Manipulação da opinião pública para esta aceitar a politica de PECs como necessária e inevitável

Estes PECs não são nem necessários nem inevitáveis
– a continuarem, só levarão o país e os portugueses ao desastre

por Eugénio Rosa [*]

RESUMO DESTE ESTUDO

O INE, divulgou o "Procedimento dos Défices Excessivos" que enviou à Comissão Europeia, para esta controlar o défice orçamental português, onde revela que, contrariamente àquilo que constava do PEC-4 do governo, a Divida Publica em 2010 não era 142.178 milhões € (82,4% do PIB) mas sim 159.433 milhões € (92,4% do PIB), ou seja, mais 17.255 milhões €; e que, em 2011, a Divida Pública atingirá não 152.486 milhões € (87,9% do PIB) como dizia o governo no PEC-4, mas sim 168.793 milhões € (97,3 do PIB), ou seja, mais 16.203 milhões €. Este aumento da Divida Pública resulta (uma parte) de dívidas que até agora o governo tem procurado ocultar (desorçamentando-as), no seu intuito de iludir a opinião pública e que agora, por imposição da UE, foi obrigado a incluir.

Essas dívidas são os "buracos" de 1.800 milhões € do BPN e de 450 milhões € do BPP, consequências de uma gestão danosa, que o governo assumiu, e que agora os contribuintes terão de pagar; e de 3.169 milhões € de euros de dividas das empresas de transportes públicos que, como consequência da politica irresponsável que o governo tem seguido neste sector (até a esta data o governo não assinou um único contrato com qualquer uma delas, como recomendou o Tribunal de Contas, que definisse com rigor os direitos e obrigações dessas empresas, o que permitiu, por um lado, que o governo transferisse para elas uma parte dos défices orçamentais e, por outro lado, se multiplicassem nelas, com total impunidade, actos de má gestão dos "amigos" que nomeou como administradores, com elevados custos para o País); repetindo, o governo foi obrigado agora a incluir mais 5.419 milhões € de dividas, o que fez subir o défice orçamental, em 2009, dos 9,3%, que tinha anunciado anteriormente, para 10%, e, em 2010, dos 7,3% previstos para 8,6% do PIB. Como temos denunciado nos estudos que temos divulgado, existem ainda mais défices orçamentais que o governo tem transferido para as empresas públicas que ainda não foram incluídos. São, por ex., os casos da CP cujos prejuízos acumulados até ao fim de 2009 já eram superiores aos seus capitais próprios em 2.234 milhões €, e os dos Hospitais EPE de 1.341,3 milhões € de prejuízos até 1º sem. 2010.

Desta forma, está-se a criar uma situação que é incomportável para o País e para os portugueses. Segundo o INE, em 2010, os juros da Divida Pública atingiram 5.195 milhões €, o que representa uma taxa de juro média ponderada de 3,5% ao ano. Em 2011, a Dívida Pública consolidada das Administrações Públicas atingirá, segundo o INE, 168.756,6 milhões €. Se se tivesse de pagar uma taxa de juro de 8% por esta divida, que é aquela que os chamados "mercados" já estão a impor em certos empréstimos a Portugal, o País teria de pagar pela mesma, só de juros, 13.503 milhões € – o que é mais daquilo que, segundo o INE, existe em 2011 para investimento público (3.807 milhões €) e no OE de 2011 para transferir para o SNS (8.140 milhões €). Mesmo admitindo uma taxa de 6%, que é aquela que a Irlanda está a pagar ao FMI e à UE, Portugal teria de pagar por uma dívida com aquela dimensão 10.128 milhões € de juros por ano, o que continua a ser incomportável para um país em profunda crise económica (recessão económica) e social. E a banca que impõe estas taxas depois vende essa mesma dívida ao BCE (mas os Estados estão impedidos de o fazer) pagando uma taxa entre 1% e 1,75% e embolsando lucros especulativos. O BCE transformou-se assim num instrumento ao serviço dos bancos na exploração dos contribuintes europeus. É urgente acabar com esta espoliação. Na Islândia a população protestou e os credores tiveram de baixar a taxa de juro e de alargar o período de amortização para 37 anos. É necessário também que os portugueses ponham cobro a esta politica de desastre que Sócrates e, agora também Passos Coelho, querem prosseguir.

