O fortalecimento do dólar está a tornar-se perigoso para toda a economia global – outras divisas estão em queda e a maior parte dos países, inclusive os próprios Estados Unidos, estão a sofrer com os altos preços das commodities e com a inflação. Isto levará à construção de um novo modelo económico no qual haverá vencedores e perdedores.
Servidão da dívida
A razão para o crescimento do índice do US dólar contra um cabaz de seis divisas dos parceiros comerciais dos EUA, o qual já ultrapassou os níveis de 2002 ao romper a barreira de 112 pontos, foi a política monetária do Federal Reserve. Na semana passada, aquele banco central elevou pela quarta vez a taxa básica em 0,75%, para 3,0% - 2,25% e disse que pelo fim do ano espera taxas acima dos 4%.
“Os juros no dólar estão em crescimento: os EUA não têm problemas no sector da energia, tais como os da UE, e o combate contra a inflação está a progredir com mais êxito para os americanos, além de a lucratividade de instrumentos em dólar ser relativamente alta”, diz Nataliya Vashchelyuk, analista chefe do Sovcombank.
Ao mesmo tempo, a maior parte dos peritos aponta para o risco de uma crise de dívida. Segundo Diana Stepanova, professora associada do Departamento de Estado e Finanças Municipais da Universidade Russa de Ciência Económica Plekhanov, os países em desenvolvimento podem ter sérios problemas com o reembolso das suas dívidas em dólar. Riscos particulares, na sua opinião, verificam-se na ascensão do custo de refinanciamento de dívidas denominadas em dólares em países fracos.
O colapso do equilíbrio da política de dívida pública também se verifica para países desenvolvidos cuja dívida pública exceda 100% do PIB – e cujas taxas de crescimento económico sejam significativamente mais baixas do que as taxas sobre a dívida pública.
Vaschelyuk concorda: o aumento da taxa do US Federal Reserve incrementa os riscos quanto à sustentabilidade da dívida de países individuais se uma parte significativa dos empréstimos forem denominados em dólares. A ascensão das taxas também significa um aumento nos gastos orçamentais com o serviço da dívida nacional e uma diminuição de oportunidades para estimular a economia.
Risco de crises cambiais
Quanto mais alta a taxa de câmbio do dólar, mais aflitiva será a situação dos países restantes e em consequência isso pode levar a uma crise cambial em grande escala, como foi por exemplo a de 1998 na Ásia, diz Yaroslav Ostrovsky, especialista do Departamento de Estudos Estratégicos da Total Research.
De acordo com Ostrovsky, todos já estão a sofrer: a UE – devido à inflação recorde; a China – por causa de restrições e problemas constantes no mercado imobiliário; o Japão – por causa dos altos preços de bens de consumo e matérias-primas; os próprios Estados Unidos – devido a um declínio no rendimento de corporações americanas no exterior e de uma redução das exportações.
Ostrovsky está convencido de que quando o dólar deixar de ser um abrigo confiável a saída será comprar ouro e o mundo começará a construir um novo modelo de interação económica.
Vencedores e perdedores
A União Europeia é quem mais pode sofrer em consequência do fortalecimento do dólar, afirma Artyom Tuzov, diretor executivo do Departamento de Mercados de Capitais da IVA Partners IC. Ele recordou que o euro tem enfraquecido frente ao dólar e que bens exportador da UE têm um valor mais baixo em dólares, que o gás em dólares ainda tem de ser comprado a preços insanos. Assim, podemos esperar uma outra rodada de inflação na UE juntamente com uma queda do seu PIB.
Na sua opinião, a economia da UE é em algum sentido “sacrificada” na crise atual e os EUA serão o beneficiário.
Mas o economista Egor Klopenko está convencido de que os EUA definitivamente não se tornarão beneficiários: o mundo está à beira de uma nova crise financeira e económica, a qual pode tornar-se um recorde em duração e profundidade pois é uma consequência de um desequilíbrio total na economia e política globais. E a Rússia, segundo ele, é o único país realmente não sentirá os problemas associados a este factor.
“Penso que quando a economia global começar a declinar mais fortemente, ouviremos propostas ocidentais sobre facilitação das medidas de sanções, pois elas também saem caras para eles”, resume Klopenko.