O presidente russo, Vladimir Putin, assinou um decreto sobre a mobilização parcial no país. De acordo com este decreto, 300 mil reservistas serão alistados no exército, dentre aqueles que já serviram nas forças armadas e têm experiência em conduzir operações militares.
Assim que o presidente russo terminou o seu discurso aos cidadãos, analistas e peritos em várias partes do mundo imediatamente começaram a perguntar-se o que “realmente” estava por trás do decreto sobre mobilização parcial e, em particular, o que significava o termo “parcial”. A este respeito gostaria de recordar que há dois tipos de conscrição no exército russo: a parcial, que já está a acontecer, e a universal, a qual aplica-se a todos os reservistas.
De acordo com uma declaração feita em 21 de Setembro pelo ministro da Defesa, Sergey Shoigu, o número dos afetados pela mobilização parcial será apenas 1% do número total de reservistas. Segundo o ministro, a Rússia tem enormes recursos de mobilização disponíveis. Estamos a falar, em primeiro lugar, acerca de pessoas que completaram o serviço militar e têm experiência de combate. E há cerca de 25 milhões de pessoas assim na Rússia.
O ministro da Defesa também explicou que a mobilização parcial foi causada pela necessidade de estabelecer controle ao longo da linha de contacto, com um comprimento de mais de 1000 quilómetros, e sobre territórios libertados anteriormente durante a operação militar especial.
Uma circunstância extremamente importante, na minha opinião, é o facto de que a mobilização parcial é executada quase em simultâneo com os referendos que serão efetuados de 23 a 27 de Setembro em quatro áreas sob o controle das Forças Armadas russas (estamos a falar acerca das Repúblicas Populares de Donetsk e Lugansk, bem como das regiões de Kherson e Zaporozhie). Quanto a isso, gostaria de recordá-los que o presidente Putin, no seu discurso aos cidadãos, disse que “não podemos e não temos o direito moral de deixar pessoas próximas de nós serem despedaçadas pelos carrascos do regime de Kiev, os quais estão a seguir uma política de genocídio, repressão, terror e perseguição contra estas pessoas, não podemos senão responder corresponder a um sincero desejo destas pessoas de determinarem o seu próprio destino”.
Se, em resultados dos referendos, o povo retorna ao seu porto nativo, à sua terra nativa, como aconteceu há poucos anos na península da Crimeia, uma responsabilidade especial cairá sobre os ombros dos corpos administrativos civis-militares nestas áreas. Sua tarefa primária será a garantir segurança, resolver todo o complexo de questões militares e sócio-económicas. Portanto, acredito firmemente que a Rússia tomou o passo absolutamente certo ao anunciar a mobilização parcial. Reservistas conscritos serão capazes de garantir a segurança das fronteiras russas e das novas regiões russas.
Gostaria de recordá-los que o número de pessoas do atual exército russo é cerca de 900 mil militares. Em consequência da mobilização parcial, este número aumentará para 1,2 milhão. Levará duas ou três semanas para um novo treino aos mobilizados. Estamos a falar acerca de pessoal militar com experiência de combate e de militares que contam com especialidades. Naturalmente, durante o treino em campo eles adquirirão as qualificações necessárias no uso de armas e equipamento militar modernos. Além disso, uma segunda onda de mobilização pode começar, em resultado da qual o número o número de pessoas do exército russo alcançará os 6 milhões de militares, os quais serão dotados de armas e equipamento militar moderno. Se uma mobilização geral for anunciada, o número do pessoal aumentará, como foi declarado pelo ministro da Defesa Sergey Shoigu, para 25 milhões. Neste caso, todos os homens entre aqueles que anteriormente prestaram serviço militar serão convocados. É de recordar que a idade máxima de conscrição é de 60 anos. As empresas industriais civis também serão abrangidas pela mobilização geral, as quais trabalharão o tempo todo para atender a todas as necessidades militares-civis da Rússia.
No seu discurso aos cidadãos, o presidente Putin focou “a política agressiva de algumas elites ocidentais, as quais estão a aplicar todo o seu poder para manter a sua dominância e, para isto, tentam bloquear e suprimir quaisquer centro de desenvolvimento independentes a fim de continuar a impor brutalmente a sua vontade sobre outros países e povos, a impor os seus pseudo-valores”.
O presidente russo também disse que “o objetivo do ocidente é enfraquecer, dividir e finalmente destruir o nosso país”. De acordo com Vladimir Putin, “eles já estão a dizer diretamente que em 1991 foram capazes de dividir a União Soviética e agora é tempo de dividir a própria Rússia que deveria desmanchar-se em muitas regiões em guerra mortal entre si”. “E tais planos”, observou o presidente russo, “eles têm estado a incubar durante um longo tempo [NR]. Eles encorajaram gangues de terroristas internacionais no Cáucaso, promoveram a infraestrutura ofensiva da NATO junto às nossas fronteiras. Eles fizeram da russofobia total a sua arma”.
