O domínio dos transportes rodoviários de mercadorias pelos privados, o "lock-out" dos patrões, o preço do gasóleo e a manipulação da opinião pública
por Eugénio Rosa
[*]
Como consequência de uma politica de transportes profundamente errada
seguida pelo sucessivos governo apostou-se, em Portugal, fundamentalmente no
transporte rodoviário, um transporte caro, altamente poluente, e gerador
de dependência externa (das importação de petróleo)
em prejuízo de outros meios transportes, como são o
marítimo e o ferroviário, onde se registou um profundo
desinvestimento em que o fecho crescente de linhas é a parte
visível.
![]() Fonte : Instituto da Mobilidade e dos Transportes Terrestres
Em toneladas transportadas, em 2000, 85,1% do transporte interno de mercadorias
em Portugal era rodoviário; 8,3% marítimo e apenas 6,7% era feito
através da ferrovia, o que revela já uma profunda
distorção no sistema de transportes português. Nove anos
depois, ou seja, em 2009, já 91,3% do transporte de mercadorias em
Portugal era rodoviário, 5,3% era marítimo e apenas 3,4% era
feito pela ferrovia. E a administração da CP tenciona continuar
esta politica desastrosa tendo já anunciado o fecho de mais linhas, e o
governo associou-se a ela com o anúncio da privatização da
CP, ou de parte dela. Como a presença do Estado é nula no
transporte rodoviário de mercadorias, este encontra-se totalmente nas
mãos de privados, embora seja estratégico para o abastecimento da
população e das empresas. E apesar do nº 4 do artº 57
da Constituição da República dispor que "é
proibido o
lock-out",
que é
" qualquer decisão unilateral do empregador que se traduza na
paralisação total ou parcial da empresa",
e não uma greve como diziam vários jornalistas nas suas
peças,
os patrões das empresas de transportes de mercadorias decidiram
paralisar as suas empresas, ficando claro o perigo que representa esse
domínio (no Chile foi precisamente um
"lock-out"
dos patrões das empresas de transportes que criou as
condições para a ditadura militar)
![]()
Em 2010, exceptuando o mês de Junho, o preço do gasóleo sem
impostos em Portugal foi sempre superior ao preço médio da UE27,
o que representou um lucro extraordinário significativo para as
petrolíferas a operar em Portugal. O quadro seguinte, com dados da
Direcção Geral de Energia de Janeiro de 2011 (os últimos
disponíveis) mostra a situação no inicio de 2011.
Em Janeiro de 2011, o preço de venda do gasóleo antes de impostos, ou seja, o preço que reverte totalmente para as empresas era, em Portugal, superior ao praticado em 24 países da União Europeia (apenas na Finlândia e na Grécia era cerca de 3% inferior ao de Portugal). Nessa data, o preço do gasóleo sem impostos em Portugal era 6,6% superior ao preço médio da União Europeia (27 países). Por outro lado, o peso dos impostos, medido em percentagem do preço de venda a público do gasóleo, representava em Portugal 46,7% do preço de venda ao público, enquanto a média na União Europeia era de 50,1%. Se a comparação for feita com Espanha, conclui-se que o preço de venda do gasóleo antes de impostos em Espanha (0,673/litro) era inferior ao de Portugal (0,692/litro), enquanto o preço de venda a publico (PVP) em Espanha (1,202/litro) era inferior ao de Portugal (1,3/litro), devido precisamente ao facto da carga fiscal em Portugal ser superior à espanhola. Em Portugal representava 46,7% do preço de venda ao (PVP), enquanto em Espanha representava 44%,portanto menos 2,7 pontos percentuais. No entanto, não é a diferença da carga fiscal que determina que o preço de venda ao público em Portugal seja 8,15% superior ao preço praticado em Espanha. Para concluir isso basta ter presente o seguinte: se a carga fiscal em Portugal fosse igual a 44% do preço de venda, e não a 46%, o preço de venda ao público devia ter sido1,237/litro, portanto um preço ainda superior ao preço espanhol em 2,9%. O AUMENTO VERIFICADO NO PREÇO DO GASÓLEO SEM IMPOSTOS EM PORTUGAL FOI 51% SUPERIOR AO AUMENTO VERIFICADO NO PREÇO DE VENDA AO PÚBLICO DE JANEIRO E MARÇO DE 2011 As petrolíferas para produzir produtos refinados (por ex., gasolina ou gasóleo) não utilizam petróleo adquirido no mesmo dia, ou na semana ou semanas anteriores. A GALP tem armazéns para armazenar petróleo para a produção de três meses. Consequentemente, o petróleo utilizado num dia foi adquirido muito antes. Para além disso, as petrolíferas não fazem aquisições para um dia, mas fazem contratos a médio prazo, com preços bem definidos e com quantidades elevadas. Portanto, o aumento dos preços dos combustíveis não resulta do aumento do preço do petróleo verificado nesse dia ou nas semanas anteriores como pretendem fazer crer as petrolíferas, manipulando a opinião pública. O quadro 3, construído com dados divulgados pela Direcção de Energia, mostra que o preço do gasóleo sem impostos em Portugal aumentou mais do que preço de venda ao público nos três primeiros meses de 2011. Quadro 3- Aumento dos preços do gasóleo sem impostos e com impostos em Portugal durante os três primeiros meses de 2011
Entre 31 de Janeiro e 3 de Março de 2011, segundo a Direcção Geral de Energia do Ministério da Economia, o preço do gasóleo em Portugal sem impostos aumentou 10%, enquanto o preço de venda ao público, portanto com impostos subiu 6,6%; portanto o aumento percentual verificado no preço sem impostos foi superior em 51% ao preço de venda ao público, que inclui impostos. É evidente que uma das causas do aumento do preço de venda ao publico do gasóleo é precisamente a subida elevada verificada no preço antes dos impostos, ou seja, no preço que reverte integralmente para as empresas, que constitui a fonte dos seus elevados lucros. E isto apesar das petrolíferas pretenderem fazer crer o contrário com o claro objectivo de manipular a opinião pública. Em Espanha, apesar do preço do gasóleo sem impostos ser inferior ao registado em Portugal, mesmo assim a Comissão Nacional de Concorrência (CNC), que corresponde a Autoridade de Concorrência (AdC) portuguesa, considera-o excessivo e diz que resulta da concorrência insuficiente que se verifica no mercado espanhol como consta do "INFORME DE SEGUIMENTO DEL INFORME DE CARBURANTES PARA AUTOMOCIÓN DE LA CNC" que divulgou em 2010. e que citamos textualmente no inicio deste estudo. Em Portugal, a AdC, apesar dos preços dos combustíveis sem impostos serem superiores aos espanhóis considera a situação normal, e nada diz nem nada faz. O governo, como é seu hábito quando estão em jogo os interesses dos grupos económicos e financeiros, mantém-se mudo e quieto, e nada faz também.
18/Março/2011
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Economista,
edr2@netcabo.pt
,
www.eugeniorosa.com
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