Dialéctica e Processo
Melvin
(*)
Tradução de Jorge Figueiredo
É importante que comunistas de todas as inclinações
ideológicas lutem individualmente e colectivamente para apreender este
momento. Gritar slogans como "construir sovietes", "programa
militar do proletariado", "contra-revolucionários pequeno
burgueses", não é análise. As questões a
seguir foram colocadas não como um desafio e sim como uma forma de
clarificar o movimento social.
Os comunistas na Argentina têm o trabalho que lhes cabe: mostrar porque
o capitalismo não pode ser reformado. Nunca esqueço que sou do
mais imperial de todos os países e não posso etiquetar as massas
da Argentina e os seus dirigentes de "pequeno burgueses" sem uma
definição específica. Por que o capital não pode
ser reformado? Qual é o significado marxista de reforma? Quais
são os alinhamentos à escala mundial e na Argentina que
clarificam esta fase da decadência das relações de
propriedade capitalistas? Quais são as tarefas dos comunistas nos
sindicatos? Quais as tarefas dos comunistas entre os desempregados e as massas
de inimpregáveis? Quais são as novas formas de
auto-organização em formação? Como está o
processo revolucionário a desdobrar-se ou antes quais são as
dimensões actuais do processo de polarização e
divisão das estruturas do Estado?
Houve uma tentativa para definir a propriedade específica da
"reforma" dentro do capital como um poder social com
específicas configurações internas de classe. Muito pouco
foi dito acerca do movimento sindical ou do trabalho organizado como um
processo histórico, cuja existência é moldada pela
dimensão do capital nas várias etapas da sua ascensão e
queda. À escala mundial já não há mais
espaço disponível para a reforma do capital tal como
historicamente evoluiu, com estas relações de propriedade
específicas.
A sociedade está fixada por rebites e opera na base da unidade das
forças produtivas e das relações de propriedade
implícitas na expressão relações de
produção. Sob todas as formas da sociedade de classe a unidade
das forças produtivas e das relações de propriedade
move-se em antagonismo e este movimento rasga a sociedade dos seus fundamentos
e promove novas relações de propriedade. O antagonismo nas
mãos de Marx era uma descrição dos processos
específicos que a sociedade atravessa quando um modo de
produção substitui outro.
A sociedade feudal representou uma configuração específica
de forças de classe organizadas com base da propriedade privada da
terra. A maioria servos, a viverem na ou em torno de feudos,
representou um polo da unidade da propriedade privada do
território do feudo. O servo não podia, e não o fez,
"extinguir a propriedade feudal". A natureza antagónica da
unidade contraditória e o conflito que constituía a base da
sociedade feudal tornava impossível para o servo o polo
subordinado na unidade da propriedade territorial feudal, "derrubar"
o polo dominante. No momento em que esta unidade de servo e senhor é
rompida, o servo deixa de ser um servo subordinado a um senhor
O que realmente aconteceu é que dentro do âmago da sociedade
feudal desenrolou-se um processo histórico que deu lugar ao nascimento,
emergência e desenvolvimento qualitativo parcial de novas classes. Estas
novas classes evoluíram a partir de classes sob relações
de propriedade feudais e emergiram na base de mudanças
tecnológicas dos meios de produção. Capitalistas
mercantis desenvolveram-se ao lado de uma secção da sociedade
envolvida na produção dispersa de mercadorias e esta actividade
tornou esta unidade da produção de mercadorias cada vez mais
divorciada da propriedade da terra. Na medida em que as características
da produção capitalista de mercadorias evoluía
vagarosamente sob as relações de produção
estabelecidas pela propriedade feudal, a riqueza e a influência dos
mercadores e das classes intermediárias crescia. Nos países onde
o capitalismo desenvolveu-se mais rapidamente, os mercadores e as classes
médias (burguesia) logo também deixaram de estar satisfeitos com
a protecção e a assistência que anteriormente lhe eram
prestadas pelas monarquias absolutas da era feudal.
