Congresso Nacional dos Povos do Equador
condena Lucio & o neoliberalismo
— Aprovado plano de governo
— Mobilização nacional em 21 de Agosto

por Pedro de la Cruz [*]

Equador: Índios à espera. Mais de 2500 delegados representantes de cerca de 300 organizações sociais equatorianas concluíram dia 22 de Julho o "Congresso Nacional dos Povos do Equador". O evento realizou-se na Universidade Politécnica Salesiana, sede simbólica do levantamento indígena de Fevereiro de 2001. O discurso inaugural foi pronunciado por Hebe de Bonafini, presidente da Asociación de Madres de Plaza de Mayo de Argentina.
Organizações sociais, de indígenas, afroequatorianos, camponeses, jovens, mulheres, pequenos comerciantes, aposentados, servidores públicos, estudantes, do magistério, petroleiros, electricistas, jornalistas, empresários progressistas, militares na reserva e activistas de direitos humanos confluíram num só "Comando Conjunto del Pueblo" e numa proposta única: o "Plan de Gobierno del Congreso de los Pueblos y la Estrategia Unificada para derrotar al neoliberalismo".

Dentre as organizações que se pronunciaram pela unidade incluem-se: FENOCIN, FEI, FEINE, ENLACE, AEEQ, FUT, CEDOCUT, CTE, FTP, CONASEP, FETSAPI, CPME, APDJ, FRENTE DE SALVACIÓN NACIONAL, FETRAPEC, FRENTE POPULAR, UNE, FEUE, JRE, FESE, UCAE, UGTE, CMS, APDH, etc. Também subscreveram o acordo para o início das acções de mobilização Pedro de la Cruz, Edgar Ponce, P. Eduardo Delgado, Marco Morillo, Santiago Yagual, Jenny Londoño, Luis Villacís, Diego Cano (líder petroleiro, na clandestinidade), Antonio Vargas, e muitos outros.

O Congresso manifestou solidariedade para com os dirigentes sindicais petroleiros despedidos e com ordens de captura emitidas pelo presidente Lucio Gutiérrez, manifestou-se contra a repressão policial e militar que atinge as comunidades indígenas de Sarayacu que se opõem à privatização do petróleo. Os filhos e as mães dos dirigentes petroleiros que estão na clandestinidade tiveram uma presença activa em toda a jornada.

Quanto ao chamado "governo popular" do presidente Lucio Gutiérrez, os participantes do Congresso dos Povos não tiveram reticências em classificá-lo: "De 'popular' não resta nada — já tirou a máscara", afirmaram os líderes sociais presentes. Condenaram ainda a política autoritária, a perseguição a dirigentes sociais e a jornalistas, a espionagem telefónica e a rede de inteligência que o coronel Patricio Acosta (mão direita de Lucio) montou no país.

Transcreve-se o texto final da resolução do Congresso dos Povos do Equador. Os seus organizadores pedem que o mesmo seja transcrito em todos os "escuros rincões do mundo" — expressão utilizada por Bush — que resistem ao neoliberalismo.



MANIFESTO RESOLUTIVO DO CONGRESSO DOS POVOS

JÁ BASTA !

Esperámos seis meses. Estabelecemos compromissos com Lucio Gutiérrez para cumprir o mandato de 21 de Janeiro de 2000 a fim de refundar a república, reactivar a produção, sair ordenadamente da dolarização, derrotar a corrupção pública e privada, construir um quarto poder moral da Nação; deter a ALCA, defender a soberania e impulsionar uma integração diferente; impedir as privatizações dos recursos estratégicos, sobretudo petróleo, electricidade, telecomunicações, segurança social, educação e saúde, e desenvolver um firme processo de modernização; promover uma política de paz e de não alinhamento diante do conflito colombiano; promover a reactivação da economia rural e um plano nacional de desenvolvimento humano para enfrentar a pobreza e o desemprego.

Mas vemos com indignação que Lucio Gutiérrez optou por continuar a mesma política neoliberal que outrora condenou; uniu-se aos representantes da direita oligárquica e moderna, com os Febres Cordero, os Mauricios e os Arboledas; converteu-se no principal aliado do governo Bush e no mais disciplinado executor das políticas do Fundo Monetário Internacional. Não podemos ter nenhuma esperança neste caminho, pois já sabemos para onde conduziu os povos da Nossa América.

As causas da crise não foram resolvidas e sim agravadas: estamos diante de uma grave recessão económica, cresceu o desemprego e subemprego e fomos conduzidos a um crescente envolvimento na guerra na Fronteira Norte. E, o que é mais preocupante, surgiram novas formas de autoritarismo, com a perseguição contra os dirigentes operários, indígenas, populares e sociais, agora convertidos pelo governo em "delinquentes e terroristas", com a acção de redes de espionagem e a reimplantação da Doutrina de Segurança Nacional como a norma máxima da República.

