Em 2008, só de juros, 1,8 milhão de famílias endividadas com a
habitação terão de pagar à banca mais de
5,7 mil milhões
RESUMO DESTE ESTUDO
A actual crise financeira, que começou nos EUA, um país
apresentado durante muito tempo pelo pensamento económico neoliberal
dominante em Portugal, nomeadamente a nível dos media, como exemplo a
seguir no campo da segurança e solidez, do crescimento económico
e do emprego, crise essa que se alastrou por muitos outros países, como
consequência de uma globalização totalmente desregulada
para não dizer mesmo selvagem imposta pelo capital financeiro,
está a ter em Portugal já consequências muito graves. No
nosso País, que caminha a olhos vistos para uma recessão
económica que só o governo e os seus defensores se recusam ver e
em tomar medidas para atenuar os seus efeitos, as consequências a
nível das famílias portuguesas são cada vez maiores e mais
dramáticas.
O número de famílias portuguesas com empréstimos para
habitação era já, em Julho de 2008, 1.808.096
representando cerca de 49,5% do total das famílias portuguesas. E entre
Dezembro de 2004 e Junho de 2008, o número de famílias endividas
aumentou +24,6% e o valor total da divida cresceu em +48,1%.
Como consequência da crise gerada pela ganância do capital
financeiro, só possível pelo domínio que este exerce sobre
os governos, que ao desmoronar-se arrastam economias e as
condições de vida de milhões de pessoas, em Portugal,
entre Janeiro de 2005 e Julho de 2008, a prestação média
total com o empréstimo destinado à aquisição de
habitação aumentou 31,3%, mas a parcela destinada a
amortização desse empréstimo diminuiu em -18,9%, enquanto
a parte dessa mesma prestação destinada ao pagamento de juros
cresceu em +75,3%. Por outras palavras, em cada 5 pagos pelo devedor
português apenas 1,44 é destinada à
amortização, ou seja, à redução da divida,
enquanto 3,56 destinam-se ao pagamento de juros. Como consequência,
o número médio de anos necessários para pagar o
empréstimo para habitação passou de 31 anos para 45 anos,
ou seja, mais do que a vida activa da maioria dos portugueses. Entre 2004 e
2008, o valor total dos rendimentos das famílias portuguesas que estas
serão obrigadas a entregar à banca para pagar só os juros
de empréstimos para aquisição de habitação
passará de 2.629,6 milhões de euros para 5.749,7 milhões
de euros, ou seja, aumentará em 118,7%. E isto tomando como base a taxa
de juros de Junho de 2008. E, entre Junho de 2008 e 18 de Setembro de 2008, a
taxa de juros Euribor a seis meses, que serve de base ao crédito
à habitação, já subiu de 5,13% para 5,22%
Embora os encargos com a habitação representem já uma
parcela importante das despesas das famílias portuguesas, o Instituto
Nacional de Estatística recusa-se a incorporar esta despesa no
índice de preços que publica mensalmente. E a
justificação que utiliza é que estas despesas destinam-se
à "aquisição de um activo". A recusa do INE em
publicar um índice que incorpore os encargos das famílias com a
aquisição da habitação só pode ser
interpretada como tendo razões politicas, ou seja, visa ocultar o
verdadeiro aumento de preços para as famílias portuguesas,
já que publica vários outros índices (IPC, IPCH, Indicador
da inflação subjacente, etc.). Se este índice fosse
publicado naturalmente a taxa de inflação seria muito superior
à oficial, o que tornaria mais difícil à propaganda do
governo e do patronato de ocultar a degradação real das
condições de vida em Portugal, nomeadamente dos trabalhadores. O
INE presta assim um bom serviço ao governo e aos patrões, mas um
mau serviço ao País pois ao contribuir para ocultar a descida
real do poder de compra dos salários e das pensões de reforma em
Portugal ajuda a que esta continue.
