Conferência alargada em Madrid :
As forças anti-bélicas europeias tomam uma posição clara contra a guerra americana

John Catalinotto [*]

Bombas da US Air Force sobre o Iraque.  São transportadas por mísseis ditos 'inteligentes'. O que dizer da inteligência dos que os comandam? A planeada agressão dos Estados Unidos contra o Iraque foi condenada numa importante conferência internacional realizada em Madrid de 16 a 17 de Novembro. Foi o primeiro encontro internacional convocado depois das eleições norte-americanas, da resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que impôs a ida dos inspectores ao Iraque, e do importante protesto contra a guerra em Florença, Itália.

Este Encontro Internacional Contra a Guerra em Solidariedade com o povo iraquiano foi organizado pela Campanha Espanhola pelo Levantamento das Sanções Impostas ao Iraque. Neste encontro, adoptou-se uma contundente declaração condenando os planos americanos de lançar uma guerra contra o Iraque e denunciou-se a Resolução 1441 das Nações Unidas como um "sinal verde" à agressão americana.

A conferência reflectiu várias posições no que concerne à guerra: sentimento generalizado das massas contra a guerra, em especial na Europa e no Médio Oriente; um novo e crescente movimento contra a guerra nos Estados Unidos; e oposição na classe dominante europeia à hegemonia dos Estados Unidos na cena mundial, aplicada pelo Pentágono.

UM MILHÃO PROTESTAM NA EUROPA

A manifestação que reuniu entre 750 mil a 1 milhão de pessoas em Florença no dia 9 de Novembro, foi um marco de referência para os oradores e para a sua audiência. Mais de 600 pessoas participaram ao longo de dia e meio de discussões.

Antes de 9 de Novembro, o movimento anti-globalização europeu não havia tomado uma posição clara em relação à guerra norte-americana contra o Iraque. Os partidos social-democratas "que na Europa lideram frequentemente governos imperialistas" têm exercido a sua influência nos fóruns sociais como o de Florença, e evitado que uma posição tão claramente anti-imperialista fosse tomada.

Mas em 9 de Novembro, a vontade das massas era de tal modo contra a guerra que as únicas exigências foram para que o governo dos EUA desistisse de lançar uma guerra contra o Iraque. Ninguém pediu aos iraquianos que se desarmassem primeiro. Este encontro do Fórum Social Europeu também anunciou planos à escala europeia para mais um dia de acções contra a guerra a decorrer em todas as capitais europeias no dia 15 de Fevereiro.

Oradores de Marrocos como Mohammad Basri da União das Forças Socialistas Populares (UFSP), alguns dos quais ajudaram a organizar uma marcha de solidariedade com a Palestina com 3 milhões de pessoas em Rabat, na Primavera passada, salientaram o papel dos Estados Unidos no Médio Oriente.

O deputado do Partido Trabalhista Britânico, George Galloway, um líder do movimento em defesa do povo iraquiano, atacou o governo de Tony Blair em Londres por ser bajulador de Washington. O movimento britânico contra a guerra juntou 400 mil pessoas no passado dia 28 de Setembro em Londres para protestar contra a guerra e em solidariedade com a Palestina. Alguns dos maiores protestos na Europa ocorreram em países cujos governos prostaram-se diante dos planos norte-americanos. Na Grã-Bretanha de Blair, na Itália do magnata dos media Sílvio Berlusconi e mais recentemente no estado espanhol de José Maria Aznar.

Michel Collon, do jornal belga Solidaire atacou especificamente o que chamou de problema "Ni-ni" (nem-nem em francês) do movimento pacifista europeu. Quando o slogan é "Nem [Slobodan] Milosevic [da Jugoslávia] nem NATO, nem Washington nem os Taliban, nem Saddam Hussein nem George W. Bush", o movimento fica logo paralisado devido ao signo de equivalência colocado entre o opressor e o oprimido. O argumento de Collon para uma clara posição de oposição a qualquer intervenção imperialista obteve uma forte resposta positiva da audiência.

Muitos oradores de diferentes partes do estado espanhol, representando sindicalistas, activistas políticos — a maioria provenientes da Esquerda Unida —, intelectuais e outros dirigiram o seu criticismo aos Estados Unidos e ao governo de Aznar.

MOVIMENTO CRESCENTE CONTRA A GUERRA DOS EUA

Os organizadores da Conferência demonstraram a importância de convidar representantes da resistência dos próprios Estados Unidos. O antigo Procurador Geral dos Estados Unidos, Ramsey Clark, não podendo estar presente, enviou uma mensagem de solidariedade. Clark condenou a Resolução 1441 das Nações Unidas, descreveu os Estados Unidos como uma plutocracia, e indicou a luta popular como o único meio que resta hoje para impedir a Administração Bush de lançar o mundo no caos e evitar o impacto que isso teria nas gerações futuras.

Pelo Centro de Acção Internacional, John Catalinotto, discutiu o documento da administração Bush "Estrátegia de Segurança Nacional" enquanto prova que a guerra norte-americana não tem nada a ver com Saddam Hussein ou com o terrorismo, mas foi motivada para estabelecer a hegemonia imperialista dos Estados Unidos pelo mundo inteiro, incluindo sobre os seus rivais na Europa e Japão.

