A história do dr. Yunus e do Grameen Bank
O Premio Nobel da Paz com que as potências imperialistas obsequiaram o
dr. Muhammad Yunnis não lhe foi arrebatado pelo governo, nem este teria
poder para fazê-lo. O governo do Bangladesh simplesmente removeu-o do
cargo de director administrativo do
Grameen Bank
com base em razões estritamente legais. Isto foi feito de acordo com as
regras do Banco de Bangladesh e as leis do país. O mérito desta
acção foi apreciado pelo Tribunal Superior, ao qual Yunus
recorreu contra a decisão do governo. O Tribunal Superior rejeitou a sua
queixa, depois de ouvir ambas as partes. A decisão foi também foi
confirmada pelo Supremo Tribunal.
Esta actuação do governo contra Yunus foi tomada com base nas
irregularidades confirmadas por ele cometidas e é um assunto interno do
Bangladesh. Sabemos que as potências imperialistas, particularmente o
governo dos EUA e a facção Clinton, que manipularam a
atribuição do Prêmio da Paz para Yunus, reagiram forte e
amargamente a esta decisão do governo.
Desde há muito analisamos criticamente as atividades de Yunus e do Banco
Grameen, pela simples razão de que ele tem apregoado feitos muito
exagerados quanto ao banco e quanto a si próprio. Afirma ele ter
inventado uma teoria segundo a qual a garantia de empréstimo seria um
"direito natural" do ser humano. Afirma que ao conceder
empréstimos aos pobres foi bem sucedido na mitigação da
pobreza no Bangladesh e que em 2030 remeteria a pobreza para um museu como
relíquia do passado. Ao fazer tal afirmação, obviamente
ridícula, revelou-se como alguém que falhou miseravelmente em
entender que a pobreza não é uma coisa, não é um
artefato arqueológico, mas sim o resultado das relações
existentes entre pessoas no decorrer da atividade produtiva e em outras
actividades na sociedade.
Sem dúvida o Banco Grameen é um operador bem sucedido na
concessão de pequenos empréstimos a agricultores pobres, tal como
muitas ONGs, e estabeleceu-se com mais destaque nessa área do que os
bancos comerciais tradicionais. Por este feito o Banco Grameen pode receber um
prêmio internacional pelo seu êxito na gestão de pequenos
empréstimos. Mas deve-se salientar que isso nada tem a ver com a paz.
Além disso, não se tem conhecimento de que o próprio Yunus
tenha protestado alguma vez contra qualquer tipo de repressão perpetrada
contra o povo por agências governamentais e outras forças sociais
predatórias. Não se tem conhecimento de que tenha alguma vez
pronunciado uma palavra sequer contra intervenções militares,
agressões e guerras predatórias imperialistas em países da
Ásia, África e América Latina. Ele nunca desempenhou
qualquer papel no alívio de tensões ou no estabelecimento da paz
entre interesses e grupos em conflito no Bangladesh ou qualquer outro lugar.
Nunca realmente fez nada pela paz. Ao contrário, sempre confraternizou
com aqueles que fazem a guerra e perturbam a paz tanto no seu país
quanto no estrangeiro. Apesar disso, ganhou o Prêmio Nobel da Paz
concedido pelas cliques imperialistas a fim de promover a sua políticas
e outros interesses no Bangladesh. Não é de surpreender portanto
que subitamente, em 2006, lhe tenha sido atribuído o Prêmio Nobel
às vésperas do golpe militar de Janeiro de 2007.
Yunus administrou os assuntos do Banco Grameen como um autocrata e, como
qualquer outro autocrata, não teve escrúpulos em cometer
irregularidades. Não tinha de prestar contas a ninguém e fazia
tudo de modo arrogante. Exercia a autoridade de nomear todos os
funcionários do banco e até os diretores. A sua
nomeação como director executivo do banco foi sempre basicamente
um acto da sua própria iniciativa, e nesses assuntos o papel da
Comissão de Directores era apenas nominal. Tomava todas as
decisões principais passando por cima daquela comissão, da qual
nem era membro. Se o relacionamento entre o Diretor Executivo e a
Comissão de Diretores fosse examinado, descobrir-se-ia ser um acordo
muito estranho. A Comissão sempre actuou como um corpo absolutamente
servil ao director executivo.