Aos olhos da burguesia e produtores dispersos de mercadorias os produtos eram
inicialmente comprados por mercadores e comerciantes e vendidos no mercado, a
monarquia era uma classe de parasitas sem lei, bandidos e ladrões que
viviam da miséria e da opressão dos povos. Todo o sistema de
ideias, preconceitos, ética e argumentos ideológicos que
justificaram o domínio da monarquia como "enviada por Deus"
tornou-se cada vez mais intolerável e sem sentido para as novas classes
emergentes progressivamente divorciadas das relações de
propriedade feudais.
A base de classes que constituía a unidade das relações de
propriedade feudais permaneciam como tais, ou antes, as relações
de propriedade feudais não podiam ser "derrubadas" pelo polo
subordinado na unidade das suas relações de propriedade o
servo. Aquilo que realmente aconteceu foi que um outro "elemento"
surgiu no útero da sociedade feudal com base no desenvolvimento
da tecnologia, e este novo elemento foram "novas" forças de
classe. Estas novas forças de classe a burguesia e produtores
dispersos de mercadorias, não podiam desenvolver-se ulteriormente dentro
dos limites das relações de propriedade feudais e dos seus
vários sistemas de ideias e estruturas legais, as quais estabilizavam as
relações sociais.
A CHAVE
Marx chamou o movimento na sociedade pelo qual a sociedade é
transformada nas mãos de uma nova força social, uma
revolução social ou sociedade a mover-se antagonicamente. A
dialéctica de Marx especificamente sua articulação
da sociedade a mover-se em antagonismo é a chave para o entendimento dos
acontecimentos que enfrentamos numa escala planetária. Uma nova
força social emerge na base do desenvolvimento tecnológico e
não pode evoluir sem a abolição das esferas
económicas, sociais e políticas em cujo útero as novas
forças sociais nasceram. É verdade que secções da
nobreza com crescente interesse próprio no novo sistema de
produção para a criação de riquezas ligou-se ao
polo oposto das instituições feudais aos quais haviam-se servido
e adoptaram a bandeira da revolução social.
Hoje enfrentamos este processo numa escala planetária. Isto não
acontecia antes da década de 1990 (ou finais da de 1980). O
desenvolvimento da tecnologia acelera e aumenta o movimento em sentido
antagónico na sociedade e cria novas forças sociais pois as
pessoas são reorganizadas na base da nova tecnologia.
Marx resumiu este movimento da sociedade na sua mais famosa
citação no prefácio de "Contribuição
para uma crítica da economia
política".
"No curso da produção social dos meios de existência,
os homens contraem entre si relações determinadas,
necessárias, independentes da própria vontade,
relações de produção que correspondem a um
determinado grau de desenvolvimento das forças materiais de
produção. O conjunto das relações de
produção constitui a estrutura económica da sociedade,
base verdadeira sobre a qual se edifica a superestrutura jurídica e
política e à qual correspondem determinadas formas de pensamento
social. O modo de produção da vida material determina em geral,
o desenvolvimento da vida social, política e intelectual. Não
é pois, a maneira de pensar dos homens que lhes determina o modo de
viver. É, pelo contrário, a maneira de viver que determina a
maneira de pensar. Em certo grau de desenvolvimento, as forças
materiais de produção da sociedade entram em conflito com as
relações de produção existentes, ou dizendo
o mesmo em linguagem jurídica com as relações de
propriedade, no seio das quais essas forças produtivas se haviam
até então desenvolvido. De formas de desenvolvimento das
forças produtivas estas relações tornam-se então
nos seus grilhões. Inicia-se então um período de
revolução social."
"Num certo estágio do seu desenvolvimento, as forças
materiais de produção da sociedade entram em conflito ... com as
relações de propriedade ...", em resultado do
desenvolvimento tecnológico e da emergência de novas forças
sociais, as quais não podem facilitar o desenvolvimento sob as antigas
"forças materiais de produção".
