Para quem não anda muito por estas lides do software e dos tipos de
licenças que existem parece muito estranho que se tome
posição ideológica sobre coisa tão
intangível e incorpórea. Mas, nesta era das Tecnologias de
Informação (TIs) o estranho seria ficarmos
alheados de uma realidade que faz parte do dia-a-dia de cada
um dos cidadãos desta Europa.
Em tudo... Desde o software que recebe o pedido da mesa no restaurante,
à transferência bancária via Internet, passando pela
conversa amena no sistema de chat ou pelo curriculum que se escreve num
processador de texto, os programas informáticos tocam os destinos de
todos
nós.
Esta é a simples realidade e está ai para durar. No
entanto não somos nós que nos devemos adaptar ao programa, mas
sim, ele
às nossas necessidades. E este é já um ponto
político em que não devemos ceder. Isto porque todo o marketing
envolvido na comercialização destes produtos quer que compremos
compulsivamente e, ainda por cima, algo que por vezes não preenche
todos os nossos requisitos.
Podemos começar por falar de um simples processador de texto,
propriedade de uma qualquer empresa monopolista, gigante tubarão
esperando ansiosamente o total controle sobre todos os tipos de
comunicação e dados (parece cinematográfico mas não
é). Este simples programa. intitulado de word, esconde a
cada tecla que batemos um sem-número de operações
algorítmicas, funções, procedimentos e sub-rotinas.
Operações essas que deveriam estar documentadas para que todos
nós tivéssemos a certeza de que aquilo que o software está
realmente a fazer é aquilo que lhe pedimos e não outra coisa,
como seja o envio de informações e dados pessoais para
processamento por uma qualquer empresa de pesquisa de mercado ou a pura e
simples espionagem sobre os nossos documentos privados. Não há
documentação suficiente, nem sequer é possível
ver essas operações pois o código do software
está já compilado e não é possível
abri-lo a não ser que cometamos um acto
tremendamente ilegal. Outra questão agregada ao
software ser fechado é o facto de obrigar a utilizar sempre
o mesmo programa para abrir o tipo/formato de documento que foi guardado em
disco. Ou seja, ficamos sem acesso aos nossos próprios dados caso
desejemos mudar de processador de texto...
Por contraponto podemos falar de outro processador de texto, que faz
exactamente a mesma coisa e mais um par de botas, abre e guarda
todos os formatos de texto, não custa nada a não ser o tempo de o
instalar, podemos verificar o que o programa faz exactamente olhando para o seu
código, podemos partilhá-lo com amigos, empresa, família e
acima de tudo não nos obriga a registar o nosso nome nem os nossos dados.
-Óptimo, fantástico! Mas porque que eu nunca ouvi falar
nisso? - pergunta o leitor.
Fácil de responder. Imaginemos um grupo gigantesco de especialistas
informáticos que, num laivo de iluminação humanista,
decide construir algo para o bem comunitário, sem o lucro como
objectivo, nem sequer deixando em aberto a possibilidade de um dia mais tarde
aquele bem ser passível de comercialização
selvática. No entanto, como não têm lucro, também
não podem usufruir de um marketing poderoso que faça chegar a
informação das suas magnificas peças de engenharia
informática ao grande mercado de consumidores. Consumidores estes que
continuam a dar dinheiro por software que basicamente é aquilo a que
chamamos vulgarmente de fachada, pois cerca de 80% do investimento
nele é em marketing e não em desenvolvimento. O
XP
, por exemplo,
não é tão bom como se poderia imaginar e nem sequer chega
a metade da produtividade que se pode obter com um Office Software
Livre. (ver exemplos:
http://pt.openoffice.org
,
http://www.koffice.org
).
A COMUNIDADE DO SOFTWARE LIVRE
Estamos a falar da comunidade GNU (
http://www.gnu.org
), que partiu há alguns anos para a aventura em busca do gosto
informático há muito perdido. Sem querer criar uma
indústria de comercialização de software acabou por criar
uma gigantesca plataforma que não só tem o tal processador de
texto, mas tudo o que é necessário para uma grande empresa, bem
como o cidadão comum, poderem funcionar com um PC em total legalidade e
sem restrições de liberdade. Programas de
Manipulação de Imagem, Edição de Vídeo, CAD,
Multimédia, Folhas de Cálculo, Edição Web,
Servidores de Web, E-mail, Sql, Dhcp, Samba, programação em
qualquer linguagem, reconhecimento de todos os tipos de
partições... (e a lista não acaba
http://www.linux.org/apps
). O sistema GNU/Linux é de momento o expoente máximo disto e
bate todos os sistemas operativos proprietários no que toca à
fiabilidade, uptime, escalabilidade, segurança (imune a vírus,
por exemplo), gestão de memória e processador e, mais
recentemente, um uso fácil e prático.
