O caminho para a estagnação em Portugal
A destruição do aparelho produtivo nacional, que tinha atingido
níveis impensáveis durante o governo PSD/CDS, continuou, embora a
um ritmo menor, durante o governo PS, pondo em causa o crescimento futuro e
sendo uma das causas da queda da produtividade. Tudo isto tem sido ocultado no
discurso económico oficial de êxitos e no da
oposição, que se carateriza também por uma falta de
qualquer estratégia a médio e a longo prazo para o país.
O caminho para a estagnação em Portugal: o emprego aumenta mas a
produtividade por empregado diminui; o investimento (FBCF) é inferior ao
consumo de capital fixo; acionistas predadores; e a desigualdade na
repartição do rendimento agrava-se.
Um dos aspetos para o qual temos chamado repetidamente a atenção
e que tem sido sistematicamente esquecido pelos comentadores oficiais,
incluindo economistas, que têm acesso privilegiado aos
órgãos de comunicação social, é que o
aumento do emprego em Portugal tem estado associado a uma redução
da produtividade por empregado, o que é grave para o desenvolvimento do
país, pondo mesmo em causa o futuro, já que um crescimento
económico assente fundamentalmente no aumento do emprego, como tem
acontecido, tem limites muito estreitos que rapidamente se esgotam.
O emprego cresce mas produtividade por empregado continua a diminuir
Entre 2015 e 2018, o emprego em Portugal cresceu em 313,2 mil trabalhadores,
constituindo uma das principais bandeiras do atual governo e das forças
políticas que o apoiam. Segundo o INE, o emprego total aumentou, entre
2015 e 2017, de 4,578 milhões para 4,802 milhões de empregados,
ou seja, o número de empregados cresceu em 226,2 mil. No fim do 2.º
Trimestre de 2018, o emprego tinha aumentado para 4,889 milhões, ou
seja, mais 87.000 empregos, quando comparado com o valor de dezembro de 2017. E
isto é positivo.
No entanto, a produtividade de cada empregado, medida dividindo o VAB do
país
(ao PIB retiramos os impostos líquidos de subsídios para o
não influenciar já que estes dependem de decisões
políticas e não do valor do produzido)
pelo número de empregados, e a conclusão que se tira é a
que consta do gráfico 1, construído com os dados do INE, ou seja,
uma diminuição que tem sido sistematicamente ignorada, quer pela
comunicação socia,l quer pelo governo e as forças
políticas que o apoiam.
Entre 2008 e 2013 a produtividade por empregado aumentou
(passou de 30.943/empregado para 33.285/empregado)
devido fundamentalmente à redução brutal do emprego
(nesse período o emprego diminuiu em 630.000, segundo o INE)
; mas, a partir de 2013, verificou-se uma recuperação do emprego,
nomeadamente com o atual governo, embora a produtividade por empregado,
calculada com base no VAB, para não ser influenciada nem por impostos
nem subsídios, tem diminuído
(passou de 33.285 para 32.555 por empregado, entre 2013 e
2017)
como os dados do INE mostram, o que é grave, mas que parece não
incomodar ninguém, nem é referido pelos média.
O investimento continua insuficiente para compensar o consumo do capital fixo
Esta queda continuada na produtividade tem como uma das causas o reduzido
investimento. Durante o governo PSD/CDS e a troika verificou-se em
Portugal
uma quebra brutal, quer do investimento privado quer público, não
tendo sido suficiente o realizado para compensar o chamado Consumo
de Capital Fixo,
segundo o INE, ou seja, aquele capital que, devido ao uso, se degrada ou fica
sem utilização. Como consequência, registou-se no
país a degradação do aparelho produtivo nacional,
incluindo infraestruturas básicas (caminhos de ferro, escolas,
universidades, hospitais, centros de saúde, etc.) indispensáveis
ao crescimento económico e ao desenvolvimento. No entanto, essa
realidade profundamente negativa para o país e para os portugueses ainda
não foi ultrapassada como os últimos dados do INE, que constam do
quadro 1.