Teresa Gutierrez da ANSWER Internacional discutiu o perfil racial e outras medidas repressivas desde o 11 de Setembro de 2001 e a aprovação do Acto Patriótico dos EUA. Demonstrou como, apesar desta repressão, o movimento contra a guerra e de solidariedade com a Palestina tem crescido de maneira consistente no próprio centro do império.

Os activistas norte-americanos contra a guerra foram muito solicitados para entrevistas, tanto dos media progressistas da Espanha, como de jornais do Chile, do Peru e Marrocos. Isto reflectiu o interesse em todo o mundo sobre o que está a acontecer nos Estados Unidos e como isso tem sido distorcido pelas corporações norte-americanas de media.

Phyllis Bennis do Instituto de Estudos Políticos, em Washington, falou dos perigos para o povo palestino que acarretaria o deflagrar de uma guerra contra o Iraque.

Naim Abu Tair, presidente da União de Comités de Trabalho Sanitário, também levantou estes perigos, mas acrescentou que o povo palestino não teria outra escolha senão continuar a sua luta, por quaisquer meios que necessite para pôr termo à ocupação israelense.

Juan Carretera, presidente da OSPAAAL, Organização de Solidariedade com os Povos da Ásia, África e América Latina, Cuba, falou da solidariedade cubana com a luta palestina e da sua insistência em terminar com as sanções contra o Iraque e que nenhuma guerra seja lançada contra este país.

SOLIDARIEDADE COM O POVO IRAQUIANO

Dennis Halliday da Irlanda e Hans-Christof von Sponeck Alemanha, ambos coordenadores dos programas das Nações Unidas no Iraque, têm sido oradores frequentes nos últimos anos em conferências como esta. Eles não são activistas "de carreira" contra a guerra, mas sim diplomatas em missões no Iraque. O choque perante os horrores impostos à população iraquiana levou-os a tornarem-se intervenientes activos.

Habitualmente eles expõem as mentiras e as contradições da política americana ou explicam como é que as sanções atingem a população iraquiana. Desta vez, solicitados a falar num "comité de solidariedade com o povo iraquiano", seguiram um enfoque diferente nas suas comunicações: demonstraram de que maneira os seus sentimentos de solidariedade se desenvolveram com a população e como levaram ambos a questionar o que estavam a fazer.

Von Sponeck, por exemplo, contou como, anos atrás, delegações do movimento espanhol foram ao Iraque com ajuda para os iraquianos que sofriam as sanções, e também manifestou-se diante dos escritórios das Nações Unidas.

Poucos imaginariam, quer os manifestantes que eu próprio, disse von Sponeck "que iríamos estar alinhados no mesmo lado. Foi importante que vós estivésseis estado lá. Fui ganho por vós".

OPOSIÇÃO EUROPEIA AOS PLANOS AMERICANOS

Um outro diplomata desertor esteve presente. Fernando Valderrama, antigo chefe da Missão Espanhola no Iraque, resignou ao cargo depois de Aznar apoiar totalmente Bush na exigência da "mudança de regime" no Iraque. Para Valderrama, esta exigência pela "mudança de regime" é uma violação da constituição espanhola, a qual proíbe a agressão. É uma razão legal  para se retirar do seu posto lá.

O que é interessante é que o governo de Aznar ainda tem de contestar Valderrama na sua interpretação da constituição. O diplomata confia que está certo legalmente, e diz ter recebido comentários de apoio não apenas da forças contra a guerra ou do seu Partido Socialista, mas também de membros do governo de direita de Aznar.

Por detrás desta experiência está a atitude do grosso da classe dominante europeia imperialista, que vê a guerra ao Iraque como algo que, mesmo que rápida, apenas beneficia o imperialismo americano. A Alemanha colocou-se fora dos despojos de guerra, a França está em melhor posição para explorar o Médio Oriente como habitualmente. Ela vê Blair, Berlusconi e Aznar como serviçais de Washington e Wall Street num perigoso empreendimento. Isto não significa que irá desafiar o imperialismo americano, nem que planeie ajudar os movimentos de libertação. Significa apenas que existe um forte ponto de contradição entre os governantes americanos e os europeus.

Embora todos os presentes na conferência tenham reconhecido quão importantes são os acontecimentos no interior dos Estados Unidos, apenas aqueles provenientes dos EUA declararam publicamente que o movimento americano tem capacidade para impedir a guerra. Os outros dirigiram os seus apelos às populações do Médio Oriente e da Europa.

As palavras são insuficientes para convencer muitos estrangeiros de que um vasto, forte e combativo movimento contra a guerra é possível nos Estados Unidos. Para isso, eles terão de ver resultados concretos.

[*] do International Action Center

Este artigo encontra-se em http://resistir.info


(Copyright Workers World Service: Everyone is permitted to copy and distribute verbatim copies of this document, but changing it is not allowed. For more information contact Workers World, 55 W. 17 St., NY, NY 10011; via e-mail: ww@wwpublish.com. Subscribe wwnews-on@wwpublish.com. Unsubscribe wwnews-off@wwpublish.com. Support the voice of resistance http://www.workers.org/orders/donate.php

30/Nov/02