O que vemos e o que esperamos:
Declaração de solidariedade com o levantamento na Grécia
Queremos antes de mais nada dizer um sim colectivo ao levantamento na
Grécia. Somos artistas, escritores e professores conectados neste
momento por amigos e compromissos comuns. Estamos globalmente dispersos e
estamos a observar, com esperança, de longe. Mas alguns de nós
estão em Atenas e têm estado nas ruas, sentiram a fúria e o
gás lacrimogéneo, e vislumbraram o espectro do outro mundo que
é possível. Não clamamos por nenhum direito especial a
falar e a sermos ouvidos. Ainda assim, temos algo a dizer. Pois isto é
também um momento global para falar e partilhar, para ter
esperança e pensa em conjunto...
Ninguém pode duvidar que o movimento de protesto e
ocupação que se espraiou por toda a Grécia desde o
assassinato pela polícia de Alexis Grigoropoulos em Atenas, a 6 de
Dezembro, é um levantamento social cujas causas são mais
profundas do que o obsceno evento que o desencadeou. A fúria é
real e é justificada. As ruas cheias, as greves e
manifestações, as escolas, universidades, municipalidades e
estações de televisão ocupadas refutaram as primitivas
tentativas oficiais de descartar a explosão social como o trabalho de um
pequeno número de "jovens" em Exarchia, Atenas ou outros
lugares na Grécia.
O que falta ver é se o movimento que agora emerge tornar-se-á uma
força política efectiva e, se o conseguir, se será
contido dentro de um horizonte liberal-reformista ou objectivará uma
transformação social e política mais radical. Se o
movimento tomar o caminho liberal-reformista, então o máximo que
pode ser esperado será a substituição de um partido
corrupto no poder pelo seu corrupto competidor, acompanhado por umas poucas
concessões simbólicas embrulhadas na retórica vazia da
democracia. Isto certamente seria a cortina de fumo para uma onda
reaccionária de novos poderes repressivos mascarados como medidas de
segurança. Só exigências radicalmente democráticas e
emancipatórias, claramente articuladas e resolutamente combatidas,
poderiam impedir este resultado e abrir espaço para uma ruptura num
sistema global destrutivo de dominação e
exploração. Como nos alinhamos entre aqueles que experimentam
este sistema como a negação violenta do espírito e
potencial humanos, só podemos saudar uma tal ruptura como uma
reafirmação da humanidade em face de uma política
repressiva de medo.
Ao observar os acontecimentos na Grécia e o discurso oficial e dos media
corporativos que se desenvolvem em resposta a eles, notamos a emergência
do que começa a parece como um novo consenso da elite. A
"perturbação violenta" na Grécia, dizem-nos com
frequência crescente, é a revolta da "geração
700-Euro" isto é, de jovens educados excessivamente com
poucas perspectivas de uma posição decente e de rendimento. A
solução, segundo este conto, é revitalizar a sociedade
grega através de mais ajustamentos estruturais para tornar a economia
mais dinâmica e eficiente. Uma vez que todos estejam convencidos de que
serão bem vindos e integrados na realidade do consumidor e premiados com
poder de compra proporcional ao seu investimento educacional, então as
condições desta "revolta" terão sido eliminadas.
Em suma, tudo estará bem e toda a gente feliz, uma vez que alguns
ajustamentos tenham tornado o capitalismo na Grécia menos
desperdiçador dos seus recursos humanos.
Já vimos esta estratégia antes, em resposta aos levantamentos nos
subúrbios de Paris e em torno das "reformas" CPE
[1]
em
França vários anos atrás. Na verdade, desde a
década de 1960 isto tem sido a estratégia perene e preferida pelo
poder para todos os levantamentos que se mostram relutantes em desaparecer de
imediato. As suas funções são claras como cristal:
canalizar o movimento neutralizando-o numa direcção
liberal-reformista e provocar divisões por meio de iscos e promessas.
Aqueles que não morderem o isco são isolados e podem seguramente
ser alvo da repressão.
Esperamos que os que estão nas ruas e todos aqueles que com eles
simpatizam e os apoiam fora da Grécia perceberão esta
estratégia e a denunciarão. Estamos certos de que há
muito mais em jogo, e muito mais a ser imaginado, esperado e combatido do que
está a ser oferecido pela pílula sonífera neoliberal. E
eperamos que, no espaço aberto pela fúria real e pela coragem do
povo que deixou a passividade e a desesperança para trás, este
movimento social organizar-se-á numa força política
durável capaz de desdenhar tais seduções recuperativas.
À luz do exposto, declaramos abertamente que:
1) Estamos comovidos pela coragem e humanidade daqueles que reitieradamente
encheram a ruas e estão agora a ocupar escolas e campus
universitários em Atenas, Tessalonica, Patras e cidade por toda a
Grécia. A nossa solidariedade para com eles não será
abalada por tentativas oficiais para dividir o movimento entre "bons"
e "maus" protestários. Face ao assassinato pela
política de um jovem de 15 anos apenas o mais recente numa longa
série de tais assassinatos por responsáveis do estado e em
face da triturante desumanidade e implacável militarização
da vida diária sob a guerra capitalista de todos contra todos, a
destruição da propriedade privada não nos inquieta. Para
sermos claros: Não endossamos a violência cega; de facto
queremos que as acções se tornem mais selectivas, mais
políticas, a cada dia. Mas sabemos quão desagregadora pode ser a
fixação sobre a "violência" dos
protestatários em momentos como este. Assim, recusamos avançar
com tentativas de isolar certos grupos. Aqueles que actuam com tal roteiro
permitem-se serem utilizados de um modo que entrega outros à
repressão directa.
2) Apelamos à imediata libertação e amnistia incondicional
para todos aqueles presos que participaram no levantamento mais de 400
pessoas no momento em que isto se escreve.
3) Rejeitamos todas as tentativas de trivializar este levantamento reduzindo-o
à revolta da excessivamente educada "geração
700-Euro".
4) Rejeitamos categoricamente qualquer tentativa de manchar este levantamento
com a etiqueta de "terrorismo". O único terror de que
é apropriado falar aqui é o terror em curso do estado infligido
sobre os autonomistas de Exarchia, sobre imigrantes, sobre os pobres e
vulneráveis e sobre aqueles que se recusam a conformar-se e submeter-se
às negras e violentas condições da normalidade
capitalista. Condenamos qualquer tentativa, agora ou no futuro, de aplicar
draconianas leis "anti-terrorismo" e medidas contra aqueles que
participam neste movimento.
Brett Bloom (Urbana)
Dimitris Bacharas (Athens)
Rozalinda Borcila (Chicago)
Peter Conlin (London)
Alexandros Efklidis (Thessaloniki)
Markus Euskirchen (Berlin)
Nathalie Fixon (Paris)
Bonnie Fortune (Urbana)
Kirsten Forkert (London)
John Fulljames (London)
Jack Hirschman (San Francisco)
Antoneta Kotsi (Athens)
Isabella Kounidou (Nicosia)
Henrik Lebuhn (San Francisco)
Ed Marszewski (Chicago)
Jasmin Mersmann (Berlin)
Anna Papaeti (Athens)
Csaba Polony (Oakland)
Katja Praznik (Ljubljana)
Gene Ray (Berlin)
Tamas St. Auby (Budapest)
Gregory Sholette (New York)
G.M. Tamás (Budapest)
Flora Tsilaga (Athens)
[1] CPE: Contrat première embauche, Contrato de primeiro emprego
O original encontra-se em
http://mrzine.monthlyreview.org/greece221208.html
Esta declaração encontra-se em
http://resistir.info/
.
|