Os trabalhadores empregados que constituem a unidade viva na lógica
produtiva da produção capitalista de mercadorias não podem
destruir "derrubar", as relações de propriedade
capitalistas porque eles não podem romper a unidade que é a base
da sua existência. Assim como o servo sob a propriedade territorial
feudal não podia, e não o fez, romper e destruir as
relações de propriedade feudais, também não o podem
os trabalhadores empregados. No momento em que as massas de trabalhadores
empregados romperem a sua unidade de conexão, com o capital social, eles
não serão mais empregados e entrarão num outro processo
evolutivo baseado no nosso actual estágio de desenvolvimento
tecnológico.
Os trabalhadores empregados que constituem a unidade viva na lógica
produtiva da produção capitalista de mercadorias não podem
romper ou "derrubar" as relações de propriedade
capitalistas como tais porque eles não podem romper a unidade que
é a base da sua existência. O que se exige é a
emergência de uma nova força social um elemento
contrário, cujo processo de desenvolvimento não pode prosseguir
sem a abolição das relações de propriedade que
impedem a sua evolução com base no seu próprio sistema
exclusivo de leis.
A ELECTRÓNICA
A crescente aplicação da electrónica, da
digitalização, da computorização, das fibras
ópticas e sua "fusão" com processos laser na
produção de mercadorias constitui a
"revolução" que está a destruir a pedra
fundamental das relações de propriedade privadas. O emprego pode
dar um salto às vezes, os lucros podem crescer; trabalho absurdamente
barato pode ser empregado ao lado de tecnologia exótica,
recuperações parciais da crise económica ocorrerão
e abrirão o caminho para crises mais intensas; mesmo quando a
política monetária emerge como o gume cortante da crise
comercial; é a revolução na tecnologia e nas suas
aplicações que embaratece o custo da força de trabalho e
rasga a sociedade dos seus fundamentos nas relações de
propriedade privadas.
Foi a revolução tecnológica que transformou um
exército industrial de reserva de desempregado numa clara massa
proletária mais ou menos incapaz de vender a sua força de
trabalho no mercado mundial. Assim que qualitativamente novos métodos
de produção são introduzidos na economia, o processo de
destruição por toda a sociedade, a separação da
sociedade das suas fundações, é objectiva e
automática. A reconstrução da sociedade na base de novas
relações de propriedade que permitam a plena
aplicação, com todo o alcance e profundidade, dos novos
métodos não é automática e depende do poder
subjectivo dos homens e das mulheres.
As novas forças sociais são uma crescente massa de
proletários divorciados dos meios de produção que
reflectem um sector do capital que está cada vez mais divorciado dos
meios de produção. Isto naturalmente significa o sector
especulativo do capital que prepara a agenda para o capital social do mundo
todo e a sua contrapartida directa no polo oposto, a característica
massa proletária mais ou menos incapaz de vender a sua força de
trabalho no mercado mundial. Esta "nova" classe que evoluiu
da base e na base das relações de propriedade capitalistas
é um produto do avanço gigantesco da aplicação da
tecnologia aos meios de produção. Aqui está o objectivo
comunista de uma classe que não pode viver ou manter as suas
condições de existência na base das relações
privadas de propriedade. Esta "nova classe" deve ser abrigada,
alimentada, ter as necessidades dos seus filhos satisfeitas, exige acesso
à medicina, ao transporte e assim por diante. A existência e o
crescimento desta nova classe não desaparece só porque um
indivíduo ou um grupo político não acredita que ela
"realmente exista". O crescimento qualitativo dos sem abrigo e dos
famintos na América do Norte, outrora atribuído a defeitos
pessoais dos indivíduos, é a prova positiva da existência
de uma nova dimensão qualitativa dentro da classe trabalhadora.
A base para o movimento social de hoje é diferente. O capital
está em outra fase da decadência e tem em parte uma nova
característica qualitativa que consiste na emergência de uma nova
classe. A produção com cada vez menos trabalho é
absolutamente incompatível com uma sociedade organizada em torno da
compra e venda de força de trabalho. Não era este o caso durante
os anos da "Guerra Fria", da era da Guerra do Vietname ou durante os
primeiros anos da Revolução Reagan. Pela primeira vez desde os
tempos de Marx e de Engels, a revolução mundial existe como um
objectivo historicamente urgente no fenómeno social.
