AS SIRENES DE BAGDAD

por César Príncipe [*]

Bagdad, ataque ao bairro de Al-Ahmadiya Senhores do Mundo
Estamos aqui
Precisamente no Mundo
Neste local difícil para viver
Na hora a que as sirenes soam
Em Bagdad
Em Lisboa Em Nova Iorque Em Buenos Aires Em Ancara

E vós julgais
Senhores do Mundo
Que nós fugimos
Mas estamos aqui
Em Bagdad
Em Londres Em Sydney Em Nova Deli No Cairo

E vos pensais
Senhores do Mundo
Que não resistiremos a tantos bombardeamentos
Em Bagdad
Em Paris Em Moscovo Em Pequim Em Jerusalém

Vós ousais convencer os mortos de que serão libertados
Em Bagdad
Em Roma Em Manila Em Havana Em Argel

Vós proclamais a inteligência das armas
Em Bagdad
Em Bruxelas Em Wellington Em Brasília Em Carachi

Vós prometeis aos soldados flores nos desertos
Em Bagdad
Em Viena Em Caracas Em Kuala Lumpur Em Rabat

Mas nós estamos aqui
Mas nós resistimos

Apesar dos que vendem as memórias e as astúcias
Ao compasso das legiões
Apesar dos que são vencidos antes de combater
Deixando-se enredar nas seduções dos Impérios
Em Bagdad
Em Saigão Em Estocolmo Em Pretória No Kuweit

Vós não pertenceis à Humanidade dos Jardins Suspensos
Vós não habitais a Cidade das Mil e Uma Noites
Em Bagdad
Em Helsínquia Em Otava Em Santiago Em Gaza

Vós sois inimigos dos berços da Terra
Em Bagdad
Em Belgrado Em Tóquio Em Lima Em Cartum

Vós Senhores do Mundo
Desconheceis que sois pobres e tristes
Porque as multidões não vos reconhecem como filhos do sol
Em Bagdad
Em Seul Em Madrid Em El Salvador Em Amã

Soam as sirenes
Senhores do Mundo
Mas é por vós que dobram os sinos de Hemingway

Nós temos a certeza de que desconfiais
De todas as areias e de todas as águas
Nós temos a certeza de que não cantareis vitória sem medo
Nós temos a certeza de que jamais olhareis os vizinhos de frente

Senhores do Mundo
Pisais as terras da Mesopotâmia
Mas antes de vós outros as pisaram
Muitos cobiçaram o solo e o subsolo
da Antiga Capital do Mundo

Ó areais e rios
Da Suméria Da Acádia Da Babilónia Da Assíria
Pisados e atravessados
Por persas e gregos Selêucidas e romanos Partos e sassânidas
E por tantos mais
Bizantinos Omíadas Abássidas Mongóis Safévidas
E por tantos sempre
Otomanos Ingleses Americanos

E se tudo isto vos recordamos
Senhores do Mundo
É por pena do vosso poder
O poder que já foi de Ciro Alexandre e Tamerlão
Em Bagdad
A cidade que aprisionou Valeriano
O imperador de Roma

Estamos aqui
E resistiremos

Com paciência

Explicando aos vossos generais
Onde fica o Iraque
Onde desagua o Tigre
Onde desagua o Eufrates

Precisamente aqui
Entre o Atlântico e o Pacífico

Diremos aos Senhores do Mundo
Vós possuís arsenais
Para destruir mil vezes a Vida
Vós procurais desarmar quem vos afronte
A fim de tranquilizar as hordas do Oeste

Ficai pois a saber
Que não nos deixaremos amedrontar
Pelas vossas razões
E que sereis derrotados
Hoje Amanhã Depois de amanhã

Aqui
Em Bagdad
Onde soam as sirenes

[*] Jornalista.

Este poema encontra-se em http://resistir.info .

02/Abr/03