No entanto o termo Software livre não é uma
questão de preço, mas sim uma questão de
liberdade de expressão.
No site da GNU dizem mesmo que não devemos pensar neste tipo de
software como se fosse cerveja grátis. Ao invés deve
o utilizador/leitor deste artigo pensar que ideologicamente é uma
questão de liberdade para poder executar o programa para qualquer
propósito, liberdade de estudar como ele funciona e adaptá-lo
às suas necessidades (por isso o acesso ao código é
tão importante), liberdade de redistribuir cópias e liberdade de
publicar as modificações que efectuou.
"Software Livre" não significa
"não-comercial". Um programa livre deve estar
disponível para uso comercial, desenvolvimento comercial, e
distribuição comercial. O desenvolvimento comercial de software
livre não é incomum; tais softwares livres comerciais
também são muito importantes.
Alguns, de língua mais afiada, e prontos a defender o capitalismo
económico indefensável, diriam logo que o Software Livre
não dá qualquer garantia e suporte...
Seria de facto muito interessante se quando se adquire um software
proprietário se tivesse a paciência para ler o EULA (End User
Licence Agreement), aquele contrato enorme que aparece na
instalação de um software e ninguém lê.
Acabaríamos por descobrir coisas fantasticamente interessantes como por
exemplo: o que se acabou de adquirir não foi o software, mas sim o
direito intransmissível de o usar (o que significa que lá em casa
só o leitor o pode utilizar), ou que não têm qualquer
garantia sobre danos causados pelo software ou corrupção de
dados... Mas isso é outra história.
O OUTRO LADO DA BARRICADA
Quando, há bem pouco tempo, falava com um técnico de uma empresa
de comunicações portuguesa, acerca de todo o processo de
aprovação, ou não, da Directiva sobre Patentes de Software
no Parlamento Europeu (ver
http://swpat.ffii.org/
), observei uma postura de kill them all, chegando ele a dizer:
O linux tem os dias contados... sem que esse
técnico se apercebesse de que não estava a proteger os interesses
do seu querido target, o cliente, mas sim de uma grande companhia
que é a Microsoft. Para estas empresas do mercado de
telecomunicações seria, e é, mais vantajoso usar software
livre, poupando milhões de Euros. Até mesmo a nossa
Administração Pública, que tanto quer reduzir nos custos,
poderia ver o investimento mal gasto em licenças caríssimas, ser
aproveitado para a compra de hardware mais recente e robusto. Além
destas vantagens económicas, as vantagens de segurança e
manutenção suplantam qualquer dúvida.
No entanto, temos noção que a luta é dura. Os processos em
tribunal em que a Microsoft está envolvida são muitos e,
indirectamente, tenta atacar o Kernel (núcleo) GNU/Linux através
de um processo movido pela SCO contra a IBM. Sabemos claramente que este
processo não é mais do que a tentativa de fazer negócio
com os tribunais.
O software Microsoft Windows é tão ruim que o estado da
Califórnia está a processá-la pelo mau serviço aos
consumidores afirmando: "O domínio total da Microsoft no software
desktop criou um risco global da segurança" (..) "em
consequência do esforço concertado da Microsoft de endurecer e
expandir os seus monopólios, firmemente integrando
aplicações com seu sistema operativo(...) as redes de
computador de todo o mundo são agora susceptíveis de uma falha
global em cascata".
As patentes de software, que os EUA tanto querem ver implementadas na Europa,
levaram um chumbo no Parlamento Europeu no passado dia 24 de Setembro. Contudo,
o ganho que os grandes monopólios têm com patentes, que só
atrasam o desenvolvimento cientifico, são enormes, portanto, continuam a
querer a aprovação da Directiva. Ver uma Europa com um futuro
cheio de grandes processos em tribunal, entraves ao desenvolvimentos de
software ou mesmo o fim do Software Livre é um pesadelo que só a
constante luta dos cidadãos europeus poderá travar. Desde
já convido a assinarem a petição:
http://aktiv.ffii.org/eubsa/en
Primeiro ignoram-te, depois riem-se de ti, a seguir tentam combater-te
até que por fim tu vences!
Mahatma Gandhi
PARTILHAR CONHECIMENTO
Um site muito interessante na web para se perceber as inúmeras
distribuições/sabores existentes é
www.distrowatch.com
. Uma visita a este site dará uma ideia muito interessante da magnitude
de todo o desenvolvimento que tem vindo a ser efectuado, apresentando o ranking
das 100 principais distribuições. De todas essas
distribuições destaco para já quatro:
DEBIAN
http://www.debian.org
Se há distribuição que segue conscientemente a
liberdade de expressão, a internacionalização e a robustez
ela tem um nome: Debian. A Debian vem com mais de 8710 pacotes (programas),
todos eles livres e actualizáveis via web.