Em todos os aspetos as regras do Banco Grameen eram extraordinárias e as
concessões a ele garantidas pelo governo na condução de
seus assuntos contradiziam todas as práticas bancárias do
país. Contudo, estas questões administrativas, incluindo as
regras de conduta dos negócios do Banco Grameen, não são o
foco da nossa preocupação real e deixamos para a Comissão
de Inquérito, que foi instituída pelo governo, investigar os
assuntos do Banco. A nossa preocupação principal é a
situação no terreno.
Não é possível detalhar aqui as consequências do
negócio de pequenos empréstimos praticado pelo Banco Grameen. Mas
uma coisa deve ficar clara. Não nos opomos a pequenos empréstimos
ou micro-crédito, porque tais empréstimos respondem a uma
necessidade desesperada da população pobre das zonas rurais,
particularmente dos camponeses e artesãos que trabalham na
produção. Prestamistas rurais existem desde há
séculos, ao longo do período feudal e até aos dias de
hoje. De forma fraudulenta e prejudicial, Yunus é glorificado como o
'banqueiro dos pobres' que os resgatou nas áreas rurais, em particular
as mulheres, enquanto o fato é que os prestamistas rurais tradicionais
foram os que historicamente efectuavam esta operação. Até
as ONGs lançadas pelo então presidente do Banco Mundial Robert
McNamara nos anos 70 concederam empréstimos aos pobres antes do
estabelecimento do Banco Grameen.
As ONGs e o Banco Grameen foram iniciativas imperialistas criadas com a ajuda
ativa e colaboração do governo, mas não para aliviar ou
erradicar a pobreza. O seu principal objetivo era perpetuar a pobreza e desviar
a atenção dos pobres das lutas políticas que visam
mudanças nas relações de produção
básicas, assim como nas relações sociais que criam e
preservam as condições de pobreza. Não cabe aqui
desenvolver este ponto, mas torna-se necessário mencionar que o maior
alarde quanto ao Banco Grameen e a sua declarada missão de erradicar a
pobreza é feito por reconhecidos inimigos dos trabalhadores pobres do
mundo, inclusive o povo do Bangladesh. Estes publicitários ruidosos
representam as forças que exploram os pobres por todo o mundo, atam os
países pobres deles dependentes e não têm o menor
escrúpulo em atacar maliciosamente os países que se atrevem a
resistir a seu assédio. São estes os países que não
hesitam em bombardear os pobres de outros países e cometem
genocídios como fizeram recentemente no Iraque e fazem atualmente no
Afeganistão, Paquistão e Líbia.
A reação destas forças, que incluem países
imperialistas como os Estados Unidos, França, Inglaterra, Alemanha,
outros países da Europa e alhures e seus serviçais em
países como o Bangladesh, é uma indicação clara dos
interesses aos quais serve o Dr. Yunus. É insano pensar que as
potências imperialistas estejam a fazer um alarido com a
remoção do director executivo do Banco Grameen por serem amigas
dos pobres em qualquer país e que possam liderar um programa para
erradicar ou mesmo aliviar a pobreza daqueles que estão sujeitos
à pior espécie de exploração por parte das classes
dominantes locais, governos e potências imperialistas.
Neste contexto, é interessante notar que os devedores ou tomadores de
empréstimos do Banco Grameen, em nenhuma área do Bangladeh,
tenham até agora efectuado qualquer manifestação em favor
de Yuns e contra a decisão do governo de removê-lo do cargo de
director executivo.
Recentemente, num folheto do Banco Grameen lia-se que cerca de três
milhões de devedores haviam assinado uma declaração de
protesto contra a remoção de Yunus. Mas
manifestações e declarações de protesto são
actos muito diferentes. É fácil conseguir uma assinatura de um
devedor quando a mesma é solicitada por responsáveis locais do
próprio Banco Grameen.