Enquanto a classe dos trabalhadores principia os seus primeiros passos
conduzida para a frente pela nova classe, já distinta dos empregados e
trabalhadores sindicalizados, ainda conectada a todos os sectores da nossa
classe, o que é preciso é um combate sustentado de acordo com uma
única linha de acção. O que é exigido hoje
é uma batalha histórica dos "impedidos de terem posses"
para moldarem a consciência social de uma "massa
crítica" dos proletários em todos os países a fim de
identificarem a si próprios em termos de classe. Clamar por
"sovietes" confunde o comunista e é incompreensível
para a massa proletária apartada da sua história política.
Politizar nossa classe captando a consciência da sua massa
crítica e actuando no seu interesse de classe, é a questão
em causa. O slogan único para o movimento comunista mundial, não
importa de que inclinação ideológica, é
"vitória para os trabalhadores na sua luta actual".
Como processo, o combate para desenvolver os rudimentos de uma infraestrutura
para executar a tarefa de principiar a luta por política de classe
só pode prosseguir com base nas formas organizacionais que
herdámos do último movimento de reforma do capital.
Alianças políticas e organizações de identidade
política são formas antigas de organização e devem
ser a arena na qual o combate pela política de classe é travado.
Tentar criar uma forma organizacional é basicamente o programa da
"agenda escondida" das várias seitas ideológicas, as
quais estão certamente condenadas pela classe trabalhadora. Os
comunistas não podem ter agendas escondidas e devem declarar-se pelo
lado da política de classe e pelo combate pela sobrevivência
material as necessidades da nova classe.
O "combate pelo socialismo" é não só abstracto
como também incorrecto. O combate é pelos interesses materiais
da classe trabalhadora medido com base no seu sector majoritário
afligido pela pobreza, relações de propriedade pública que
permitam às pessoas comerem e serem abrigadas são
construídas e dentro da estrutura das relações de
propriedade privada não podem ser reivindicadas como tais. Confundir a
batalha emergente desta época no sentido de criar uma massa
crítica de proletários com consciência de classe com a
tarefa de reconstruir a sociedade é monstruosamente incorrecto e
totalmente NÃO-dialéctico. O que dizer sobre os processos reais
que devem desdobrar-se onde os militantes comunistas são recrutados e
combinados em conjunto na base de uma linha geral estratégica?
A batalha acaba de escalar no sentido de identificar a nova classe na base do
movimento antagónico que polariza a classe trabalhadora, dilacera uma
secção da classe para fora de si própria e lança-a
violentamente na cena mundial como uma nova força social cuja
existência é incompatível com qualquer forma de capital.
POLARIZAÇÃO
A sociedade move-se em antagonismo de classe. "Num certo estágio
do seu desenvolvimento, as forças materiais de produção na
sociedade entram em conflito... com as relações de
produção... Das formas de desenvolvimento das forças de
produção, estas relações (de propriedade) tornam-se
os seus grilhões. Chega então o período da
revolução social".
Aplicações de novos métodos (tecnológicos) de
produção embaratecem a força do trabalho e crescentemente
tornam supérfluas para a produção de mercadorias cada vez
maiores porções do trabalho mundial. O trabalho humano é
a fonte do valor usada nas mercadorias. A crescente produção sem
valor é incompatível com um sistema baseado na compra e venda de
força de trabalho. O avanço tecnológico deve por
definição polarizar uma sociedade baseada na compra e venda de
força de trabalho. Polarização significa a crescente
separação externalização, dos pólos
que constituem a unidade e conflitam no processo de produção
entre trabalho e capital, uma ruptura na unidade e emergência dos
pólos como entidades relativamente independentes.
A "ruptura" na contradição trabalho e capital significa
uma ruptura na fábrica social. A sociedade está a ser arrancada
dos seus antigos fundamentos ou a experimentar um "salto" para um
novo modo de produção. O aspecto objectivo do salto
começou com a introdução de algo novo, a
transição dos processos automatizados electro-mecanicos para
processos automatizados digitalizados. Se os meios de produção
deram um salto, então a resposta social deve ser caracterizada como um
salto para uma nova consciência necessária a fim de formar o
aspecto subjectivo do novo modo de produção.