MANDRAKE
http://www.mandrakelinux.com
É a distribuição em que escrevo este artigo,
utilizando o OpenOffice. Trás, nos seus três cd's tudo o que se
possa necessitar. Instala-se em menos de 30 minutos e começa logo a
funcionar.
KNOPPIX
http://www.knopper.net/knoppix/index-en.html
Um sistema operativo que corre directamente do CD. Ideal para
administradores de sistemas, para experimentar o GNU/Linux ou para pessoas que
gostam de trazer os seus próprio recursos debaixo do braço.
Não necessita de disco rígido e pode ser usado com um USB
Flashdisk para guardar os documentos, ou mesmo uma disquete...
REDHAT
-
http://www.redhat.com
A RedHat é a primeira grande distribuição a criar
soluções de servidores e que detêm uma grande
reputação pelo seu suporte e formação. Não
admira que muitos leitores conhecedores vejam esta distribuição
como a melhor.
Entre outras distribuições estão a Slackware, a mais
antiga, a
SUSE, que arrebatou 14000 máquinas de trabalho à Microsoft em
Munique, sendo para já o caso de maior impacto na Europa. A China
já criou a sua própria distribuição, REDFLAG e o
Brasil promete continuar a dar muitas cartas com a Conectiva
http://www.conectiva.com.br
. Aqui em Portugal existe a
Caixa Mágica
que, na minha óptica, carece de algum apoio do Estado para um melhor
desenvolvimento:
http://www.caixamagica.pt
. Se o nosso actual governo fosse minimamente inteligente e interessado nos
cidadãos nacionais era por ai que começava...
DOCUMENTAÇÃO.
Outro mito que as empresas monopolistas e os seus serviçais do poder
instituído
tentam fazer passar é de que não há
documentação... Nada mais errado. O GNU/Linux nasceu na Internet
e por isso, nesse meio é mais fácil esbarrar com
documentação sobre GNU/Linux do que sobre outro sistema operativo
qualquer. Um site de referência é o The Linux Documentation
Project
http://www.tldp.org
ou em
http://www.linux.org/docs
. À parte disso todas as aplicações vêm
documentadas, e existe mesmo um comando para consultar o manual de qualquer
aplicação: man.
Quantos somos nós, os utilizadores deste sistema operativo?
Estima-se que esteja na casa dos oito milhões, segundo as
estatísticas e o contador em
http://wiht.co/linux-primer
. Um contador criado por Harald T. Alvestrand que, a 30 de Setembro de 1993,
decidiu dar início a esta árdua tarefa de contar... Bom trabalho,
Harald. Já agora convido o leitor se é utilizador a dar uma
mãozinha e a contabilizar-se no site.
O SOFTWARE TEM SUPORTE TÉCNICO?
A esmagadora maioria dos projectos tem a sua própria página de
apresentação com alguma documentação e a
possibilidade de contactar o(s) programador(es). As próprias
distribuições dão suporte e no caso disto tudo falhar, o
que é muito improvável, posso ajudar.
Estes projectos têm dois sites gigantescos onde encontramos tudo o que
é aplicação. São eles:
FRESHMEAT
www.freshmeat.net
SOURCEFORGE
www.sourceforge.net
FUTURO DO COMPUTADOR
Até agora o Software Livre tem conseguido arrebatar muito do mercado de
servidores. Os casos de maior sucesso de funcionamento sem
interrupções estão registados em
http://uptime.netcraft.com
. Quando este artigo foi escrito o servidor que estava em primeiro lugar era
um FreeBSD (outro Unix) a funcionar com o Apache -
www.apache.org
- e tinha 1645 dias de existência (mais ou menos 4 anos e meio).
Mas enquanto o FreeBSD ainda não tem a simplicidade suficiente para
chegar
à secretária de trabalho, o GNU/Linux está já a ser
instalado por todo o lado, seja em servidores, seja em máquinas
pessoais. Prova disso são os artigos e troca de opiniões em
http://www.desktoplinux.com/
.
Mais impressionante é a quantidade de dispositivos que hoje em dia
já
trazem GNU/linux como sistema base. Uma visita a
http://www.linuxdevices.com
deixará muitos impressionados, quando virem as
utilizações actuais deste sistema operativo: Desde um simples
relógio de pulso a uma pilotagem remota de um avião, passando
pelos comuns routers, PDA, Telefone (Voice-over-IP), leitores de DVD... Bom.
Largas à imaginação!
Para já e até ao próximo artigo, aqui ficam algumas
imagens de um ambiente de trabalho em GNU/Linux (clique para ampliá-las).