E mesmo assim, não há provas de que tal declaração
tenha realmente sido assinada por 3 milhões de devedores. A
questão pode ser uma mentira e uma propaganda fraudulenta de
funcionários de uma parte do Banco Grameen leais a Yunus.
Apesar da falta de apoio a Yunus pelos devedores do Banco Grameen, de quem se
diz serem os "verdadeiros donos" daquela instituição,
é extraordinário ver o tipo de apoio internacional organizado em
favor de Yunus. Louvam os feitos do Dr. Yunus de forma a proteger a sua
posição no Banco Grameen. Sob a presidência de um antigo
presidente da Irlanda, formou-se uma 'comissão de amigos do Grameen' na
sua sede em Paris. A 30 de Março numa sessão de perguntas e
respostas na Assembléia Nacional Francesa, o ministro de Negócios
Estrangeiros francês Alain Juppe disse: "o modelo de
micro-crédito do Banco Grameen foi unanimemente reconhecido como uma
ferramenta de alívio da pobreza, 'magnificamente bem sucedida' e
replicada por todo o mundo, ajudando especialmente ao fortalecimento da
posição das mulheres nos países em desenvolvimento''
(Daily Star,
1/4/2011). Esta declaração do ministro francês não
é exceção. Afirmações deste teor são
regularmente publicadas por representantes imperialistas e seus
serviçais no Bangladesh. Mas o fato é que, além das
pessoas que emitem tais declarações, ninguém reconhece o
modelo de micro-crédito do Grameen como 'magnificamente bem sucedido' na
mitigação da pobreza do Bangladesh. E ninguém reconhece o
papel do Banco Grameen como contribuindo para o fortalecimento da
posição das mulheres no Bangladesh.
As mulheres do Bangladesh estão sujeitas aos mais variados tipos de
exploração e repressão por todo o país, em
particular nas áreas rurais. As mulheres pobres dessas áreas
são as mais oprimidas da sociedade e são vitimas de exploradores
rurais e opressores, incluindo os mullahs que frequentemente emitem fatwas
contra elas. Não consta que o Dr. Yunus do Banco Grameen se tenha oposto
de alguma forma a tais atrocidades.
Não é preciso grande conhecimento ou sabedoria para entender em
teoria que a mitigação da pobreza e o fortalecimento da
posição das mulheres nada têm a ver com empréstimos
bancários, independentemente dos termos dos acordos de
empréstimo. Mesmo uma pesquisa modesta da situação nas
áreas rurais revela que não houve nenhum alivio
perceptível da pobreza através do desembolso de créditos
rurais do Banco Grameen ou de qualquer outra ONG, apesar de ser possível
que existam casos excepcionais em que os devedores possam ter melhorado a sua
situação financeira usando fazendo uma utilização
sagaz de tais empréstimos.
Não é necessária qualquer discussão elaborada sobre
o 'feito' de Yunus para evidenciar que a sua principal realização
foi a gestão das operações de empréstimos do Banco
Grameen.
O seu negócio expandiu-se a vastas áreas do Bangladesh, o
número de tomadores de empréstimo do Banco atingiu, de acordo com
o seu próprio relatório, mais de oito milhões, e,
através de um mecanismo de controle especial, a sua taxa de cumprimento
é de 98%! Este êxito não teria sido possível sem uma
contribuição financeira massiva do estrangeiro e sem as
concessões e privilégios especiais garantidos pelo governo a este
Banco, que não são igualmente disponibilizados aos outros bancos
comerciais.
A função do negócio bancário do Grameen não
é diferente dos pequenos serviços de crédito tradicionais
que operam há séculos e são praticados por prestamistas
rurais conhecidos como
mohajons.
