Está no campo de Trump a bola para aliciar o Irão
por M K Bhadrakumar
Tal como escrevi na semana passada, uma conversação de má
qualidade tem estado a decorrer entre Washington e Teerão. O
alto-falante não é mais utilizado, a conversação
é em tom civil a partir de plataformas públicas ou, mais
significativamente, através do Twitter. Tornou-se uma ocorrência
quase diária. Falando na generalidade, a comunicação
é entre o presidente Donald Trump do lado americano, com o ministro dos
N. Estrangeiros Javad Zarif a interpor-se activamente por conta do presidente
Hassan Rouhani quase em tempo real. Certamente o líder supremo, Ali
Khamenei, está a ouvi-los.
O dueto chegou a isto de modo gradual. Trump está desejoso de
encontrar-se com Rouhani "em qualquer momento... sem
condições prévias". Ultimamente ele tem um
pressentimento de que isto poderia acontecer "muito em breve".
(Quando Trump coloca um prazo como este em traços gerais, isto aponta
para algum canal de rectaguarda.) Mas a seguir, Teerão diz que
não conversará sob coação, com o orgulho e a honra
ofendidos. Os EUA devem primeiro mostrar "respeito" e cessar
actividades hostis.
Por outro lado, Trump afirma perceber mudanças no comportamento do
Irão. (Isto pode ser interpretado como um sinal ou um reconhecimento.)
De modo interessante, Teerão nem contesta nem confirma a
afirmação de Trump. De facto, há alguma
"mudança" discernível no comportamento do Irão
Moscovo revelou
que forças iranianas e "formações xiitas"
retiraram seu armamento pesado na Síria para uma distância de 85
km das Alturas de Golan ocupadas por Israel e que "não há
unidades com equipamento e armamento pesado que pudessem apresentar uma
ameaça a Israel a uma distância de 85 km da linha de
demarcação".
Claramente, esta "mudança" no comportamento do Irão
tornou-se possível no pano de fundo da reunião Trump-Putin em
Helsínquia, em 16 de Julho. O facto importante é que Rouhani
(leia-se Khamenei) anuiu ao conselho de Putin (a pedido de Trump).
Naturalmente, o primeiro-ministro israelense, Netanyahu, tal como o Oliver
Twist de Dickens, continua a dizer: "Por favor, senhor, quero algo
mais" nomeadamente que o Irão deveria deixar também o
solo sírio, mas isso é
um pedido "irrealista", como ponderou Moscovo
. (Putin teria dito isso a Trump, também.) Isso equivale a dizer que
Moscovo não tem inclinação para aconselhar Teerão a
fazer diferente. No entanto, esta "mudança" do comportamento
iraniano no próprio Golan é uma boa coisa no que respeita aos
CBMs (Conventional Ballistic Missiles].
E quanto às expectativas de Teerão? O primeiro lote das
sanções de Trump supostamente entra em vigor na próxima
semana. Serão elas revertidas? Enquanto isso, Zarif, o secretário
de Estado Mike Pompeo, os ministros dos N. Estrangeiros russo Sergey Lavrov e
chinês Wang Yi bem como a chefe da política externa da UE Federica
Mogherini estão a convergir para Singapura no contexto da reunião
de ministros de N. Estrangeiros da ASEAN em 4 de Agosto.
A caminho de Singapura, Zarif emitiu um tweet: "O Irão & os EUA
tiveram dois anos de conversações. Com a
UE/E3+Rússia+China, produzimos um acordo multilateral único
o JCPOA. Ele tem funcionado. Os EUA podem culpar-se apenas a si
próprios por saírem & abandonarem a mesa. Ameaças,
sanções & truques de RP não funcionarão. Tentem o
respeito pelos iranianos & pelos compromissos internacionais". Isto foi em
resposta à observação de Trump de que está pronto a
encontrar-se com Rouhani sem estabelecer qualquer condição
prévia. "É bom para o país, bom para eles, bom para
nós e bom para o mundo. Nenhumas condições prévias.
Se eles quiserem reunir-se, eu reunirei", havia dito Trump.
As coisas na verdade limitaram-se dramaticamente. Hamid Aboutalebi, ajudante do
presidente Rouhani, esclarecer que o retorno ao acordo nuclear é a maior
condição prévia para possíveis
conversações "Respeitar os direitos da
nação iraniana, reduzir hostilidades e retornar ao acordo nuclear
são passos que podem ser dados para abrir a estrada acidentada de
conversações entre o Irão e a América", tuitou
Aboutalebi.
Mas então, será que Trump realmente rasgou o acordo de 2015? Ele
disse querer melhorar o acordo de 2015 (o qual não era suficientemente
bom no seu julgamento). Trump está determinado a entrar para os livros
de história como um negociador mais hábil do que Barack Obama
seja em relação à alteração
climática, ao TPP ou ao acordo com o Irão.
Em geral, esses são estímulos positivos. Significativamente,
sentindo que "uma reunião pode não estar para além do
reino da possibilidade",
o jornal governamental China Daily sugeriu num editorial em 31 de Julho
que "as outras partes do acordo nuclear de 2015 deveriam encorajar
Washington e Teerão a se unirem pois realmente seria bom conversar".
Sem dúvida, a China é uma das principais partes interessadas.
Além de ser o destino de mais de um terço de todas as
exportações do petróleo iraniano, o que inevitavelmente a
torna um alvo de danos colaterais devido às sanções dos
EUA, a China também está lidando com uma das
disposições mais complicadas do acordo de 2015
nomeadamente, o re-desenho do reactor nuclear de água pesada de Arak, no
Irão, para torná-lo incapaz de fabricar plutónio de grau
militar sob operação normal.
Este assunto constou na reunião entre Rouhani e o presidente
chinês, Xi Jinping, em Pequim, em Junho, à margem da cimeira da
SCO
. Sobre Arak, o acordo de 2015 especifica que o novo desenho terá como
objectivo minimizar a produção de plutónio e impedir a
produção de plutónio com grau militar na sua
operação normal. Também especifica o combustível
que o Arak deve utilizar e diz que o combustível gasto durante a vida
útil do reactor deve ser despachado para fora do Irão. Os EUA
inicialmente lideraram o grupo de trabalho para redesenhar o reactor de Arak
com a China, mas o Reino Unido agora o substituiu. Pense-se simplesmente em
toda a confusão criada por Trump.
02/Agosto/2018
O original encontra-se em
blogs.rediff.com/mkbhadrakumar/...
Este artigo encontra-se em
https://resistir.info/
.
|