O antagonismo com sua polarização de riqueza e pobreza,
separação de pólos exprimindo a unidade do trabalho e do
capital no processo de produção, dimensões e
mudanças quantitativas e qualitativas, saltos e saltos evolutivos
não são categorias separadas. São, sim, isolados como
aspectos do desenvolvimento para indicar porque a sociedade comporta-se de um
certo modo porque aquilo que era simplesmente uma massa de trabalhadores
desempregados foi transformada numa nova classe emergente.
O salto por vezes um processo muito longo , é a
transição de uma qualidade para outra ou, melhor ainda, a
transição de um sistema legal para outro. O salto não
é um vagaroso movimento quantitativo a deslocar-se para longe do antigo,
mas uma súbita ruptura na continuidade e o estabelecimento de um novo
desenvolvimento qualitativo, incompatível com o velho sistema legal. O
salto não é, tão pouco, o suave estabelecimento do novo
sistema legal com uma qualidade já audaciosa feita de uma penada.
Todos os que reconhecem o poder da dialéctica de Marx entendem que o
capitalismo não podia e não assegurava o padrão de
desenvolvimento vital e cultural da classe trabalhadora. Aquilo que não
era entendido era a limitação específica das
relações de propriedade capitalista como uma força social
historicamente evoluída porque a revolução
tecnológica não se desenrolara. Todos geralmente concordamos em
que a maturação de um sistema de produção cria as
condições para a sua mudança. Na ausência da
existência das condições materiais concretas para o salto
de um sistema legal para o seguinte ou uma mudança no modo de
produção, as fronteiras específicas da
produção capitalista de mercadorias não podiam ser
definidas e isto era articulado como "num certo estágio do seu
desenvolvimento, as forças materiais de produção na
sociedade entram em conflito... com as relações propriedade".
PRODUÇÃO SEM VALOR
As condições fisicamente concretas que definem a fronteira da
produção capitalista de mercadorias e o horizonte de um novo
sistema legal de produção são resumidas como
produção sem valor
(value-less production)
. O que tem obscurecido este processo para muita gente é a
concepção da "economia da informação". O
que constitui a distinção qualitativa primária não
é a reconfiguração dos canais de informação
a qual certamente representa melhoria qualitativa, mas o crescente
carácter sem valor da produção de mercadorias. Cada vez
mais a produção sem valor é a distinção
qualitativa primária que define o salto transição
de um modo de produção para outro. Aqui está a qualidade
primária a exigir que as relações de propriedade sejam
reconfiguradas não a estrutura e o carácter
tecnológico da informação.
A tecnologia a restituição de uma crescente massa de
trabalho vivo supérfluo ao processo de produção
cria a condição que define a fronteira do capital. Como
condições amadurecidas, elementos do novo sistema de tecnologia
são enxertados dentro da antiga infraestrutura. O novo é
incompatível com o sistema legal que governa o velho e o novo
começa a destruir as velhas relações sociais que orientam
a produção. Na linguagem da dialéctica de Marx isto
é declarado como uma lei do processo geral de desenvolvimento: "a
transição qualitativa começa com a
introdução quantitativa da nova qualidade no desenvolvimento
quantitativo da antiga".
Eis aqui o que limitou a estrutura da luta social no passado recente:
1º Uma classe explorada não pode derrubar uma classe exploradora
uma vez que elas em conjunto constituem o sistema. Sua luta infindável
é sobre a divisão do produto social e liberdades políticas.
2º Uma vez que elas não podem derrubar o sistema, a luta
básica das massas conduzidas pelo sector organizado da classe
trabalhadora era reformar ou reestruturar o sistema em favor do povo. Estas
reformas ou reestruturação constituem o reconhecimento da
sociedade de mudanças quantitativas no processo económico que
exigem mudanças no contrato social. Assim, todas as reformas são
políticas e redefinem as relações entre classes.
