Um choque petrolífero em 2012?
O preço do petróleo está novamente nas notícias
diárias. A referência da Europa ocidental, o Brent, pairou
próximo dos US$100/barril durante grande parte do mês passado e a
IEA
(International Energy Agency, da OCDE)
está outra vez a advertir quanto ao peso do consumo de petróleo.
Será isto um anúncio de coisas que estão para vir? Ou uma
mera
anomalia estatística num mercado que está bem abastecido? Como
serão os acontecimentos nos mercados de petróleo daqui a um ano
ou dois?
Certamente, os preços do petróleo subiram devido à forte
procura, a qual em parte é estrutural e em parte transitória. O
hemisfério Norte assistiu a um Inverno extremamente frio, levando a uma
utilização acrescida do óleo. E a economia global
está a recuperar de uma recessão profunda, com a procura a saltar
novamente do fosso recessivo. Estes são, em certa medida, eventos
passageiros. Mas em muitos aspectos, os preços acrescidos reflectem
fundamentalmente uma procura de petróleo que está a crescer mais
rapidamente do que a oferta.
Na verdade, o crescimento recente da procura foi descrito como
"espantoso". Se bem que não seja inesperado na nossa
perspectiva, o crescimento da procura ainda é impressionante. Segundo a
EIA (Energy Information Administration], o consumo mundial de líquidos
de petróleo subiu para 2,8
milhões de barris por dia, isto é 3,2%, nos três meses
até Janeiro/2011, em comparação com os mesmos três
meses um ano antes. Embora isto seja um número elevado, não
é sem precedentes. Nos doze anos até 1972, o consumo mundial de
petróleo aumentou em 30 milhões de b/d, o que representa um
crescimento da procura de 150% ao longo do período e um crescimento
médio anual de 2,5 milhões de b/d em termos de volume.
E a procura aumentou em 7-8 milhões b/d nos três de
recuperação a seguir ao choque petrolífero de 1973 e
à recessão de 2001. (Estas recessões foram possivelmente
as mais comparáveis a esta recente. Depois de 1973, o mundo ocidental
ainda continuava o processo de motorização e portanto a procura
recuperou-se rapidamente. Isto também foi verdadeiro depois de 2001,
quando a China fez o seu primeiro impacto nos mercados globais de
petróleo). Hoje, tal como após 1973 e 2001, o ritmo de
motorização continua na verdade, acelerou-se no
mundo em desenvolvimento e portanto o crescimento da procura a um ritmo de 2,5
milhões b/d por ano até 2012 não ser surpreendente.
Nem tão pouco o crescimento da procura de petróleo em
comparação com outras fontes de energia deveria ser uma surpresa.
O consumo de gás natural e de carvão aumentou em 3,2% e 5,1% por
ano, respectivamente, desde 2002 até 2008, o início da
recessão. É difícil imaginar que o consumo de
petróleo ficasse para sempre atrás de outras fontes de
combustíveis se o petróleo estivesse disponível.
E estava disponível em 2010. Segundo a EIA, a oferta de petróleo
aumentou em 2,1 milhões b/d nos três meses concluídos em
Janeiro/2011, em comparação com o mesmo período do ano
anterior. Os líquidos não-OPEP contribuíram com 1
milhão b/d para isto, consistindo primeiro nos EUA (+0,4 milhão
b/d), China (+0,3), antiga URSS (+0,3%), Brasil (+0,2) e Índia (+0,1),
compensando declínios de produção, nomeadamente no Mar do
Norte (-0,4) e México (-0,2). A equilibragem do aumento veio da OPEP,
com líquidos de gás natural (NGLs) a contribuírem
aproximadamente com 1 milhão b/d e o bruto uns modestos 0,2
milhão b/d
Ainda assim, ao longo do período, a oferta atrasou-se em
relação à procura em 635 mil barris por dia nos
últimos três meses comparados com o ano anterior e isto é
isto que mostram os preços, os quais ascenderam US$8/barril durante o
período.
O que deveríamos esperar, prospectivamente? As previsões da IEA,
EIA e OPEP para o crescimento da procura em 2001 caem no intervalo dos 1,4-1,7
milhão b/d. Mas as expectativas da IEA e EIA foram baixas em talvez um
milhão de barris no ano passado e elas podem estar baixas outra vez numa
quantidade semelhante. Com tanto na análise técnica como
histórica, o crescimento da procura da ordem dos 2,4 milhões b/d
em 2011 e 2012 parece mais provável.