O aumento dos juros está a contribuir fortemente para a
degradação das condições de vida em Portugal,
nomeadamente dos trabalhadores. É urgente que sejam tomadas medidas para
impedir que a situação atinja níveis
insustentáveis. E não é suficiente a baixa do chamado
"spread", pois os "spread" mais elevados aplicam-se
sobretudo aos empréstimos mais recentes. Uma medida mais adequada seria
uma bonificação nos juros, como já existiu no passado,
financiada em parte pelo Orçamento do Estado, e se possível em
parte também pela banca, reduzindo os elevados "spread" e
também os juros que cobra, destinada nomeadamente às
famílias em que a taxa de esforço seja elevada (por ex., acima
dos 25%) e com rendimentos baixos (por ex. abaixo dos 1.600 euros por
mês), e sem ligações a famílias ricas. Se isso
não suceder, com a continuação do aumento da taxa de
juros, milhares de famílias entrarão em ruptura e em
falência, e o crédito mal parado disparará, como já
começa a acontecer.
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Nos últimos três anos e meio o valor total dos empréstimos
para habitação aumentou significativamente, assim como
também cresceu muito o número de famílias portuguesas
endividadas com a habitação. O quadro seguinte, construído
a partir de dados divulgados pelo Banco de Portugal e pelo Instituto Nacional
de Estatística, revela que uma parte muito significativa das
famílias portuguesas se encontram endividadas com a
habitação.
Entre Dezembro de 2004 e Junho de 2008, o valor total dos empréstimos
concedidos pela banca para a habitação aumentou em 48,1%, e o
número de famílias endividadas subiu em 24,6% ( mais 356.886
famílias). Assim, em Junho de 2008, o total de famílias
portuguesas endividadas como consequências de empréstimos
contraídos junto da banca para adquirir habitação atingia
1.808.096, o que representava cerca de 49,5% das famílias portuguesas.
ENTRE JAN/2005 E JUL/2006, OS ENCARGOS COM JUROS AUMENTARAM 75%, E O
NÚMERO DE ANOS NECESSÁRIOS PARA AMORTIZAR O EMPRESTIMO PASSOU DE
31 PARA 45 ANOS
Como mostra o quadro, construído com dados divulgados pelo Instituto
Nacional de Estatística, a parte da prestação da casa
destinada a amortizar o empréstimo tem diminuído de uma forma
continua, enquanto a parte de juros tem crescido de uma forma vertiginosa. Como
consequência o número de anos necessários para pagar o
empréstimo de habitação aumentou muito em Portugal.
Entre Janeiro de 2005 e Julho de 2008, a prestação media total
com o empréstimo em divida destinado à aquisição de
habitação aumentou em 31,3%. Se desdobrarmos a
prestação em duas partes - a destinada a
amortização do empréstimo e a destinada a pagamento dos
juros concluímos que enquanto a primeira diminuiu, a segunda
aumentou assustadoramente.
Assim, entre Janeiro de 2005 e Julho de 2008, a parcela da
prestação média paga por cada família destinada a
amortização do empréstimo para habitação
diminuiu em -18,9%, enquanto a parte dessa mesma prestação
destinada ao pagamento de juros cresceu em 75,3%. Como consequência, o
número médio de anos necessários para pagar o
empréstimo para habitação passou de 31 anos para 45 anos,
ou seja, mais do que a vida activa da maioria dos portugueses.
EM 2008, AS FAMILIAS PORTUGUESAS PAGARÃO MAIS DE 5.749 MILHÕES
SÓ DE JUROS À BANCA POR EMPRESTIMOS PARA A
AQUISIÇÃO DE HABITAÇÃO
Entre 2004 e 2008, a parcela dos rendimentos das famílias entregues por
estas à banca para pagar juros com a aquisição da
habitação cresceu assustadoramente como revela o quadro seguinte,
construído a partir de dados divulgados pelo Banco de Portugal e pelo
Instituto Nacional de Estatística.