Sob tais condições, não só os comunistas e sim toda
a gente é reduzida a mendigar por interesses sectoriais e manobrar para
"obter o que eu vinha obtendo". Enquanto a reforma é no
sistema isto é, enquanto uma série de desenvolvimentos
quantitativos podem ainda ter lugar dentro do modo de produção
a batalha dos comunistas é conduzida de acordo com a
lógica de reforma da qualidade chamada capital. O processo é
objectivo e nenhum slogan ou visão subjectiva podem substituir o
desenvolvimento lógico objectivo.
Depois de o movimento de reforma ter legalizado os sindicatos, o trabalho dos
comunistas nos mesmos ou então o trabalho comunista nos sindicatos
significava organizar os desorganizados e, quando possível, ganhar
elementos dispersos para a causa ideológica do comunismo, porque ainda
havia espaço deixado para a reforma. Os comunistas perseveram na linha
de organizar os desorganizados a fim de melhorar as condições dos
trabalhadores, fortalecer sua capacidade combate e sabendo que tal actividade
destinava-se a quebrar a força da aristocracia operária em
relação à massa de trabalhadores desorganizados o
movimento trabalhista pela expansão do movimento sindical em
direcção ao movimento trabalhista. A época desta
configuração específica da história está
ultrapassada.
Sempre que o desenvolvimento dos antigos meios de produção
cessava, a reforma cessava. A mudança revolucionária na economia
(a introdução quantitativa de uma nova dimensão
qualitativa) começa a destruir a sociedade construída sobre as
antigas fundações. Nenhuma reforma é possível. O
salto inicial assinala que um novo período de acumulação
de forças necessária para o salto evolutivo está a
caminho. O salto evolutivo é o estabelecimento da dominância de
um novo sistema legal. O salto é governado pelo subjectivo e não
pelas forças produtivas porque o salto significa transição.
A nova tecnologia existe e está a ser aplicada parcialmente para
reforçar os lucros e proporcionar retornos máximos. Uma
contradição antagónica não pode ir além da
resolução parcial sem destruir as condições de
existência do polo anteriormente dominante, de modo que as novas
forças sociais podem evoluir baseadas no seu próprio sistema
legal. A luta pela mudança do desenvolvimento espontâneo para o
desenvolvimento por meio da consciência deve ser travada e consolidada
por todos os membros esclarecidos da sociedade.
Uma vez que o salto qualitativo inicial nas forças produtivas tenha
tido lugar a aplicação ou estabelecimento da nova
qualidade , há espaço para um salto de uma base
política para outra e isto é inteiramente subjectivo. Que
espécie de sociedade haverá? Como deverá a sociedade ser
reorganizada para conformar-se aos novos desenvolvimentos das forças
produtivas? Como as pessoas vestir-se-ão, comerão e
abrigar-se-ão?
Não há mais espaço para reformas no capital. A luta
espontânea por reformas não existentes não pode
senão forçar a introdução de novas ideias
ideias compatíveis e reflectindo a revolução
económica da nova característica qualitativa do processo
produtivo. Estas ideias não podem nascer do movimento espontâneo
por reformas não-existentes, mas devem ser elaboradas e introduzidas no
movimento social a partir do lado de fora deste pelo chamado "elementos
consciente". Esta é a tarefa do comunismo moderno.
Não a exigência do socialismo, a qual nas nossas
condições actuais está obsoleta, ou antes,
não exprime claramente aquilo que é novo (qualitativamente novo e
diferente) no nosso sistema de produção. Aqui já
não existe a necessidade de construir "a base material" para o
socialismo ou o socialismo como tal. Isto é assim porque na medida em
que a nova classe se consolida e torna-se consciente de si própria e dos
seus interesses materiais, o que é necessário não é
a construção de uma vasta infraestrutura industrial ou um sistema
baseado sobre a contribuição do trabalho de cada um a
venda da força de trabalho e sim um sistema baseado sobre as
necessidades. O que separa de expandir o desenvolvimento completo da
produção sem valor (o novo desenvolvimento qualitativo) é
a autoridade política nas mãos dos trabalhadores. Não era
este o caso trinta anos atrás.
