Carta de um comunista iraquiano aos progressistas árabes

por Baker Ibrahim

"Esperamos a vossa condenação da postura da direcção do PCI e de todos os partidos e indivíduos que defenderam a guerra e hoje [defendem] a ocupação; pedimos que rompam toda relação com eles. Inversamente, [pedimos] que ouçam as vozes dos patriotas iraquianos de todas as tendências que recusam a ocupação e que lutam pela independência do país e pelo seu progresso."

Pedras contra tanques em Fallujah. A todos os progressistas árabes, queridos camaradas:

A maioria dos historiadores concorda em que o Partido Comunista Iraquiano (PCI) foi fundado em Março de 1934. Consideram também unanimemente que os primeiros marxistas contribuíram na acção nacional (do Iraque) e que tiveram contactos com os meios internacionalistas antes da própria fundação do partido, bem como em que a primeira organização que significou o primeiro passo para a criação desse partido chamava-se Comité de Luta contra o Colonialismo e o Capital. Nesta denominação observa-se a associação entre a luta pela independência nacional e a luta pelo progresso social e a realização do socialismo.

Estas duas dimensões inseparáveis acompanharam toda a história do PCI e assim tem de ser para sempre ainda que, desgraçadamente, os actuais dirigentes hajam renegado a história do partido e tenham passado do anti-imperialismo à colaboração com o imperialismo.

Esta mudança começou há já 13 anos, ou seja, um pouco antes da primeira guerra de agressão contra o Iraque de 17 de Fevereiro de 1991. É sabido que aquela guerra foi precedida pelo desmoronamento da URSS e dos países da Europa do Leste, acontecimento que provocou uma onda de renegações de grande envergadura nas fileiras da esquerda de vários países.

CONVERGENCIA DE INTERÊSSES

Os dirigentes do PCI justificam sua adesão aos planos do imperialismo estadunidense e dos seus aliados com o pretexto de que há uma convergência entre os interesses gerais por acabar com a ditadura [de Sadam Hussein] e o estabelecimento da democracia. É verdade, a selvagem repressão policial que tanto tempo durou afectou todas as forças que lutavam pela libertação do Iraque e pelo seu progresso. É verdade também que o antigo regime fechou todas as portas a uma solução pacífica à crise interna que permitisse conter a hemorragia e melhorar a situação. Tudo isto criou as condições para o debilitamento da capacidade dos iraquianos de impedir a invasão imperialista, que acabou com a independência do país, arruinou sua economia, dissolveu seu exército, destruiu seu patrimonio cultural e, finalmente, pôs suas riquezas à venda como viu há pouco.

Os EUA e seu aliados conseguiram todos estes objectivos porque conseguiram mobilizar forças políticas iraquianas que responderam positivamente às suas promessas fraudulentas de salvar o Iraque da ditadura e de instalar a democracia no país. O PCI foi uma dessas forças, além de outros partidos que faziam parte do movimento nacional iraquiano.

A participação do PCI no chamado Conselho Governativo (Governing Council) e no [subsequente] governo designado pelos ocupantes foi planificada muito tempo antes da guerra e da ocupação. Os dirigentes do partido não estão a ser sinceros quando alegam que eles nunca estiveram a favor da guerra e da ocupação nem quando alegam que querem por fim à referida ocupação.

Ao PCI e aos demais partidos colaboracionaistas unem-nos interesses com os ocupantes e, por isso, não há que esperar nada de positivo deles; muito pelo contrário, as forças populares que estão contra a ocupação devem considerá-los como partidos que abandonaram o campo da luta nacional, democrática e internacionalista.

Estes partidos ambicionam a consagração e a perenidade da ocupação enquanto alegam que vão recorrer à negociação com os ocupantes para determinar o tempo da sua estadia no Iraque. Só a luta popular com suas diferentes formas e sob a direcção de uma frente nacional contra a ocupação é capaz de permitir alcançar um futuro melhor para o Iraque.

Apoiamos a reivindicação de organizar eleições livres sob supervisão internacional e imparcial que permitam ter um governo legítimo capaz de manter a independência do país, salvaguardar suas riquezas [nacionais] e de devolvê-lo aos seu ambiente árabe e à comunidade internacional.

PETIÇÃO

Agradecemos vossa solidariedade com o povo iraquiano contra a guerra e o embargo, e vossa luta hoje para que o Iraque recupere sua independência e desfrute da democracia. Agrada-nos que tenhamos contribuído ao vosso lado para esta luta que é universal.

Esperamos de vós e de todos os partidos progressistas e socialistas, assim como das instituições pró direitos humanos, o apoio à luta do povo iraquiano e a ajuda humanitária urgente às vítimas da guerra e da ocupação.

Esperamos a vossa condenação da postura da direcção do PCI e de todos os partidos e indivíduos que defenderam a guerra e hoje [defendem] a ocupação; pedimos que rompam toda relação com eles. Inversamente, [pedimos] que ouçam as vozes dos patriotas iraquianos de todas as tendências que recusam a ocupação e que lutam pela independência do país e pelo seu progresso.

A maioria dos militantes do PCI e da esquerda iraquiana, que lutam há décadas, estão contra a política da direcção actual do partido. Muitos deles tomaram conhecimento do conteúdo desta carta antes de publicá-la.

Saudações afectuosas,
Baker Ibrahim

9 de Outubro de 2003

O original encontra-se em Comité de Solidariedade com a Causa Árabe.

Esta carta encontra-se em http://resistir.info .
19/Dez/03