Sustentabilidade no século XXI
por A. M. Samsam Bakhtiari
[*]
tradução de J. Figueiredo
INTRODUÇÃO
A sustentabilidade nunca foi um problema planetário. Em breve
poderá vir a sê-lo. Algo 'jamais vu' para a espécie humana.
Até à aurora do século XX ninguém se preocupara com
a
sustentabilidade pois a principal actividade económica, a agricultura,
era basicamente sustentável: ano a ano, o produto da terra era colhido
de acordo com os ciclos da Mãe Natureza.
Até mesmo as sucessivas ondas de industrialização pareciam
ser facilmente sustentáveis e, naturalmente, os serviços
tão pouco criavam quaisquer problemas.
A questão da sustentabilidade global foi levantada inicialmente pelo
Clube de Roma, em 1972, com o seu relatório seminal 'Limites do
crescimento'. Mas a severa advertência do relatório gradualmente
desvaneceu-se no último quarto de século.
DEFINIÇÃO
Preliminarmente tentemos definir o que é 'sustentável'. Este
conceito vasto ajusta-se mal a qualquer definição simples.
Entretanto, ele tem implicações "para um não
especificado longo período de tempo" digamos, "um certo
número de gerações humanas". Além disso, sua
imagem multifacética contem noções de
'manutenção', 'continuidade' e 'persistência'. De certa
forma, podia ser "a capacidade para navegar à presente velocidade
rumo a um futuro previsível".
De facto, sustentável significa diferentes coisas para diferentes
pessoas. Para um político é uma palavra útil que
ele gosta muito de utilizar tal como "desenvolvimento socialmente
sustentável". Para o ambientalista, ela parece de
importância crítica pois ata num só conjunto a Terra
à economia e ao sistema social. E, para o homem corrente, soa positiva
e reconfortante: quem pensaria em apoiar a 'insustentabilidade'?
Não só o seu significado varia com os indíviduos que a
utilizam como os seus reflexos diferem quando examinados do ponto de vista das
principais entidades sociais existentes no planeta.
DIFERENTES VELOCIDADES
Toda a sociedade ou agrupamento humano vive num nível específico
de desenvolvimento, portanto a uma dada velocidade. Falando em termos gerais,
no dealbar do século XXI, a espécie humana pode ser subdividida
em cinco grandes grupos: (1) pré-agrícola; (2) agrícola;
(3) industrial; (4) pós-industrial; e (5) os pioneiros da era da
informação.
Para cada um dos grupos acima citados, 'sustentabilidade' não só
tem um diferente significado como também implicações muito
diversas. No nível mais baixo do espectro, apenas ajustamentos menores
podem manter o grupo numa rota sustentável. Em contraste, no
nível mais alto, mesmo perturbações menores podem
descarrilar o mais refinado dos sistemas. Assim, pode-se dizer que a
vulnerabilidade de um grupo é inversamente proporcional à sua
velocidade média. E também, como corolário, que quanto
mais vulnerável for o sistema, mais instável e menos
sustentável ele será se posto à prova.
É interessante verificar que os muitos ricos e os muito pobres em cada
grupo não têm de se preocupar com a sustentabilidade. Os primeiros
sempre poderão adquirir os pré-requisitos para sustentar o seu
estilo de vida, ao passo que os últimos sempre serão capazes de
prover a sua miséria.
Para a grande maioria neste intervalo, a questão da sustentabilidade
acabará no fim das contas por depender da questão crucial dos
futuros abastecimentos de energia.
ENERGIA
A actual oferta global de energia é dominada pelos combustíveis
fosseis: petróleo, gás natural e carvão. Mas o fardo
principal cai sobre o petróleo que ainda fornece 40% das necessidades
globais de energia primária.
Todo o processo de produção depende da energia. Mesmo a lavoura
modesta está directamente dependente dela, tal como a agricultura
plenamente mecanizada exige combustíveis e fertilizantes. As grandes
indústrias tal como a automobilística, aeroespacial,
química e serviços públicos são altamente
intensivas em energia. E mesmo as 'novas' indústrias da era da
informação consomem grandes quantidades de energia: cerca de 30%
da electricidade da California é tragada pelos computadores e toda a sua
parafernália.
O FIM
(THE CRUNCH)
Durante o século XXI parece inevitável o fim do petróleo
(petroleum crunch)
. O mundo não pode consumir 28 mil milhões de barris de
petróleo bruto por ano e ilusoriamente esperar que este continue a ser
'sustentável'. Com reservas de petróleo estimadas em cerca de
1000 mil milhões de barris, é claro que dentro destas
próximas décadas a oferta inevitavelmente deixará de
cobrir a procura, na medida em que as reservas de petróleo gradualmente
secarem.