A situação em 2011 e nos anos seguintes será ainda mais grave. Irresponsavelmente, Sócrates comprometeu-se com a UE a reduzir o défice orçamental em, 2011, para 4,6% e, em 2112, para 2% do PIB. Passos Coelho, já foi a Bruxelas e à Alemanha de Merkel, em autêntica vassalagem, a comprometer-se com os mesmos objectivos. E isto quando em 2010 o défice foi de 8,6%. É certo que 1,8% do PIB dizem respeito às dívidas de 2.250 milhões € do BPP e BPN e 793 milhões € da REFER, Metro de Lisboa e Metro do Porto. Mesmo se retiramos aos 8,6% os 1,8% ainda ficam 6,8%. No entanto, uma parte da redução do défice de 2010 é ilusória pois foi conseguida através da transferência dos Fundos de Pensões da PT e da Marconi (2.693 milhões €, 1,6% do PIB). E esta redução sendo ilusória terá de ser somada aos 6,8% o que dá 8,4% do PIB. Assim, o que Sócrates e Passos se comprometeram em 2011 foi reduzir o défice de 8,4% para 4,6% do PIB em 2011, ou seja, em 6.592 milhões € (3,8% do PIB). É evidente, com a recessão económica e a consequente quebra de receitas fiscais que as medidas já aprovadas pelo governo não serão suficientes. Portanto, se a actual politica continuar, seja com Sócrates ou Passos Coelho, serão necessários mais PECs.

Como afirmou Paul Krugman, prémio Nobel da economia referindo-se a Portugal:
"A redução da despesa em períodos de desemprego elevado é um erro. Os defensores da austeridade prevêem que esta produza dividendos rápidos sob a forma de aumento da confiança económica, com poucos ou nenhuns efeitos negativos sobre o crescimento e o emprego; o problema é que não têm razão. Cortar na despesa numa economia em recessão acaba por ser contraproducente nem que seja em termos fiscais: quaisquer poupanças na despesa são anuladas pela redução da receita fiscal resultante da contracção da economia. É por isso que a estratégia correcta é emprego primeiro e défice depois".

Em Portugal, quem defenda a mudança da politica que está a ser seguida, que está a conduzir o País e os portugueses ao desastre, é acusado, pelo governo, por toda a direita e pelo pensamento económico neoliberal dominante nos media de pertencer à esquerda radical. Desta forma, procura-se isolar e desacreditar, perante a opinião pública, todo o pensamento diferente. O pensamento económico oficial, papagueado nos media, pelos comentadores oficiais, procura assim transformar-se na única verdade, ou seja, na cultura dominante. E, como referia já Pierre Bourdieu, em Poder simbólico, a cultura dominante procura impor " a legitimação da ordem estabelecida ", surgindo como um "poder quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que é obtido pela força (física ou económica), contribuindo assim, segundo a expressão de Max Weber, para a "domesticação dos dominados", ou seja, para a sua passividade, resignação e aceitação. No entanto, quem não se deixe subjugar pela gigantesca operação de manipulação da opinião pública em curso ou pelas benesses do poder sabe bem que esta politica é um grande erro, é mesmo um autêntico suicídio.

A POLITICA PORTUGUESA É UM ERRO PARA O PREMIO NOBEL DA ECONOMIA PAUL KRUGMAN

Paul Krugman, um economista americano, prémio Nobel da Economia, que não pode ser acusado de pertencer à esquerda radical, afirmou em 25 de Março deste ano, referindo-se expressamente a Portugal, o seguinte:
"A redução da despesa em períodos de desemprego elevado é um erro. Os defensores da austeridade prevêem que esta produza dividendos rápidos sob a forma de aumento da confiança económica, com poucos ou nenhuns efeitos negativos sobre o crescimento e o emprego; o problema é que não têm razão". E perguntava: "Porque não começar pela redução do défice?" E respondia: "Porque os aumentos de impostos e os cortes da despesa contribuiriam para desacelerar ainda mais a economia, agravando o desemprego. Além disso, cortar na despesa numa economia em recessão acaba por ser contraproducente nem que seja em termos fiscais: quaisquer poupanças na frente da despesa são anuladas pela redução da receita fiscal resultante da contracção da economia. É por isso que a estratégia correcta é emprego primeiro défice depois".

Não é preciso saber muito de ciência económica para compreender isto, mas os nossos economistas e comentadores oficiais, com acesso privilegiado aos media, teimam em repetir o contrário, certamente porque assim obtêm as benesses do poder económico e politico dominante. Passos Coelho, ainda não chegou ao governo, mas em declarações a um jornal norte-americano, o Wall Street Journal, disse o seguinte: "Votamos contra o PEC IV não porque se foi longe demais, mas porque não foram suficientemente longe" ( Público, de 30/03/2011). Eis o que pensa este "homem invulgar", como é designado num livro de propaganda que se encontra em muitas livrarias, antes mesmo de chegar ao governo, e o que se espera dele se os portugueses permitirem que chegue. No entanto, não se coibiu de afirmar em Portugal, comentando a intervenção do presidente da República anunciando a dissolução da Assembleia da República, que o mais importante é o crescimento económico mas ao mesmo tempo defende a redução ainda maior da despesa publica o que, em plena crise económica, são coisas incompatíveis. Portanto, Passos Coelho tem um discurso para o estrangeiro e outro para consumo interno com o objectivo de manipular a opinião pública e obter votos.