O gráfico abaixo mostra a diferença entre o ponto de vista da EIA
e o nosso. A EIA vê uma ruptura na linha de tendência recente, com
crescimento em 2011 e 2012 literalmente pela metade do de 2010, o primeiro ano
de plena recuperação económica. Em contraste, pensamos que
a recuperação ganhará velocidade este ano e que nenhuma
ruptura real será verificada no mundo em desenvolvimento, nomeadamente a
China. Portanto, pressões sobre a procura nos próximos dois anos
são antecipadas analogamente a 2010 e à semelhança das
recuperações de recessões comparáveis no passado.
Em consequência, nossa previsão é mais elevada do que a da
EIA. No fim de 2012, a diferença entre a nossa previsão e a da
EIA totaliza 1,75 milhão b/d, com o pico da procura atingindo 92
milhões b/d em alguns meses.
Do lado da oferta, a perspectiva da EIA parece plausível. Em 2011 e
2012, a produção da OCDE é estabelecida em declínio
quase o tempo todo, embora apenas ligeiramente. A oferta da antiga URSS
será essencialmente constante e o Brasil acrescenta-se modestamente
à oferta dos "outros não-OCDE". O Brasil deveria, e o
Azerbaijão e Casaquistão poderiam, concebivelmente apresentar
melhores números do que o previsto. Mas na generalidade, os
números da EIA parecem defensáveis. Em consequência, a OPEP
deve aumentar a produção para atender à procura
incremental e a EIA vê a produção de petróleo da
OPEP a aumentar em 0,7 milhão b/d em 2012 e uma quantidade semelhante em
2012. A fatia do leão disto é presumivelmente do Iraque;
portanto, a previsão da EIA quanto à oferta depende de o Iraque
apresentar dois anos excelentes do começo ao fim. Isto poderia ser
considerado razoavelmente optimista o Iraque aumentou a
produção em 0,3 milhão b/d em 2010 mas não
impossível. A contribuição do Iraque, contudo, é
absolutamente valiosa.
Com a nossa perspectiva da procura indo à frente da da EIA e a nossa
perspectiva da oferta alinhada, presumivelmente a diferença seria
constituída por reduções em capacidade de reserva quando a
OPEP elevar a produção. E na OPEP, só a Arábia
Saudita importa. Em Janeiro de 2011, a Arábia Saudita representou 78%
3,65 milhões b/d da OPEP e, como questão
prática, das reservas de produção global. Quanto desta
capacidade realmente existe? Durante a subida do preço do
petróleo de 2008, a Arábia Saudita nunca comprometeu o
último milhão de barris da sua capacidade nominal. Muitos
observadores, incluindo o autor, acreditam que faltou capacidade ao reino
saudita ele nada reteve do mercado. Se aplicarmos a mesma métrica
às reservas hoje declaradas de produção saudita, o seu
excesso de capacidade podia ser apenas de 3 milhões b/d ou talvez um
bocado menos.
Como o reino saudita comprometerá esta reserva? Muitos observadores
acreditam que os sauditas nunca bombearão mais de 10 milhões b/d
apenas 1,4 milhão b/d do que produz hoje. Esta crença
baseia-se na história. A produção saudita nunca se
sustentou acima dos 10 milhões b/d. Alguns duvidam que a Arábia
Saudita possa elevar os volumes de produção e, na verdade,
documentos recentes da WikiLeaks lançam dúvidas sobre as reservas
sauditas e limites de produção. Nenhum destes argumentos é
inteiramente convincente. É verdade que muitos dos novos
desenvolvimentos no reino são relacionados ou a petróleos pesados
ou os do offshore, de recuperação aperfeiçoada ou de
gás natural. Nada disto é sugestivo quando a um país no
qual alguém podia espetar uma palha no chão e extrair
petróleo
light sweet
sem esforços. Contudo, quando os sauditas foram pressionados antes da
recessão, eles foram capazes de aumentar em dois milhões de
barris de capacidade em prazo relativamente curto e a um custo comparativamente
modesto. A Arábia Saudita não é mais um Iraque um
recurso subdesenvolvido mas com 260 mil milhões de barris de
reservas provadas, o reino ainda é um produtor formidável capaz
de elevar a produção se o seu interesse nacional assim o ditar.
