moradores de Stalingrado foi reconhecida por meio de um gesto
singelo, a entrega de uma espada enviada pelo rei George VI, na qual foi
gravada a seguinte frase: "Aos cidadãos de coração de
ferro de Stalingrado, um presente do rei George VI, como sinal da homenagem do
povo britânico".
A Batalha de Stalingrado contribuiu para ampliar a moral das forças
aliadas e dos movimentos socialistas em várias partes do mundo.
Também inspirou toda uma geração de artistas, entre os
quais o poeta chileno Pablo Neruda, que compôs o célebre
Nuevo canto de amor a Stalingrado
. No Brasil, Carlos Drummond de Andrade, em sua
Carta a Stalingrado
, escreveu:
Saber que resistes.
Que enquanto dormimos, comemos e trabalhamos, resistes.
Que quando abrirmos o jornal pela manhã teu nome (em ouro oculto)
estará firme no alto da página.
Terá custado milhares de homens, tanques e aviões, mas valeu a
pena.
Saber que vigias, Stalingrado, sobre nossas cabeças, nossas
prevenções e nossos confusos pensamentos distantes dá um
enorme alento à alma desesperada e ao coração que duvida.
[*]
Texto elaborado pela
Oficina de Informações
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