por
Monthly Review,
editorial
Andre Gunder Frank, um dos principais cientistas sociais radicais do fim do
século XX e durante longo tempo amigo e colaborador da Monthly Review e
da Monthly Review Press, morreu em 23 de Abril de 2005, aos 76 anos.
Frank (tratado pelos seus amigos como Gunder) nascera em Berlim em 24 de
Fevereiro de 1929. Seu pai, um pacifista e novelista que se opunha à
ascensão do movimento nazi, levou-o para um internato
suíço quando ele tinha quatro anos de idade. Em 1940-41 ele veio
para os Estados Unidos, primeiro para Hollywood e depois Gunder ficou com a sua
mãe em Ann Arbor, Michigan. Estudou ciências económicas no
Swarthmore College, na Pennsylvania, abraçando a perspectiva keynesiana.
Em 1950, sem perceber onde se estava a meter, inscreveu-se no programa Ph.D em
económicas na Universidade de Chicago, onde teve como professor nada
mais nada menos que Milton Friedman. Descobrindo-se num tugúrio de
economistas de extrema-direita, ele esforçou-se por passar todos os seus
exames com distinção, mas rejeitou muito do que lhe estavam a
ensinar. O departamento de ciências económicas de Chicago
respondeu enviando-lhe uma carta em que o aconselhava a abandonar devido
à sua "incompatibilidade" com o seu programa.
Estudou económicas por algum tempo na Universidade de Michigan, antes de
abandoná-la totalmente, como escreveu posteriormente, a fim de tornar-se
"um beatnik no café Vesuvius na Praia Norte de San Francisco antes
de Jack Kerouac ter chegado ali
On the Road
", e a seguir reentrou na Universidade de Chicago pela porta do cavalo,
através do centro de investigação Bert Hoselitz sobre
Desenvolvimento Económico e Mudança Cultural. Acabou por
escrever uma dissertação para departamento de económicas
de Chicago sobre a produtividade na agricultura e indústria
soviética. Durante a sua elaboração passou um
verão a investigar em Kiev, na Ucrânia. Mas ele estava mais
interessado nas questões levantadas por Hoselitz e outros sobre o
relacionamento entre desenvolvimento económico e mudança cultural
e acabou por gastar a maior parte do seu tempo em Chicago em
associação e aprendizado junto a antropólogos, mais do que
com economistas.
Em 1960 decidiu descobrir por si mesmo as condições no terceiro
mundo e visitou Cuba brevemente após a revolução, assim
como viajou à Gana de Nkrumah. Posteriormente abandonou um cargo que
havia assumido como professor assistente de económicas na Michigan State
University e transferiu-se para a América Latina, principiando pelo
México. A partir dali, via Peru e Bolívia, chegou ao Chile onde
encontrou a sua futura esposa e colaboradora, Marta Fuentes.
Ali, bem como no Brasil e no México, efectuou o seu trabalho mais
importante, publicando o ensaio "O desenvolvimento do
subdesenvolvimento" no número de Setembro de 1966 da
Monthly Review,
bem como o seu livro muitíssimo influente
Capitalismo e subdesenvolvimento na América Latina,
publicado pela Monthly Review Press em 1967. Nestas obras, estreitamente
relacionadas com
A economia política do crescimento,
de Paul Baran (Monthly Review Press, 1957), mas enraizadas num estudo
minucioso das condições latino-americanas, argumentou que a
abordagem reformista de quase todas as teorias do desenvolvimento estava
errada. "O Subdesenvolvimento", escreveu ele no seu artigo
clássico de 1966, "não é devido à
sobrevivência de instituições arcaicas e à
existência de escassez de capital em regiões que permaneceram
isoladas do fluxo da história mundial. Ao contrário, o
subdesenvolvimento era e ainda é gerado pelos mesmos processos
históricos que também geraram desenvolvimento económico:
o próprio desenvolvimento do capitalismo". Nesta visão, o
que estava a ser reproduzido juntamente com o desenvolvimento dos estados no
centro da economia capitalista mundial era o subdesenvolvimento e sob
circunstâncias normais a subordinação permanente daqueles
estados na periferia.
A análise de Frank, juntamente com todo o corpo de trabalhos
provenientes do terceiro mundo, constituía aquilo que viria a ser
conhecido como teoria da dependência e apontava para a necessidade da
revolução social naqueles países que experimentavam o
desenvolvimento do subdesenvolvimento. O seu artigo "O desenvolvimento do
subdesenvolvimento" na
MR
foi encarado pelo governo americano como uma ameaça ao seu
império nas América e foi-lhe enviada uma carta do Procurador
Geral do EUA a dizer-lhe que não seria permitida a sua reentrada nos
Estados Unidos. Esta decisão acabou por ser revogada em 1979 quando o
senador Edward Kennedy (D-Mass) interveio a fim de permitir que ele e Ernest
Mandel, o autor de
Teoria económica marxista
(Monthly Review Press, 1968) lecionassem num seminário na Universidade
de Boston.
Daí em diante, durante muitos anos, Frank teve o papel de intelectual
mundial itinerante. Em 1976 publicou
Genocídio económico no Chile: Equilibrium à ponta de
baioneta,
em resposta à viagem do seus antigos professores da Universidade de
Chicago, Milton Friedman e Arnold Harberger, ao Chile a fim de aconselhar o
governo militar de Pinochet que se seguiu ao sangrento golpe contra o governo
socialista de Allende. Na década de 1970 devotou-se basicamente
à análise da crise da economia mundial e ao que viria a ser
conhecido como sistema da análise mundial, na qual foi um pioneiro e um
dos mais destacados criadores até ao presente. Um marco quanto isto foi
o seu
Acumulação mundial, 1492-1789
(Monthly Review Press, 1978).
Estamos a publicar neste número da MR uma curta homenagem a Gunder, do
seu e nosso amigo Samir Amin. Aqueles que pretenderem mais
informação acerca dele e da sua obra estão convidados a
ver o seu sítio web em
http://rrojasdatabank.info/agfrank
.
Nota: O último artigo que Gunder Frank publicou em vida, "A
ascensão
vertiginosa da dívida externa dos EUA e o declínio do
dólar americano", está em resistir.info:
http://resistir.info/varios/gunder_frank_dolar.html
O original encontra-se em
http://www.monthlyreview.org/nfte0605.htm
Este in memoriam encontra-se em
http://resistir.info/
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