Quanto a isto, gostaria de recordá-los que o presidente da Ucrânia, Vladimir Zelensky, no seu discurso de 19 de Fevereiro deste ano declarou que a Ucrânia pode rever as disposições do Memorando de Budapeste sobre Desarmamento Nuclear assinado em 5 de Dezembro de 1994. Esta declaração surpreendentemente coincidia com as exigências de um certo número de figuras ucranianas de topo acerca da necessidade de “ter as suas próprios armas nucleares” e acerca do “posicionamento das forças armadas ucranianas (segundo algumas estimativas, era cerca da metade de todo o pessoal do exército ucraniano) na fronteira com o Donbass”. Portanto, quando Vladimir Putin disse “a Rússia inevitavelmente tinha de intervir na situação, protegendo a população que fala russo do Donbass, a qual esteve sujeita a genocídio durante oito anos (notamos, a propósito, que o chanceler alemão Olaf Scholz certa vez disse que a conversa de genocídio no Donbass é “ridícula”), repressão, violência e bombardeamento diário”.
Hoje, tal como assinalaram Vladimir Putin e Sergey Shoigu, já não estamos mais a falar apenas de exercícios conjuntos de forças da NATO e da Ucrânia sobre o território desta última, a poucos quilómetros das fronteiras russas. A Ucrânia, tendo perdido, de acordo com o Ministério da Defesa russo, cerca da metade do pessoal do seu exército (mais de 100 mil pessoas, incluindo 61.207 mortos e 49.638 feridos), está a combater com a ajuda de armas e financiamento da NATO. 150 conselheiros da Aliança do Atlântico Norte participam no planeamento de operações militares do exército ucraniano. Cerca de 70 satélites militares da NATO e 200 satélites civis de países ocidentais providenciam o exército ucraniano com toda a informação de inteligência necessária em tempo real. Além disso, cerca de 2000 mercenários estrangeiros que combatiam no exército ucraniano e como parte de destacamentos nacionalistas extremistas ucranianos foram mortos. Outros 1000 mercenários continuam a combater no território da Ucrânia. Portanto, como disse Shoigu, a guerra não é mais com a Ucrânia, mas com o ocidente, o qual abastece a Ucrânia com armas modernas. Enquanto isso, o regime de Kiev anuncia uma mobilização após a outra, remetendo os seus cidadãos para a morte certa.
As relações entre a Rússia e a Ucrânia têm piorado por causa da política estúpida do ocidente, o qual ainda não pode e não quer entender que foi derrotado na Ucrânia. Isto tornou-se claro desde o princípio da operação militar especial, depois de toda a infraestrutura militar que a NATO e o Pentágono estiveram a criar na Ucrânia durante anos foi destruída. Em consequência, o povo ucraniano estava de facto “dividido” entre os que viviam nas partes ocidentais, do leste e do sul do país. Os resultados desta “divisão” serão visíveis conforme os resultados dos referendos a efetuar em quatro regiões da Ucrânia.
A entrada destas regiões dentro da Federação Russa significará que a guerra entre a Ucrânia e as Repúblicas Populares de Lugansk e Donetsk, cuja independência a Rússia reconheceu em Fevereiro deste ano, tornar-se-á uma guerra entre a Rússia e a Ucrânia. Consequentemente, qualquer agressão contra território russo levará ao facto de que será não só uma operação militar especial mas também uma guerra contra o estado agressor. A razão para esta situação é a política da liderança ucraniana a receber instruções da Embaixada dos EUA em Kiev.
Kiev tem recusado e continua a recusar negociações, não porque não goste dos termos ou do formato das negociações, mas porque o regime de Kiev não toma decisões independentes. Este regime está sob a autoridade absoluta daqueles que o financiam e lhe proporcionam toda a assistência militar necessária para alcançarem seus próprios objetivos, perseguirem seus próprios interesses, radicalmente diferentes dos objetivos e interesses dos povo ucraniano. O povo ucraniano e o exército ucraniano tornaram-se uma espécie de “luva” americana que receber armas modernas. Isto leva a uma expansão da escala das hostilidades. Kiev está a fazer o trabalho sujo por conta de Washington. Estamos a falar acerca de uma guerra híbrida, tal como todas as guerras anteriores envolvendo os Estados Unidos. A única diferença é que a escala do combate expandiu-se significativamente. Estamos praticamente a falar acerca de uma confrontação entre duas potências nucleares. É aqui que está o perigo.
Alguns analistas e “figuras” políticas consideraram a decisão do presidente Putin de declarar mobilização parcial como sinal da “fraqueza de Moscovo”, “uma reação à contra-ofensiva com êxito do exército ucraniano”, “uma decisão de recorrer a táticas de terra queimada”. Parece-me a mim que este passo significa o começo do fim da operação militar especial da Rússia e a transição para um novo cenário, em que Putin vai estabelecer todos os pontos e dar à Aliança do Atlântico Norte e à Europa a última oportunidade de evitar uma guerra em grande escala. Afinal de contas, Washington, aparentemente, está pronta para lançar um enorme número de pessoas para dentro da fornalha de guerra, para envolver novos países na mesma, como a Polónia e os Estados Bálticos, por exemplo. Contudo, os Estados Unidos não deveriam esquecer que a Rússia tem participado em tais guerras no passado e venceu-as. Não há dúvida de que desta ve a Rússia vencerá novamente desta vez.