Entretanto, os sauditas, tendo produzido agressivamente durante mais de meio
século, podem visionar um futuro, talvez daqui a setenta anos, em que os
recursos do país estarão em grande medida esgotados. Se a
Arábia Saudita ainda não chegou à metade do caminho quanto
aos seus recursos petrolíferos, está bastante próxima de
verificar que eles são finitos. Esta perspectiva pode ter levado o Rei
Abdullah a ordenar em 2008 a "deixá-lo no chão, por
Alá, nossos filhos precisarão dele". Em consequência,
o reino pode estar relutante em aumentar a produção. Certamente
é razoável afirmar que os sauditas prefeririam preços mais
elevados a volumes de produção mais elevados e o ambiente
actual parece que provavelmente será nesse sentido. Assim, tanto a
visão a longo prazo como os preços do petróleo
expectáveis podem encorajar o país a limitar a
produção.
Será, então, que a capacidade reserva nominal da Arábia
Saudita pode ser tomada pelo seu valor facial? Ninguém, provavelmente
nem mesmo os sauditas, sabe com certeza. Contudo, para objectivos
políticos, uma abordagem conservadora assumiria que os sauditas
não excederão os 10 milhões b/d e que, com base no seu
historial, uma capacidade efectiva de mais de 11 milhões b/d não
deveria ser assumida.
Em consequência, a capacidade de reserva efectiva no sistema global
deveria ser considerada de 1,4 a 2,3 milhões b/d menos do que os 4,65
milhões b/d relatados pela EIA. Consequentemente, não pode haver
mais do que 2,25 a 3,25 milhões b/d, no essencial tanto quanto o
crescimento da procura global no ano passado. Isto não é
demasiado.
Além disso, se ligarmos a capacidade de reserva reduzida com a nossa
previsão de procura acrescida, então a capacidade
excedentária efectiva é consumida num ritmo rápido. Em
meados de 2012, a capacidade de reserva poderia estar tão baixa como 1
milhão b/d ou até menos, se os sauditas decidirem limitar a
produção a 10 milhões b/d. Em certa medida, estes
desenvolvimentos poderiam ser evitados por reduções de stocks e,
na verdade, a EIA prevê reduções de stocks que rondam um
quarto de milhões de b/d em 2012 para sustentar a capacidade de
produção de reserva. Tais reduções não
são sem precedentes ou inabituais em si próprias, mas elas
constituem outro factor a sugerir mercados tensos. Em qualquer evento, quando a
capacidade excedente cai abaixo de um milhão de barris por dia, um
choque petrolífero não pode ser excluído. Portanto, no
melhor caso, o mundo está a deparar-se com mercados de petróleo
tensos em 2012; no pior caso, o país pode estar a encaminhar para outro
choque petrolífero e recessão.
Para decisores políticos, isto tem um grande número de
implicações. Para começar, sugere que a Arábia
Saudita terá uma influência material nas eleições
dos EUA de 2012. O reino saudita será capaz de criar preços de
petróleo constrangedores não só pela
contenção de produção como pela sua
libertação de forma demasiado lenta. Portanto, a natureza e
qualidade das relações dos EUA como o reino saudita
importará. Isto também sugere que um choque petrolífero
é provável em 2013, mesmo se os EUA forem bastante felizes para
escapar de um em 2012. Tais choques estão tipicamente associados com
recessões, as quais implicaria desemprego acrescido, défices
orçamentais crescentes e possivelmente mais pressão sobre os
preços habitacionais e o sector financeiro. Os analistas
políticas precisam examinar os números para anteciparem a queda
potencial e procurarem mitigar efeitos adversos na medida do possível.
14/Fevereiro/2011
Do mesmo autor:
A primeira recessão do Pico Petrolífero
, 15/Set/2009
[*]
Responsável da Douglas-Westwood, consultores de negócios em
energia. A firma apoia fornecedores de serviços energéticos com
pesquisa de mercado, desenvolvimento estratégico e diligências
comerciais. O autor é o único responsável pelas
opiniões expressas neste artigo.
O original encontra-se em
http://www.aspousa.org/index.php/2011/02/an-oil-shock-in-2012/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
.
|