Quadro 1 FBCF e Consumo de Capital Fixo no período 2011-2017
Anos
|
Formação Bruta de Capital Fixo (Investimento)
Milhões
|
Consumo de capital fixo
(desgaste e inutilização)
Milhões
|
SALDO
Milhões
|
2011
|
32 451,8
|
31 428,9
|
1 022,9
|
2012
|
26 672,0
|
30 551,5
|
-3 879,5
|
2013
|
25 122,0
|
29 884,2
|
-4 762,2
|
2014
|
25 993,1
|
30 323,6
|
-4 330,6
|
2015
|
27 843,9
|
31 012,6
|
-3 168,7
|
2016
|
28 292,7
|
31 339,8
|
-3 047,1
|
2017
|
31 186,1
|
32 073,2
|
-887,1
|
Fonte: INE, Contas Nacionais Provisórias 2017
Entre 2011 e 2015, portanto com o governo PSD/CDS e a troika, a
Formação Bruta de Capital Fixo (Investimento) foi inferior ao
Consumo de Capital Fixo (desgaste e inutilização) em 16.141
milhões ; nos anos de 2016 e 2017, já com o atual governo
PS, continuou-se a verificar um saldo negativo, embora de menor
dimensão, pois a Formação Bruta de Capital Fixo foi
inferior ao Consumo de Capital Fixo em 3.934,1 milhões . A
destruição do aparelho produtivo nacional, que tinha atingido
níveis impensáveis durante o governo PSD/CDS, continuou, embora a
um ritmo menor, durante o governo PS, pondo em causa o crescimento futuro e
sendo uma das causas da queda da produtividade. Tudo isto tem sido ocultado no
discurso económico oficial de êxitos e no da
oposição, que se carateriza também por uma falta de
qualquer estratégia a médio e a longo prazo para o país.
Portugal, um país atrasado em relação à
média da União Europeia, continua a investir muito menos que a
média dos países europeus, e o pouco investimento público
previsto não é depois realizado, para cumprir as metas do
défice.
O país continua alegremente a atrasar-se e a divergir em
relação à média dos países da União
Europeia. Isso é claro em relação à percentagem do
PIB (riqueza nacional criada) que é destinada ao investimento, ou seja,
a criar emprego e capacidade produtiva para o país poder crescer e
desenvolver-se a ritmos mais elevados. Segundo o Eurostat, em 2017, a
Formação Bruta de Capital Fixo, ou seja, o investimento total em
Portugal, correspondeu apenas a 16,2% do PIB, sendo apenas 1,8% do PIB o
investimento público
total.
Na União Europeia, em 2017, a média de investimento total
(público e privado) nos 28 países correspondeu a 20,5% do PIB,
sendo o investimento público 2,7% do PIB
(+ 50% do que em Portugal)
e o investimento privado 17,8% do PIB
(+ 23,6% do que em Portugal).
Em Portugal, em 2018, até ao mês de julho, as
Administração Públicas só tinham executado 39,1% do
investimento previsto para este ano. É previsível que se chegue
ao fim do ano sem que se tenha investido o total do pouco investimento previsto
para 2018, mas é também desta forma que se reduz o défice
para além do previsto e que o governo e, em particular, Mário
Centeno, brilha perante os senhores de Bruxelas, à custa do
atraso do país. O investimento pouco e insuficiente que é
realizado, pondo em causa o futuro de Portugal, não tem
constituído preocupação nos debates na
comunicação social nem fora dela.
Acionistas predadores que sacam os lucros e os transferem para o estrangeiro
sem pagar impostos sobre dividendos são tratados da mesma forma que
acionistas que investem os lucros em Portugal, criando emprego e riqueza.
Uma coisa que sempre causa espanto é, chegada a altura da
preparação do Orçamento do Estado, a azáfama dos
partidos políticos para apresentarem novas propostas isoladas de
alteração dos impostos, muitas delas sem um estudo fundamentado e
sem conhecimento claro das suas consequências e do seu impacto, e sem
qualquer enquadramento, nomeadamente numa estratégia a médio e
longo prazo de crescimento económico e desenvolvimento do país
(melhoramento das condições de vida dos portugueses).
