O arrogante caminho para a guerra
Fomos advertidos acerca deste caos
Quão arrogante foi o caminho para a guerra. Como o presidente Bush
agora tenta desesperadamente bajular o velho jumento da ONU a fim de que o
salve do Iraque ele que nos advertia que a ONU corria o perigo
de transformar-se num "clube de conversas" tipo Liga das
Nações se se recusasse a legitimá-lo na sua invasão
somos supostos acreditar que ninguém em Washington podia ter
adivinhado o futuro.
Os srs. Bush e Blair fantasiaram sua estrada para a guerra com todas aquelas
míticas armas de destruição em massa e
"ameaças iminentes" do Iraque seja da variedade 45
minutos ou não e da "libertação",
"democracia" e mudança de mapa no pós-guerra que iriam
conceder à região. Mas o registo mostra apenas quantas
advertências a administração Bush recebeu de pessoas
sãs e decentes nos dias que antecederam o mergulho nesta terrível
aventura.
Tomem-se as audiências no Comité de Relações
Exteriores do Senado, em Washington, na véspera da guerra. O assistente
do subsecretário Douglas Feith, um dos "neo-cons"
[neoconservadores] de Rumsfeld, revelou que só três semanas antes
havia sido aberto um gabinete para o "planeamento do
pós-guerra". Ele e o subsecretário de Estado Marc Grossman
admitiu que o Pentágono estivera "a pensar" acerca do
pós-guerra no Iraque durante 10 meses. "Há enormes
incertezas", disse Feith. "O máximo que se pode fazer em
planeamento é desenvolver conceitos".
Os senadores americanos na altura ficaram altamente suspeitosos acerca destes
"conceitos". Quando o democrata Joe Biden perguntou se alguém
na administração Bush havia planeado o governo do
pós-guerra no Iraque, Grossman respondeu que "Há coisas nos
nosso país que não estamos a ser capazes de fazer por causa do
nosso compromisso no Iraque". Richard Lugar, o presidente republicano
perguntou então: "Quem governará o Iraque e como? Quem
proporcionará segurança? Por quanto tempo podem as tropas
americanas concebivelmente permanecer ali? Terão as
Nações Unidas algum papel?"
O ex-general Anthony Zinni, outrora o homem principal no US Central Command e
com experiência de "manutenção da paz" no Kosovo,
Somália e (em 1991) norte do Iraque sentiu que algo cheirava mal e disse
isso em público. "Queremos nós transformar o Iraque ou
apenas transformar o regime inaceitável de Saddam Hussein numa
nação razoavelmente estável? A
transformação implica mudanças significativa nas formas de
governação. Não será certamente uma democracia
espontânea..."
Zinni falou do longo e duro caminho rumo à reconstrução e
acrescentou com irónica visão do futuro que
"isto não se resolve com um punhado de pessoas que saem do
Pentágono, apanham um avião e chegam ao local logo após a
paz para tentar consertar esta coisa".
Mas, incrivelmente, foi exactamente o que aconteceu. Primeiro foi Jay
"encolha-a-sua-barriga-e-diga-estou-orgulhoso-de-ser-um-americano"
Garner, e a seguir o famoso perito em "anti-terrorismo" que fracassou
em Bagdad na contratação e a seguir recontratação
do exército iraquiano e então confrontado com um americano
morto por dia (e 250 soldados americanos feridos só no mês de
Agosto) recontratar os bandidos assassinos dos centros de tortura de
Saddam para ajudar na batalha contra o "terrorismo". O Iraque,
admitiu delicadamente Bremer na semana passada, precisará de
"várias dezenas de milhares de milhões" de
dólares apenas no próximo ano".
Não é de admirar que Rumsfeld continue a contar-nos que tem
homens "suficientes" no Iraque. Dezasseis das 33 brigadas de combate
dos EUA estão agora no caldeirão do Iraque cinco outras
estão instaladas no ultramar e a 82nd Airborne, com dificuldade
para sair do Afeganistão (onde cinco outros soldados americanos foram
mortos no último fim de semana) está prestes a ser instalada no
norte de Bagdad. "Eles que venham", zombou Bush das guerrilhas
inimigas no mês passado. Bem, elas tomaram a sua palavra ao pé da
letra. Não há até agora um grama de evidência de
que a última fantasia da administração Bush
"milhares" de combatentes islâmicos estrangeiros da
"jihadi" a fluírem para dentro do Iraque a fim de matar
americanos seja verdadeira.
Mas isto pode vir a acontecer dentro em breve. E o que lhes dirá
então? Não foi o Iraque invadido para destruir o terrorismo ao
invés de recriá-lo? Dizem-nos que o Iraque estava a ser
transformado numa democracia e subitamente está a ser um campo de
batalha para mais "guerra contra o terror". A América, diz
agora Bush ao seu povo, "está a confrontar terroristas no Iraque e
no Afeganistão... assim nosso povo não terá de enfrentar
violência terrorista em Nova York ou... em Los Angeles". De modo
que isto é assim. Tirem todos estes asquerosos terroristas do nosso
muito amado Iraque "libertado" e eles gentilmente deixarão a
"pátria" livre. Assombra-me.
Mas perceba-se, também, como tudo é baseado nos custos para a
América, para o sangue americano. Um comentador americano, Rosie
DiManno, escreveu esta semana que no Iraque "Há também o
outro custo, um custo que é medido em vidas humanas... um americano
morto por dia desde que Bush declarou acabado o grande combate". Note-se
aqui como o sangue dos iraquianos a quem estávamos desesperados
por libertar seis meses atrás desapareceu da narrativa.
Acredita-se que mais de 20 inocentes civis iraquianos estejam a morrer por dia
em assassínios, mortes por vingança, em postos de controle
americano e eles já não contam mais. Não é
de admirar que jornalistas agora tenham de pedir permissão às
autoridades de ocupação para visitar hospitais de Bagdad. Quem
saberá quantos cadáveres eles encontrarão na morgue?
"Os comunicados de Bagdad são atrasados, insinceros, incompletos.
As coisas estão muito pior do que nos dizem... Estamos hoje não
muito longe de um desastre". O escritor estava a descrever o
desmoronamento da ocupação britânica do Iraque, sob ataque
de guerrilha em 1920. Seu nome era Lawrence da Arábia.
[*]
Robert Fisk é repórter de
The Independent
e autor de
Pity the Nation
. Ele contribuiu para o livro
The Politics of Anti-Semitism
, de Cockburn e St. Clair.
O original encontra-se em
http://www.counterpunch.org/
. Tradução de JF.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info
.
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