BANCO DE PORTUGAL CONFIRMA QUE ESTA POLITICA SÓ GERA RECESSÃO E DESEMPREGO

O Banco de Portugal acabou de divulgar o seu "Boletim Económico – Primavera 2011" que veio também confirmar que a politica que está a ser seguida é um grande erro e mesmo um suicídio. Comparando as previsões agora apresentadas com a do boletim anterior – Inverno de 2010 – conclui-se que as actuais são muito piores. Há três meses o Banco de Portugal tinha previsto uma quebra na actividade económica de -1,3% em 2011, e um crescimento de 0,6% em 2012; mas agora a quebra da actividade económica em 2011 já aumentou para -1,4% e crescimento em 2012 baixou para 0,3%, ou seja, para metade do previsto há três meses. E nesta quebra acentuada da actividade económica não estão consideradas, segundo ele, os efeitos das medidas anunciadas pelo governo depois da aprovação, na Assembleia da República, do OE-2011. Para além disso, o Banco de Portugal refere ainda que "em 2011 persistem riscos de implementação de mais medidas que "decorrem do grau de consolidação orçamental numa magnitude sem precedentes" e que, em 2012, as medidas adicionais que tanto o PS como PSD consideram necessárias "implica uma nova contracção significativa da actividade económica, à semelhança ao projectado para 2011". Portanto, de trimestre para trimestre, o Banco de Portugal vai corrigindo para pior as suas previsões. É o descalabro total da economia portuguesa com consequências sociais dramáticas.

Se comparamos estas previsões do Banco de Portugal com as do governo constantes no PEC-4, conclui-se do irrealismo das previsões do governo. Segundo este a quebra na actividade económica, este ano, seria apenas de -0,9%, quando o Banco de Portugal prevê já uma quebra em cerca de 55,5% superior, e isto sem considerar ainda os efeitos negativos de todas as medidas já anunciadas por Sócrates (e Passos Coelho diz que ainda é pouco) e a anunciar se esta politica se mantiver.

As consequências a nível do desemprego e da inflação, quando as pensões, os salários e o subsídio de desemprego ou estão congelados ou sofrem cortes, são também dramáticas. O governo tinha previsto no PEC-4 para 2011 uma taxa de inflação de 2,7% e uma taxa de desemprego de 11,2%, com uma taxa de variação do emprego de -0,6%, ou seja, uma destruição de 30.000 empregos. O Banco de Portugal prevê em 2011 uma taxa de inflação de 3,6%, ou seja, mais 33,3% do que a do governo; e uma destruição de -0,9% do emprego (45.000 empregos), ou seja, mais 50% do que o previsto pelo governo. E, recorde-se que ainda não estão considerados os efeitos recessivos de todas as medidas já anunciadas por Sócrates. E Passos Coelho ainda diz que não são suficientes.

O AUMENTO DA DÍVIDA PÚBLICA É DEVIDO AO BPN, AO BPP E ÀS EMPRESAS DE TRANSPORTES, SENDO A DESPESA COM JUROS JÁ SUPERIOR AO INVESTIMENTO PÚBLICO OU 77% DAS TRANSFERENCIAS PARA O SNS

Os dados oficiais seguintes dão uma informação mais verdadeira sobre divida actual do Estado.

Quadro 1- PIB, Divida Pública, Juros, Investimentos e Transferências do OE para SNS-2007/2011
ANOS
PIB (INE)


Milhões euros
Divida Pública Bruta Consolidada segundo INE
Milhões euros
Divida Pública Consolidada segundo Governo-PEC-4
Milhões euros
Juros
segundo INE

Milhões euros
Juros
se taxa for de 8%

Milhões euros
Investimento público
segundo INE

Milhões euros
SNS (*) (Transferências OE)

Milhões euros
2010 172.546 159.433 142.178 5.195 12.755 4.782 8.699
2011 173.477 168.793 152.486 6.327 13.503 3.807 8.140
Fonte: Procedimento Défices Excessivos -2011- INE; PEC-4 do governo: pág. 38; (*) Relatório OE-2011