Talvez para que fiquem na pequena história, dando o seu nome ao novo
imposto criado.
Tenho chamado repetidamente a atenção, em vão, para o
facto de que não deve ser tratado fiscalmente da mesma forma um
acionista que não recebe os lucros da empresa através de
dividendos, sendo esses lucros investidos em Portugal, criando emprego e
riqueza, de outros acionistas, a que designo por acionistas predadores, que
sacam os lucros das empresas, os transferem para o estrangeiro, como acontece
na maioria das grandes empresas a operar em Portugal que são já
controladas por estrangeiros, não pagando nem imposto sobre os
dividendos
(se for português e resida em Portugal tem de pagar uma taxa de 28% sobre
o dividendo recebido, o que não acontece com os estrangeiros ou com
portugueses que criam empresas no estrangeiro como o Jerónimo Martins e
muitos outros),
deixando as empresas totalmente descapitalizadas que, para poderem funcionar,
têm de se endividar enormemente. A estes acionistas predadores devia ser
aumentado o IRC, para desmotivar a descapitalização das empresas,
e diminuído o IRC apenas àqueles que investem os lucros.
O Jornal de Negócios, um jornal insuspeito, divulgou, no seu numero de 4
de setembro de 2018, uma lista de grandes empresas, cujos acionistas se
comportavam como autênticos predadores, pois como escrevia o
próprio jornal
a divida das empresas do PSI-20 aumentou em 1.180 milhões
na primeira metade do ano, devido à distribuição de
dividendos relativos a 2017. As empresas do PSI terminaram a 1ª metade do
ano de 2018 com um nível de endividamento líquido de 28.653,7
milhões , distribuindo aos acionistas 2.430 milhões
de lucros,
a esmagadora deles transferidos para o estrangeiro, sem pagar impostos sobre
dividendos. Entre estas estas empresas estão a EDP, a Jerónimo
Martins, a NOS, a SONAE, a NAVIGATOR, os CTT, a REN, a IBERSOL, a PHAROL, a
GALP, a ALTRI, a SEMAPA, etc. Era necessário que a classe
política
[1]
olhasse para esta situação e que conseguisse distinguir as
empresas cujos comportamentos dos acionistas lesam o país, das empresas
cujos acionistas promovem o crescimento e o desenvolvimento do país, o
que ainda não aconteceu, até esta data. Muitas vezes mete-se tudo
no mesmo saco.
Agrava-se ainda mais a grave distribuição do rendimento em
Portugal
Associada a toda esta situação, a distribuição do
rendimento em Portugal tem-se agravado em benefício do Capital e em
prejuízos dos Trabalhadores, como revela o gráfico 2,
construído com dados divulgados pelo INE
(os salários de 2017 são uma estimativa nossa).
Em 2008, a parcela do PIB que revertia para os Trabalhadores, sob a forma de
Ordenados e Salários, era de 36,6% e, em 2017, já era apenas de
34,6%. Em relação ao Capital, a parcela do PIB de que se
apropriava sob a forma de Excedente Bruto de
Exploração era, em 2008, 40,6% do PIB e, em 2018, 41,8% do
PIB. A parcela do Trabalho diminuiu, mas a do Capital cresceu. Os
comentários são desnecessários mas revela o que
está a acontecer no país
sendo mais um grave obstáculo ao desenvolvimento
[2]
.
[*]
edr2@netcabo.pt
Notas de "Pelo socialismo":
[1] Os editores consideram que não há classe
política. Cada partido e os seus dirigentes representam os
interesses de determinada classe.
[2] Um total rigor teórico imporia que se acrescentasse: mesmo no
quadro do sistema capitalista vigente.
O original encontra-se em
eugeniorosa.com/...
e em
pelosocialismo.blogs.sapo.pt/o-caminho-para-a-estagnacao-em-portugal-48820
Este artigo encontra-se em
http://resistir.info/
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