Em linhas gerais, estes serviços ajudam a pequena
produção de agricultores e artesãos e de todo o tipo de
atividades econômicas em pequena escala. Assim, a implacável
propaganda praticada pelos círculos imperialistas e seus
serviçais no Bangladesh nada tem a ver com o trabalho real e os 'feitos'
do Banco Grameen, nem com as afirmações de seu famoso
diretor-executivo dr. Yunus relativamente aos oito milhões de devedores
serem proprietários do banco e receberem dividendos com regularidade.
Essa afirmação é completamente falsa e é
fraudulenta. Qualquer investigação no terreno revela que nenhum
devedor do Banco possui documento de controle acionário, nem tem
qualquer prova ou relata ter recebido qualquer dividendo. Mas a
incansável e estereotipada propaganda imperialista continua, e os meios
de comunicação internacionais, seja em formato eletrônico
ou impresso, transmitem uma vasta propaganda na qual muitas pessoas bem
intencionadas acreditam.
O Banco do Bangladesh e o governo do Bangladesh removeram Yunus do posto de
diretor-executivo. Dizem os imperialistas que sem ele o Banco Grameen
parará de funcionar como um 'mitigador de pobreza' e perderá o
seu caráter. Isso é uma falsidade e uma propaganda motivada,
porque, como se disse amtes, tal caráter não existe. O que
realmente poderá acontecer após o seu afastamento é uma
série de reformas nas práticas operacionais do Banco Grameen que
trarão algum alívio aos tomadores dos empréstimos e
reduzirão o lucro do banco. Poderá também reduzir a
entrada de capital estrangeiro no banco e enfrquecer a posição do
dr. Yunus como um agente das corporações multinacinais que
promovem o seu 'negócio social'.
Através da propaganda massiva que construiu a imagem de Dr. Yunus, os
imperialistas tentaram elevá-lo à posição de um
semideus, um redentor dos pobres e dos oprimidos. Tentaram retratar as suas
atividades como uma panacéia para a pobreza e um meio de fortalecer as
mulheres. Há um objetivo duplo nesta construção da imagem
de Yunus. O primeiro é usá-lo para criar oportunidades de
investimento na exploração de excedentes produzidos pela
população rural pobre, e o segundo, mais importante, é
usá-lo para fins políticos. Isso se tornou óbvio quando
ele recebeu o Prêmio Nobel da Paz em 2006, nas vésperas de um
golpe militar no Bangladesh que teve a mão dos Estados Unidos e de
europeus. Subsequentemente, Yunus tentou usurpar o poder político,
aproveitando-se da situação então existente ao tentar
organizar o seu próprio partido político. A sua tentativa falhou
completamente, devido à sua total incapacidade pessoal de compreender o
processo político e ponderar cada passo no processo de
construção de um partido político. Consequentemente,
demonstrou-se um fracasso político. Mas os imperialistas não
perderam a esperança de poder usá-lo no jogo político que
talvez tenham de jogar em tempos de crise. Foi por essa razão que o
governo norueguês, depois acusá-lo de desonestidade financeira
recuou nessa posição a fim de salvaguardar a sua imagem e
isentá-lo das acusações que eles próprios haviam
feito.
A consternação nos círculos capitalistas após a
remoção de Yunus da posição de diretor-executivo do
banco, e o alinhamento das ONGs e dos cavalheiros da sociedade civil do
Bangladesh por trás dele, revela completamente o verdadeiro
caráter de Yunus. Expõe também as caras de pessoas e
instituições neste país que actuam nos interesses do
imperialismo como seus serviçais. E demonstra claramente que Yunus, o
tão publicitado "banqueiro dos pobres", não representa
realmente os interesses dos mais pobres e oprimidos neste país, mas sim
os interesses dos exploradores e opressores nacionais e estrangeiros. Na
conspiração dos imperialistas, será difícil para
eles utilizarem o dr. Yunus, com a sua "brilhante" imagem anti-povo e
anti-pobre, como seu instrumento político em qualquer futura crise
política.
27/Abril/2011
[*]
Badruddin Umar
é um conhecido político e historiador marxista do Bangladesh.
O original encontra-se em
http://www.countercurrents.org/umar270411.htm
. Tradução de DAZ.
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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