Hoje, conclamamos todas as nossas organizações e o nosso povo a dizer: Já basta!

Estamos diante da obrigação moral e política de retomar o caminho histórico construído em conjunto e através da luta os povos indígenas, movimentos sociais, organizações laborais, organizações camponesas, militares patriotas, forças políticas, empresários honestos, cristãos comprometidos, organismos de direitos humanos, organismos de defesa do meio ambiente e cidadãos/ãs democráticos.

Estamos perante uma disjuntiva programática: ou somos capazes de travar o avanço das fracassadas receitas neoliberais ou veremos a destruição da nossa Pátria. Não há espaço para posições intermediárias.

Hoje, neste CONGRESSO DOS POVOS, reassumimos nosso caminho de unidade e independência. Acabaram os tempos das manipulações do diálogo, dos documentos de aspirações, dos mandatos e dos pedidos ao governo. Iniciamos nosso caminho soberano, numa linha de oposição democrática e de promoção do PLANO DE GOVERNO DOS POVOS. Resolve-se, em conjunto e unitariamente, adoptar as seguintes disposições das nossas organizações para todo o território da República:

1- Vamos organizar a nível sectorial, regional e em cada província o CONGRESSO DOS POVOS, como um espaço de unidade e de decisões para defender a soberania, o património nacional, a vida e a democracia e apresentar diante do país e debater com a sociedade em seu conjunto o Plano de Governo dos Povos aprovado por todos e todas em 20 de Julho de 2003.

2- Conclamamos todas as forças sociais, indígenas, produtivas e políticas que estejam dispostas a enfrentar a política neoliberal e a construir um Equador justo para todos e todas a participar neste processo de unidade e de luta.

3- Convocamos todo o povo equatoriano, defraudado pela traição do governo, a mobilizar-se no dia 21 de Agosto de 2003.

4- Para alcançar uma saída para a crise, propomos:

a) Deter as privatizações e concessões do petróleo, electricidade, segurança social, telecomunicações, educação e saúde; suspender a tentativa do governo de apoderar-se dos fundos da segurança social e dos excedentes petroleiros a fim de destiná-los ao pagamento da dívida externa; e promover um processo de modernização das empresas públicas.

b) Promover a luta por um Plano de Emergência de reactivação económica que comece pelo apoio ao campo e às empresas públicas produtivas públicas e privadas, pela suspensão de todas as formas de continuação da salvação (salvataje) bancária, e por acordar uma saída ordenada da dolarização. Rechaçar a elevação dos impostos, em particular dos prédios rústicos, e das tarifas dos serviços básicos, em particular da electricidade e dos telefones.

c) Exigir que cesse a perseguição contra os trabalhadores petroleiros, professores da Politécnica Nacional, comunidades indígenas de Sarayacu, e os demais companheiros/as acusados/as de "subversivos e terroristas". Defender o respeito dos direitos à organização, à privacidade da comunicação e exigir que se eliminem as redes de espionagem. Exigir aos organismos judiciais, em particular à Procuradoria (Fiscalía) que não se submeta às pressões políticas do executivo e levante imediatamente as injustas ordens de prisão contra nossos companheiros e companheiras. Exigir a imediata saída da Frente Económica e do ministro da Energia, Carlos Arboleda.

d) Fortalecer a campanha de luta contra a ALCA, a Base de Manta, o Plano Colômbia e as privatizações.

e) Defender os direitos trabalhistas, à organização, a um salário digno, à contratação colectiva. Defender os direitos dos aposentados a uma elevação substancial das pensões. Deter o "projecto de Lei da Unificação Salarial" proposto pelo governo, que é uma armadilha para destruir a estabilidade dos trabalhadores e reduzir seus rendimentos. Propor, em sua substituição, uma Lei da Equidade Salarial e exigir o respeito dos direitos dos comerciantes pequenos e informais.

f) Lutar pela elevação do orçamento social, para combater a pobreza, sobretudo com o fortalecimento da educação, da segurança social e da saúde pública. Opormo-nos às migalhas dos "Bonos de la Pobreza". Opormo-nos à elevação do preço do gás e exigir uma política que elimine os intermediários, controle o contrabando e o consumo suntuário e fortaleça a participação da Petroecuador nos produtos embalados e na comercialização.

Este é o momento da UNIDADE. Vamos juntar as nossas forças para construir o país que aspiramos para todas e todos, porque sabemos que SIM, OUTRO EQUADOR É POSSÍVEL.

[*] Jornalista

O original encontra-se em
http://www.nodo50.org/cgi-bin/mailman/listinfo/diariodeurgencia


Este artigo encontra-se em http://resistir.info .

14/Jul/03