Quem recorre a escudos humanos:
o Hamas ou Israel?

por Domenico Losurdo

. Nestes dias, na tentativa de desviar a indignação da opinião pública do massacre da população civil perpetrado pelos bombardeamentos da aviação israelense, uma campanha nos vários meios de comunicação, claramente planeada em Tel Aviv, repete incessantemente o seguinte argumento: sim, é verdade, mulheres e crianças palestinas são assassinadas e martirizadas em massa pelas bombas israelenses (e americanas), até com armas proibidas pelas convenções internacionais, mas a culpa toda é... do Hamas, que se serve de mulheres e crianças como escudos humanos.

Mas eis aqui um comentário no International Herald Tribune de 22 de Junho de 2006, escrito por Haim Watzman, que antes havia servido nas fileiras do exército de Tel Aviv:

"Há nove meses o Supremo Tribunal de Israel proibiu o exército israelense de usar civis (palestinos) como escudos humanos para invadir casas onde se julgavam estar combatentes palestinos. Na semana passada o diário israelense Haaretz afirmou que a consequência desta decisão foi pôr os civis palestinos numa situação de ainda maior perigo: os soldados já não entram nas casa para procurar os seus alvos; o exército usa bulldozers para demolir as casas com as pessoas no interior".

Assim, ficamos a saber de fonte insuspeita que os primeiros a usar como escudos humanos os Untermenschen (sub-humanos) palestinos são os próprios que hoje pretendem marcar como bárbara a resistência. O exército de Tel Aviv parou de utilizar esta técnica apenas para poder sepultar mais rapidamente e sem distinções as suas vítimas.

E todavia, a julgar pela campanha que se desenrola nos meios de comunicação, não é lícito pôr em dúvida a verdade oficial, segundo a qual o recurso à utilização de escudos humanos é uma prática utilizada apenas pelos bárbaros do Hamas, pelos palestinos, pelos árabes e islâmicos de todo o tipo, incapazes de compreender o valor da vida humana.

Como explicar o êxito deste estereótipo? Poucas semanas antes do início da operação Barbarossa, surpreendido pela destemida resistência encontrada na União Soviética pelo exército hitleriano, a 11 de Agosto de 1941, Goebells anota no seu diário: "Para os russos a própria vida tem apenas um valor subordinado, vale menos que uma limonada. Assim, renunciam à vida sem se lamentarem. Isto explica em grande parte a obtusa resistência que os bolcheviques opõem ao ataque alemão".

Nos grandes meios de "informação" italianos e ocidentais Goebells celebra por estes dias o seu póstumo triunfo.

(Para um mais amplo tratamento dos temas aqui abordados remeto para o meu livro " Il linguaggio dell'Impero" "A linguagem do Império", Laterza, 2009).

O original será publicado em http://domenicolosurdo.blogspot.com/ Traduzido por João Camargo.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

19/Jan/09