NOVA DISTRIBUIÇÃO
Hoje na América do Norte necessitamos um sistema de
produção e distribuição do produto social baseado
nas necessidades das pessoas, não no conteúdo da
contribuição do trabalho individual das pessoas. As bases
tecnológicas para a produção sem valor e a
distribuição abrangente do total da produção social
já existe hoje. Cobertura médica, comida,
educação, ocupações culturais,
habitação, transporte público, etc, não deveriam e
não podem ser baseados no trabalho, lugar de emprego ou no
conteúdo de valor do produto social. A sociedade já deu o salto
inicial nas forças produtivas e não pode evoluir para trás
ou avançar qualitativamente para a frente sem uma mudança
política na sociedade. A mudança política é
conduzida por seres humanos pensantes e terá lugar mais rapidamente
adoptando uma linha estratégica geral. A batalha que deve desdobrar-se
é por uma visão de classe e política de classe.
Não há mais reformas a fazer no capital, praticamente e
historicamente.
A visão declarada por Marx tornou-se verdadeira: "A cada um
segundo as suas necessidades, de cada um segundo a sua capacidade". A
percepção profética de Engels quanto ao limite
histórico do valor como um mediador das relações humanas,
articulada em 1844, foi confirmada nos dias de hoje.
Mesmo um olhar casual às condições da nossa classe revela
características novas. Na sequência do fim da guerra contra os
povos do Vietname, aqueles que eram chamados veteranos sem abrigo tornaram-se
todo um segmento do povo sem abrigo nos centros de todas as grandes cidades. O
estilo de vida em família dos Ozzie and Harriet
(1)
, com o pai capaz de
manter um emprego mais ou menos ininterrupto e obter uma pensão de
reforma, foi
relegado para a antiguidade. A separação entre o povo e a
superestrutura do Estado, a polarização, já começou
e exprime a nova característica qualitativa da economia. O
empobrecimento de um cada vez mais vasto segmento dos trabalhadores obriga a
polícia a deslocar-se da protecção dos nossos
cidadãos para o controle "da gentalha". A superestrutura do
Estado está a polarizar-se com departamentos de polícia a
entrarem em colapso nas cidades mais pequenas e os empregados da polícia
e do Estado chegam às filas do desemprego.
Este processo é particularmente claro para qualquer um com coragem para
ver e a fortaleza da convicção para captar a dialéctica do
antagonismo como o movimento da sociedade de classes. Por outras palavras, um
caso de manual da destruição do "médio" e suas
consequências está a ter lugar. O médio é o vasto
estrato de pessoas da pequena burguesia e da classe trabalhadora que
através do rendimento e da propriedade tem um grande interesse nas
relações de propriedade. O colapso de Março de 2000 do
valor do mercado de acções e dos sonhos de pensão teve
profundas consequências sobre o pensamento dos médios. Na medida
em que os médios são reduzidos e destruídos, a sociedade
é polarizada em dois campos hostis os trabalhadores sem
propriedade e os capitalistas. Este processo em desenvolvimento é a
descrição do manual da revolução social escrita no
Manifesto Comunista com todos os pormenores.
Uma totalidade de 30 milhões, ou um terço da força de
trabalho, é chamada de trabalhadores "dispensáveis",
que ganham somente 70% do que ganham os trabalhadores que fazem a mesma tarefa
numa base permanente. Não só eles não têm
benefícios como não têm horário de trabalho regular.
Suas tarefas incluem programadores de software de alta tecnologia, empregados
de escritório, porteiros, motoristas de táxi, professores
auxiliares de escolas, prestação de cuidados de saúde
domésticos, processamento de alimentos, etc. A taxa de rotatividade
destes trabalhadores é 80% e muitos vivem em condições
horríveis, especialmente nas áreas mais rurais em abjecta pobreza
e a propagar doenças como a TB. No Iowa, trabalhadores do Laos vivem em
choças do caminho de ferro que se assemelham às barracas dos
lixeiros de Seul.
