Guerra social e guerra imperialista
por Rémy Herrera
A França está habituada às greves e às
manifestações. Mas neste princípio de primavera, a
atmosfera está excepcionalmente pesada, tensa. Os discursos
presidenciais e mediáticos afirmando que a ordem está em vias de
ser restabelecida são demasiado frequentes para que possamos estar
seguros de que nada de grave se prepara. Os descontentamentos subiram de
nível nestas últimas semanas. Graças a Macron,
principalmente, que se diz à escuta dos protestos e se põe em
cena dialogando com aqueles que se dispõem a isso, mas manda espancar
todos os que se movem.
Em meados de Abril, ele enviou 2500 militares para fazer evacuar uma centena de
activistas radicais da "zona a defender" (ZAD) em
Notre-Dame-des-Landes, no Oeste do país. Estes militantes, movimentos
ecologistas e autónomos (extrema-esquerda), impediam ali a
construção de um aeroporto e ocupavam os lugares transformados em
squats
a céu aberto, em busca de espaços agrícolas alternativos,
colectivos, numa recusa à propriedade individualizada. Na véspera
da intervenção, os "zadistas" a enfrentar as
forças da ordem eram cinco vezes mais numerosos. No mesmo momento,
Macron lançava a tropa de choque do CRS para desalojar os estudantes que
ocupavam a Sorbonne e Tolbiac para protestar contra a "reforma
educativa". De imediato, foram ocupadas, ou reocupadas, outras
universidades como Nanterre e mesmo Sciences Po, grande escola na qual
se diplomou o Presidente da República. Em Lille, foi entre duas alas
de polícias que os estudantes tiveram de prestar seus exames.
As manifestações parisienses da jornada de acção
interprofissional de 19 de Abril organizada pela CGT e reunindo 300
mil no país tiveram direito a canhões de
água e granadas lacrimogéneas, quando nada de grave o
justificava. Com falta de sustentação popular, é pelo
envio da tropa contra as resistências pacifistas que o Presidente
pretende demonstrar a sua força. Apoiado pela alta finança,
é verdade que ele tem com que se sentir forte. Tão forte que
pôde declarar a guerra social. E pode desafiar o povo, em nome de
"reformas necessárias" e desprezando o diálogo social.
Hoje, é a coluna vertebral do movimento operário que Macron
pretende quebrar; a começar pelos ferroviários, na primeira linha
da defesa do serviço público e que permitiu uma
cristalização das contestações.
Tal como Thatcher, no seu tempo, quebrou os mineiros. Entretanto, a 3 de Abril
último, o primeiro dos 36 dias de greve intermitente
("grève perlée")
no SCNF anunciado nacionalmente pelos sindicatos de ferroviários, a
direcção da Eurostar (companhia ferroviária anglo-francesa
responsável pelos comboios de alta velocidade entre a França e o
Reino Unido, através do túnel sob o Canal da Mancha), tentou
deslocar empregados de Leyton (Leste de Londres) para Paris. Através de
uma acção conjunta da CGT e do RMT (sindicato dos transportes
britânicos), os operários franceses e britânicos
organizaram-se e impediram que os patrões quebrassem ilegalmente
a greve em França recorrendo a empregados britânicos. A
demonstração da eficácia da solidariedade internacional
entre trabalhadores estava feita.
No momento actual, muito está em jogo. Duas visões da sociedade
se afrontam: uma, apresentada como "ultrapassada", é a da
solidariedade, da justiça social, da esperança reencontrada pela
juventude, de um futuro em comum; a outra, neoliberal, a estratégia das
elites, está destinada ao fracasso e lança num impasse a maioria
da população. Quanto tempo esta maioria o mundo do
trabalho recuará frente a esta minoria de privilegiados que a
esmaga?
Dia 19, os sectores da química, da electricidade e do gás
entraram na batalha. Será uma guerra de desgaste. A questão
colocada neste 19 de Abril é a que deve ser feita: como encontrar, nas
lutas, as condições da sua convergência? Apesar das
divisões sindicais nas quais as jovens gerações
descobrem aquilo que seus pais e avós sabiam desde há muito: que
as orlas social-democratas traem os trabalhadores uma frente de trabalho
está em vias de se desenhar. Certamente, no momento, as forças da
esquerda política não estão à altura dos desafios.
Na generalidade, a recusa de discutir a colocação em causa do
euro e do espartilho europeu bloqueia o futuro. Só está
desorganização da esquerda política ainda permite aos
burgueses adormecerem quase tranquilamente. Atenta, a extrema-direita observa.
E como a França monárquica conquistou a Argélia esmagando
suas revoluções de 1830 e 1848, foi precisa uma guerra
imperialista para acompanhar a guerra social. Ao nos cantar a
canção das "armas químicas", entoada outrora por
Bush, Macron foi à guerra, docilmente, atrás de Trump e May, para
bombardear a Síria. As duas caras guerreiras do capitalismo...
22/Abril/2018
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