Para o observador perspicaz, as primeiras pequenas falhas energéticas
já surgiram na California (a sexta economia do mundo) e no Brasil (um
dos mais prometedores países em desenvolvimento). Estes primeiros
sinais de perturbação assumiram a forma de cortes de corrente: a
electricidade é o Calcanhar de Aquiles da energia.
E quando acaba a luz, "voces voltam à Idade Média",
segundo
o Dr. Richard Duncan.
DESACELERAÇÃO VOLUNTÁRIA
Por todo o globo, algumas pequenas minorias principiam a acordar para as
ameaças a longo prazo. Suas motivações são
certamente diversificadas, mas todas elas têm a 'sustentabilidade' como
objectivo.
Projectos de estudos sobre sustentabilidade básica estão a
multiplicar-se por todo o mundo. Basta citar três exemplos:
-Primeiro, o 'Projecto de indicadores de sustentabilidade'
lançado por
três municípios do Texas, que cobre 40 parâmetros
relacionados com actividades sustentáveis sob quatro categorias: (1)
Comunidade/infância; (b) Economia/força de trabalho; (c)
Ambiente/saúde; e (d) Terra/infraestrutura.
-Segundo, o 'Projecto sustentabilidade' principiado em 1999
pela University of
Victoria, na Columbia Britânica (Canadá) que até agora
concebeu um "Sistema de Administração
Sustentável" (SMS), apoiou estudos sobre energia, ambiente,
transportes e água, e ainda auditou todo os resíduos gerados no
seu campus.
-Terceiro, o "Movimento das cidades lentas"
("Slow Cities' Movement)
lançado na região italiana da Toscania para ser preciso
em Greve, um pequeno centro urbano a cerca de 25 km de Florença e
agora circundado por umas 70 cidades toscanas, é um caso exemplar. Os
objectivos pretendidos pela associação são salvar "a
alma das cidades", bem como as zonas rurais, sua tradição e
sua culinária.
MAIS LENTAS?
Alguns dos provérbios populares, como "A pressa leva ao
fracasso" e "Devagar se vai ao longe", não foram forjados
em vão pelos nossos antepassados ao longo dos séculos.
Possivelmente, um modo de vida mais lento e mais calmo poderia realmente vir a
enriquecer a vida comunitária e por fim a melhorar a qualidade de vida.
Será que realmente precisamos de andar cada vez mais rápido?
Para alcançar quem?
Há um voto na lentidão nas campanhas
anti-globalização que se espraiam por todo o mundo (como Seattle,
Genova, ...). Há inegáveis sinais de que por trás do
bruá-á existe uma reacção contra o
super-rápido e o super-eficiente. As batalhas perfiladas parecem ser
entre as "Forças da tradição" e as
"Forças da velocidade". Uma luta global começou a opor
o mercado aberto uma vez por semana à superloja, a padaria tradicional
à fábrica de pão completamente automatizada, e o
restaurante local fora de moda ao
fastfood
relâmpago.
Postas em perspectiva, estas são as primeiras fagulhas de uma prolongada
contestação que lança a generalidade das pessoas contra a
eficiência organizada. Não é preciso dizer que o resultado
final deste duelo desigual está decidido de antemão: a
generalidade dos indivíduos prevalecerá, como sempre aconteceu.
RETORNO ÀS RAÍZES
Todas as vezes em que é confrontado com a mais vaga
sensação de insustentabilidade, o Homem instintivamente
retorna às suas raízes. Quando travado nos seus
caminhos por circunstâncias fora do seu controlo (como por exemplo
fornecimentos de petróleo reduzidos), ele terá apenas uma forma
de sair da sua difícil situação: agarrar-se àquilo
que tem: suas tradições, sua história, sua cultura
numa palavra, suas 'raízes'.
Assim, com a 'insustentabilidade' a assomar bombasticamente durante o
século XXI, o Homem será cada vez mais atraído para as
suas fontes originais e para velocidades mais baixas ou seja,
retornará às cores e aos ritmos da Mãe Natureza.
No fim, os vencedores finais serão aqueles com raízes mais
profundas especialmente aqueles que tiveram a previsão de
cuidadosamente preservarem as suas durante o turbulento século XX. E ai
daqueles que perderam as suas raízes.
À escala individual, os prémios finais irão para aqueles
que
estão preparados para fazer os sacrifícios necessários.
Além disso, aqueles que têm humildade uma qualidade humana
altamente apreciada por Deus Poderoso atravessarão melhor do que
outros os labirintos e caminhos tortuosos que estão por vir.
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Analista de petróleo, iraniano.
O original deste artigo encontra-se em
http://www.samsampapers.go.cc/
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info
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