Abaixo destes trabalhadores estão os destituídos. Aqui as
condições são deploráveis e destacadas por
milhões de homens e mulheres sem abrigo. Estas duas simples categorias
da classe trabalhadora constituem a nova classe e apontam para a
direcção da revolução tecnológica em curso.
Nosso slogan inspirador é "vitória para a classe
trabalhadora na sua luta actual" mas há somente um programa com
significado para 50% da classe trabalhadora no nosso país e 80% da
população mundial: "distribuição base na
necessidade". Esta é a nova ideia que tem de ser conscientemente
elaborada, o principio guiador a que temos de prestar lealdade antes que surjam
as condições para a sua realização
"distribuição com base nas necessidades".
Na Argentina as massas na sua totalidade e complexidade de classe
irromperam dentro das lojas e espontaneamente apossaram-se de comida
(distribuição), exigiram a liquidação da
dívida e este impulso afectou profundamente os comunistas na
América do Norte. Nós naturalmente nunca poderemos dizer aos
nossos compatriotas o que fazer ou pensar, pois no mínimo
correríamos o risco de sermos legalmente estigmatizados como canalhas.
Contudo, podemos extrair uma conclusão simples deste impulso, a qual
podemos usar no nosso programa de luta: o programa da classe trabalhadora
mundial está aparentemente voltado na direcção da
distribuição baseada na necessidade.
Uma grande quantidade de questões tem de ser resolvida no campo
teórico, mas dificilmente haverá alguma quanto ao trabalho no
interior da classe, se captarmos as conclusões revolucionárias do
velho Manifesto Comunista e soubermos viver este momento. Exemplos: Qual
é a configuração do movimento fascista no nosso
país, qual é a sua base ideológica; qual é a
trajectória do movimento do trabalho organizado; por que o fascismo na
América do Norte não pode assumir uma forma militar como na
Alemanha? Qual é o actual estado ideológico dos vários
sectores da classe? Quais são os números? Qual é o papel
e a urgência de um Partido Trabalhista sob condições em que
não há mais reformas no capital e a sociedade deu um salto
qualitativo nas forças produtivas? Como fazer para atacar a classe
dominante pouco a pouco, prosseguindo a partir de onde as pessoas estão,
mostrando que o comunismo não é um bolo no céu e apresenta
uma solução prática para os problemas práticos de
hoje? Como construir uma massa crítica na classe trabalhadora com um
centro de gravidade capaz de empurrar para a frente todas as
secções da sociedade?
O que se tornou especialmente claro é que o período de tempo em
que o movimento do trabalho organizado o movimento sindical podia
exprimir a vontade da classe está ultrapassado. A ideia de que o
movimento sindical pode ser identificado como o movimento dos trabalhadores
é errada. A ideia de que um particular dirigente sindical pode ser
identificado com ou substituído pela massa dos membros do sindicato
deixar-nos-á sem defesa face ao assalto do capital. É certamente
desejável que a exigência pela "distribuição
baseada na necessidade" ganhe raízes no sector organizado. No
entanto, o trabalho do comunista dentro do movimento sindical é ganhar
os seus membros para o programa do movimento trabalhista real, a
"distribuição baseada na necessidade". Os dirigentes
do movimento sindical nunca deveriam ser confundidos com os milhões de
membros do movimento sindical.
Já não há reformas possíveis no capital. Lutas por
reformas limitadas e isoladas referem-se a um tipo de actividade em que a
expansão quantitativa é permitida dentro de um sistema de
produção. O movimento social, exprimindo uma nova
dimensão qualitativa o movimento do salto evolutivo exige
uma outra espécie de actividade a actividade da classe. A
exigência do momento é dominar a arte de dar a conhecer porque e
como as classes combatem pela sua existência material.
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Intertítulos da responsabilidade de
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(1)
Ozzie e Harriet eram personagens de um popular programa de televisão
nos EUA em que se retractavam cenas da vida de uma família das camadas
médias.
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