O INE acabou de divulgar o chamado "Procedimento por Défices Excessivos" (PDE), o documento que o governo tem de enviar à Comissão Europeia para esta controlar o défice orçamental. E os dados divulgados agora pelo INE incluem, por imposição da União Europeia, uma parte da dívida pública que o governo tinha procurado ocultar. Assim, foram incluídos 1.800 milhões € relativos os prejuízos do BPN, e 450 milhões € referentes aos do BPP, o que soma já 2.250 milhões €. Portanto, prejuízos causados pela gestão danosa dos banqueiros que agora terão de ser pagos pelos contribuintes portugueses. A este valor há ainda a acrescentar 3.169 milhões € de dívidas das empresas de transporte REFER, Metropolitano de Lisboa e Metro do Porto de 2007/10, com as quais o governo nunca assinou qualquer contrato de prestação de serviços de transportes públicos à população, com disposições claras e rigorosas, como o Tribunal de Contas já defendeu várias vezes. Isto permitiu ao governo ocultar, por um lado, uma parte do défice orçamental nestas empresas, não pagando o que devia pela prestação do serviço de transportes públicos e, por outro, os actos de má gestão realizados pelos seus homens de mão que coloca nestas empresas e que são frequentemente objectos de noticia (mesmo no dia 1 de Abril, e não tinha nada a ver com a mentira deste dia, os jornais noticiaram o caso de um administrador dos CTT, que é o amigo SE dos Transportes e que foi nomeado há 5 anos por este, que dizia que era licenciado em economia – saiu no Diário da República – agora veio-se a saber que não o era, e a aquisição de três carros de luxo para os administradores da Carris, uma empresa que está tecnicamente falida). Como consequência a divida pública disparou, em 2010, para 159.433 milhões € (92,4% do PIB) segundo o INE, ou seja, mais 17.255 milhões € do que o constante do PEC-4 do governo, e a previsão da divida pública feita pelo INE para 2011 atinge 168.793 milhões € (97,3% do PIB), ou seja, mais 16.307 milhões € do que o previsto pelo governo no PEC-4. Este aumento tão significativo da Divida Pública fará aumentar os juros a pagar, o que acabará por determinar mais cortes nas despesas com as funções sociais do Estado (por ex., prestações sociais, pensões, SNS, etc), com consequências sociais e económicas desastrosas, se a actual politica de obsessão do défice e de juros especulativos se se mantiver.

Em 2010, a taxa de juros média ponderada foi 3,3% e a prevista pelo INE para 2011 é de 3,7%, o que fará subir a despesa do Estado com juros em 22%, pois passará de 5.195 milhões € para 6.327 milhões €. O valor de juros previstos pelo INE para 2011, é já superior a todo o investimento público previsto pelo INE para este ano, e representa 77,6% das transferências do OE para o SNS que, entre 2010 e 2011, diminuíram já de 8.699 milhões e para 8.140 milhões €. No entanto, Portugal já está a pagar pelos empréstimos que contrai taxas de juros muito superiores a 3,7%, que variam entre 5,7% (empréstimos a um ano) e mais de 9% (empréstimos a 3,5, 6 e 7 anos). Admitindo uma taxa de 8%, pela divida de 168.783 milhões €, Portugal teria de suportar uma despesa anual só com juros estimada em 13.500 milhões €, o que é incomportável. E com uma taxa de juros de 6%, que é a que a Irlanda esta a pagar ao FMI e à União Europeia, daria uma despesa anual de 10127,6 milhões €, o que continuaria a ser incomportável para um País que vai entrar em recessão económica prolongada como consequência da politica contraccionista que Sócrates e Passos Coelho pretendem seguir, pois foi esse o compromisso que ambos já assumiram perante a União Europeia e Merkel.

É certo que este ano, a substituição da divida antiga mais a divida nova soma cerca de 45.000 milhões €, e é só esta que estará sujeita a estas taxas, mas com o tempo e a substituição gradual de toda a divida, Portugal acabará por suportar juros especulativos incomportáveis. Para além disso, os bancos cobram ao Estado Português taxas entre 5,7% e 9%, e depois vendem essa mesma divida ao BCE pagando uma taxa de juros entre 1% e 1,75%, obtendo lucros especulativos à custa dos contribuintes portugueses, e o Estado português continua a não se poder financiar junto do BCE. Só aquela diferença de juros permite à banca obter, para 45.000 milhões €, um lucro de 2.500 milhões € extra.

02/Abril/2011
[*] Economista, edr2@netcabo.pt , www.eugeniorosa.com

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04/Abr/11