Entre 2004 e 2008, a parcela dos rendimentos familiares que os portugueses
foram obrigados a entregar à banca para pagar só juros de
empréstimos destinados a aquisição de
habitação passou de 2.629,6 milhões de euros para 5.749,7
milhões de euros, ou seja, aumentou 118,7%. E tenha se em conta
que nos nossos cálculos dos valores anuais utilizamos, para 2008, como
valor mensal a média de juros pagos em Junho de 2008, e após esse
mês a taxa de juro para habitação não tem parado de
aumentar. Entre Junho e Setembro de 2008, a taxa Euribor a 6 meses, que serve
de base aos empréstimos para a habitação, aumentou de
5,13% para 5,22%.
O ÍNDICE DE PREÇOS NO CONSUMIDOR PUBLICADO TODOS OS MESES PELO INE
ESTÁ ERRADO E ESTA ENTIDADE RECUSA-SE A CORRIGI-LO
Embora os encargos com a habitação representem já uma
parcela importante das despesas de centenas de milhares de famílias
portuguesas, o Instituto Nacional de Estatística recusa-se a incorporar
esta despesa no índice de preços que publica mensalmente. E a
justificação que utiliza é que estas despesas destinam-se
à "aquisição de um activo". Esta
justificação pseudo-técnica torna-se cada vez mais absurda
se se tiver presente que uma parcela cada vez maior desses encargos é
com juros e não com amortização dos empréstimos, e
que agora, com a diminuição do valor da
amortização, são já necessários em
média 45 anos para amortizar (pagar) um empréstimo
médio. E o INE recusa-se a publicar esse Índice quando já
publica vários índices (ÍPC, Índice de
Preços no Consumidor Harmonizado, Índice de
inflação subjacente, etc.).
A recusa do Instituto Nacional de Estatística em publicar um
índice que incorpore os encargos das famílias com a
aquisição da habitação só pode ser
interpretada por razões politicas, ou seja, visando ocultar o aumento
real de preços para as famílias portuguesas. Se este
índice fosse publicado naturalmente a taxa de inflação
seria muito superior à oficial, o que tornaria à propaganda do
governo mais difícil de ocultar a degradação real das
condições de vida em Portugal, nomeadamente dos trabalhadores e
reformados. Igualmente tem razões politicas o facto de o INE não
utilizar no Índice que publica mensalmente a estrutura das despesas das
famílias portuguesas que obteve através de um inquérito
que realizou em 2005-2006, continuando a utilizar a estrutura do
inquérito de 2000 que está desactualizada. A
utilização da estrutura de 2005-2006 determinaria valores de
inflação superiores aos que têm sido divulgados. Desta
forma, o INE está a prestar um bom serviço ao governo e ao
patronato, mas um mau serviço aos País, aos trabalhadores e aos
reformados que são desta forma lesados no aumento dos seus
salários e pensões.
É URGENTE MEDIDAS PARA IMPEDIR O ESTRANGULAMENTO FINANCEIRO DAS FAMILIAS
Nos nossos cálculos utilizamos valores médios, mas é
evidente que os empréstimos e os encargos não se distribuem de
uma forma igual por todas as famílias. Existem famílias que
estão a pagar menos que a prestação média e existem
famílias que estão a pagar muito mais que o encargo médio.
E é evidente que não é apenas diminuindo o chamado
"spread" que se resolve o problema destas famílias pois os
valores de "spread" mais elevados aplicam-se aos empréstimos
mais recentes. Uma medida mais adequada seria uma bonificação nos
juros, como já existiu no passado, financiada em parte pelo
Orçamento do Estado, e se possível em parte também pela
banca, reduzindo um pouco os elevados juros que cobra, destinada nomeadamente
às famílias com uma taxa de esforço elevada (por ex.,
acima dos 25%) e com rendimentos baixos (por ex. abaixo dos 1.600 euros), e que
não tivessem ligações a famílias ricas. Se isso
não suceder, com a continuação do aumento vertiginosos da
taxa de juros, milhares de famílias portuguesas entrarão em
ruptura e em falência, e o crédito mal parado disparará,
como já começa a acontecer
20/Setembro/2008
[*]
Economista,
edr@mail.telepac.pt
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